Política

Por Camila Cetrone, redação Marie Claire — São Paulo


Ana Moser foi a primeira mulher no cargo de Ministra do Esporte — Foto: JULIA RODRIGUES
Ana Moser foi a primeira mulher no cargo de Ministra do Esporte — Foto: JULIA RODRIGUES

“Um plano interrompido.” É assim que a agora ex-ministra do Esporte Ana Moser define sua saída da pasta para dar lugar ao deputado federal André Fufuca (PP), que toma posse nesta quarta-feira (13), numa tentativa do Governo Lula de acomodar o Centrão em troca de mais apoio no Congresso. A decisão foi comunicada pelo Palácio do Planalto há uma semana, mesmo após mobilização para a permanência de Moser no cargo.

Visivelmente emocionada, Moser encontrou um espaço para dar entrevista por videoconferência a Marie Claire em seu último dia de trabalho, na última terça-feira (12). O desânimo, no entanto, não a parou: ela e sua equipe organizaram às pressas relatórios, decretos e projetos de lei pendentes numa tentativa de orientar a gestão de Fufuca para continuar implementando uma política esportiva pautada na regulamentação, valorização e inclusão.

Por mais que o presidente Lula tenha afirmado que o Esporte não era “moeda de troca”, Moser foi uma das cortadas pela minirreforma ministerial. Após nove meses na gestão, se tornou a segunda ministra mulher a ser demitida depois de Daniela Carneiro (União Brasil-RJ), ex-ministra do Turismo.

Medalhista olímpica e uma das atletas mais importantes de sua geração, Moser foi a primeira mulher a comandar o Ministério do Esporte – e a primeira ministra abertamente lésbica do país. Além disso, recebeu a difícil tarefa de reconstruir a pasta (durante o governo de Jair Bolsonaro, foi reduzido à secretária).

“A gente entregou algumas coisas, mas era muita coisa [pendente]. Não deu para entregar nem perto o que se planejava. Foi uns 10%, 20% disso. Estávamos mexendo com estrutura de sistema. Agora, a gente torce de fora”, diz Moser.

Ao longo desta entrevista, ela não esconde o sentimento de “luto”, como a própria define, diante de sua saída, e diz que não teve contato com o atual ministro. Em um balanço da gestão interrompida, conta que quer ser lembrada como uma ministra que trabalhou “pela construção de uma nação efetivamente esportiva” e por políticas de inclusão para garantir acesso ao esporte a todos os brasileiros.

"Não vim para o Governo para assumir um cargo, mas para aceitar a oportunidade de implantar uma visão de política pública para uma área que precisa ser construída, diferente de outras áreas já colocadas. Acho que consegui trazer mais efetividade no discurso de esporte para todos, relevância dentro das áreas sociais e todo debate para reestruturação e formalização do esporte", pondera.

Leia os principais trechos da entrevista a seguir.

MARIE CLAIRE O Palácio do Planalto comunicou há uma semana sua demissão do Ministério do Esporte. Neste momento, como a senhora se sente com a decisão?
ANA MOSER
Cansada. Tem sido um processo intenso. Foi um impacto pessoal, na verdade. Um plano que foi interrompido. Para os próprios planos do ministério também foi uma quebra. Estamos tendo que lidar com tudo isso em um tempo rápido, numa incerteza para poder fechar esse trabalho e entregar a pasta. Estávamos com muitas frentes abertas e muitas ações, desde a Bolsa Atleta, a Estratégia Nacional para o Futebol Feminino e a Lei Geral do Esporte até vários programas que foram reativados, [o interesse em] construir uma política de esporte antirracista, indígena, de inclusão no esporte com impacto na sociedade. Eu me sinto de luto com o esporte por essa quebra.

MC A senhora recebeu apoio de membros do governo, incluindo da primeira-dama Janja da Silva e da ministra Anielle Franco, além do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e de atletas. Isso ajudou a senhora a se manter firme?
AM
Senti esse apoio e agradeço. É importante para dar sequências e para que as pautas do esporte se mantenham íntegras, com a visão de amplitude que a gente vinha pondo em prática.

