O que faz uma consultoria de diversidade em um desfile, como o de João Pimenta no SPFW?

A também estilista Cintia Felix, da marca AZ Marias, integrou a equipe técnica da apresentação com esse cargo. Mas, afinal, qual foi o papel dela dentro da apresentação?

Por Nathália Geraldo, redação Marie Claire — São Paulo


Desfile João Pimenta no SPFW N 56 Ag. Fotosite

As crenças dos brasileiros são entranhadas entre si e esse sincretismo religioso foi o que deu o tom para o desfile de João Pimenta, na quarta (8), que levou sua apresentação de roupas masculinas ao São Paulo Fashion Week em uma sala de desfile armada no Shopping Iguatemi. Inspirado para "tecer com fios de ouro" essa história que atravessa o culto aos orixás e as representações e os exercícios de fé católicos, o estilista contou com uma consultora de diversidade na equipe técnica: a também estilista Cintia Felix, da marca AZ Marias.

O nome de Cintia aparece nos créditos do material entregue à imprensa ao lado de um "consultor de linguagem", o professor Kledir Salgado. Os dois são professores no Senac, que deu apoio educacional ao desfile, com uma equipe técnica também formada por alunos e docentes da instituição. Os dois são negros.

Cintia conta a Marie Claire que foi de João Pimenta a ideia de estabelecer um alinhamento de diversidade -- algo que já é bastante difundido no setor corporativo, sob o nome de Diversidade e Inclusão -- antes de os modelos pisarem na passarela. Com roupas que tocam no universo do candomblé, além das referências a mantos de santos católicos, foi preciso que um olhar mais apurado se debruçasse sobre a linha narrativa da coleção. Tudo para que "não se caísse em nenhum estereótipo negativo", conta a consultora.

Desfile João Pimenta no SPFW N 56 — Foto: Ag. Fotosite

"A ideia era que não acarretasse nenhum ruído para o desfile. Os modelos de capuz, por exemplo, não eram pretos. E o próprio capuz teve uma concepção: teve que ser uma peça bem rente à cabeça, para não fazer de forma alguma alusão ao grupo extremista da Ku Klux Klan. São esses pequenos detalhes que passam pelo meu olhar".

De olho na diversidade

Desfile João Pimenta no SPFW N 56 — Foto: Ag. Fotosite

Segundo Cintia, o movimento de se preocupar com a diversidade-- não só racial, mas que contemple pessoas gordas, LGBTQIA+ e com deficiência -- partiu da ação individual do estilista. Marie Claire tem feito a cobertura desta edição do SPFW e, ao menos nas passarelas, a presença de pessoas de diferentes corpos, experiências de vida e faixas etárias tem marcado boa parte dos desfiles.

Vale lembrar que no SPFW tem cota racial: desde 2020, as marcas precisam levar metade do casting com negros, afrodescendentes e indígenas. Nem sempre, claro, foi assim.

"O SPFW é uma plataforma que existe há muito tempo e agora vem sendo cobrada por esses novos olhares. O Brasil é diverso porque tem os indígenas, que já estavam, os negros escravizados e os portugueses, nossos colonizadores. Isso cria a nossa diversidade 'natural'. Mas dentro do SPFW, nos anos 90 e até a virada dos anos 2000, não tinha diversidade de corpos, de pessoas pretas", pondera Cintia.

Desfile João Pimenta no SPFW N 56 — Foto: Ag. Fotosite

O calo apertou, com movimentos sociais potencializados pela internet, e as coisas precisaram mudar, diz Cintia. "A sociedade não botava pressão suficiente para que o evento pudesse dialogar com isso. Mas hoje vemos que está ansiosa para ver esses novos corpos e corpas, novos criadores. E acredito que também estamos falando de um novo tipo de mercado. Marcas querendo ter ações positivas".

O trabalho, diz a consultora e também estilista, serve ainda para ressoar mais vozes. Para ela, mais grifes e diretores criativos poderiam se preocupar com esse tipo de consultoria. "Seria bom para que as marcas não errassem por puro desconhecimento", analisa.

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