Lúcia Monteiro

Por Lúcia Monteiro

Crítica, pesquisadora e professora de cinema da Universidade Federal Fluminense

Sou tomada por sentimentos ambivalentes todo janeiro, quando a Academia anuncia a lista dos indicados ao Oscar. Primeiro tento ignorar o assunto. Lembro que se trata de uma instituição conservadora, que raramente premia o melhor do cinema e para a qual o mérito artístico não é o critério mais importante. Talvez num grau ainda mais acentuado do que em outras premiações, ser ou não indicado é resultado de um jogo de forças brutal, no qual sucesso comercial, estratégia política e negociação pesada contam muito, além de outros fatores insondáveis para espectadores e especialistas. A verdade é que acabo me dobrando. Às vezes consigo me manter esnobando o assunto por uma semana; neste ano, não me segurei por mais do que 5 minutos. Fui logo lá conferir na lista quantos filmes faltam para eu ver, fazer minhas apostas, torcer. Comemorar e lamentar.

Comecemos pela festa. Pela primeira vez, há três títulos dirigidos por mulheres entre os dez indicados para o prêmio de melhor filme. "Anatomia de uma queda", de Justine Triet, "Barbie", de Greta Gerwig, e "Vidas passadas", de Celine Song. Das três, apenas Justine Triet concorre à estatueta de melhor direção. Em número de indicações, o campeão, por enquanto, é "Oppenheimer", de Christopher Nolan: concorre em treze categorias, seguido por "Pobres criaturas", de Yorgos Lanthimos (onze indicações), e "Assassinos da Lua das Flores", de Martin Scorsese (dez). "Barbie" aparece na quarta posição, com oito indicações. Gerwig não disputa a estatueta de melhor direção e Margot Robbie, a protagonista, não foi indicada.

Comoção, polêmica, críticas e memes surgiram imediatamente. Quando comecei a ler sobre o assunto, depois dos meus 5 minutos tentando ignorá-lo, já pipocava um gif engraçadíssimo com a cara de "Ken não entendeu" do Ryan Gosling ao ser indicado como ator coadjuvante, enquanto Gerwig e Robbie ficaram fora da disputa. Difícil não fazer uma relação com o assunto do filme. Afinal, a lista dos concorrentes ao Oscar vai sempre mostrar o patriarcado resistindo a abrir mão de posições de poder – ainda que, para isso, faça concessões aqui e ali?

Você pode ler mais sobre "Vidas passadas", o filme de Celine Song, em minha coluna na Marie Claire de fevereiro. Eu adoro, e acho um feito e tanto ter uma diretora de origem coreana disputando o prêmio de melhor filme. Estou festejando também que Lily Gladstone está na disputa pelo prêmio de Melhor Atriz. Ela cresceu em uma reserva no estado de Montana e é a primeira mulher indígena na categoria. Seu desempenho é mesmo fantástico, embora eu não goste do filme de Scorsese. Pareceu-me autoindulgente e longo demais (e olha que um de meus filmes preferidos tem mais de seis horas). Acredito também que subestima a inteligência da plateia, ao mostrar uma ação e, em seguida, apresentar um diálogo em que os personagens narram o ocorrido. Não precisa, é redundante. Se o roteiro tivesse sido escrito por um aluno meu, ganharia um comentário do tipo "por que repetir isso?".

Concorre ainda ao posto de melhor atriz Annette Bening, por "Nyad", de Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi. Bening está muito bem, contracenando com a também incrível Jodie Foster, em papeis desafiadores de nadadora e treinadora, ambas lésbicas. Foi uma das grandes apostas da Netflix no ano passado e fico especulando sobre as pressões todas para o filme ganhar uma estatueta ao menos.

Nas semanas que nos restam até a noite da premiação, há duas possibilidades. Tentar ignorar o assunto, lembrando que o melhor do cinema passa ao largo do bonequinho dourado. Ou correr para ver o máximo de filmes indicados, debater performances, roteiros e trilha sonora intensamente. Sugiro equilibrar um pouco das duas posturas. É assim que fazem os votantes da Academia e o júri de toda premiação. Voltamos a conversar em março.

Veja a lista completa de mulheres indicadas ao Oscar de 2024:

Melhor Filme

Anatomia de uma Queda (Justine Triet)
Barbie (Greta Gerwig)
Vidas Passadas (Celine Song)

Melhor Direção

Justine Triet, por "Anatomia de Uma Queda"

Melhor Atriz

Annette Bening, por "NYAD"
Lily Gladstone, por "Assassinos da Lua das Flores"
Sandra Hüller, por "Anatomia de uma Queda"
Carey Mulligan, por "Maestro"
Emma Stone, por "Pobres Criaturas"

Melhor Atriz Coadjuvante

Emily Blunt, por "Oppenheimer"
Danielle Brooks, por "A Cor Púrpura"
America Ferrera, por "Barbie"
Jodie Foster, por "NYAD"
Da'Vine Joy Randolph, por "Os Rejeitados"

Melhor Roteiro Original

Justine Triet & Arthur Harari, por "Anatomia de uma Queda"
Celine Song, por "Vidas Passadas"

Melhor Roteiro Adaptado

Greta Gerwig & Noah Baumbach, por "Barbie"

Melhor Documentário

"The Eternal Memory", de Maite Alberdi
"Four Daughters", de Kaouther Ben Hania
"To Kill a Tiger", de Nisha Pahuja

Melhor Trilha Sonora

Laura Karpman, por "American Fiction"

Melhor Canção Original

"What Was I Made For?" (Barbie), por Billie Eilish

Melhor Design de Produção

Sarah Greenwood, por "Barbie"
Ruth De Jong, por "Oppenheimer"
Shona Heath, por "Pobres Criaturas"

Melhor Figurino

Jacqueline Durran, por "Barbie"
Jacqueline West, por "Assassinos da Lua das Flores"
Janty Yates, por "Napoleão"
Ellen Mirojnick, por "Oppenheimer"
Holly Waddington, por "Pobres Criaturas"

Melhor Montagem

Laurent Sénéchal, por "Anatomia de uma Queda"
Thelma Schoonmaker, por "Assassinos da Lua das Flores"
Jennifer Lame, por "Oppenheimer"

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