Carreira

Por Talita Fernandes, em colaboração para Marie Claire


Ambiente saudável, direitos trabalhistas e possibilidade de crescimento na empresa parecem a descrição do emprego ideal. Na realidade de 2022 pós-pandemia de covid-19, porém, nem mesmo isso tem sido suficiente para garantir que uma pessoa se mantenha em sua vaga. É isso que explica Luíza Marques, de 37 anos, quando conta sobre sua decisão de deixar um emprego em um grande conglomerado de mídia brasileiro para voltar a trabalhar como freelancer, algo que tinha feito anteriormente por sete anos. A decisão dela coincidiu com a retomada do trabalho presencial ao longo de 2022, após o arrefecimento da pandemia e a redução do número de mortes, internações e novos casos.

Investigamos o comportamento que tem mexido profundamente não só nas relações de trabalho, mas no sentido que ele tem na vida das novas gerações  — Foto:  Luma Petriz
Investigamos o comportamento que tem mexido profundamente não só nas relações de trabalho, mas no sentido que ele tem na vida das novas gerações — Foto: Luma Petriz

Luíza diz que, depois de trabalhar de forma remota em um emprego fixo entre o início de 2020 e o de 2022, a possibilidade de voltar a fazer isso no escritório por oito horas diárias a fez refletir. O deslocamento para o trabalho foi o que mais pesou, considerando que isso provocaria um aumento no tempo gasto, prejudicando, especialmente, sua prática diária de ioga. Além disso, conta que a rotina afetaria uma ferramenta que considera crucial para exercer seu ofício com qualidade: a criatividade. “O meu caso [de pedido de demissão] não é de olhar ao entorno e falar: ‘Tá todo mundo mal e vou me salvar’. Minha saída é muito mais sobre o que quero e gosto do que porque estava mal no trabalho que tinha”.

Luíza atuou com carteira assinada entre 2020 e 2022, justamente durante o período mais duro da pandemia, quando pôde fazer home office na maior parte do tempo. Com isso, conseguiu conciliar o que mais gostava da vida de freelancer: a elasticidade de trabalhar de casa.

A comunicadora faz parte de um grupo que, por diversos motivos, está aderindo ao movimento de trocar um trabalho com contratação formal por mais flexibilidade, o que muitas vezes implica “o olho da rua”. Essa tendência tem sido observada nos últimos anos em diversos países e, mais recentemente, ganhou o nome de The Great Resignation nos Estados Unidos, o que pode ser traduzido como Grande Renúncia. Especialistas em economia, recursos humanos, gênero e diversidade ouvidos por Marie Claire explicam que o fenômeno não vem de hoje e pode ter se acelerado durante a pandemia.

Com base em dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Previdência) entre janeiro e maio de 2022, a gerência de Estudos Econômicos da Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro) publicou um levantamento que mostra que uma em cada três quebras de contrato de trabalho se deu por iniciativa do trabalhador. O número chama atenção por isso acontecer num momento em que o país ainda enfrenta alta taxa de desemprego, em torno de 10%, e de baixo crescimento econômico. Uma análise detalhada mostra que essas demissões afetam diferentes parcelas da população, a depender de gênero, grau de escolaridade e área de atuação, por exemplo.

Especialistas em economia, recursos humanos, gênero e diversidade ouvidos por Marie Claire explicam que o fenômeno não vem de hoje e pode ter se acelerado durante a pandemia — Foto: Luma Petriz
Especialistas em economia, recursos humanos, gênero e diversidade ouvidos por Marie Claire explicam que o fenômeno não vem de hoje e pode ter se acelerado durante a pandemia — Foto: Luma Petriz

Questionada sobre se a Grande Renúncia chegou ao Brasil, a economista Camila Bandeira da Rocha, da Firjan, responde que sim, mas aponta diferenças. “A gente entende que esse fenômeno chegou ao Brasil, só que de uma forma diferente do que tem sido observado nos Estados Unidos. Lá, esse movimento tem sido mais geral, em diversos setores e com trabalhadores de diferentes escolaridades. No Brasil, ele tem sido principalmente de profissionais mais qualificados, com nível superior e muito direcionado, em sua maior parte, para as ocupações de tecnologia da informação”, explica. Ou seja, por aqui, as classes mais baixas não estão incluídas nesse movimento.

