O índice de homicídios de mulheres no Brasil foi subnotificado por 40 anos, entre o período de 1980 e 2019. Segundo um novo estudo realizado por quatro instituições, houve uma alta de 28,52% do crime, o que significa 5,89 assassinatos por 100 mil mulheres. Os dados consolidam o cenário brasileiro como de extrema violência, já que a Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que uma região violenta é caracterizada por mortes acima de 3 para 100 mil mulheres.
O levantamento foi realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Instituto Nacional do Câncer (Inca) e Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A pesquisa utilizou um método de correção ao analisar mortes violentas de mulheres como uma possibilidade de identificar violência de gênero nas últimas quatro décadas. Foram utilizados dados do registro de óbito do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Sistema Único de Saúde (SIM/Datasus).
Nesses casos, existem técnicas demográficas que identificam fatores de correção para a subnotificação, como explicou Karina Meira, coordenadora do estudo e pesquisadora da UFRN, a Agência Brasil. "Primeiro nós fizemos a correção para as causas indeterminadas e depois nós fizemos as correções para a subnotificação, e aí a gente teve um número de óbitos, de homicídios, corrigido."
No entanto, o estudo aponta que apenas os dados do SIM não são suficientes para apontar a relação dos óbitos com a violência de gênero, já que, além de se tratar de uma tipificação recente (o feminicídio só se tornou crime no Brasil em 2015, pela lei nº 13.104), não existia preparo das forças policiais para identificá-lo ou forma de avaliar a relação da vítima com a pessoa que cometeu o crime.
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Segundo o estudo, a frequência de óbitos de mulheres decorrentes de violência é frequente em todo o país, mas a região Norte lidera as incidências e apresentam 49,88% mais incidência. O menor índice foi registrado no Sul, mesmo com um aumento de 9,13% nas ocorrências.
“A gente tem uma redução do risco de óbito para o Sudeste e para o Sul e um aumento no Norte e Nordeste, o que significa dizer que ao longo destes últimos 40 anos, gradativamente, esse problema de saúde pública foi se tornando particularmente mais penalizante para mulheres do Norte e do Nordeste do que pro Sul do Brasil”, explica o coautor do estudo Rafael Guimarães, pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fiocruz.
As principais vítimas são as mulheres negras, que Meira aponta como um reflexo do racismo estrutural presente no país. Em 2019, elas tinham um risco 1,7 maior de serem assassinadas, com agravo em alguns estados: no Rio Grande do Norte, por exemplo, esse índice é 5,1 vezes maior.
Em relação a grupos etários, estão mais vulneráveis as mulheres entre 20 e 39 anos. Também são mais suscetíveis as que vivem em cidades mais conservadoras e com forte cultura patriarcal, ao contrário das que vivem em regiões onde a discussão sobre violência de gênero é mais disseminada. Entre os principais métodos de homicídio encontrados no estudo estão, em ordem, arma de fogo, objetos contundentes ou perfurantes e estrangulamento.
*Com informações de Agência Brasil
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