Prematuros
 


A pequena Ester Vitória Rinaldo Gonçalves, 3 meses, de São Paulo, teve um começo de vida difícil. A menina chegou ao mundo antes da hora, com apenas 27 semanas e pesando somente 510 gramas. "Quando eu a vi pela primeira vez, ela era muito pequena, cabia na palma da mão. Pensei: 'Só por misericórdia, não tem como um bebê desse tamanhozinho viver'. Foi muito impactante", diz a mãe, Aline Rinaldo Saloní, 41, professora de psicanálise, em entrevista exclusiva à CRESCER.

Nos primeiros dias de vida, Ester cabia na palma da mão — Foto: Arquivo pessoal
Nos primeiros dias de vida, Ester cabia na palma da mão — Foto: Arquivo pessoal

A gravidez foi uma surpresa para ela. "Em 2022, eu tinha perdido um bebê. No ano passado, eu perdi meu pai e o neném era para nascer no dia em que o meu pai faleceu, em 17 de junho", lembra. Foi um momento muito delicado, por isso, ela e o marido tinham desistido de ter outro filho. "Mas, depois de dois meses, eu descobri que estava grávida de novo. Quando eu descobri a gravidez, eu tive que sair desse luto e focar só na neném, eu não queria passar esse sentimento, essa dor emocional para ela", diz. "Claro que uma pessoa não substitui a outra, mas eu sinto que ela veio num momento para me tirar dessa dor", acrescenta.

Restrição de crescimento

Os primeiros meses foram tensos para Aline, pois ela tinha medo de perder o bebê novamente. "Eu não via a hora de chegar o segundo trimestre, porque eu pensava que finalmente ia conseguir curtir a gravidez, fazer o enxoval e o chá revelação", afirma. Infelizmente, durante um ultrassom na 17ª semana da gestação, ela recebeu uma notícia preocupante. "A médica disse que a conta estava errada, que o bebê estava com 15 semanas. Eu achei muito estranho porque tinha o primeiro ultrassom com seis semanas. Mas ela disse que era melhor investigar e pediu para eu repetir o ultrassom em 15 dias", recorda a mãe.

Ela aguardou e repetiu o exame em laboratórios diferentes. "Em todos os lugares sempre dava esse atraso de duas semanas, até que começou a dar um atraso de três semanas. Os médicos disseram que a bebê estava pesando menos do que o esperado e dava alteração no fêmur como se estivesse mais curto", diz. "Eu achava que seria o momento que eu finalmente poderia relaxar e foi o momento de maior apreensão. Eu tinha muito medo", desabafa.

Os médicos levantaram a hipótese de que o bebê tinha restrição do crescimento, uma condição que atinge até 15% das gestações, segundo dados publicados pela Escola Superior de Ciências da Saúde, de Brasília, em conjunto com a Faculdade de Medicina de Botucatu/Unesp. O termo é usado para classificar bebês que, por alguma razão, não atingiram o tamanho esperado para a idade gestacional em que se encontram. Mas, os médicos de Aline ainda não sabiam ainda o que estava provocando isso.

Insuficiência placentária

No início desse ano, ela saiu da cidade onde morava, Americana (SP), e se consultou com um médico na capital paulista para ter uma outra opinião. "Eu estava com 23 semanas e ele disse que precisava ter um parto de 32 a 34 semanas, porque a bebê ainda estava muito pequena, era incompatível com a vida. Mas que era para eu me preparar que ela podia não guentar todo esse tempo e entrar em óbito fetal. Eu sai da consulta arrasada. Eu estava esperando uma resposta diferente", lamenta.

Ela voltou para casa, no entanto, pouco depois, surgiram sintomas preocupantes. "Durante a gravidez eu tive infecções urinárias e, no dia 17 de janeiro, ela se manifestou de novo, só que eu comecei a tremer. Eu tremia absurdamente, achava que estava convulsionando. Eu senti que alguma coisa estava acontecendo, até pensei se o bebê tinha morrido", recorda.

Aline decidiu que precisava ir ao hospital, mas com tantas preocupações e o mal-estar, não conseguia dirigir. "Era 6 horas da manhã, meu marido tinha acabado de sair para trabalhar. Então, eu sai na rua enrolada num cobertor e comecei a bater nas casas dos vizinhos para ver se alguém me ajudava, mas aí ninguém saiu para fora. Aí, eu fiquei na calçada, sentada e chorando, até que passou um carro e fiz um sinal para ele, ele parou e me levou para o hospital", conta.