MC Acredita que é um sinal de aprovação da sua gestão?
AM
Não vi assim. Mas, com certeza tenho compromisso com o esporte. Isso foi reconhecido e tocou as pessoas, mesmo as que não são efetivamente da área do esporte, mas que o tem no dia a dia. Esse apoio fala também disso. Com a questão da valorização e ampliação do conceito de esporte, a gente teve um ganho muito grande.

O trabalho sempre foi em cima de um contexto de Brasil muito sedentário. Não temos essa cultura do esporte, mas conseguimos visualizar o que seria uma nação ativa, com mais acesso. O esporte tem um poder de transformação dentro do contexto da educação, saúde, convivência comunitária, da ocupação dos espaços públicos, de identidade, até da questão econômica – que vai muito além das apostas eletrônicas. Esse discurso foi divulgado, e agora, mais ainda, é importante manter a relevância.

MC O deputado federal André Fufuca foi o escolhido do Centrão para comandar a pasta. A senhora acredita que ele é o melhor nome?
AM
O critério foi uma composição política. Como é um órgão público, não para. Não é porque nós saímos que acabou. Tanto que quando chegamos já tinham políticas que já haviam sido construídas anteriormente e foram continuadas. Mas esse enfoque [atual], com certeza, foi muito própria desta gestão que estava lá.

MC Mas qual é a opinião da senhora? Conseguiram conversar?
AM
A transição começou hoje. Eu não tive contato com ele.

MC Como está sendo o diálogo com essa nova equipe?
AM
A primeira conversa de transição desta reforma ministerial eu tive na terça-feira passada [5 de setembro]. Teve feriado no meio, muita coisa ainda está para ser organizada. Estamos deixando algumas coisas já encaminhadas, em forma de documento e relatório, para essa estruturação do esporte amplo e democrático. O que vai acontecer, eu realmente não sei.

MC Na última semana, especulava-se que a senhora poderia não sair do Governo Lula e ocupar outro cargo. Há negociações neste sentido? Como fica sua relação com o Governo?
AM
Não tem negociação, nem cargo. Meu envolvimento na verdade é com a causa, que é muito anterior, e vai continuar. Não vim para o Governo para assumir um cargo, mas para aceitar a oportunidade de implantar uma visão de política pública para uma área que precisa ser construída, diferente de outras áreas já colocadas. Sempre pensei isso. Enquanto presidente do Instituto Esporte e Educação (IEE), eu brincava de política pública numa escala menor. [Ocupar o ministério] era exatamente uma visão de escala que só o poder público pode dar.

MC A senhora afirmou em entrevista recente que todas as mulheres sofrem ataques nesta gestão, especialmente da direita, e que há uma estratégia de diminuir a capacidade delas. Vimos ao longo das últimas semanas que, além da senhora, Rita Carreira [da Caixa], Nísia Trindade [Saúde] e Cida Gonçalves [Mulheres] estavam na mira do Centrão. Além disso, a senhora foi a segunda ministra mulher demitida em nove meses. Há o interesse em fazer a política regredir a um espaço ainda mais masculino, como já foi antes?
AM
Sem a mínima dúvida. Os meios de grandes poderes são muito masculinos, tanto políticos, esportivos, de dirigentes, mas também no Legislativo e Judiciário. Apesar de as mulheres estarem participando, as decisões ainda são tomadas pelos homens. No meio privado isso [ações de inclusão e diversidade] até existe, mas no público é uma construção. O parâmetro deve ser de trazer valores mais equilibrados para trazer a diversidade. Acho que quanto mais ampliar isso, melhores vão ser as decisões. Dizem que isso [a retirada de mulheres] é jeito de fazer política, mas é política de quem? Quem é que está fazendo essa política?

MC O fato de mulheres estarem à frente de ministérios e instituições tão importantes incomoda a esses homens?
AM
Acho que sim.

