Contr�rios � onda fitness, movimentos pregam o fim do 'corpo ideal'
Karime Xavier/Folhapress | ||
A embaixadora do Body Image Movement (Movimento da Imagem Corporal) no Brasil, Mariana Cyrne |
Como ter um corpo ideal para ir � praia? 1) Tenha um corpo. 2) V� para a praia.
A frase, que ficou conhecida nas redes sociais ao satirizar antigos "conselhos" disseminados em revistas femininas, � um dos exemplos de um debate que tem ganhado for�a em p�ginas e grupos na internet –e sobretudo em frente ao espelho.
Na contram�o da onda fitness, ganham for�a movimentos contra a imposi��o de padr�es est�ticos e de peso e em prol da aceita��o do pr�prio corpo.
Em outros pa�ses, a proposta � chamada de "body positive" (corpo positivo, positividade corporal) ou "body neutrality" (neutralidade corporal).
No Brasil, no entanto, a discuss�o ainda � incipiente, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
O tema � pano de fundo do document�rio "Embrace", lan�ado neste ano na plataforma Netflix, que narra a trajet�ria da ativista australiana Taryn Brumfitt, criadora do BIM (Movimento da Imagem Corporal, na sigla em ingl�s), e de outras mulheres em busca de uma rela��o de paz com a imagem no espelho.
"Pesquisas mostram que 92% das mulheres est�o insatisfeitas com o corpo. N�s que estamos erradas ou � o mundo que ensinou assim?", questiona Mariana Cyrne, 30, embaixadora do BIM no Brasil.
No ano passado, ela e quatro amigas criaram o blog Garotas FDP (Fora do Padr�o) para falar de moda e visibilidade "plus size". O come�o, por�m, foi desafiador.
O maior receio era tirar fotos que mostrassem o corpo todo ao mostrar as roupas.
"Descobrimos que pod�amos tirar foto de corpo inteiro, e que gost�vamos do que v�amos", diz ela, para quem � preciso incentivar as mulheres a olhar para si mesmas.
"Estamos t�o acostumados a ver na m�dia um corpo sarado ou pessoas supermagras que n�o conseguimos olhar direito no espelho. Precisamos olhar mais, at� para nos acostumarmos a ver um corpo diferente do que vemos o tempo todo", diz.
Essa mudan�a no olhar tem sido o mote da jornalista Mirian Bottan, 30. Ela lutou 15 anos contra a bulimia desenvolveu ortorexia (obsess�o pela alimenta��o saud�vel). "Minha vida girava em torno de construir aquele corpo perfeito. Percebi que era a mesma obsess�o, s� havia mudado a ferramenta de controlem a alimenta��o."
Agora, em vez da tradicional foto de "antes e depois" com quilos a mais e a menos, faz desde janeiro o contr�rio: do corpo antes tido como "ideal" (mas desnutrido), passou ao "real" -valendo at� o que chama "tremid�o nervoso [da barriga] contra baixo astral".
Hoje, soma mais de 200 mil seguidores. "Essa procura me mostrou que � uma discuss�o que estava fazendo falta."
DAN�A
Desde que passou a integrar o time da cantora Anitta, a bailarina Tha�s Carla, 25, tem sido apontada como exemplo de representatividade de mulheres gordas –que em geral eram deixadas de fora dos palcos.
"� bom para as pessoas enxergarem o outro lado. As pessoas confiam muito na est�tica, acham que tem que ser magrinha e 'modelete' para fazer as coisas", afirma.
"Aceito meu corpo e gosto de mim. N�o estou aqui para vender gordura ou meu corpo. Estou para vender o meu conceito. Voc� vai transparecer o que as pessoas querem ou o que voc� quer?".
Para Joana Novaes, coordenadora do n�cleo de doen�as da beleza da PUC-Rio e autora do livro "Com que corpo eu vou?", movimentos como o "body positive" surgem como resist�ncia diante de uma sociedade lipof�bica (com avers�o � gordura).
"� cada vez mais dif�cil achar algu�m plenamente satisfeito com o pr�prio corpo", diz a psicanalista, para quem a sociedade ainda imp�e o corpo como instrumento de segrega��o de classe.
"Em momentos hist�ricos onde a comida n�o era uma facilidade, o corpo gordo era o ideal", explica.
Ao mesmo tempo em que cresce a discuss�o, quem ousa quebrar os padr�es tamb�m ouve cr�ticas. A principal � a de "apologia da obesidade". Para quem lida com o tema, por�m, n�o se trata de conformismo –mas, sim, de ter mais foco em sa�de do que na est�tica (em alguns casos, um escudo pr�prio contra o preconceito).
CUIDADOS
"N�o � comer x-bacon como se n�o houvesse amanh�. N�o � um movimento de neglig�ncia ou autoabandono. � buscar a sa�de de uma maneira que seja compat�vel com a sua vida, e isso envolve alimenta��o equilibrada e atividades f�sicas", diz a nutricionista comportamental Paola Altheia, autora do site N�o Sou Exposi��o, no qual questiona dietas da moda e aborda os riscos da busca por padr�es.
Para a endocrinologista Cintia Cercato, movimentos de aceita��o do corpo podem trazer benef�cios, desde que vinculados a essa ideia de cuidados e com alerta para os riscos da obesidade.
"N�o falamos em tratar obesidade para ficar magro. Reduzir 10% do peso, em geral, j� traz impacto positivo na sa�de", afirma. "Quando falamos que � preciso que as pessoas se cuidem, de forma alguma queremos acusar. Entendemos que a obesidade � uma doen�a complexa e a pessoa n�o � obesa porque quer."
Segundo Altheia, a press�o excessiva por emagrecer pode levar a transtornos.
"Lido com pessoas que adoecem por tentar chegar a um padr�o. Estamos tendo um 'boom' de doen�as alimentares", afirma. "Modifica��es externas n�o resolvem problemas internos. N�o � mudando o peso que vai se aceitar."
Tamb�m n�o � de uma hora para outra que a aceita��o ocorre. Para muitas, nem � preciso, de fato, amar seu corpo: apenas n�o odi�-lo j� � um bom caminho.
Na adolesc�ncia, numa tentativa de emagrecer, Vanessa Campos, 38, perdeu peso t�o rapidamente que chegou a ser diagnosticada com princ�pio de anorexia.
Passou por dietas e pelo efeito rebote da maioria delas. Nos �ltimos anos, mudou sua rela��o com a comida. Hoje, reveza o trabalho e atividades como ioga, caminhada e pole dance com o BlogueiraFail, onde escreve sobre moda "plus size" e amor-pr�prio.
"Fui entendendo que a mudan�a n�o era corporal, mas de comportamento", afirma ela, para quem o processo visa primeiro a sa�de mental, e depois a do corpo. "Hoje, vejo meu corpo como o mapa das minhas escolhas."
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