Política

Por Camila Cetrone, redação Marie Claire — São Paulo


Saiba como nova lei de igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem a mesma função deve funcionar — Foto: Getty Images
Saiba como nova lei de igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem a mesma função deve funcionar — Foto: Getty Images

O presidente Lula sancionou nesta segunda-feira (3) a lei nº14.611/23, que endurece punições a empresas que não cumprirem com a obrigatoriedade de pagamento de salários iguais para homens e mulheres que executam a mesma função. A legislação era uma de suas principais promessas durante a campanha eleitoral.

A lei altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para enfatizar a obrigatoriedade do pagamento de salários iguais a homens e mulheres. Agora, empresas que a descumprirem terão de pagar multa dez vezes maior que o salário devido, caso haja discriminação em decorrência de gênero, raça, etnia, idade ou origem. O empregador também deverá pagar a diferença devida à funcionária que for prejudicada.

O texto aprovado é um substitutivo do Projeto de Lei nº 1085/23 encaminhado por Lula ao Congresso em 8 de março deste ano, que foi elaborado pela deputada federal Jack Rocha (PT-ES), relatora do projeto na Câmara dos Deputados.

Para detalhar o que se sabe sobre o funcionamento da nova lei até o momento, Marie Claire conversou com a advogada Fayda Belo, especializada em gênero, direito antidiscriminatório e feminicídio, e a empreendedora Juliana Alencar, CEO da empresa de inovação e cultura Weird Garage e especialista em cultura corporativa.

Como deverá ser feita a denúncia por desigualdade salarial por gênero?

Até o momento, Lula não afirmou qual órgão ficará responsável pela fiscalização. Com a sanção, ficou definido que os casos podem ser encaminhados por um portal do Ministério do Trabalho ou pelos números de telefone Disque 100, Disque 180 e Disque 158.

Alencar afirma que é preciso que a funcionária reúna evidências que comprovem a desigualdade salarial e as direcione ao novo canal. Até o momento, o Ministério Público do Trabalho é um dos principais órgãos responsáveis por reunir essas denúncias.

Para que o poder público possa fazer a fiscalização, é preciso que tenham dados que demonstram a desigualdade salarial. Isso deve ser evidenciado em outro ponto da lei, que obriga empresas a entregarem relatórios semestrais que descrevem a divisão salarial no local.

Alencar, no entanto, afirma que a lei pode ficar fragilizada nos casos em que há remuneração com base em metas de performance. “Muitas empresas não têm métricas e indicadores claros para que haja um reconhecimento baseado na meritocracia dos resultados de cada colaborador.”

Como funcionará a aplicação de multa por desigualdade salarial? E qual valor a funcionária recebe?

Anteriormente, a CLT determinava que a multa por salários desiguais era de um salário mínimo. Agora, a multa será equivalente a dez vezes o salário devido.

“Se essa empresa é pega pelo poder público não laborando na igualdade de remuneração entre homens e mulheres, aplica-se a multa. O dinheiro vai para o poder público, que vai aplicar o valor em programas e ações de igualdade de gênero e que incluam mais mulheres no mercado", explica Belo.

No caso da funcionária prejudicada, deverá ser paga a diferença do valor não recebido ao longo do tempo de contribuição, sem tirar dela o direito de pedir uma indenização por danos morais.

Por exemplo: se Maria trabalhou por quatro meses recebendo R$ 1 mil e José, na mesma função e período, ganhou R$ 2 mil por mês, Maria deverá receber a diferença de R$ 1 mil que não foi pago ao longo desses quatro meses. Portanto, a empresa deverá pagar a Maria R$ 4 mil.

Lei de igualdade salarial pode corrigir desigualdade para mulheres negras, trans e com deficiência?

Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019, o rendimento das mulheres corresponde a 77% do dos homens.

No caso de mulheres negras, este valor pode ser 40,2% menor se comparado ao recebido por uma mulher branca, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022. Isso sem contar a presença escassa de mulheres LBT (lésbicas, bissexuais e trans), indígenas e com deficiência, por exemplo.

Assim, é possível que a nova lei nivele os salários de mulheres de diversos marcadores sociais? Para Fayda Belo, a expectativa é que sim.

"O que se espera com a nova lei é que não só não exista desigualdade de gênero, mas também entre gêneros. Agora há meios e instrumentos em que se pode comprovar que não existe essa hierarquia entre mulheres – porque hoje é isso que existe", diz.

Outras leis preveem igualdade salarial entre homens e mulheres. A nova lei é redundante?

Um dos argumentos de opositores da nova lei é de que o projeto oferece “mais do mesmo”. Isto porque, desde 1952, a CLT prevê que homens e mulheres que desempenham a mesma função devem receber a mesma remuneração.

Além disso, a Constituição Federal garante que homens e mulheres são iguais em direitos e deveres e que devem receber remunerações iguais pela mesma função – isso sem contar os tratados dos quais o Brasil participa para mitigar a desigualdade de gênero no ambiente empresarial.

No entanto, somente isso não foi o suficiente. "Infelizmente, no Brasil, se você não cria junto uma norma que reprima quem não cumpre a regra, ela não funciona. O que é a repressão de um salário mínimo para uma grande empresa? Nada", diz Belo.

Isto porque a regra não era encarada como obrigatoriedade e abria brechas para o não cumprimento. "A realidade é que hoje essa igualdade não existe. E, se não existe, precisa-se criar ações, programas e leis que possam fazer com que a norma escrita e vários outros instrumentos sejam realizados”, enfatiza a advogada.