MC Além da Estratégia Nacional para o Futebol Feminino, que a senhora citou, o que mais uma gestão feminina trouxe ao ministério?
AM
Esse ano instauramos a licença-maternidade no Bolsa Atleta. Há quantos anos tem Bolsa Atleta e nunca ninguém pensou nisso? Só uma gestão feminina pensaria nisso. Porque não fui só eu, mas tinha a secretária executiva [a economista Juliana Picoli Agatte], a secretária Marta [de Souza Sobral], uma diretoria ocupada por mulheres. Foi uma gestão feminina que trouxe essas questões. Isso é inclusão, é trazer possibilidade de uma mulher atleta pensar em família, o que era totalmente proibido. O homem pode, tem quem cuida, é a mulher. Ela, não. São valores femininos que com certeza agregam na hora de tomar decisões políticas.

MC A senhora afirmou em abril a Marie Claire que foi vítima de ataques lesbofóbicos e misóginos a vida toda, e que isso ficou mais intenso no Esporte. Isso piorou desde nossa última conversa?
AM
Fiquei mais tranquila quanto a isso depois da nossa primeira conversa. Falando em redes sociais, isso é tudo estratégia, muita coisa é feita por robôs. Nós conseguimos criar várias vacinas para sobrepor esse barulho. Com uma contraestratégia, trazendo conteúdo positivo, você acaba minimizando. Me chamavam de burra ou que eu não sabia fazer algo, falávamos “não, pera aí, olha aqui [o contrário]”. Trazíamos as realizações, e isso foi tirando o sentido dos ataques. Os argumentos eram muito fracos por serem ataques misóginos. Foi na sensibilidade [que refutamos isso], mas no coração das pessoas essas questões ainda existem porque somos uma sociedade conservadora, que está avançando. Não importa se é velha, se é gay, mas o que você defende. Isso vai sobrepondo.

MC Do que a senhora planejou para sua gestão, o quanto deixou de entregar?
AM
A gente entregou algumas coisas [durante a transição de gestão], mas era muita coisa [pendente]. Não deu para entregar nem perto o que se planejava. Foi uns 10%, 20% disso. No fim de agosto, era para termos lançado a Rede de Esporte, uma política de inclusão, mas por questões de agenda do presidente e lançamento da nossa parceria com o SESI, que estava dentro da estratégia do futebol feminino, acabamos não fazendo.

Estávamos mexendo com estrutura de sistema, estruturando a proposta de governo para o Plano Nacional de Esporte. Conseguimos finalizar a regulamentação do Sistema Nacional de Esporte. Mas ainda faltou muita coisa. Fizemos todo esse trabalho em construção com a sociedade. O Plano Nacional veio de um grupo de trabalho, toda construção e regulamentação da lei foi feita a partir de dezenas de reuniões com o setor e com o Congresso. Agora, a gente torce de fora.

MC Do que conseguiu realizar à frente do ministério, o que mais te deixa satisfeita?
AM
Acho que consegui trazer mais efetividade no discurso de esporte para todos, relevância dentro das áreas sociais e todo debate para reestruturação e formalização do esporte. Prova disso é a própria Estratégia Nacional para o Futebol Feminino – que, com certeza, vai ser tocada de uma maneira diferente por um homem.

Fizemos um processo que tem um caminho andado, mas o que vai ser depende muito de uma intenção que eu não conheço. Vamos ter que esperar para ver. Mas o paradigma foi colocado de uma maneira concreta, com documento, debate, diagnóstico e ação. Foi um processo que conseguimos deixar mais visível.

O tempo foi o suficiente para alçar o esporte a um patamar mais amplo do que normalmente vinha sendo. Historicamente, o esporte só é visível pelo que passa na televisão. Nem todos vão virar atletas olímpicos, mas o esporte vai ter a cara de cada um que possa se beneficiar de várias maneiras, individualmente e coletivamente. Lutei pela construção de uma nação efetivamente esportiva. É assim que quero ser lembrada enquanto ministra.

MC Quais são os seus planos neste momento?
AM
Realmente não sei o que vou fazer. Não sei nem como é que é o desligamento, como vou fazer com esse apartamento que tenho alugado aqui [em Brasília]... Não deu tempo de nada. Aos poucos vou me encaminhando.

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