Se no passado o lema “no pain, no gain” era usado para insinuar que não existem resultados sem sofrimento no universo dos exercícios, nos últimos tempos esse conceito caiu em desuso. Graças a um movimento do setor que prega um olhar mais gentil e de longo prazo para o exercício físico, a recuperação do corpo, etapa que sempre foi muito negligenciada, principalmente pelos esportistas amadores, ganha cada vez mais relevância, interesse e papel cativo na rotina de treinos.
“Descansar e dar tempo para que o seu corpo se recupere é importante não apenas para evitar lesões, mas para melhorar a própria performance. Entre os esportistas profissionais, as práticas de recovery já são conhecidas. Porém, vivemos um boom de interesse pelo esporte, e os atletas entusiastas têm se dedicado mais às modalidades. Praticam musculação, mas também corrida, natação, tênis. A maior intensidade traz consciência sobre a necessidade de o organismo fazer seus reparos”, explica a coordenadora do Grupo Médico Assistencial da Medicina do Esporte do Hospital Israelita Albert Einstein, Karina Hatano.
Com o aumento da demanda, um mercado se formou em torno da tendência. Técnicas, tratamentos e ferramentas que visam encurtar o tempo de descanso necessário entre uma prática e outra e eliminar mais rápido incômodos e fadigas gerados pelo exercício se popularizam, como as botas de compressão, as máquinas de crioterapia, as saunas infravermelhas e os banhos de gelo.
A tríade básica que forma a recuperação ideal após a atividade física, diz a médica, envolve alimentação saudável, descanso estratégico e sono de qualidade. “A dieta precisa ser balanceada para repor a energia que foi perdida e recompor os músculos. O descanso pode ser feito de maneira ativa – com atividades de baixa intensidade, como uma caminhada leve, movimentos de alongamento ou mobilidade (que contribuem para a circulação e para eliminar subprodutos e toxinas produzidas pelo exercício) – ou passiva, que significa repouso. O sono é essencial para a secreção dos hormônios que auxiliam no reparo muscular, no processo de síntese proteica (responsável pelo ganho de massa) e no relaxamento.”
Inaugurado em São Paulo em 2023, o The Corner Sports & Health oferece um plano 360° aos alunos. Além da academia e quadras de beach tennis e pickleball, os associados podem fazer uma sessão semanal do protocolo de recovery, que inclui o uso da bota de compressão e uma massagem desportiva. “A manipulação manual ajuda a soltar os pontos de tensão, e a bota pneumática auxilia na circulação sanguínea, aliviando o acúmulo de substâncias inflamatórias geradas pelo esforço elevado. É indicado fazer o duo logo após o treinamento para um resultado mais eficiente”, fala a fisioterapeuta do espaço, Thaís Dutra. O centro de medicina integrada Awake Health também recebe interessados em melhorar a recuperação. Entre as técnicas mais populares, está a câmara de crioterapia. “A máquina segue o mesmo conceito das banheiras de gelo. Porém, pode ser mais prática e agradável. Em aproximadamente três minutos, ela envolve o corpo com nitrogênio e chega gradativamente até quase -190 °C. A exposição à baixa temperatura reduz a inflamação, alivia a dor muscular, acelera a recuperação e influencia positivamente no desempenho físico dos próximos dias”, diz a médica responsável pelo setor de medicina esportiva na clínica, Raquel Marques.
Corredora amadora, a influenciadora carioca Nathalia Medeiros entrou para uma assessoria de corrida quando decidiu fazer a sua primeira meia maratona um ano atrás. Com o acompanhamento profissional, entendeu mais sobre a importância da recuperação. “Faço semanalmente a bota de compressão, a massagem desportiva (com o auxílio de pistolas massageadoras, ventosas ou as mãos) e a banheira de gelo. Quando faço um treino longo, de 15 quilômetros, por exemplo, a ajuda dessas ferramentas fica evidente. Não acordo cheia de dor no dia seguinte. Antigamente, quando não me atentava a isso, eu me sentia quebrada após a corrida”, conta ela, que frequenta a clínica Map.Go, em Ipanema. O espaço oferece também botas que unem compressão e crioterapia, quiropraxia, bandagens funcionais, tecnologia de eletroestimulação e laser para tratamento de lesões.
Mas não é só aliviar o estresse físico que conta para uma boa recuperação. Cuidar do mental também é importante, lembra o médico Rodrigo Duprat, sócio da La Prat Bioevolution & Spa, em São Paulo. “Muitos atletas, mesmo amadores, quando treinam para uma competição ou durante a própria prova, sentem que a fadiga que impacta a performance ou leva à desistência acontece, muitas vezes, mais quando influenciada pela mente do que pelo próprio corpo. Incluir técnicas para controlar esses fatores estressantes pode ajudar. Na clínica, muitos esportistas procuram a cápsula meditativa, onde são expostos a ondas sonoras binaurais para relaxar.”
Apesar de novidades pipocando no mercado, Karina Hatano lembra que ainda faltam evidências para que os benefícios de parte desses métodos sejam comprovados pela ciência, e completa: “É importante lembrar que essas ferramentas não substituem uma nutrição correta ou uma noite bem dormida, mas funcionam como complementos para uma recuperação eficiente”, finaliza.