Saúde
 

Por Nathan Fernandes


O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), sancionou, nesta terça-feira (31), a Lei 17.618/2023, que garante o fornecimento de produtos à base de cannabis no SUS do estado. A sanção ocorreu após a Assembleia Legislativa ter aprovado a proposta, em dezembro de 2022.

"Esta lei garante que São Paulo esteja na vanguarda desse assunto aqui no Brasil. É uma grande vitória, principalmente para as famílias com pessoas que precisam da cannabis medicinal: autistas; com síndromes raras; idosos com Parkinson, epilepsia, Alzheimer; entre outras", comentou o deputado estadual Caio França (PSB), autor do projeto na Alesp. Os parlamentares Erica Malunguinho (PSOL), Patrícia Gama (PSDB), Marina Helou (Rede), Sergio Victor (Novo), Adalberto Freitas (PSDB), Isa Penna (PCdoB), e Monica da Mandata Ativista (PSOL) são coautores da proposta.

O CBD não é o único derivado da maconha, apesar de ser o mais usado. Atualmente, os cientistas conhecem, pelo menos, entre 60 e 80 canabinoides — Foto: Getty Images
O CBD não é o único derivado da maconha, apesar de ser o mais usado. Atualmente, os cientistas conhecem, pelo menos, entre 60 e 80 canabinoides — Foto: Getty Images

A nova legislação estabelece que a rede estadual pública de Saúde e a rede privada conveniada ao SUS fornecerão, de forma gratuita, medicamentos com canabidiol (CBD) e tetrahidrocanabinol (THC) — dois derivados da Cannabis — para pacientes com prescrição médica.

De acordo com o documento, a distribuição ocorrerá em situações excepcionais indicadas pela medicina. Os produtos poderão ser nacionais ou importados e precisarão estar em conformidade com as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Evidências reforçam benefícios do uso da cannabis

A proibição da cannabis sativa no Brasil, também conhecida como maconha, não é capaz de conter as evidências dos benefícios medicinais da planta, os quais incluem melhoras nos sintomas de depressão, dor crônica, dor oncológica, esclerose múltipla, Parkinson e Alzheimer.

O pesquisador e professor brasileiro Alysson Muotri, da Faculdade de Medicina da Universidade da Califórnia, por exemplo, começou a estudar o CBD – ou canabidiol, um dos derivados extraídos da maconha – depois de ouvir relatos de famílias com filhos com transtorno do espectro autista (TEA) que utilizavam o óleo para bloquear a epilepsia, melhorando quadros de autismo. “Os resultados preliminares mostraram que existe possivelmente um benefício no autista severo em relação a autoagressões com o CBD purificado (sem THC, substância psicoativa da maconha) e em doses altas.”

Esses resultados devem ir ao encontro das observações já feitas pela farmacêutica clínica carioca Bruna Fernanda Dias, 39, mãe de três crianças diagnosticadas com autismo severo: Mateus, 13, Rebeca, 7, e Isaque, 5. Ela lembra que, antes do uso do óleo de cannabis, as crianças não falavam, davam cabeçadas na parede e arrancavam os cabelos com as mãos. Em 2020, a farmacêutica se tornou a primeira pessoa no Brasil a conseguir um habeas corpus, sem a presença de um advogado, para manter o cultivo de maconha em casa. Como farmacêutica, fez diversas pesquisas até chegar ao produto ideal para os filhos: “Desenvolvi uma técnica para preparar um óleo similar ao que importava e era o que funcionava melhor para eles. Com isso tenho um alto controle quanto às espécies ideais para cada filho”, conta Bruna.

“Meus filhos tinham diversas limitações. Hoje, vivem como crianças. Mateus sonha em fazer mestrado. Rebeca e Isaque não têm atrasos. Isso é transformador”, diz a mãe, que, além de manter um canal no YouTube, o Mamãe Bruna Cultiva, é presidente da Associação Humanitária Canábica do Brasil (AHCB) e fundadora da clínica Farma Autismo.

