Retratos

Por Mariana Gonzalez, em Colaboração Para Marie Claire

A pediatra Priscila Gonçalves trabalha no atendimento a povos indígenas de diferentes regiões do país há uma década como voluntária da ONG Expedicionários da Saúde. Mas, logo no começo da conversa por telefone com Marie Claire, num intervalo entre viagens à terra indígena yanomami, em Roraima, deixa claro que nunca viu uma situação semelhante. E embarga a voz algumas vezes ao descrever o cenário de abandono que encontrou nas últimas entradas no território – foram quatro ao longo de 2022, a última entre novembro e dezembro.

“Armários de medicamentos todos vazios, centro de saúde caindo aos pedaços na nossa cabeça, sem água na torneira, sem energia elétrica e gerador. Como você atende sem remédio e água limpa?”, ela indaga.

Embora as crianças sejam as mais vitimadas – 570 morreram nos últimos quatro anos e outras centenas foram diagnosticadas com desnutrição, pneumonia e malária –, são as mães yanomami que mais sofrem, percebe a pediatra. “Elas estão o tempo todo com as crianças e os mais velhos que estão doentes, vendo de perto esse pesadelo. Pensam em todo mundo primeiro, distribuem o próprio alimento, prestam socorro e colocam a saúde delas em último lugar”, descreve.

Desde o início de janeiro, o Governo Federal, especialmente por meio dos ministérios da Saúde, dos Povos Indígenas e da Funai, denuncia a omissão que teve o Estado nos cuidados ao povo yanomami, especialmente no Território Indígena Yanomami em Roraima. Os yanomami acusam o garimpo ilegal – facilitado pelo governo Bolsonaro – de prejudicar a caça e a pesca, além de contaminar os rios, deixando centenas de pessoas sem acesso à comida e água potável.

Uma das cenas mais simbólicas do sofrimento das mulheres em meio à emergência de saúde, relata a médica, é a dificuldade de amamentar de algumas em razão da desnutrição e da desidratação.

“A amamentação é muito presente na cultura indígena. Elas andam com as crianças próximas ao corpo, procurando a mama, e só param de amamentar com a chegada do próximo filho – às vezes nem isso, porque conseguem dividir o leite. Quando elas percebem que estão sem lactação, é um sofrimento enorme. A mãe está desnutrida, a criança também. Os dois precisam de alimento e ela está ali, tentando dar o leite que não tem. Elas choram muito, é sofrido de ver.”

Por diversas vezes, Priscila recebeu mães que chegavam ao posto de atendimento no meio da madrugada, depois de caminhar horas numa escuridão total, carregando o filho que precisava de socorro. Outras vezes vinham sozinhas, pedindo atendimento para uma criança que estava na aldeia, a algumas horas dali.

Outro caso que a marcou, durante sua última estada na terra indígena em novembro, foi o de uma criança de seis dias de vida que precisou ser socorrida pelo transporte aéreo. O bebê recém-nascido chegou de madrugada carregado pela mãe, que percebeu que ele estava frio e com dificuldade de mamar. A criança precisou ser transferida de avião para um hospital na cidade.

“Ela teve que entrar no avião sozinha com o filho, sem ninguém para acompanhar. Além dos dois e da equipe médica, foi preciso levar um cilindro de oxigênio, então não cabia mais ninguém na aeronave. E a gente via a preocupação dela. Uma mulher jovem, que tinha parido há menos de uma semana, viu o filho passando mal, caminhou de madrugada para socorrê-lo e agora estava sendo levada para um lugar que ela não conhecia, dentro de um avião. Talvez nunca tivesse saído dali, e estava indo sozinha, sem apoio”, narra a pediatra. “Depois de um tempo um parente foi encontrar com ela no hospital. Mas quantos momentos de angústia ela viveu sozinha?”

Todo o contato com as famílias é feito com a ajuda de intérpretes, que ajudam a traduzir a situação de saúde das crianças, quais cuidados serão necessários e como será a internação.

A pediatra Priscila Gonçalves na comunidade Watoriki, no território indígena Yanomami, em novembro de 2022 — Foto: Acervo pessoal
A pediatra Priscila Gonçalves na comunidade Watoriki, no território indígena Yanomami, em novembro de 2022 — Foto: Acervo pessoal

Zona de guerra

Em meio à emergência de saúde e desnutrição, médicos enfrentam pelo menos dois grandes obstáculos: falta de recursos (água, comida, medicamentos) e a tensão de trabalhar em uma zona marcada por conflitos – inclusive socorrendo indígenas com ferimentos de bala.

“As condições físicas são muito ruins. A gente dorme em redes com mosquiteiros com medo das picadas, tem que ir até o igarapé para buscar água e tomar banho, à noite não tem energia. Sobrevoando a área, a gente ouve barulho de espingarda e vê garimpeiros e indígenas armados, incluindo crianças, para poder passar de um lugar para o outro e se defender. Ver crianças carregando armas é chocante em qualquer situação, ainda mais sabendo do contexto. É uma área de guerra. A gente fica um alerta o tempo todo, com medo, mas pensa: ‘Não vai acontecer nada, vamos lá’. Liga um automático.”

Não raro os médicos recebem indígenas sozinhos, que chegam ao posto de saúde para pedir socorro para uma criança ou idoso que está na aldeia, mas não podem trazê-los porque é perigoso fazer esse trajeto em meio às ameaças dos garimpeiros. Nesses casos, muitas vezes, os profissionais não conseguem chegar às aldeias onde as pessoas estão doentes, por falta de segurança.

“São doenças evitáveis, que podem ser revertidas com poucas ações, mas não tem ferramentas para isso, não consegue acessar os doentes. É muito frustrante, a pior sensação. A gente sente que foi tolhido de todas as possibilidades da profissão”, lamenta.

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