Um promotor de Justiça de uma vara de família de Vitória, no Espírito Santo, recomendou que Alessandra de Souza Silva, mulher que denunciou seu ex-marido, Carlos Augusto de Aguiar, por violência doméstica e tentativa de feminicídio, "aquietasse o facho" e permanecesse casada com o seu marido. O caso aconteceu após a vítima já ter denunciado o antigo parceiro e ter entrado com um pedido de pensão alimentícia para as cinco filhas menores.
De acordo com informações da coluna Cristina Fibe, de Universa Uol, que teve acesso à gravação da audiência comandada pela juíza Clesia dos Santos Barros, o promotor de Justiça Luiz Antônio de Souza Silva contesta: "Vocês com cinco filhos juntos, hein doutora? Cinco filhos juntos. Vocês em vez de aquietar o facho e ficar o resto da vida juntos?".
"Deus me livre", reage a vítima no áudio. Então, Souza Silva continua: "Deus me livre, não. Quem tem cinco filhos juntos deveria aquietar o facho. Tá? É isso aí, tá? [...] Todo mundo é livre, mas olha aí a consequência. Os filhos depois crescem, gente, os filhos precisam de um ambiente mais? A questão única não é só o dinheiro, a questão é o emocional dos filhos, é os pais estarem bem".
Vítima diz ter se sentido 'humilhada'
Em outro áudio, a mulher lamentou: "Eu morei com meu ex-marido 20 anos, e nesses 20 anos o que passei foi ser humilhada, violentada, sofri abuso psicológico". Ela também falou sobre a situação protagonizada pelo promotor em questão. "A gente tem que debater com ex-marido e chegar para fazer audiência, e lá virar chacota para promotor, aí a gente sai de lá como lixo, né? Fica humilhada mais ainda, a gente vira chacota, e aí o que acontece, a gente fica calada e volta para casa."
A sentença dada pela juíza Clesia dos Santos Barros definiu que as cinco filhas ficarão na residência da mãe e ela receberá meio salário mínimo por mês de pensão, correspondendo a R$ 706, o equivalente a R$ 141 por criança. Alessandra também conseguiu medida protetiva contra Carlos Augusto, com base na Lei Maria da Penha.
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Promotor é denunciado por violência institucional
Em nota enviada a Uol, Souza Silva afirma que o "aflige bastante" saber que sua atuação "possa ter gerado eventual desconforto, certamente advindo de algum ruído de comunicação, que poderia ter esclarecido a respeito, instantaneamente, mesmo porque, seguramente, o possível faria para isso, já que não condiz com a forma como busco desempenhar minhas atribuições institucionais". Marie Claire também tentou contato com o promotor, mas ainda não teve retorno.
O magistrado foi denunciado por violência institucional, devido à sua conduta, ao Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O caso foi encaminhado pelo Fordan, um programa de extensão e pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santos (UFES), que presta assistência e acolhimento a vítimas de violência doméstica.
O Ministério Público do Espírito Santo diz não ter tido acesso ao áudio e que não foi notificado pelo Conselho Nacional. O CNMP também afirma que não recebeu representação sobre o caso.