Saúde
Por , Em Colaboração para Marie Claire — São Paulo

Violet Barga, 22, viralizou no TikTok ao falar sobre o seu diagnóstico de transtorno de personalidade antissocial (TPAS), usado como sinônimo de sociopatia e de psicopatia a fim de desmistificar o tema. Uma das vivências trazidas pela criadora de conteúdo é em relação aos seus comportamentos violentos, um dos traços do quadro psiquiátrico, e como aprendeu a contorná-los para que não chegar ao ponto de ser presa.

O processo de Barga, moradora de Bauru (SP), para chegar ao diagnóstico correto não foi simples. Aos 16 anos, ela começou a fazer terapia e, inicialmente, recebeu o laudo de depressão profunda. Foi informada que também apresentou a doença na infância.

“Ao mudar de psicólogo, ele percebia que tinha muitos comportamentos diferentes em mim. Ele dizia que eu tinha bastante atividades violentas, não tinha muitos impulsos emocionais, era uma pessoa muito fria e tinha vícios em algumas substâncias. Ele sempre sugeriu que eu me consultasse com um psiquiatra, só que eu negava o tratamento com remédio. Expliquei que só iria passar em consulta caso tivesse um motivo muito bom para isso”, lembra.

A saída encontrada pelo psicólogo foi aplicar testes neurológicos para tentar chegar ao diagnóstico correto. A produtora de conteúdo, porém, foi diagnosticada com transtorno de personalidade borderline e encaminhada para o psiquiatra. “Eu comecei a tomar muita medicação, só que não tinha resultado. Inclusive, alguns remédios me levaram para o pronto-socorro”, relata.

Barga passou por uma reavaliação neurológica que cravou transtorno de personalidade antissocial. O quadro atinge de 1% a 2% da população mundial, o que corresponde a uma em cada 100 pessoas com a desordem neuropsiquiátrica.

O diagnóstico correto, dessa vez, permitiu que a jovem fosse medicada de forma adequada. Posteriormente, Barga foi orientada pelo psicólogo a procurar pela abordagem terapia cognitiva-comportamental. Ela trocou mais uma vez de terapeuta, que confirmou o TPAS, e atualmente segue a linha TCC.

Violet Barga — Foto: Arquivo pessoal
Violet Barga — Foto: Arquivo pessoal

“Quando recebi o diagnóstico do transtorno de personalidade antissocial, entrei em processo de negação porque tudo fazia sentido, mas, ao mesmo tempo, é um diagnóstico raro, cheio de preconceitos, que pode acabar prejudicando minha imagem. Então, comecei a acreditar que não tinha nada de errado comigo e sim com o mundo ao meu redor, só que isso também é um sintoma muito claro do transtorno”, reflete.

Após esse primeiro embate com o laudo do TPAS, Barga explica que ter consciência do diagnóstico permitiu que ela encontrasse o tratamento adequado — tanto psicológico quanto psiquiátrico — e sentido para muito do que viveu ao longo da vida. Ainda assim, isso não anula os desafios do que é ter transtorno de personalidade antissocial e o estigma que permeia a desordem neuropsiquiátrica.

Os sintomas do transtorno de personalidade antissocial

“A característica principal do transtorno da personalidade antissocial é um padrão generalizado de desrespeito e violação dos direitos alheios, insensibilidade e comportamento agressivo, cujos primeiros sinais manifestam-se desde a infância e adolescência e persistem na vida adulta”, explica o psiquiatra forense Thiago Fernando da Silva, sócio-diretor da Ethos Psiquiatria e membro do Núcleo de Psiquiatria Forense e Psicologia Jurídica do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.

O indivíduo com a condição também apresenta, segundo a psiquiatra Emily Gomes de Souza, da clínica Revitalis e especialista em transtorno de personalidade antissocial pela Associação Brasileira de Psiquiatria:

- Extrema dificuldade em seguir normas sociais e comportamentos legais, o que pode levá-lo a ser preso por cometer algum delito;
- Descaso pela sua segurança e a dos outros;
- Tendência a mentir repetidamente, em benefício próprio;
- Irresponsabilidade;
- Impulsividade;
- Irritabilidade e/ou agressividade;
- Ausência de remorso.