Chegando lá, ela foi confirmado que ela estava com uma febre alta deivdo à infecção urinária e, no mesmo dia, ela foi transferida para um hospital particular em São Paulo. Ela recebeu antibióticos e, no dia seguinte, foi atendida por uma especialista em medicina fetal, que finalmente conseguiu explicar a causa da restrição do crescimento: Aline sofria com insuficiência placentária.

"Insuficiência placentária ocorre quando a placenta não exerce de forma adequada o papel de suprimento de nutrientes para o feto e isso leva, consequentemente, à restrição de crescimento do feto - muitas vezes, pode ser acompanhada de alteração de fluxo no cordão umbilical (artéria umbilical)", explica Mariana Azevedo, coordenadora de Medicina Fetal no Hospital Sepaco. Infelizmente, não há tratamento para essa condição. "Quando há alteração grave do bem-estar fetal, indicamos o parto prematuro", diz.

'O parto foi muito emocionante'

Ester com uma semana de vida — Foto: Arquivo pessoal
Ester com uma semana de vida — Foto: Arquivo pessoal

Com este diagnóstico, Aline precisou ser internada, quando estava com 25 semanas gestacionais. Ela precisou fazer ultrassons todos os dias para identificar qualquer sinal de que a bebê estava com falta de oxigênio ou que estava em sofrimento. Quanto mais tempo ela conseguisse ficar na barriga, melhor, mas eles precisavam saber o momento certo de fazer o parto.

O plano era chegar até pelo menos 32 semanas, mas ela levou a gravidez um passo de cada vez. "Eu pensava: 'Ganhamos mais um dia'. Eu consegui segurá-la por mais duas semanas, porque teve um momento que um ducto da placenta ficou afetado. Então, começou a faltar oxigênio para ela. A médica disse que a Ester já estava bem ativa na barriga, fazia a sucção de treinamento e estava bem perto dos 500 gramas. Ela achou melhor fazer a cesárea antes que ela ficasse sem oxigênio", explica.

Aline estava com 27 semanas de gestação, o que significaria que a filha seria uma prematura extrema - nascida antes das 28 semanas gestacionais. Mas, os médicos disseram que era o melhor a se fazer. Assim, em 4 de fevereiro, Ester nasceu, pesando 510 gramas. "Foi um momento muito emocionante. Eu já tinha sido avisada que a chance dela chorar no nascimento era muito baixa, mas que não era para eu me assustar, porque eles iam tentar socorrê-la. Mas, ela nasceu chorando", comemora a mãe.

"Os médicos tentaram intubá-la, mas ela começou a se debater e eles tiraram o tubo", recorda. Para a surpresa de todos, a bebê estava conseguindo respirar e estava com alta saturação. Ester nem precisou ser intubada - procedimento comum em casos de prematuros extremos. A pequena foi colocada em um aparelho de suporte de respiração (CPAP), que não é invasivo, e internada na UTI.

'Em alguns momentos, parece que estou num campo guerra'

"Os primeiros dias da UTI são assustadores. Eu chorava por tudo, era um emocional muito à flor da pele. Quando eu a vi pela primeira vez ela era muito pequena, ela cabia palma da mão. Eu pensei: 'Só por misericórdia, não tem como um bebê desse tamanhozinho viver'. Foi muito impactante", lembra Aline. "A cada exame a gente ficava na maior tensão, morrendo de medo dos resultados", acrescenta.

A vida de UTI não é nem um pouco fácil. "Às vezes eu sinto que eu estou dentro de um filme. Alguns dias são mais difíceis que outros. Em alguns momentos, parece que estou num campo de guerra, com o barulho da UTI, meu coração fica acelerado. Mas eu tento o tempo todo me acalmar e me lembrar que independentemente de como ela esteja agora, ela vai ficar bem logo. Fico sempre trabalhando isso", destaca.

Comemoração de um mês de vida de Ester — Foto: Arquivo pessoal
Comemoração de um mês de vida de Ester — Foto: Arquivo pessoal

'As médicas disseram que ela precisa ser estudada'

Para que pudesse ficar sob suporte ventilatório não invasivo, Ester recebeu medicação para amadurecer o pulmão e foi acompanhada por uma equipe de fisioterapia, enfermagem e médicos. Ela contraiu vírus hospitalares algumas vezes, o que é comum para prematuros principalmente por terem um sistema imune muito imaturo, mas ela se recuperou todas as vezes rapidamente.

