Silvia Chakian

Por Silvia Chakian*

O caso Daniel Alves despertou atenção para o Protocolo espanhol "No Callem", criado pelo governo de Barcelona em 2018 para enfrentar situações de violência de gênero em espaços de lazer. O protocolo é estruturado em prevenção à violência, acolhimento e proteção à vítima, com respeito à sua privacidade e autonomia, exigindo a capacitação de funcionários para saber como agir.

Com a repercussão do caso e a rápida prisão do jogador, ao menos seis iniciativas legislativas para um protocolo semelhante no Brasil foram apresentadas por parlamentares em âmbito municipal, estadual e federal. O governador de São Paulo inclusive sancionou a Lei 17.621/23 que determina aos estabelecimentos do setor de entretenimento a adoção de medidas de auxílio a mulheres em situação de risco, ainda pendente de regulamentação.

A Espanha vem passando por uma modernização de sua legislação, em especial após o estupro coletivo que gerou comoção no país em 2016, episódio conhecido como La manada. Trata-se de avanço semelhante ao panorama brasileiro, iniciado com a Lei Maria da Penha em 2006, complementado pela Lei do Feminicídio em 2015, Lei da Importunação Sexual em 2018, Lei do Stalking e da Violência Psicológica em 2021. Mas, tanto lá como aqui, há aspectos comuns que precisam ser destacados.

Se, por um lado, no caso Daniel Alves houve resposta imediata de decreto de prisão fundamentada na palavra da vítima, por outro, chama atenção que desde o primeiro momento ela tenha declarado publicamente que não queria ser identificada
— Silvia Chakian

Como se o recebimento de direito legal, na hipótese de condenação de um autor de crime sexual, tornasse menos legítima essa expectativa de justiça. O que é revelador do calvário de julgamento moral público e perverso que as mulheres vítimas de violência sexual atravessam quando denunciam agressores: acusadas de serem loucas, vingativas ou, em casos de autores famosos e ricos, interesseiras.

É terrível que tenhamos que lidar com essa realidade, que acontece na Espanha e da mesma forma no Brasil, do paradoxo entre a evolução legislativa, aumento dos instrumentos de proteção, canais de denúncia, até ampliação da compreensão sobre violência na sociedade; e o descrédito da palavra da vítima de violência sexual, o julgamento moral, a persistência dos mitos e crenças sobre seu comportamento antes, durante e pós denúncia.

É sintomático que a vítima tenha declarado abrir mão de direito legítimo: tinha a certeza (assim como todas nós) que seria julgada, circunstância que a especialista Deborah Tuerkheimer já definiu como anticipated credibility discount.

Uma vítima de acidente de trânsito não abre mão do direito à indenização. Da mesma forma quando vítima de erro médico, roubo ou estelionato. Trata-se de direito previsto em lei, porque da violação decorrem danos financeiros e morais. E esse impacto acontece principalmente na violência de gênero. Tanto é que, no Brasil, o Superior Tribunal de Justiça entende que o dano moral devido à mulher em casos de violência doméstica prescinde de prova e deve ser reparado já na sentença que condena o agressor.

Então, para além da comemoração dos avanços legislativos, é preciso compreender como funciona o sistema de descrédito da vítima, tão inescapável e perverso que quando não a silencia faz com que ela abra mão de direito legal, como estratégia desesperada de neutralizá-lo. Com mais de duas décadas de atuação na esfera criminal, nunca conheci uma mulher que tenha conquistado sucesso, fama ou riqueza pelo fato de se dizer vítima de estupro.

Para além da comemoração dos avanços legislativos, é preciso compreender como funciona o sistema de descrédito da vítima, tão inescapável e perverso que quando não a silencia faz com que ela abra mão de direito legal
— Silvia Chakian

Necessário repudiar essas concepções sobre as mulheres, historicamente construídas como pouco confiáveis, vingativas, descontroladas ou mercenárias, para que denúncias de violência sexual sejam investigadas seriamente, com respeito à dignidade das vítimas, garantias de não revitimização, evitando-se, principalmente, que estereótipos de como deve ser e se comportar uma “verdadeira vítima” não mais influenciem negativamente esses julgamentos. A mulher vítima de violência sexual não pode se tornar menos vítima porque exerce seu direito legítimo à indenização.

*Silvia Chakian é promotora de Justiça, mestre em direito penal e autora do livro A Construção dos Direitos das Mulheres (@silvinhachakian)

Silvia Chakian — Foto: Arquivo pessoal
Silvia Chakian — Foto: Arquivo pessoal
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