Cultura
Por , redação Marie Claire — São Paulo (SP)


Inspirada na obra de Ana Maria Gonçalves, exposição "Um defeito de cor" chega em São Paulo. — Foto: colagem de Silvana Mendes/divulgação Sesc Pinheiros
Inspirada na obra de Ana Maria Gonçalves, exposição "Um defeito de cor" chega em São Paulo. — Foto: colagem de Silvana Mendes/divulgação Sesc Pinheiros

Lançado no ano de 2006 pela editora Record, o romance Um defeito de cor, da escritora Ana Maria Gonçalves, se consagra como uma das maiores obras da literatura brasileira. Explorado na forma de samba-enredo pela Portela no Carnaval deste ano, o livro também deu origem à exposição, de mesmo nome, apresentada em Salvador e no Rio de Janeiro e que chega ao Sesc Pinheiros, em São Paulo, onde estará até dia 1º de dezembro. “O que vocês vão ver nesta exposição é uma contribuição coletiva de cada artista que está dentro para contar para a gente e ajudar a construir um pedaço da história do Brasil que durante muito tempo foi negada. É um entendimento de um passado para que a gente aprenda a construir um futuro melhor e mais igualitário”, disse a autora durante a cerimônia de lançamento da exposição em São Paulo.

Vencedor do prêmio literário Casa de las Américas (2007), o livro traz — através da história de Kehinde, protagonista que foi sequestrada junto de sua irmã gêmea e avó na cidade de Uidá, no continente africano, e traficada para ser escravizada no Brasil — uma revisão historiográfica sobre os assuntos e marcos históricos que caracterizam o Brasil colonial e escravagista do século 19.

“Está na ordem do dia esse momento de reviver e recontar a história do Brasil”

Mas a exposição, que traz produções de 131 artistas, não se restringe ao universo do livro, faz dele um ponto de partida para refletir e revisitar o período do Brasil Império, bem como seus desdobramentos, que se arrastaram ao longo dos anos e que persistem até aqui com as outras roupagens do racismo — e da luta e resistência contra ele.

“É um livro de ficção e não queríamos que as obras e os artistas se transformassem em mera ilustração do livro. A Ana Maria também pediu para que não contássemos a história ou detalhes do final do livro, que tirassem a vontade das pessoas de ler”, explica Amanda Bonan, doutora em Artes pela Universidade de São Paulo e curadora da exposição ao lado de Ana Maria Gonçalves e Marcelo Campos.

“Nossa abordagem foi, principalmente, sobre os assuntos que o livro levanta. Sobretudo, as macro histórias do Brasil do século 19 e essa relação muito intrincada com países da África, como Nigéria e Benin”.

Os núcleos conceituais, que setorizam a exposição, sugerem um caminho que remontam a eixos temáticos importantes do romance, como trabalho, matriarcado das mulheres negras, revoltas protagonizadas pelas pessoas negras escravizadas na luta abolicionista e religião; passando ainda por desdobramentos atuais, como a violência policial nas favelas e periferias e outros principalmente ligados à figura do advogado, jornalista e abolicionista Luiz Gama — que seria o filho a quem Kehinde incansavelmente procura no romance.

“Na exposição tem uma espécie de homenagem ao Luiz Gama, em que Lázaro Ramos o representa e lê o texto que ele escreveu sobre sua mãe Luísa Mahin, a personagem [Kehinde] recebe esse nome aqui no Brasil. O Luiz Gama procura essa mãe em vários lugares do Brasil e escreve esse texto sobre ela e é a partir desse texto que a Ana Maria constrói a ficção”.

“Deixamos os assuntos na mão dos artistas”

Com a colaboração de mais de 100 artistas, exposição no Sesc Pinheiros remonta história do Brasil. — Foto: Acervo Museu Nacional da Cultura Afro-Brasilieira/reprodução Sesc Pinheiros
Com a colaboração de mais de 100 artistas, exposição no Sesc Pinheiros remonta história do Brasil. — Foto: Acervo Museu Nacional da Cultura Afro-Brasilieira/reprodução Sesc Pinheiros

Embora o livro em si seja forte, tanto pela abordagem do tema central de uma mãe em busca do filho, quanto pela riqueza das descrições das cenas de violações ou dos sentimentos angustiantes das personagens (que contados em primeira pessoa têm seu impacto ainda mais reforçado), se deixa enganar quem, na exposição, atribui ao todo das obras uma visão altamente tomada por pessimismo e negatividade — ainda típico e fortemente consolidado em nosso imaginário sobre as imagens e fotografias das inúmeras e diversas realidades negras.

Sobre isso, a exposição Um defeito de cor traz criações artísticas que celebram a cultura negra no laço entre Brasil e países do continente africano. As mulheres negras, tantas e tão necessárias na trajetória da protagonista, tem sua ala muito bem representada através da arte, que além de trazer esses rostos em protagonismo, deixa um recado que reforça a importância indiscutível das mulheres negras no curso histórico do país, em uma mistura de mundo real com o fictício.

“Além dos textos de núcleo, colocamos trechos que são biografias que criamos das mulheres do livro, das personagens. Então é engraçado que o público também fica em dúvida se aquilo é ficção ou se aquilo é histórico. Mas essa dúvida que é interessante. É justamente esse lugar da fabulação, da narrativa e da história contada. Acho que é uma exposição que as pessoas vão ter a necessidade de ver mais vezes, de ficar bastante tempo e fruir com tempo”.

