Última a votar, a ministra Cármen Lúcia deve desempenhar papel-chave no julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que discute a fixação de critérios para diferenciar o consumidor e o traficante de maconha, que será retomado – e, espera-se, finalmente concluído – nesta terça-feira à tarde.
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Só Carmén e Luiz Fux ainda não se manifestaram no julgamento, iniciado em 2015 e que se arrasta até hoje, após sucessivos pedidos de vista e adiamentos. Enquanto Fux é considerado um magistrado conservador na pauta de costumes, Cármen é vista pelos colegas como uma ministra da ala progressista.
O placar provisório está 5 a 4 por declarar inconstitucional a atual legislação sobre maconha, de 2006, que considera o porte de drogas um crime. Falta, portanto, apenas um voto para formar maioria pela descriminalização.
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O entendimento nessa linha foi inaugurado pelo ministro Gilmar Mendes e acompanhado por Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Edson Fachin e a ex-presidente do STF Rosa Weber, que fez questão de antecipar o voto no caso antes de se aposentar, em agosto do ano passado.
Devido às divergências de perfil de Fux e Cármen Lúcia, a aposta nos bastidores é a de que o ministro vota pela constitucionalidade da lei, o que empataria o placar e deixaria com Cármen a missão de selar o placar final. As posições já externadas pela ministra em outras oportunidades indicam o caminho que ela deve votar.
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“Essa é uma questão de saúde, não de polícia. Quem porta droga e faz uso da droga não necessariamente comete um crime que pode ser tipificado e equiparado, por exemplo, a práticas que são realmente nocivas à sociedade e às pessoas, como o tráfico, como outros crimes que são praticados exatamente por conta do uso de droga”, disse Cármen Lúcia em junho de 2021.
O comentário foi feito durante participação por videoconferência de um evento chamado Cannabis Affair, um fórum mantido por ativistas, pesquisadores e profissionais de saúde, voltado para a discussão de estudos e projetos sobre a maconha e sua regulamentação.
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“É que é preciso também que o poder público brasileiro invista em políticas de saúde para aqueles que, estando em situação de vício, seja pelo álcool, seja pela droga, que eles recebam um tratamento”, completou Cármen na ocasião.
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A posição de Cármen está alinhada às posições de Barroso, Gilmar, Moraes, Fachin e Rosa Weber, que veem o tema como uma questão de saúde e segurança pública.
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Em 2011, a ministra também votou a favor do direito de manifestantes de todo o país promoverem protestos pela liberação das drogas, como a Marcha da Maconha. Foi essa a tese que acabou prevalecendo no STF, aliás.
“E marchas como essa comportam exatamente a ideia de que nós temos que tolerar, ir para a praça discutir, e dali se tirar o consenso do que vai ser mantido como direito ou ser um dado transformador do direito”, afirmou Cármen naquele julgamento.
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“A ideia de justiça muda de tempo para tempo, de local para local, e ela só amadurece e se positiva como direito, à medida que as pessoas podem discutir e amadurecer as ideias.”
Já uma cartilha sobre crack lançada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2016, quando Cármen presidia o órgão, sustenta que “não há sociedade livre de drogas” e que “a melhor forma de prevenção é a informação”.
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“A droga é algo que já existe há muito tempo. Logo, o consumo de substâncias que alteram o estado de consciência é fenômeno cultural, que ocorre em diversos contextos (social, econômico, ritual, religioso, estético, psicológico, cultural). Não há sociedade livre de drogas. O que há são diferentes finalidades quanto ao uso. A busca de experiências de prazer é apenas uma delas”, diz o texto de apresentação do documento.
Conforme informou o blog, mais de 6 mil processos que tramitam em diversas instâncias judiciais de todo o país estão parados, à espera da conclusão do julgamento do STF sobre o porte de maconha para uso pessoal.
O caso analisado hoje chegou ao Supremo em 2011, quando um homem pego com 3g de maconha em sua cela na cadeia, recorreu ao tribunal para anular a condenação de prestação de dois meses de serviço comunitário, alegando que a lei em vigor ofende o princípio da intimidade e da vida privada.
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O processo começou a ser julgado em 2015 e até hoje o tribunal não deu o seu veredicto sobre o tema, após sucessivos pedidos de vista que postergaram a conclusão do julgamento. O último deles foi do ministro Dias Toffoli, em março deste ano.
Na prática, o STF está decidindo pelo menos três coisas: se a legislação atual sobre maconha fere ou não a Constituição; qual a quantidade que deve ser fixada para diferenciar o usuário do traficante; e se cabe ao próprio STF determinar esse limite, ou se isso é uma função do Congresso ou da Anvisa, como defende Toffoli.
Até mesmo ministros que votaram para manter a legislação atual de pé, como Cristiano Zanin, Nunes Marques e André Mendonça, também defendem a fixação de um critério para delimitar a quantidade de maconha que caracteriza o consumo, e não o tráfico – para Zanin e Nunes Marques, o limite é 25g; para André Mendonça, 10g.
Favoráveis à descriminalização, Barroso, Gilmar, Rosa e Alexandre de Moraes defendem uma quantidade maior – 60g. Já Edson Fachin, mesmo aderindo à corrente pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, avalia que cabe ao Congresso Nacional decidir a questão.
Com tantas nuances nos votos de cada ministro, após os votos de Fux e Cármen, os integrantes do STF deverão fazer uma nova votação para chegar a um consenso sobre a quantidade exata que será usada como parâmetro.