Renda Variável

Por Naiara Bertão, Valor Investe — São Paulo

Num grupo de amigos sempre tem aqueles coleguinhas mais matemáticos, que pensam em números e cálculos antes de tomar uma decisão. E a turma dos que refletem, refletem, refletem até a cabeça fundir para escolher o prato no restaurante, não é mesmo? Bom, no mercado financeiro também é assim.

Tem a turma que faz uma grande e sofisticada análise de uma empresa, passando horas olhando seus resultados financeiros, conversando com os gestores, fazendo cálculos de quanto a empresa vale para só depois decidir se vale ou não comprar suas ações. Esses são os chamados fundamentalistas. O nome não tem a ver radicalismos religiosos, mas se deve ao fato de a análise se basear, teoricamente, nos fundamentos das empresas - ou seja, seu desempenho operacional e financeiro ao longo do tempo.

Mas também tem o pessoal que acredita em padrão de comportamento de preços — os técnicos ou grafistas —, que ficam o dia todo olhando gráficos que sobem e descem nas telas de negociação e tentando traçar tendência de preço para as ações.

Ambas as turmas têm o mesmo objetivo. Se baseiam em suas metodologias para desenhar uma estratégia vencedora de investimentos. Em geral, esses profissionais trabalham para bancos e corretoras ou para empresas que fazem análise e recomendação de investimentos.

É importante você saber a diferença entre as duas estratégias para entender qual faz mais sentido para você. Vou te explicar nos próximos parágrafos. Vem comigo!

Diferença entre análise técnica e fundamentalista

Uma das grandes diferenças entre essas duas vertentes é o tempo em que montam e desmontam uma estratégia. Um grafista, por exemplo, está, em grande parte do tempo, preocupado em dar retornos no curto prazo, alguns até no mesmo dia, os chamados “day traders” (pensar em casamento deve ser bem difícil para esses analistas!) É claro que é difícil generalizar. Tem analista e investidor técnico que demora alguns dias ou semanas para comprar e vender ações que acredita que vão render bons frutos, a depender do padrão do gráfico. Outros não dormem com o papel na carteira de jeito nenhum (esses sim são os solteiros convictos!!!).

Brincadeiras à parte, isso é importante porque é justamente o que os colegas fundamentalistas não fazem. Eles gostam de paquerar, namorar, noivar, sentir uma pressãozinha da família e só depois casar. Enrolam um, dois, seis meses e até mais de um ano analisando uma companhia antes de investir. Precisam estar confiantes de que o preço está num bom patamar e que os fundamentos da empresa vão valorizá-la no futuro.

Em custos, os grafistas gastam mais em taxas de corretagem e softwares e os fundamentalistas em sola de sapato e muitas horas debruçados nos números das companhias. As grandes corretoras e bancos, em geral, tem gente das duas escolas trabalhando pra eles.

Já tem um cheiro de qual é mais sua cara? Entenda um tiquinho mais sobre eles.

Gráficos – os solteiros de plantão

Os “day traders” trabalham vendendo e comprando ações no mesmo dia para tentar bater uma meta diária de rendimento. Lembra o motorista de Uber, né? Cada dia é um dia. Mas, ao invés de tentar prever qual região da cidade está bombando mais e pagando o preço dinâmico, os grafistas examinam traçados, linhas de suporte e resistência, pivôs e stop loss. Parece coisa de professor de geometria? E é um pouco.

Essas são as figuras gráficas, os instrumentos de trabalho dos grafistas. Na prática, os gráficos observam padrões de comportamento passado dos ativos ao longo de um tempo para prever movimentos futuros, já que, segundo esses profissionais, historicamente os movimentos se repetem. Como o mercado é bem dinâmico ao longo do dia, alguns grafistas vivem só disso. A estratégia também pode ser automatizada por robôs, que já agilizam a execução das ordens de compra e venda.

Um exemplo simplificado para você entender. Se, historicamente, as ações da Petrobras sobem após cair três dias seguidos, os grafistas vão ficar de olho quando os papéis se desvalorizarem. Se no terceiro dia cair mesmo, eles vão comprar os papéis, já que esperam que vão se valorizar no dia seguinte. Além de ações, muitos grafistas hoje têm operado contratos de dólares.

O volume de negociação também é importante para usar a estratégia gráfica. É mais fácil negociar com ações mais líquidas, ou seja, que são mais negociadas diariamente. “Não recomendo operar com as penny stocks (ações que estão valendo menos que R$ 1 o papel) porque qualquer mudança no preço tem uma variação percentual muito grande e não dá para entender quais os riscos envolvidos”, comenta o analista gráfico da corretora Genial Investimentos, Igor Graminhani, que trabalha na área há dez anos.

