• Carolina Ingizza
  • Em colaboração para Marie Claire
Atualizado em

A administradora Ana Zucato estava há dez anos no mercado de tecnologia quando decidiu que era a hora de deixar de ser funcionária para empreender. Depois de trabalhar com produtos nas fintechs Guiabolso e Intuit — além de ter comandado a operação brasileira da empresa de soluções contra fraudes Truora —, ela resolveu aproveitar o momento de ebulição do mercado de finanças para reinventar um produto querido dos brasileiros: a conta conjunta.

Mesmo tendo comandado grandes projetos e trabalhado lado a lado com diretores de empresas de inovação brasileiras e internacionais, o caminho até conseguir o primeiro investimento da sua empresa não foi simples. "Acho que pelo fato de ser mulher, o trabalho de análise dos investidores foi maior. Cheguei a ouvir de um deles que, mesmo me conhecendo há uma década, ele não sabia se eu conseguiria fazer uma empresa", conta Ana.

Há 10 anos no mercado de tecnologia, a empreendedora Ana Zucato lançou em 2022 uma startup para facilitar a divisão de pagamentos entre casais e amigos —  negócio que já conquistou fundadores do Twitter, iFood e QuintoAndar como investidores  (Foto: Divulgação)

Há 10 anos no mercado de tecnologia, a empreendedora Ana Zucato lançou em 2022 uma startup para facilitar a divisão de pagamentos entre casais e amigos — negócio que já conquistou fundadores do Twitter, iFood e QuintoAndar como investidores (Foto: Divulgação)

A empreendedora não se deixou abalar e, no total, apresentou e defendeu sua ideia para mais de 150 pessoas, tendo um resultado muito melhor do que esperava inicialmente: levantou R$ 17 milhões no final do ano passado. Entre os investidores estão grandes nomes do mercado de tecnologia, como Biz Stone, cofundador do Twitter; Patrick Sigrist, do iFood; e André Penha, do Quinto Andar.

O capital recebido permitiu que a Noh contratasse os primeiros funcionários e saísse do papel. A empresa, segundo a fundadora, nasce para o que ela chama de uma segunda onda das finanças digitais. Se a primeira foi individual, com cartão e conta virtuais, a atual teria o foco em finanças coletivas. "Somos o país da gambiarra. O brasileiro divide tudo: mensalidade da Netflix, casa no Airbnb, conta de luz", diz.

O objetivo da Noh enquanto empresa é facilitar essas divisões financeiras ao permitir que duas ou mais pessoas sejam cobradas ao realizar um pagamento. A ideia é que cada vez que um boleto for pago ou uma compra no cartão de crédito for feita, o dinheiro saia proporcionalmente da conta de todos os envolvidos. Nesse primeiro momento, a fintech limita o uso a duas pessoas apenas, mas nos próximos meses planeja ampliar para grupos maiores.

"Percebemos que o brasileiro médio gasta em média R$ 4.500 com outra pessoa por mês. Então, era mais importante facilitar os pagamentos do que oferecer uma conta conjunta tradicional", diz a fundadora e CEO.

Desde que o negócio começou, no final de 2021, a empresa já processou mais de R$ 700.000 em transações e teve o aplicativo baixado mais de 10.000 nas lojas digitais.

Fora da curva

Ana destoa do esteriótipo do empreendedor padrão, ainda que reconheça seus privilégios como mulher branca de classe alta de São Paulo. Sem formalidades ou anglicismos, a jovem conversou com Marie Claire sobre o sonho de empreender, as influências familiares e sua visão sobre diversidade nas empresas.

O sonho de ter o próprio negócio, por exemplo, é antigo. Ela conta que desde criança se inspirava na paixão que o pai tinha pela sua empresa de eletrônicos. Ainda que não quisesse seguir na mesma área dele, admirava a energia que ele colocava nos negócios e pensava em, um dia, ter uma relação similar com o trabalho.

Antes de sair criando uma empresa, no entanto, ela quis se preparar. Depois de anos estudando em uma escola construtivista em São Paulo, fora dos padrões tradicionais de ensino, ela se jogou no mundo dos negócios na faculdade de administração da Fundação Getúlio Vargas. O choque entre os dois modelos de ensino foi grande: “ali percebi que eu não queria nunca usar roupa social na minha vida”, diz, rindo.

Ao se formar, enquanto seus colegas se encaminhavam para bancos e consultorias, ela decidiu se aventurar na logística da varejista Zara — o mundo da moda, afinal, era mais flexível com as roupas. De lá, mudou para o e-commerce OQVestir e não parou mais.

Seu último trabalho antes de fundar a fintech Noh foi na startup de prevenção de fraudes Truora — por lá, ela comandou a operação brasileira da empresa e fez o negócio crescer cinco vezes em um ano. "A Truora para mim foi como um laboratório, foi a primeira vez que precisei sair da área de produtos e liderar marketing, vendas, recursos humanos", relembra.

Hoje, na Noh, ela lidera, ao lado dos sócios Octavio Turra e Felipe Cabral, uma equipe de 19 pessoas, com 50% de mulheres. Apesar dos desafios de comandar um negócio próprio, ela se diz feliz de ter conseguido criar um ambiente de trabalho bom e acolhedor. Desde a fundação, nenhum funcionário saiu ou foi demitido. Agora, seu foco é ampliar a diversidade racial. "Eu acho que no futuro as empresas não diversas vão ser extintas. Para mim, diversidade é como equipamento de segurança, ninguém quer trabalhar em um lugar que não tenha", diz Ana.