O maior desafio foi em relação ao ganho de peso. Ela nasceu com extremo baixo peso e, nos primeiros dias, o peso dela baixou para 480 gramas. Mas já era algo esperado. "Todo recém-nascido pode perder peso na primeira semana após o nascimento, geralmente cerca de 10% do peso. Isso porque perdem um pouco de líquido após o nascimento, desinchando; e o metabolismo muda de fetal para neonatal, exigindo mais energia para manter as necessidades vitais, diferente da vida intraútero. Também ocorre uma adaptação gradual à aceitação do leite, levando alguns dias para que a alimentação efetiva seja estabelecida", explica a pediatra neonatologista Renata Castro, Coordenadora Médica Assistencial da UTI Neonatal do Hospital Sepaco, que acompanha os cuidados de Ester.

O problema era que o peso dela não conseguia evoluir, ela vivia ganhando e perdendo peso, permanecendo na casa dos 500 gramas durante todo o primeiro mês. "A recuperação nutricional da Ester foi lenta, ela apresentou dificuldade na progressão do volume de leite", diz Renata Castro. Até que eles perceberam que ela sofria com refluxo gastroesofágico, isto é, quando o alimento volta do estômago para o esôfago, causando a regurgitação. Assim, Ester passou a fazer um tratamento e começou a ganhar mais peso. "Ela também está com uma suspeita de alergia a proteína do leite de vaca, sendo acompanhada de perto pela equipe médica e de nutrição", adiciona a pediatra.

Agora, a pequena já está com 1,690 kg. "Ela tem que chegar em 1,800 kg para colocar a roupinha pela primeira vez e para sair da incubadora e ir para o bercinho. Com 2 kg, ela já pode sair da da UTI", diz Aline. "Ela já está conseguindo respirar sozinha em ar ambiente", comemora.

Ester também começou o treinamento da mamada com uma fonoaudióloga. "Isso é uma grande dificuldade dos prematuros, porque eles não não conseguem associar direito a respiração junto com a deglutição e e com as paradas. Hoje ela consegue tomar 10 ml de fórmula na mamadeira e recebe o resto por sonda", afirma a mãe. Aline também está estimulando a produção de leite que, devido ao estresse tem sido muito baixa, para poder oferecer o seu leite materno para a filha.

A menina ainda deve ficar internada no hospital por pelo menos um mês, mas ela segue ganhando peso e evoluindo a cada dia. "As médicas disseram que ela precisa ser estudada, porque ela é a menor bebê que esteve lá nesse período que esteve internada e que não precisou intubar. Ela também se recuperou super rápido de todas as intercorrências", comemora.

Ester está ganhando peso e se desenvolvendo — Foto: Arquivo pessoal
Ester está ganhando peso e se desenvolvendo — Foto: Arquivo pessoal

'Ficamos direto no hospital, é estranho quando eu volto para casa'

Hoje, a rotina de Aline é voltada para os cuidados da filha e a UTI neonatal se tornou sua segunda casa. "Ficamos direto no hospital, estamos lá todos os dias. A gente chega às 9 horas da manhã e fica lá até às 2 horas da manhã. Tem uma salinha que é para os pais e tem chuveiro. Então, tomamos banho, nos reunimos com pais para o café da manhã, para o café da tarde, oramos juntos... Já estamos acostumados. É estranho quando eu volto para casa", conta.

Eles já fizeram várias comemorações de mesversários de Ester dentro do hospital. No Dia das Mães, Aline precisou se dividir entre a bebê e as suas outras duas filhas, Ashley, 20, e Ana Lauren, 17, e sua neta, Heloísa, 3. "Fui tomar café da manhã com elas em Laranjal Paulista [cidade onde elas moram] e passei a tarde com a Ester em São Paulo. Fiquei com ela no colo o tempo inteiro e ficamos conversando. Foi um dia das mães totalmente diferente do que eu estou acostumada, mas foi gratificante. Mesmo com o cansaço, é uma alegria estar com ela", diz.

Mesversário de três meses da Ester — Foto: Arquivo pessoal
Mesversário de três meses da Ester — Foto: Arquivo pessoal

Com a melhora de Ester, a mãe já está se preparando para recebê-la em casa. "O chá de bebê e o enxoval dela seriam em fevereiro, mas ela nasceu em fevereiro, como tudo foi antecipado, não conseguimos comprar nada. Agora estamos indo atrás de tudo para arrumar o quarto dela. Está sendo uma achar roupa do tamanho dela por ser uma prematura extrema. Estou esperando ela ganhar uns quilinhos para vermos o que fazemos", afirma Aline.