Outra característica muito própria da análise técnica é que a estratégia de investimento nada tem a ver com o fato de a empresa estar indo bem ou mal, de ter gente apostando que vai crescer e dar mais lucro aos acionistas.

“Independentemente da economia, sempre vai ter um papel que dá pra comprar ou vender e ganhar dinheiro com isso”, comenta Graminhani.

ATENÇÃO: O próprio analista da da Genial, especialista na área, alerta que, para quem não conhece como a bolsa de valores funciona ou não tem tempo para aprender e acompanhar, nem que seja um pouco por dia, é difícil já sair tentando lucrar com análise gráfica. “Análise técnica é mais agressiva, mais arriscada. Apesar de poder dar mais retorno no curto prazo, o risco de perder o dinheiro também é grande”, diz o analista.

Um dos principais erros de iniciantes é apostar tudo em um só ativo ou colocar a maior parte de suas economias neste tipo de operação. “Dinheiro da análise gráfica é aquele que, se perder, não vai ser tão problemático, por isso deve ser uma parcela pequena do investimento”, alerta Graminhani.

Fundamentalistas - a turma dos casamenteiros

O nome já entrega. A turma acima é bem mais tradicional, conservadora e não vai na onda do mercado. O que eles gostam mesmo é de pesquisar, pensar, pesquisar, pensar, pesquisar e depois de “tripensar”, decidir se investem ou não. Enquanto um analista técnico começa estudando um papel a partir de gráficos, um analista fundamentalista vai direto para as demonstrações financeiras.

“Nós olhamos os fundamentos da empresa, se ela tem um plano para o futuro, se sabe para onde quer ir, se os executivos estão alinhados, se são competentes para gerir a empresa e se ela tem vantagens competitivas. São esses fatores que vão definir sucesso e insucesso dela no longo prazo”, explica Marcelo Audi, sócio da gestora de recursos Cardinal Partners. Ele conta que, na gestora dele, já foram mapeadas dezenas de empresas, mas por enquanto foram poucas as que receberam investimentos.

A rotina é bem regradinha. Por pelo menos um mês (às vezes levam vários meses), os analistas fundamentalistas passam a empresa em uma espécie de máquina de raio-X. Olham todos os resultados da companhia, o balanço patrimonial, demonstração de fluxo de caixa, ouvem os diretores, participam de eventos e acompanham todas as notícias sobre ela, seu mercado e concorrentes. Ou seja, praticamente um MBA sobre ela.

Fazem tudo isso para chegar a duas conclusões: se as ações têm potencial de se valorizar no futuro e qual o valor justo da empresa. Ou seja, considerando todos os números e perspectivas, quanto as ações deveriam valer. Esse “valor justo” vai ser a base para eles decidirem se é hora de comprar.

Se esses papéis estiverem sendo negociados na bolsa abaixo desse preço justo, normalmente com uma margem de segurança, a recomendação é para comprá-los. Num exemplo hipotético, se o "valor justo" calculado é de R$ 15 por ação e a cotação na bolsa é de R$ 10 por papel, vale a compra. Se estiverem acima ou no valor exato, os analistas monitoram para esperar os papéis caírem e só depois comprar. “Não entramos em euforia e modismos porque são períodos em que os preços ficam inflados”, comenta Marcelo, da Cardinal.

Obviamente, como muitos investidores estão fazendo as mesmas contas, e tentando encontrar distorções de preços entre o valor das empresas e o preço de negociação do papel, a tarefa de encontrar barganhar na bolsa não é fácil. Além disso, o analista pode estar convicto de que determinada empresa está barata na bolsa em comparação com os fundamentos. Mas o resto do mercado — ou seja, os outros investidores — pode demorar a perceber isso, o que significa que o retorno esperado no momento da compra pode demorar para se concretizar (ou até mesmo não vir).

Por isso, os fundos que seguem a visão fundamentalista podem chegar a ficar por anos com o ativo na carteira, esperando a empresa desabrochar.

Uma nova gestão na empresa investida, por exemplo, nem sempre pode implementar mudanças radicais da noite para o dia e é preciso tempo para criar novos produtos, campanhas de marketing, cadeia de suprimentos, fazer uma reestruturação ou entrar em um novo mercado. E, claro, mesmo planos e estratégias de negócios promissoras podem não dar certo e, por isso, os investidores que seguem a cartilha fundamentalista acompanham de perto as empresas que investem, e devem estar prontos para mudar de opinião quando os fundamentos também mudam.

Agora que você entendeu a diferença entre análise técnica e fundamentalista, já pode escolher a sua turma.

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