Política

Por Mariana Gonzalez, colaboração para Marie Claire — São Paulo


O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, que chega perto de bater um milhão de pessoas presas sob a tutela de um sistema superlotado, complexo, que nas últimas duas décadas foi alvo de sete sanções internacionais por episódios de violações de direitos humanos, como letalidade e tortura. Uma espécie de “caixa preta”, com pouquíssimos dados concretos que permitem mapear quem são os encarcerados e quais são os fatores que o levaram à prisão, define a jurista Rita Cristina de Oliveira, secretária-executiva do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, em entrevista a Marie Claire.

Para começar a desatar esse nó, o presidente Lula encomendou ao Ministério dos Direitos Humanos uma espécie de censo demográfico para mapear a população carcerária brasileira com olhar específico para grupos mais vulneráveis, como pessoas LGBTQIA+, com deficiência e mulheres, especialmente negras, mães e gestantes.

A responsável pela missão é Rita Cristina de Oliveira, número 2 da pasta nomeada no início da gestão pelo ministro Silvio Almeida: “O Brasil não tem dados concretos sobre o sistema e quem está lá dentro, e isso nos impede de pensar adequadamente políticas públicas que assegurem os direitos humanos das pessoas presas”, resume a jurista.

Rita Cristina de Oliveira, secretária-executiva do Ministério dos Direitos Humanos — Foto: Arquivo pessoal
Rita Cristina de Oliveira, secretária-executiva do Ministério dos Direitos Humanos — Foto: Arquivo pessoal

Rita é nascida em Osasco (SP), criada no Rio de Janeiro, graduada em Brasília e concursada como defensora pública no Paraná, onde se destacou atuando na regularização de títulos aos integrantes de comunidades tradicionais quilombolas. Também já atuou em Belém no combate ao tráfico de pessoas e à exploração sexual infantil e em Foz do Iguaçu (PR) na resolução de conflitos de fronteira. Esse resumo de seu currículo prova que, além de ter transitado em diferentes áreas de Direitos Humanos, a jurista conhece o Brasil – ou, pelo menos, tem uma ideia clara dos problemas que o país enfrenta de Norte a Sul.

Na Defensoria Pública da União, coordenou o Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais e também fez parte da Comissão de Juristas Negros e Negras instituída pela Câmara dos Deputados; nesta comissão, ajudou a construir a tese que levou o Congresso a aprovar uma importante mudança na lei: a equiparação dos crimes de injúria racial e racismo, fazendo com o que o primeiro, era era considerado “mais brando”, se tornasse inafiançável e imprescritível.

Toda sua atuação desde a graduação até a nomeação ao Ministério de Silvio Almeida, Rita trabalhou fazendo pressão sobre o Poder Executivo, fosse recomendando ou cobrando ações efetivas de defesa de grupos vulneráveis. Agora, como gestora do governo, está “do outro lado da trincheira”, diz, em seu texto de apresentação no site do Ministério dos Direitos Humanos do governo federal.

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A expectativa agora, com o censo prisional, é “concluir uma tarefa histórica, que contribua para que a sociedade seja mais justa, solidária, e enfrente seus fatores de desigualdade”, diz a secretária.

Para isso, vai reunir um grupo de trabalho que envolve atores do governo, Justiça, sociedade civil e Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, que tem expertise em coleta de dados) e aprimorar a base de dados do sistema prisional e chegar a um diagnóstico preciso de como está funcionando, “ou melhor, de como não está funcionando”, fala a secretária.

No fim, com os dados em mãos, o grupo deve propor diretrizes para o governo assegurar os direitos humanos dentro das prisões, com foco em combate à tortura e de desencarceramento, especialmente de pessoas presas injustamente, como as que já cumpriram pena mas seguem presas por lentidão da justiça.

Um dos maiores apagões de dados, segundo Rita, é em relação ao encarceramento feminino e as violações de direitos das mulheres no sistema prisional.

Embora o habeas corpus coletivo para mães e gestantes aprovado pelo Supremo Tribunal Federal em 2018 tenha sido um grande passo –afinal, a medida estabeleceu como prioridade a prisão domiciliar para presas neste perfil– “ainda temos muitas gestantes mães encarceradas, até berçários dentro das unidades prisionais, principalmente em lugares com menos visibilidade, mas não há números concretos sobre isso”.

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E continua: “É uma situação extremamente degradante. O sistema masculino também, mas pensando que temos uma sociedade extremamente machista e opressora em relação às mulheres, esse sistema de violação de direitos humanos é ainda mais cruel e perverso em relação às mulheres”.

“Mulheres são as maiores vítimas da guerra à drogas”

O Brasil é o terceiro país do mundo com o maior número de mulheres presas, segundo um levantamento divulgado em 2022 pelo World Female Imprisonment List – por aqui, mais de 42 mil mulheres e meninas estão encarceradas, entre as condenadas e submetidas a regime provisório.

O mesmo estudo mostrou que a população carcerária feminina cresceu 400% no país desde o começo dos anos 2000, enquanto a média deste mesmo crescimento no mundo não ultrapassa os 60%.

E um dos principais problemas que levou (e ainda leva) ao hiperencarceramento de mulheres no Brasil é a chamada guerra às drogas, que tem raízes profundas na desigualdade social e na criminalização da pobreza, explica Rita.

“Temos um sistema de justiça criminal seletivo em relação a pessoas negras e pobres, que respondem em grande medida por crimes não violentos. E na base dessa pirâmide estão justamente as mulheres negras, as maiores vítimas de uma política de enfrentamento às drogas enviesada”, percebe.

O cenário do encarceramento feminino mudou – e piorou – completamente com a aprovação da Lei de Drogas sancionada em 2006 pelo presidente Lula e que vigora hoje. Desde então, o usuário de drogas é despenalizado, diferentemente do traficante, que pode ser preso - o que a secretária considera um pequeno avanço. O problema, explica, é que essa lei não estabelece uma quantidade que diferencie usuários e traficantes, restando assim uma margem de interpretação muito ampla desde a abordagem policial até o julgamento, que comprovadamente leva mais pessoas negras a serem consideradas traficantes, mesmo com pequenas quantidades.

E isso vitimou principalmente as mulheres pegas com pequenas quantidades, as chamadas “mulas” do tráfico de drogas: “Em geral, elas acabam sendo atraídas para o tráfico de pequenas quantidades para ganhar um valor ínfimo, mas que muitas vezes é necessário numa emergência financeira, principalmente quando os maridos dessas mulheres estão presos”, fala.

O boom de prisões femininas somado à falta de dados e à invisibilidade das mulheres nos debates sobre sistema carcerário gera um ambiente “extremamente violador”, em que as detentas em geral não têm acesso a saúde especializada, política de reabilitação e outros direitos relativos à educação, trabalho e renda.

Além disso, quando falamos em mulheres e cárcere, não devemos pensar apenas nas mulheres que estão encarceradas, mas também nas que frequentam o ambiente da prisão, lembra Rita. “Nessas visitas, muitas vezes acabam sendo criminalizadas, assediadas, impedidas de visitar seus companheiros, capturadas por uma série de questões de vulnerabilidade social porque o companheiro está encarcerado e não tem acesso à promoção social. É como se a pena desse homem fosse estendida para a mulher e os filhos.”

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