“Lembrando que não é necessário que o paciente tenha todas essas características ao mesmo tempo. E o diagnóstico só pode ser concluído após os 18 anos”, completa Souza.

Barga relata que, desde criança, sua mãe já percebia que havia algo de diferente com ela. Só que pela ausência de conhecimento sobre o assunto, não sabia dizer ao certo o que era. A produtora de conteúdo tinha, por exemplo, uma irritabilidade exacerbada com as pessoas.

“Eu não tinha problema para socializar, só que eu me irritava muito facilmente com as outras pessoas, as enxergava como inferiores e eu tinha muita dificuldade de respeitar os direitos alheios, no sentido de que os outros merecem respeito e compaixão”, conta.

O desprezo pela lei também sempre foi algo recorrente na vida da jovem. “Isso já me fez cometer alguns atos de criminalidade desde a minha adolescência, que me colocaram em algum tipo de detenção. Só que como eu era uma pessoa muito racional, todas as vezes que acabava sendo colocada em alguma represália, eu conseguia sair com muita facilidade”, relata.

Eu conseguia forçar choro e criar uma história a meu favor, porque eu tinha uma compulsão por manipulação/mentira. A minha cabeça sempre funcionou olhando para as outras pessoas me perguntando o que eu conseguiria delas”.
— Violet Braga

O que a fez entender que ela precisaria aprender a se regular, para controlar o impulso por atos violentos, foi acompanhar de perto o que a sua figura paterna viveu.

“Na infância, fui muito à penitenciária visitar o meu pai com a minha mãe. Sei como é lá dentro. É um ambiente hostil, em que acontecem muitas situações desumanizantes para quem está lá. Consequentemente, se tornou um medo para mim acabar igual meu pai. Quando percebi que atos violentos contra os outros poderiam ter essa possibilidade de me colocar nesse mesmo local, precisei aprender a regular essa questão”, relata.

Já entre as atitudes motivadas pelo desprezo em relação à própria segurança, Barga passou por um episódio bastante perigoso. Ela ingeriu meia lata de alvejante por estar em profundo tédio, uma emoção comumente observada entre quem tem transtorno de personalidade antissocial.

“Foi em um dia que eu estava em tédio crônico, não tinha onde buscar minha dopamina, além de não sentir aquele medo do perigo. Eu estava brigada com meu namorado, não faço mais uso de drogas, não tinha nenhum livro para ler, então, tive uma atitude extremamente impulsiva que foi acabar tomando meia lata de alvejante. Consequentemente, acabei vomitando tudo e fiquei de cama, porque fiquei com o estômago ruim. Era como se eu estivesse com intoxicação alimentar”, lembra.

A falta de empatia também sempre foi um traço marcante de Barga e foi ele quem levou a suspeita do segundo psicólogo sobre a possibilidade dela ter transtorno de personalidade antissocial.

O tratamento para transtorno de personalidade antissocial

O psiquiatra Acioly Luiz Tavares de Lacerda, professor do departamento de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador do Programa de Transtornos do Humor da universidade, explica que ainda não há um tratamento ouro aprovado para o transtorno de personalidade antissocial por falta de evidências ou comprovações precárias de intervenções eficazes para o quadro.

Ainda assim, alguns caminhos podem ser explorados. “Por exemplo, o uso de medicamentos como estabilizadores de humor podem auxiliar em algumas características presentes no transtorno de personalidade antissocial, como impulsividade e comportamento violento”, cita o especialista. Antidepressivos e antipsicóticos também podem ser prescritos dependendo do caso.

Silva esclarece que o tratamento farmacológico não costuma ser a primeira tentativa de intervenção devido às evidências científicas limitadas para o uso de remédios em quem tem TPAS. O acompanhamento para a maioria dos casos deve ser multiprofissional, sendo essencial psicólogos.

