Cultura
Por , redação Marie Claire — São Paulo (SP)


A artista contemporânea Thatiana Cardoso passou três anos em contato com golpistas do amor; curiosidade se tornou trabalho, exposto na Pinacoteca de São Bernardo do Campo — Foto: Gabriel Augusto
A artista contemporânea Thatiana Cardoso passou três anos em contato com golpistas do amor; curiosidade se tornou trabalho, exposto na Pinacoteca de São Bernardo do Campo — Foto: Gabriel Augusto

Em 2021, quando a pandemia de covid completou seu primeiro (longo) ano, o inbox do Instagram da artista Thatiana Cardoso recebeu uma mensagem incomum. O remetente era um dito soldado norte-americano que estaria em missão no Afeganistão. E o assunto? Ele estava perdidamente apaixonado por ela. Casada e com uma filha pequena, a artista não buscava um novo amor e achou tudo aquilo muito estranho. Antes disso, nunca tinha ouvido falar em golpe do amor.

Dois indícios chamaram a atenção dela. “Estranhei quando ele me chamou de ‘donzela’. E, ao abrir o Instagram dele, vi fotos de armamentos pesados misturados com mensagens românticas.” Ao fazer uma busca reversa no Google, descobriu que a foto vinha de um banco de imagens do Exército dos Estados Unidos. Além da fotografia, encontrou alertas da Interpol, CIA e FBI, que avisavam que aquela foto havia sido roubada por pessoas que criam perfis falsos nas redes sociais para atrair mulheres e aplicar golpes financeiros.

"Ele demonstrou ser muito romântico e contou uma história super triste: de que era viúvo, tinha um filho e só queria casar com uma princesa para cuidar dele e da casa”, conta a artista a Marie Claire, em entrevista por vídeo. Um modus operandi que, depois entendeu, era frequente.

Por pura curiosidade, passou os três anos em diante servindo de “isca” para golpistas. Para conseguir chegar até eles, Thatiana teve acesso ao banco de imagens roubadas do Exército dos Estados Unidos e passou a procurar perfis que as usavam no Instagram. No perfil pessoal, arquivou fotos da filha, fingiu que era divorciada e assumiu uma nova persona. “Usei o mesmo perfil porque, por eu ser artista, pensavam que eu tinha dinheiro. Fazia parte do disfarce”, diz.

Trecho da obra O amor morre mais de indigestão do que de fome, em que Thatiana Cardoso expõe trechos de conversa com golpistas — Foto: Thatiana Cardoso
Trecho da obra O amor morre mais de indigestão do que de fome, em que Thatiana Cardoso expõe trechos de conversa com golpistas — Foto: Thatiana Cardoso

A artista foi fundo no experimento de se vestir de uma versão fictícia de si mesma, a ponto de manter relacionamentos com alguns destes homens por períodos que variaram de três semanas a seis meses. “Meu golpe era fingir estar apaixonada, dar trela e ver até onde esses homens queriam ir. Muitos desapareciam rápido. Acredito que porque queriam aplicar logo o golpe e acabaram conseguindo fazer outra vítima.”

Esse foi um processo, ela conta, que se tornou muito exaustivo emocionalmente. “Lembro que passava dias mandando áudios em inglês, em que precisava parecer muito apaixonada. Criei muitas mentiras para sustentar esses ‘namoros’, o que demandou muito de mim e do meu corpo.”

O Amor morre mais de indigestão do que de fome

Thatiana Cardoso monta a exposição O Amor morre mais de indigestão do que de fome, que retrata o golpe do amor — Foto: Marina Maeda
Thatiana Cardoso monta a exposição O Amor morre mais de indigestão do que de fome, que retrata o golpe do amor — Foto: Marina Maeda

A curiosidade logo se transformou em trabalho, e levou Thatiana a transformar golpe do amor em arte. O resultado desses três anos de pesquisa de campo é a exposição O Amor morre mais de indigestão do que de fome, em cartaz na Pinacoteca de São Bernardo do Campo, região metropolitana de São Paulo, até 29 de junho.

A mostra reúne 18 obras que se dividem entre fotografias, vídeos, performances e instalações que expõem a existência do crime, as táticas dos golpistas e as dores que ficam para as mulheres que se tornam vítimas. Bebendo da fonte da ironia, Thatiana ressignifica a estética cor-de-rosa e do Dia dos Namorados em ironia e repulsa.

O resultado é uma denúncia às violências psicológicas e patrimoniais que só são possíveis graças à pressão social de que mulheres devem, prioritariamente, almejar um relacionamento. E não só, mas um amor romântico, de “conto de fadas”, em que devem ser salvas e protegidas por um homem.

Essa denúncia, com requintes de deboche e humor, se materializa em obras como Explosão de Amor, em que 30 ursinhos de pelúcia com camisas de força segurando uma granada vermelha; em um ensaio com um urso gigante chamado Ronaldo; ou em Era Para Ser Doce, uma casinha de vidro preenchida com 700 cápsulas de remédio – cada uma delas com uma frase que um golpista disse nas conversas com Thatiana. Ironicamente, muitas delas trazem versículos bíblicos ou falam de Deus.

Thatiana Cardoso monta a exposição O Amor morre mais de indigestão do que de fome, que retrata o golpe do amor — Foto: Marina Maeda
Thatiana Cardoso monta a exposição O Amor morre mais de indigestão do que de fome, que retrata o golpe do amor — Foto: Marina Maeda

O amargor vem não apenas de sua própria indignação, mas das inúmeras conversas que teve também com vítimas do golpe do amor. "Os golpes são extensos e mexem com o psicológico delas: eles criam um conto de fadas, dizem que têm uma casa linda nos Estados Unidos, que estão esperando uma princesa. Ninguém pede dinheiro do dia para noite."

“Não quero que uma vítima deste golpe se sinta culpabilizada, mas acredito que possa ser um espaço de cura ou de exposição de suas dores. Frequentemente, essas mulheres são descredibilizadas e tidas como ingênuas por cair neste golpe”, pensa.

Esse tipo de estelionato emocional e financeiro tem impactos grandes no mundo. Inclusive no Brasil. Dados de 2023 do hub Era Golpe, Não Amor, que presta suporte a vítimas de golpes financeiros em relacionamentos amorosos, constatou que 4 em cada 10 brasileiras já foi vítima do golpe ou conhece alguém que foi. Outra pesquisa encomendada por Marie Claire e feita pela Toluna em outubro de 2023 mostra que 1 em cada 3 mulheres já se relacionou com perfis fakes e usaram de outra identidade e história para atraí-las. Para 20% delas, a pessoa por trás do perfil pediu favores financeiros ou dinheiro e, depois, sumiu.

Com a exposição, Thatiana pretende visibilizar uma dor que nem sempre é abordada da maneira como merece: com seriedade, sem fazer com que as vítimas se sintam ridicularizadas.

“A arte não é descolada da realidade e, às vezes, toca em lugares que não são tão bonitos. Tenho o entendimento que, ao falar da violência, a arte também fala, principalmente, sobre a nossa vida. Por meio destes trabalhos, sinto como se de alguma forma estivesse me vingando poeticamente pelas mulheres que foram vítimas.”

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