Sobre insuficiência placentária

A insuficiência placentária ocorre primariamente por uma invasão inadequada das artérias uterinas pela placenta, pois é através disso que a placenta consegue crescer de forma adequada e propiciar todos os nutrientes necessários para o bebê. "Não sabemos até hoje porque algumas pacientes desenvolvem insuficiência placentária e outras não; mas já sabemos rastrear pré-eclampsia e restrição de crescimento fetal pela avaliação do primeiro trimestre, que podem ser sinais da condição", explica Mariana Azevedo.

Um dos principais riscos é a necessidade de realizar um parto prematuro, que é decidido por critérios bem estabelecidos em casos de alteração grave do bem-estar fetal. "Em casos muito graves, infelizmente, pode ocorrer óbito fetal, quando ainda não temos possibilidade de oferecer os cuidados pós-natais, seja por ser uma idade gestacional ainda muito precoce ou por um peso tão baixo que é impossível o cuidado pós-natal", diz.

Quem já teve a condição tem chance de ter novamente em uma futura gestação. "Toda paciente que teve insuficiência placentária grave tem um risco de 20 a 30% de recorrência. É necessário avaliação com obstetra para investigar trombofilia adquiridas [alteração na capacidade de coagulação sanguínea que está associada à condição]", afirma. "Infelizmente, ainda não há um tratamento comprovado para insuficiência placentária grave quando ela já está estabelecida. Mas é possível tratar pré-eclâmpsia e trombofilia", diz. Por isso, é fundamental um bom acompanhamento no pré-natal.

Mais recente Próxima "Eu já tinha perdido meu primeiro filho, agora meu segundo estava lutando pela vida dele"
Mais de Crescer

A mais nova das seis irmãs tem 88 anos e a mais velha, 101. Juntas, elas somam mais de 570 anos!

Recorde mundial: juntas, irmãs somam mais de 570 anos de idade

Ela postou a foto do produto e divertiu a web. ““Achei que fosse o rosto de um demônio”, comentou uma pessoa

Mulher encomenda bolo de aniversário da Hello Kitty e recebe “demônio”

A chamada "chupeta virtual", segundo os pesquisadores, impede que as crianças aprendam a controlar suas emoções, gerando ainda mais raiva: “Eles precisam da ajuda dos pais durante esse processo de aprendizagem, não da ajuda de um dispositivo digital”, disse a autora principal do estudo

Eletrônicos não devem ser usados para acalmar birras, alertam cientistas. Entenda

"Ajudar alguém a criar a família dos seus sonhos não tem preço", disse a mãe de dois norte-americana Lauren Brown, 36 anos. Ela e a esposa tiveram seus dois filhos com esperma de doadores e agora estão "retribuindo" a ajuda que receberam

Mãe que engravidou com esperma de doador, se torna barriga de aluguel de casal gay

A mãe disse que levou um susto quando a cratera misteriosa surgiu em seu jardim. Felizmente, ela conseguiu pegar o filho antes que ele caísse — "Um novo medo desbloqueado", disse ela

Buraco misterioso de 3 metros surge em jardim e bebê quase é "engolido"

Em uma imagem logo após o parto, o bebê está com a cabeça bem pontuda e, 24 horas depois, ela volta ao normal. Entenda por que e como isso acontece!

Cabeça de recém-nascido muda de formato e impressiona web

Consultamos os seguidores da CRESCER para saber quais gírias e expressões já causaram dúvida nas conversas do dia a dia com os filhos; confira os significados

Descubra o significado de sigma, tilt, mewing e outras palavras que bombam entre os pré-adolescentes!

O pequeno ficou dentro do veículo o dia todo e não resistiu. A mãe só percebeu quando viu uma chamada perdida da babá, na hora de sair do trabalho

“Corpo do meu bebê sem vida me assombra e nunca vou me perdoar”, diz mãe que perdeu o filho depois de esquecê-lo no carro

Mulher foi chamada de heroína depois de brigar com um homem que tentava roubar o carro, em que ela estava com seu neto

Avó dá soco em homem para proteger o neto

A mulher precisou tomar a difícil decisão de desligar os aparelhos que mantinham as crianças vivas

Arrasada, mãe faz alerta após perder os dois filhos, enquanto brincavam de “Marco Polo” na piscina