Camila pontua que, embora o dado bruto mostre mais homens pedindo demissão do que mulheres, um olhar mais atento permite observar diferença entre os gêneros. No total de demissões do começo do ano, 57% correspondem a homens contra 43% das mulheres. Porém, como elas são 44% da força de trabalho do mercado nacional, isso significa que, proporcionalmente, mulheres foram responsáveis por 38% das saídas do mercado contra 31% do gênero masculino.

As demissões estão mais concentradas em trabalhadores com maior grau de instrução, mas ainda que haja uma grande diferença na escolaridade entre gêneros – 32% da força de trabalho feminina tem nível superior contra 17% da mão de obra masculina – para trabalhadores desse perfil, o percentual de desistência dos postos de trabalho é equivalente em ambos os gêneros. “Quando a gente olha outro nível de escolaridade, conforme os anos de estudo vão se reduzindo, as mulheres apresentam mais pedidos de demissões se comparadas aos homens”, diz Camila.

Para a economista, os dados da pesquisa não permitem entender os motivos, mas ela apresenta a hipótese de serem elas as mais propensas a sair de vagas formais para assumir tarefas domésticas e de cuidado. “Quando a mulher tem mais escolaridade, ela tende a ter maior rede de apoio, estrutura melhor para o lar e os filhos, já as de menor escolaridade tendem a ter menos condições”, complementa.

O salário não basta

A hipótese de Camila dialoga com o que Adalgisa Bozi Soares, especialista em gênero e desenvolvimento e cofundadora da Cuidemos Consultoria e Treinamentos, observa. Ela diz que, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, há diminuição das mulheres no mercado de trabalho e que isso se dá nem sempre por escolha. “Sair do emprego é uma opção mais ou menos. Se você for perguntar para algumas mulheres, elas vão dizer que é para dar conta e para manter a saúde mental.

Se os dados do Caged mostram que as saídas do mercado formal estão mais presentes entre os trabalhadores mais favorecidos, a experiência de Liliane Rocha à frente da Gestão Kairós, consultoria especializada em sustentabilidade e diversidade, traz um outro cenário. Ela diz que tem chamado sua atenção o fato de que pessoas com marcadores de diversidade (mulheres, negros, integrantes da comunidade LGBTQIA+ e pessoas com deficiência) têm se mostrado menos propensas a permanecer no ambiente corporativo.

“O que a gente tem visto recentemente é que quem sai é quem tem marcadores identitários de diversidade, quem a gente presume que não sairia de uma empresa sem ter algo em vista, mas que está saindo por um excesso de fadiga, de cansaço e pelo sentimento de que a empresa não atende algumas necessidades suas básicas e fundamentais.”

Ela menciona o caso de três mulheres negras com quem trabalhou recentemente para reposicioná-las no mercado. No caso delas, sendo uma na faixa de 20 anos e as outras duas na casa de 40 anos, todas decidiram deixar o ambiente corporativo, mesmo com boas ofertas de emprego. A mais jovem, segundo Liliane, disse não ter interesse em se recolocar no mercado quando a Gestão Kairós a procurou. Por outros meios, Liliane descobriu que a jovem estava fazendo brigadeiros e vendendo no farol como forma de sustento.

“O que elas têm em comum, além de serem mulheres negras, é a fadiga em relação ao ambiente corporativo. Questões de raça e de gênero que elas têm de lidar são tão expressivas que preferem tentar não estar neste contexto”, afirma a CEO como uma hipótese ao fenômeno que ela tem observado.

“Me parece que para o empresariado não caiu a ficha. É difícil você entender que alguém que precisa do emprego, que alguém que não é rico, que às vezes tem problemas de saúde e familiares, prefere não trabalhar. Como a gente explica isso para o capitalista tradicional? O salário não basta, mesmo se for alto”, diz Liliane. “A gente está num conflito entre a forma como opera o capitalismo e a forma como essas novas gerações deste momento entendem que se dá o ambiente de trabalho.

