Comportamento

Por Camila Cetrone

O Dia da Consciência Negra, celebrado neste domingo (20), é um lembrete dos avanços que foram alcançados ao longo desse anos na luta antirracista – mas também do quanto ainda é necessário caminhar para garantir a emancipação da população negra no Brasil e no mundo, bem como a necessidade de luta contra o racismo todos os dias do ano.

A socióloga Carol Canegal é pesquisadora do Observatório da Branquitude, uma sociedade civil lançada em junho deste ano que se dedica a expor a manutenção do poder pela branquitude. Nathália Oliveira atua há anos em movimentos sociais – incluindo a Iniciativa Negra, fundada por ela – e em órgãos institucionais para repensar a política de drogas no Brasil. Sarah Fonseca empreende há 10 anos e usa sua plataforma nas redes sociais para visibilizar, amparar e incentivar negócios criados por mulheres negras – principalmente por meio da websérie ‘ElaFazONegócioDela’.

A seguir, as três falam a Marie Claire sobre sua atuação e expectativas para a luta contra o racismo no país.

Cara gente branca…

Carol Canegal é uma das fundadoras do Observatório da Branquitude — Foto: Diego Padilha
Carol Canegal é uma das fundadoras do Observatório da Branquitude — Foto: Diego Padilha

Entender a branquitude é compreender os mecanismos de opressão e privilégios que estruturam o racismo, sejam materiais ou simbólicos, a partir de quem os criou. É o que explica a socióloga Carol Canegal, uma das pesquisadoras por trás do Observatório da Branquitude junto de Thales Vieira e Diogo Santos. Criado em junho deste ano, o observatório se debruça na divulgação e realização de pesquisas que evidenciam a ocupa��ão dos espaços de poder, que são “monopolizados por um grupo social branco”, nas palavras da pesquisadora.

Os caminhos de Carol apontam principalmente para as políticas públicas. Ao longo da carreira, ela foi pesquisadora no Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação e analista do tema no Ministério Público do Estado do Rio. Foi ao longo desse percurso, bem como a realização de mestrado e pós-doutorado focados em educação, que passou pelo processo de tornar-se negra. Foi o que a aproximou da agenda de relações raciais de maneira mais incisiva.

A pesquisadora se descreve como um ponto fora da curva por "fugir do script" do que é esperado da população negra no Brasil. Nascida em Ipanema, ela é filha de uma professora de história e do diretor do Renascença Clube, o primeiro clube de negros da cidade do Rio. Também é neta de Newton Canegal, um dos primeiros jogadores negros do Flamengo. Ela e a irmã, que é historiadora, fazem parte da segunda geração da família que teve acesso à universidade.

"Tinha uma família consciente de onde a gente estava. Essa trajetória foi uma purificação desse choque de estar na branquitude e ser uma criança e uma adolescente negra com privilégios", diz. "Mas nada, absolutamente nada, me poupou de sofrer racismo em diversas situações."

Essa dicotomia fez com que Carol fosse tomada por muito tempo pelo não pertencimento, o que a fez compreender a importância de se tratar raça e classe de maneira interseccional. "Se a gente não olhar para a raça, o Brasil não muda e vai seguir reproduzindo desigualdades", ressalta.

É isso que é feito pelo Observatório da Branquitude de uma maneira que pode parecer inédita, mas não é – afinal, nos últimos 20 anos mais de 250 trabalhos sobre branquitude foram desenvolvidos; 60% deles assinados por mulheres.

Dessa maneira, a organização aponta para a maioria branca (e masculina) que ocupa esse 1%, que se beneficia das estruturas racistas criadas para que só um grupo fosse beneficiado. A expectativa também é quebrar com o ciclo que, por anos, exime as pessoas brancas da responsabilização por essas normas.

"É para incomodar, constranger e compreender esse ciclo. O olhar está sempre na gente, mas não se toma o branco nessa discussão. Esse grupo de brancos está empenhado em se manter intocável, sem precisar se mexer, enquanto 57% da população realmente luta para sobreviver diariamente, sai de casa sem saber se volta”, explica a socióloga.

Composto por uma equipe inteiramente negra, o observatório quer se tornar referência na produção de conhecimento, articulação política e comunicação de questões profundas de forma simples, pautando desde desigualdades sociais, racismo estrutural ao pacto narcísico da branquitude e privilégio branco. “O observatório nasce dessa inquietação. A gente se entende como fruto desse movimento de olhar que se recusa a entender as relações sociais olhando só para negros e indígenas. Estamos procurando o outro polo dessa equação”, ressalta a pesquisadora.