Nesse sentido, outro diferencial da lei está nos critérios mais rigorosos de transparência fiscal e de fiscalização, segundo Juliana Alencar. Um exemplo disso é a apresentação do novo relatório de transparência, em que será possível identificar e corrigir possíveis disparidades. A empreendedora também enfatiza a possibilidade da indução de outras ações afirmativas, como incentivos fiscais às empresas que cumprirem a legislação.

Lei da igualdade salarial pode inibir contratação de mulheres?

Esse é outro argumento usado por opositores da lei. Fayda Belo, no entanto, discorda. Como exemplo, ela cita o fato de que as mulheres são mais capacitadas do que os homens: segundo dados de 2019 do IBGE, 19,4% das mulheres com 25 anos ou mais têm ensino superior completo. Para os homens, esse percentual cai para 15,1%.

"A lei não será um obstáculo para as empresas. O que vai ficar claro é que não se pode virar as costas para mulheres qualificadas, que têm o mesmo currículo e a mesma competência – ou mais – que os homens”, afirma.

Contudo, Juliana Alencar vai por outro caminho. A empreendedora afirma que a inibição pode acontecer se outras decisões não acompanharem o avanço.

Ela cita, por exemplo, o período muito desigual de licença-maternidade e paternidade – em que homens ficam afastados por apenas cinco dias, com possibilidade de acréscimo de uma quinzena, e as mulheres por 120 dias.

“Essa diferença pode, sim, tirar uma vantagem competitiva das mulheres”, explica. “É necessário reaver a licença paternal para que ambos saiam do mesmo ponto de partida. Atualmente, essa é uma realidade apenas de forma autônoma do corporativo, sem o apoio do governo.”

Quando a nova lei se torna arbitrária para uma empresa?

De acordo com a nova lei, uma empresa fica dispensada da exigência de igualdade salarial quando adotar planos de cargos e salários por meio de negociação coletiva, com base em previsão de meta ou previsão de que atinja cargos maiores – uma dinâmica comum no setor varejista, por exemplo. Esta é uma norma já prevista na CLT.

“É o chamado plano de carreira, em que se determina um tempo para que esse novo cargo seja atingido, bem como o necessário para que a funcionária se desenvolva para chegar na meta. Deve-se deixar claro os níveis salariais que são pretendidos para ela”, explica Alencar.

"Neste caso, inclui-se essa evolução das mulheres no meio da empresa, dando-as essa chance de crescer e avançar sem privilegiar um gênero. Mesmo assim, tudo isso precisa ser fiscalizado para incluir a mulher de maneira igual", ressalta Belo.

Quanto tempo as empresas têm para se adequar?

Por mais que as empresas, em tese, já devessem ter adotado mecanismos de equidade salarial, Belo enfatiza que a lei permite que elas identifiquem disparidade salarial e criem um plano de ação, com metas e prazos.

Para esta elaboração, deverão participar representantes dos funcionários da empresa e ainda um representante sindical. Se houver descumprimento da meta, haverá uma multa administrativa de até 3% da folha de pagamento do empregador, limitada a cem salários mínimos.

Alencar afirma que, para fazer essa adequação, é necessário que as empresas promovam mudanças internas, como educação de funcionários (por meio de guias, bate-papos ou movimentos diferentes para ampliar troca de informações e acelerar a implementação de diversidade); avaliação da situação atual (por análise interna de disparidade salarial ou de gênero em cargos de liderança); e revisão de práticas e políticas de recursos humanos (como as de recrutamento, seleção, promoção e remuneração, garantindo que promovam a igualdade de oportunidades).

Como a lei de igualdade salarial pode impactar a economia?

Um estudo de 2018 do Banco Mundial constatou que a equiparação salarial com base em gênero pode melhorar em 3,3 pontos percentuais a economia dos países. Esse dado foi lembrado pela ministra das Mulheres Cida Gonçalves no início de junho deste ano, em entrevista ao Estadão.

Alencar pensa da mesma maneira, e destaca que oportunidades iguais também fazem parte dessa equação. “Com mais membros economicamente ativos na sociedade, mais a economia gira. Sem distinção por gênero, mais talentos são aproveitados, o que gera mais ganhos em produtividade e melhora os resultados financeiros em todos os setores do mercado”, explica.

Nova lei de igualdade salarial prevê criação de outros mecanismos

A lei estabelece ainda a implementação de medidas que garantam a permanência das mulheres no mercado de trabalho e que intensifiquem a promoção de políticas de diversidade e inclusão. Entre elas estão canais de denúncia, incentivo à capacitação profissional, criação de comitês direcionados e treinamento de lideranças sobre equidade de gênero no mercado. Alencar afirma que, por meio dos comitês, há mais chances de abrir espaço para discutir o assunto e oportunidade de focar nessas questões.

Belo acrescenta que esses outros pilares ajudam a sustentar a lei de igualdade salarial e a fortalecer todo ecossistema empresarial para ir contra a desigualdade de gênero.

"O Brasil está avançando para que grandes empresas e marcas entendam que é importante que a mulher seja vista pelo prisma da competência e que pode ocupar qualquer espaço de forma justa. Elas precisam ser vistas como mais do que um corpo. Reforço que, para isso, é preciso que haja compreensão por gestores e donos de que isso vai trazer ótimos resultados, e que enxerguem essa lei como mais um braço para termos um Brasil mais justo e igual para todo mundo.”

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