Antes mesmo de a pandemia ser uma realidade, esse movimento de abandono de um posto estável e valorizado de trabalho já era observado pela escritora gaúcha Leila de Souza Teixeira, de 43 anos. Por sua própria experiência, e com o intuito de escrever uma obra de ficção, ela pesquisou essa tendência entre 2015 e 2019. O resultado aparece em Se Eu Não Posso Ser Quem Sou (editora Zouk, 236 págs., R$ 52). Ainda que seja um personagem ficcional, a protagonista Geórgia tem semelhanças com pessoas que estão vivendo o momento da Grande Renúncia. Aos 35 anos, ela deixa um concurso público em um tribunal de Justiça para descobrir quem é.

Mulheres de nível superior foram as que mais deixaram empregos formais nos primeiros meses de 2022 no Brasil, num movimento que vem sendo conhecido como Grande Renúncia — Foto: Luma Petriz
Mulheres de nível superior foram as que mais deixaram empregos formais nos primeiros meses de 2022 no Brasil, num movimento que vem sendo conhecido como Grande Renúncia — Foto: Luma Petriz

A ideia de escrever sobre isso surgiu de uma decisão pessoal. Leila deixou um emprego público na Petrobras em 2016 para se dedicar ao ofício de escritora. Em dado momento da carreira, se deu conta de ter seguido o script de se formar no colégio, na faculdade e ingressar num trabalho com estabilidade e boa remuneração. “Quando vi, estava numa faculdade, dentro de um emprego público, e não sabia direito como tinha chegado lá. Tinha feito tudo para conquistar independência financeira e não sabia quem eu era. Eu tinha feito tudo por dinheiro.”

O romance foi concluído em 2019, muito antes de a covid-19 ser uma realidade. Ao lançá-lo em 2022, Leila ficou com medo de que a temática ficasse desconectada da realidade brasileira. “Imaginava que o livro não ia fazer sentido, que as pessoas estariam muito agarradas a seus trabalhos por medo da crise financeira, mas foi bem o contrário. Recebo diariamente mensagens de pessoas dizendo: ‘Eu sou a Geórgia. Eu quero largar meu emprego, odeio meu emprego e não larguei por falta de coragem’”, conta.

Já no caso da consultora Marcela Ávila, de 27 anos, a chegada da pandemia trouxe complicações para o trabalho em que tinha ingressado recentemente. Formada em Políticas Públicas, trocou um cargo comissionado na prefeitura de Porto Alegre por uma vaga de consultora em meio ambiente no setor privado. A ideia era ter mais tempo. Logo depois da mudança, no início de 2020, veio a pandemia.

Marcela conta que se viu surpresa com o ambiente corporativo em que vivia, ao qual define como tóxico. Para descrever o que a fez se sentir assim, cita microgerenciamento e excesso de cobrança, inclusive sobre aspectos de saúde. Durante a pandemia, houve a contratação de uma psicóloga, que fazia palestras com todos os funcionários. “Isso se tornava uma pressão para que todos tivessem vida saudável, uma positividade tóxica. Estava todo mundo tentando sobreviver e a mulher nos cobrando pelo que estávamos comendo”, diz.

Além disso, ela cita como exemplos o microgerenciamento por meio de aplicativos, câmeras e contabilização semanal de horas e atividades realizadas, o que era recebido por ela e pelos demais colegas como uma pressão por produtividade. Em setembro de 2020, Marcela decidiu deixar o trabalho para se arriscar como empreendedora no ramo de consultoria empresarial. Ela hoje faz parte de uma rede de consultores e tem flexibilidade para trabalhar de qualquer lugar.

Em maio deste ano, ela e o namorado decidiram se mudar para Berlim, na Alemanha. Quando questionada sobre o maior ganho, ela diz que tem conseguido ressignificar o espaço e a importância do trabalho na vida. “É um processo de entender uma separação maior [entre vida e trabalho]. O trabalho é uma das partes do que eu sou. E ainda vivo um dilema, o de sustentar a hipótese de que o trabalho é apenas a fonte do meu dinheiro.

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