A esperança e desejo de Carol é que o trabalho do observatório desemboque em um debate público preparado para identificar as estruturas brancas de poder e mobilizar a população para que o Estado brasileiro seja pressionado a criar políticas públicas e reparadoras para negros e indígenas no país. Para ela, é uma caminhada que deve ser conjunta para abarcar e incluir de forma realmente democrática a multidisciplinaridade e pluralidade de todas as existências brasileiras.

"O processo de emancipação subjetiva não tem sentido se ele não vier acoplado de um compromisso social. Hoje, minha vida pessoal e profissional está totalmente montada para essa entrega para esse país, para os meus. Isso não exclui os brancos. Queremos uma sociedade justa, capaz de enfrentar os seus fantasmas e de transformar diversidade, igualdade e equidade para todo mundo”, destaca a pesquisadora.

+ Comportamento: Como brancos podem contribuir na luta antirracismo

Pelo fim da guerra contra pessoas

Nathália Oliveira, fundadora da Iniciativa Negra, ao lado do filho, José Pedro, de 9 anos — Foto: Alice Vergueiro
Nathália Oliveira, fundadora da Iniciativa Negra, ao lado do filho, José Pedro, de 9 anos — Foto: Alice Vergueiro

A socióloga Nathália Oliveira se descobriu enquanto mulher preta aos 15 anos, a mesma idade em que começou a experimentar substâncias como álcool e outras drogas. Ela morava na Penha, bairro periférico na Zona Leste de São Paulo, e se lembra de presenciar e sentir na pele a violência policial nas favelas.

"Tomei muitos enquadros. Sofri violências físicas, verbais e cheguei a ser revistada por policiais homens", lembra. Também notou a maneira como as meninas e mulheres periféricas que optam por fazer uso de substâncias são as mais vulneráveis a violências, incluindo as sexuais. Essa combinação de situações despertou nela um senso de justiça e a aproximou à demanda de legalização e regulamentação das drogas lícitas e ilícitas.

Aos 35 anos, Nathália é socióloga e é considerada uma das vozes mais potentes em prol do antiproibicionismo no Brasil. "Eu atuo pelo fim da Guerra às Drogas e me coloco contra a proibição da circulação de substâncias psicoativas", explica.

Um de seus principais interesses é desmantelar a lógica por trás do suposto combate ao narcotráfico, que escalou mais fortemente no Brasil em 2006, com a sanção da Lei de Drogas (nº11.343). "Mundialmente, essa guerra contra substâncias acaba se tornando uma guerra contra pessoas", afirma. Isso porque essa narrativa e suas operações são uma ferramenta que mantém o racismo estrutural ao marginalizar, violentar, encarcerar e matar desproporcionalmente a população negra brasileira. "É nas favelas, compostas por uma maioria de sujeitos negros, onde acontecem ações mais violentas, mas não é ali que está toda a produção do tráfico internacional", ressalta.

Essas noções foram ficando mais claras a partir de 2011, quando ela integrou o Centro de Convivência É de Lei em São Paulo, uma referência em redução de danos. Nathália atuou para auxiliar mulheres pretas em privação de liberdade, o público jovem e pessoas que estão na Cracolândia, por exemplo. "Aí eu começo a entender, nomear e compreender o que eram esses incômodos que eu trazia enquanto usuária de álcool e outras substâncias."

Ao longo da carreira, ela participou de conselhos que pensam políticas públicas e abordagem relacionadas às drogas em São Paulo e até hoje coordena a Plataforma Brasileira de Política de Drogas. Em 2016, ela deu um novo passo ao fundar a Iniciativa Negra ao lado do historiador baiano Dudu Ribeiro. Trata-se da primeira organização negra do país a pensar ações para alcançar justiça racial através da reforma da política de drogas no Brasil.

Por meio de mobilização popular, articulação política e campanhas, o intuito é sensibilizar a opinião pública e pressionar o poder brasileiro. “Quando o Brasil começar a discutir novas legislações sobre drogas, isso deve ser acompanhado de medidas de reparação à população negra, que foi a mais atingida”, diz Nathália, que espera ainda uma abordagem que leve à redução de danos em consideração, fomentando o uso responsável e a relação saudável e menos abusiva com as substâncias.

