Caso Daniel Alves: mulher que denunciou estupro 'não dorme, toma remédio, não trabalha’, depõe prima da vítima

"Estiveram por muito tempo lá, não sei quanto. Quando ela saiu, estava com a cara feia... Então perguntei se ela estava bem? Ela só disse "vamos!". Fomos embora. Ela disse que ele [Daniel Alves] fez muito mal a ela, que tinha ejaculado dentro dela... Minha prima não dorme, toma remédio, antes não era assim. Tem tomado antidepressivos, não trabalha. Apenas sai de casa quando queremos e insistimos muito. Choramos dia sim, dia não", disse a prima da denunciante em seu depoimento.

Ela também afirmou que a vítima foi ao banheiro voluntariamente, mas que só se deu conta de que local se tratava quando entrou e foi impedida de sair.

Uma amiga da denunciante que estava na boate naquela noite de 30 de dezembro de 2022 também prestou depoimento. A jovem falou por cerca de meia hora e precisou interromper a declaração duas vezes devido ao choro.

A mulher afirmou que a denunciante foi encontrada "chorando inconsolavelmente". "Nunca a tinha visto chorar assim na minha vida". A testemunha relatou que a amiga repetia "ele me machucou muito, ele me machucou muito". "No final, nós três choramos porque não sabíamos como reagir", disse, se referindo à denunciante e à prima dela.

Segundo a amiga, Alves aproximou-se dela e da denunciante com uma atitude "nojenta", tocando nos corpos de ambas. Também falou sobre o atual estado da vítima: "Ela perdeu muito peso, não se encontra mais com os amigos porque não confia em ninguém. Pensa que a estão seguindo, nunca está tranquila, acha que estão tentando fotografá-la. É difícil tirá-la de casa. Fica obsessiva com tudo".

Neste primeiro dia de julgamento, também depuseram a própria denunciante - por 1 hora e 15 minutos, a portas fechas e com voz destorcida -, o porteiro do local onde supostamente ocorreu o estupro e dois garçons da boate.

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O julgamento na 21ª seção da Audiência de Barcelona é presidido pela juíza Isabel Delgado Pérez, acompanhada dos magistrados Luis Belestá Segura e Pablo Díez Noval.

"O julgamento do caso Daniel Alves é emblemático, coincide com o movimento de avanço legislativo na Espanha e joga luz sobre o tema do consentimento para atos sexuais", explica a promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo Silvia Chakian.

"Ausência de capacidade plena da vítima, emprego de força física ou coação moral, ausência de liberdade para manifestação de vontade, mitos sobre o comportamento da vítima de violência sexual e credibilidade da palavra da mulher, são todos elementos que virão à tona durante os debates no Tribunal", conclui.

Alves está preso preventivamente desde 20 de janeiro de 2023, no Centro Penitenciário Brians 2, nos arredores de Barcelona. Ele teve quatro pedidos de liberdade provisória negados pela Justiça da Espanha, que usou como argumento o risco de fuga para o Brasil. O Ministério Público pede nove anos de prisão para o brasileiro. A defesa da denunciante quer 12 anos — pena máxima para esse tipo de crime na Espanha.

A Justiça impôs ao ex-jogador o pagamento de € 150 mil (R$ 783 mil) à vítima caso seja condenado, por danos morais e psicológicos. Não há prazo definido para a apresentação da sentença final.

Segundo a promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo Silvia Chakian, a repercussão do episódio despertou atenção para o protocolo espanhol No Callen. A medida foi criada para enfrentar situações de violência de gênero em espaços de lazer a partir de ações de prevenção, acolhimento e proteção à vítima, com respeito à sua privacidade e autonomia, exigindo a capacitação de funcionários.

Após o caso Daniel Alves, diversas iniciativas legislativas parecidas avançaram no Brasil. Uma das mais importantes foi a sanção da lei nº 14.786/23 pelo presidente Lula, em dezembro de 2023, que criou o Protocolo Não é Não, também para amparar mulheres vítimas de violência em espaços de lazer.

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Chakian também destaca como avanço o fato de ter havido resposta imediata de decreto de prisão de Alves fundamentada na palavra da denunciante. "Por outro lado, chama atenção que desde o primeiro momento ela tenha declarado publicamente que não queria ser identificada. Como se o recebimento de direito legal, na hipótese de condenação de um autor de crime sexual, tornasse menos legítima essa expectativa de justiça. O que é revelador do calvário de julgamento moral público e perverso que as mulheres vítimas de violência sexual atravessam quando denunciam agressores: acusadas de serem loucas, vingativas ou, em casos de autores famosos e ricos, interesseiras", pondera.

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