Fantasias da Portela e outras obras inéditas

Croquis e fantasias da Portela, dos carnavalescos Antônio Gonzaga e André Rodrigues, compõem acervo de obras inéditas da exposição "Um defeito de cor". — Foto: Aldrey Olegario
Croquis e fantasias da Portela, dos carnavalescos Antônio Gonzaga e André Rodrigues, compõem acervo de obras inéditas da exposição "Um defeito de cor". — Foto: Aldrey Olegario

Algo interessante sobre a realização no Sesc Pinheiros é que pela primeira vez serão disponibilizados ao público as fantasias desfiladas na Sapucaí pela escola de samba Portela no Carnaval de 2024. “Incorporamos nesta edição os croquis e as fantasias do Antônio Gonzaga, que foi o carnavalesco da Portela, cujo enredo foi a partir do livro Um defeito de cor”, diz Bonan. Inclusive, tecidos e indumentárias no geral são outro forte da exposição.

+ Portela com 'Um defeito de cor' e como as agremiações usaram a literatura no Carnaval

“Quando estávamos em Salvador com a exposição em cartaz, o carnaval ainda estava acontecendo e achamos muito interessante como foi a reverberação do livro depois do carnaval. O livro esgotou e é, na verdade, o poder que o carnaval tem de difusão cultural”.

Outra novidade é o documentário Entre Savalu e Madureira, da fotógrafa e diretora de cinema Safira Moreira, que também aborda os preparativos do Carnaval. “Safira fez um documentário da própria Ana Maria, acompanhando-a na organização do Carnaval da Portela este ano”.

A pintura Retrato de Ana Maria, feita pela da artista visual Panmela Castro, também compõe o acervo de obras inéditas. Ela se destacou na arte principalmente com o grafite e a pintura, pelo qual representou figuras femininas e temas ligados aos direitos das mulheres. Na exposição, seu trabalho está junto de outras criações (não inéditas) de artistas como Kika Carvalho, Goya Lopes, Yedda Affini, Gabriella Marinho e Roberta Holiday.

Novos ares vindos da arte contemporânea

Cada artista ajuda a contar uma parte diferente da exposição e, como explica Bonan, são eles e elas que apresentam os temas ao público. “Trabalhamos, sobretudo, com os artistas contemporâneos. Na verdade, todos os assuntos ali são tratados via o trabalho de arte. Deixamos os assuntos na mão dos artistas”, explica ela sobre o processo de curadoria.

“Não são obras que foram comissionadas pela exposição. Os artistas já têm tratado das histórias e das memórias do Brasil. O que fazemos é selecionar os artistas e obras que já tratavam desses assuntos que o livro traz. E é muito interessante que, sobretudo, os artistas jovens estão falando sobre esses temas. Está na ordem do dia esse momento de reviver e recontar a história do Brasil.”

Exposição "Um defeito de cor" estará no Sesc Pinheiros até 1º de dezembro de 2024 — Foto: Márcio Vasconcelos/divulgação Sesc Pinheiros
Exposição "Um defeito de cor" estará no Sesc Pinheiros até 1º de dezembro de 2024 — Foto: Márcio Vasconcelos/divulgação Sesc Pinheiros

“Temos evitado trazer documentos de escravidão ou qualquer outro objeto nesse sentido. Até porque esses objetos deveriam estar no museu da polícia. São testemunhos de um crime”

Para ela, a importância de se trabalhar uma obra em diferentes formatos está na possibilidade de ampliar seu alcance. “Atinge diferentes públicos. Já são dois anos com a exposição em cartaz, mas são públicos diferentes. Tudo começa na literatura, com a ficção da Ana Maria, mas acho que em todos os formatos, a história da personagem principal e de seu filho, a narrativa e a fabulação dessas histórias precisam ser contadas. E a exposição também faz isso à sua maneira”.

+ Cena artística contemporânea brasileira: conheça o trabalho dessas 6 artistas

As bonecas orixás, que são objetos de culto e que passaram por autorização para serem incorporadas à exposição, também mostram caminhos da arte. “Temos textos em que situamos o público sobre o culto aos orixás, aos voduns e aos egunguns, mas são os artistas que tratam desse assunto. Trazemos as bonecas do Pai Dedé, que é o líder espiritual da festa de Iemanjá, de Itaparica. A princípio esses são objetos de culto, são oferendas e aí, claro, que toda vez que vamos montar a exposição pedimos as devidas autorizações”, explica. “É interessante porque na cultura ocidental existe essa divisão do que é objeto de culto e objeto de exposição. É uma divisão que entendemos que não existe em verdade. As coisas são intercambiáveis e ao mesmo tempo que é um objeto de arte é um objeto de culto, por exemplo. É muito interessante como a religião está presente e acho que também é um assunto que a arte moderna quis excluir das galerias de arte, mas é um assunto que sempre volta, que é a questão da espiritualidade”.

A exposição Um defeito de cor é gratuita e estará no Sesc Pinheiros (2º andar do espaço expositivo), em São Paulo, até dia 1º de dezembro de 2024 . De terça a sábado, o horário de visitação é das 10h30 às 21h e aos domingos e feriados das 10h30 às 18h00.

Tema no livro "Um defeito de cor", religião está presente na exposição do Sesc Pinheiros — Foto: Aldrey Olegario
Tema no livro "Um defeito de cor", religião está presente na exposição do Sesc Pinheiros — Foto: Aldrey Olegario
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