Malu Gaspar
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Malu Gaspar

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Informações da coluna

Ao deixar a Petrobras, Jean Paul Prates contou aos colegas de diretoria que Luiz Inácio Lula da Silva foi lacônico ao demiti-lo do cargo na última terça-feira, em encontro rápido no Palácio do Planalto. Pelo relato dele, o presidente alegou duas razões principais para tirá-lo do posto.

A primeira: os dois não estavam “alinhados” em relação aos rumos da empresa. A segunda: Lula não perdoou o fato de Prates não obedecer sua ordem para votar pela retenção dos dividendos extraordinários que seriam distribuídos aos acionistas, entre os quais a própria União. Uma afronta, falou o presidente na conversa. Uma deslealdade, disse Lula aos aliados.

Nem é preciso ser bom entendedor para traduzir o gesto. Prates nem de longe era rebelde às ordens do presidente. Mas Lula está ansioso para voltar rapidamente ao tempo em que mandava na companhia sem grandes obstáculos, para que ela volte a despejar bilhões em megaprojetos como a refinaria Abreu e Lima ou o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).

Ou na construção de estaleiros, que na última encarnação petista eram financiados pela Sete Brasil. O presidente tem saudades de quando se apresentava de macacão laranja e mãos sujas de óleo para aplauso de um mundo que via no Brasil uma estrela global em ascensão.

Naquela época, a Petrobras chegou a responder por 34% do investimento do Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC, e a economia brasileira chegou a crescer 7,5% em um ano.

A nova CEO da Petrobras, Magda Chambriard, prometeu trazer de volta esse passado. Nas conversas com os ministros de Minas e Energia e da Casa Civil, maiores adversários de Prates no governo, ela também sinalizou que abraçaria seus projetos favoritos — como os gasodutos que fazem brilhar os olhos de Alexandre Silveira ou a fábrica de fertilizantes da falida Unigel, de um empresário amigo de Rui Costa.

Abriu espaço, também, para que indicassem pessoas de sua confiança para a diretoria e cargos-chave na empresa. E, antes de ser confirmada, recebeu o aval de Dilma Rousseff e do ex-presidente da Petrobras José Sergio Gabrielli, consultados pelo próprio Lula.

Portanto, por mais que seja reconhecida como técnica experiente, foi pela política que Magda conquistou o posto. E, se por um lado o passado que ela se comprometeu a reviver evoca boas lembranças em Lula e em seus ministros, aos contribuintes e acionistas da Petrobras ele reaviva a memória de um rastro de prejuízos irreparáveis.

Os números são do Tribunal de Contas da União (TCU): só Abreu e Lima torrou US$ 19 bilhões. O Comperj, mais US$ 8 bilhões. A Sete Brasil, criada para financiar os estaleiros com conteúdo nacional, fez derreter mais US$ 25 bilhões.

Somado, o rombo foi de US$ 56 bilhões, ou quase R$ 300 bilhões que, de acordo com o TCU, nunca mais serão recuperados — com exceção dos R$ 6,1 bilhões devolvidos por pessoas físicas e empresas que confessaram ter desviado o dinheiro da Petrobras por meio de propina e superfaturamento.

Tudo isso sem contar a desastrosa política de uso do caixa da Petrobras para subsidiar os combustíveis, que custou mais US$ 40 bilhões.

Regras de governança na mira

Superar o trauma deixado por tamanha destruição de valor exigiu longo aperfeiçoamento institucional, com restrições legais ao uso político das empresas de controle público e mudanças no estatuto da Petrobras que travam investimentos sem um mínimo de viabilidade e retorno financeiro.

O “sistema” vem trabalhando para desmontar esse arcabouço desde o governo Jair Bolsonaro, com as mudanças na Lei de Improbidade Administrativa, a flexibilização da Lei das Estatais e o desrespeito às regras de governança da Petrobras.

A escolha de Magda Chambriard sugere que Lula está decidido a completar o trabalho e derrubar as barreiras erguidas desde o petrolão, repetindo a estratégia de usar a Petrobras para irrigar a economia, a tempo de chegar em 2026 com mais chances de se reeleger.

Acontece que o Brasil não é mais o mesmo.

Além da Lei das Estatais, estão aí a autonomia do Banco Central, os entregadores de iFood, os motoristas de Uber, o orçamento secreto, o conservadorismo evangélico, a extrema direita radical e grandes catástrofes naturais como a do Rio Grande do Sul.

Não há razões para acreditar que soluções que já não funcionaram lá atrás, num cenário favorável, funcionarão agora, em contexto bem mais desafiador, com uma sociedade tão mais complexa e desafios tão diversos.

Torrar bilhões para fazer o Brasil de 2024 se encaixar num roteiro dos anos 2000 gerará enormes prejuízos. Sem garantir final feliz nem sucesso de público.

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