“A internação psiquiátrica somente é indicada quando o paciente torna-se um risco importante para si ou para terceiros”, reforça Silva.

A terapia foi um divisor de águas na vida de Barga. Foi por meio do acompanhamento psicológico que ela conseguiu criar técnicas para controlar a raiva que sente e driblar os comportamentos violentos que tinha.

“A minha psicóloga não reprime os meus comportamentos. Eu falo que tenho pensamentos homicidas e ela me instrui a jogar isso no papel, por exemplo. Fazer uma arte a respeito, escrever, mostrar o que estou pensando”, conta. Ter um espaço seguro para sentir profundamente o que vem à tona ajudou a produtora de conteúdo a reduzir as atitudes violentas em relação a terceiros.

Além disso, o acompanhamento psicológico ajudou Barga a estabelecer relações interpessoais mais duradouras. Ela passou a entender que as pessoas tinham algo a oferecer para ela e vice-versa e, dessa forma, o senso de desprezo pelo outro reduziu. Atualmente, ela está em um relacionamento amoroso estável.

O grande desafio da terapia em relação a quem tem transtorno de personalidade antissocial é que nem sempre o indivíduo entende que precisa de acompanhamento psicológico. Isso faz com que a busca pelo especialista seja feita por “familiares, ou até mesmo devido a tratamentos coercitivos determinados por autoridades judiciais”, completa Silva.

Transtorno de personalidade antissocial, psicopatia e o encarceramento

Ao falar sobre transtorno de personalidade antissocial, há quem associe o quadro a psicopatia/sociopatia e obrigatoriamente ao encarceramento. Só que tais associações são carregadas de preconceito e desinformação.

“O nome transtorno de personalidade antissocial tentou justamente reduzir o estigma dos termos utilizados até a década de 1970 em classificações oficiais, como sociopatia ou psicopatia. Estes, de fato, são termos carregados de estigma e de um pressuposto de que todas as pessoas com o diagnóstico de transtorno de personalidade antissocial necessariamente se envolverá em atividades criminosas, o que não é verdade”, explica Lacerda.

A associação do transtorno de personalidade antissocial com encarceramento ocorre devido o indivíduo ter extrema dificuldade em seguir leis. Só que nem sempre ele acabará no sistema penitenciário. E pode ser possível manejar os atos com acompanhamento psicológico para que não haja esse desfecho negativo.

“Outra explicação é a capacidade desses indivíduos de burlarem o sistema de justiça e não serem responsabilizados pelos seus atos. Esses indivíduos apresentam uma grande tendência à falsidade, com mentiras repetidas, e muitas vezes irão realizar grandes esforços a fim esconder seus delitos, com o objetivo de não sofrerem punições por seus atos”, esclarece Silva.

Já em relação ao transtorno de personalidade antissocial ser sinônimo de psicopatia/sociopatia, a explicação deles não serem está na definição dos transtornos psicológicos.

De acordo com Silva, os critérios para o diagnóstico do transtorno de personalidade são baseados na Associação Americana de Psiquiatria e no Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM), atualmente em sua quinta edição. Já o conceito de psicopatia deriva do psicólogo Robert Hare, influenciado pelo trabalho do psiquiatra americano Hervey Cleckley, que publicou um livro chamado “A máscara da sanidade”, criando uma escala chamada de PCL-R (Psychopathy Checklist, Revised), que é a ferramenta diagnóstica padrão-ouro para a condição.

“Apesar dos critérios presentes na PCL-R e os critérios do transtorno de personalidade antissocial apresentarem algumas semelhanças, a PCL-R avalia diversas características graves que não estão presentes nos critérios do transtorno de personalidade antissocial, como loquacidade e charme superficial, estilo de vida parasitário, versatilidade criminal e revogação de liberdade condicional”, explica Silva.

Assim, o psiquiatra conclui: “Quase todos indivíduos que apresentam psicopatia, definida pela PCL-R, preencherão os critérios para o transtorno de personalidade antissocial, porém uma minoria dos indivíduos que apresenta o transtorno de personalidade antissocial preencherá os critérios para psicopatia”.

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