"Mais do que antiproibicionista e usuária de drogas, eu sou mulher, mãe e também usuária de drogas. Busco a partir dessa pauta um sentido de lutas coletivas que visem a construção de diminuição de desigualdades e justiça social", finaliza.

Mulheres pretas de negócio

Sarah Fonseca criou Projeto Conexão para entrevistar empreendedores negros e divulga os negócios de mulheres negras — Foto: Divulgação
Sarah Fonseca criou Projeto Conexão para entrevistar empreendedores negros e divulga os negócios de mulheres negras — Foto: Divulgação

Sarah Fonseca ficou conhecida nas redes sociais por compartilhar seu dia a dia, com foco em beleza, lifestyle, moda e empreendedorismo. Diariamente, ela divide sua rotina com mais de 670 mil seguidores no Instagram. A niteroiense de 28 anos começou a empreender oficialmente há dez anos, mas lembra da facilidade que, desde a época da escola, tinha facilidade para conseguir levantar o próprio dinheiro.

"Quando eu era adolescente, fazia miçanga e vendia material escolar na escola. Mesmo sendo tímida, sempre gostei de comprar, produzir e vender", conta. Sarah lembra ainda que, desde criança, ela dizia que seria dona de um shopping. "Foi quando meu sonho de empreender começou."

A primeira empresa surgiu em 2012, quando cursava a faculdade de administração. "Tinha R$ 200 do meu último salário de um estágio que fazia na época e, em vez de pagar as contas, eu comprei bijuterias para vender." Sarah fez as vendas em um grupo de Facebook, em que pediu as senhas das amigas para incluir mulheres de todos os perfis. "Fiz mais de R$ 600 em uma semana", lembra. A loja, nomeada de Sr. Biju, existe até hoje.

Sarah faz parte de um setor que tem presença marcante de mulheres negras. De acordo com um levantamento feito pela GEM (Global Entrepreneurship Monitor) 51% dos que empreendem no Brasil são mulheres, sendo 47% delas mulheres pretas. Mesmo sendo maioria entre as mulheres, elas são as menos reconhecidas e as que menos recebem oportunidades.

Ela mesma passou por racismo depois de abrir a sua empresa. Ao sacar o FGTS para investir, passou por um longo questionário aplicado pelo banco, que pensou que aquele dinheiro não era dela. "Não importa sua profissão. Se você é mulher preta, vai sofrer racismo de qualquer forma", diz. Ela destaca ainda que o alto número de empreendedoras negras está mais relacionada à necessidade de buscar alternativas para se manter, e não necessariamente um indicativo de sucesso.

Ao notar essa discrepância, ela decidiu criar o Projeto Conexão. Seu objetivo era entrevistar empreendedores negros para que pudessem falar de suas trajetórias. Além de abordar os sonhos, para ela era importante mostrar os obstáculos que pessoas negras enfrentam ao empreender devido ao racismo.

Para somar esforços na divulgação de negócios de empreendedoras mulheres, negras e não negras, a empreendedora decidiu visibilizar em sua websérie publicada no Instagram, 'ElaFazONegócioDela'. "São vídeos contando a minha história como empreendedora no Instagram. Disponibilizei alguns episódios para divulgar empreendedoras. Um deles foi voltado exclusivamente para empreendedoras negras", diz.

Esse episódio específico foi ao ar em março deste ano, logo depois de Sarah ter sido vítima de racismo em uma padaria no Rio de Janeiro. Na ocasião, o segurança pensou que ela estava pedindo dinheiro aos outros frequentadores e pediu que Sarah se retirasse. "Escolhi quatro empreendedoras negras, comprei seus produtos, paguei por eles e divulguei com todo amor e carinho."

A divulgação dos episódios de '#ElaFazONegócioDela' foi paralisada e deve ser retomada em 2023. Uma das metas da empreendedora é criar mais vídeos destacando empreendedoras negras. Para além do trabalho que ela faz na internet, o maior desejo de Sarah é "não ver mais o olhar de desconfiança ou descrença quando dizemos que temos uma empresa".

"Espero que o número de empreendedoras negras esteja mais relacionado à realização de sonhos do que a necessidade de pagar as contas de casa. Espero que tenhamos mais oportunidades, sejamos vistas como empreendedoras sérias. Espero que a nossa cor e traços não falem mais alto do que nossa capacidade e inteligência", pensa.

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