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) lembra que, até o momento, o uso dos derivados da maconha para o manejo de sintomas de TEA se baseia em relatos de casos, como os de Bruna, ou em pequenos ensaios clínicos. Estudos mais aprofundados, como os de Muotri, ainda precisam ser feitos e validados. Outras evidências indicam que a cannabis pode ser usada para o alívio de dores, embora existam poucas pesquisas com crianças. Também não há estudos que mostrem os efeitos da planta a longo prazo. A falta dessas informações é resultado direto da proibição, que dificulta a pesquisa.

As evidências mais robustas mostram que produtos à base de maconha são efetivos em casos de síndromes epilépticas, nomeadamente as síndromes de Dravet (como no caso de Clárian), de Lennox-Gastaut e de Doose.

A médica Magda Lahorgue Nunes, presidente do Departamento Científico de Neurologia da SBP e professora de neurologia da PUC-RS, lembra que “as evidências disponíveis sugerem que o risco de dependência do medicamento [à base de CBD] seja pequeno quando seu uso é controlado e monitorado por um médico especialista”.

Mas o CBD não é o único derivado da maconha, apesar de ser o mais usado. Atualmente, os cientistas conhecem, pelo menos, entre 60 e 80 canabinoides (como são chamados os derivados). “O CBD não possui efeitos psicoativos nem euforizantes e é muito estudado para fins medicinais, mas a planta in natura, a maconha, é uma droga ilícita usada para fins alucinógenos pelos seus efeitos psicoativos e euforizantes”, aponta Magda. De acordo com a médica, o THC, que é o canabinoide responsável pela famosa “brisa”, é quem traz os maiores riscos, como psicose precoce, esquizofrenia e depressão. “Quanto mais THC o produto contém, maiores são essas ameaças.”

A cannabis e a legislação

Desde o fim de 2019, a Anvisa aprova a venda de produtos à base de cannabis nas farmácias brasileiras com prescrição. Atualmente, é possível encontrar 23 desses produtos: 14 à base de CBD puro e nove com todos os componentes (“full spectrum”), sendo permitido até 0,2% de THC. Os produtos, que não são chamados de “medicamentos” pela Anvisa, podem ser administrados como óleos, tinturas, drágeas comestíveis, cápsulas, pastilhas, adesivos dérmicos, sprays e de forma vaporizada.

Ainda assim, em setembro de 2022, o Conselho Federal de Medicina (CFM) restringiu o uso do CBD somente às crianças e adolescentes com epilepsias específicas, deixando de fora, por exemplo, pacientes de esclerose múltipla, como a atriz Cláudia Rodrigues. Depois de críticas, o órgão voltou atrás e abriu consulta pública.

Ao lado do Suriname e das Guianas, o Brasil é um dos últimos países da América do Sul onde utilizar maconha ainda é crime. A discussão sobre a descriminalização (que retira a questão da esfera criminal, ninguém é preso por portar ou plantar) – diferente da legalização (quando a maconha passa a ser regulamentada, e o Governo controla o plantio, a distribuição e a taxação de impostos) – está parada no STF desde 2017, sem previsão de retomada. Além do uso medicinal ser aceito em diversos países, como os latinos e os europeus, o uso recreativo também é permitido e regulamentado em lugares como Uruguai, Canadá e mais 21 estados dos EUA.

Cannabis ao redor do mundo

Cannabis ao redor do mundo — Foto: Crescer Online
Cannabis ao redor do mundo — Foto: Crescer Online

  1. América Latina: Na América do Sul, o Brasil, o Suriname e as Guianas são os únicos países onde o uso da maconha é crime. Por aqui, no entanto, o uso medicinal é autorizado pela Anvisa, com algumas restrições. No Uruguai e no México, além do uso medicinal, o uso recreativo também é regulamentado.
  2. América do Norte: Nos EUA, 37 estados consideram legal o uso da cannabis na medicina, enquanto em 21, o uso recreativo também é liberado. Ao lado do México e do Uruguai, o Canadá é um dos únicos três lugares em que o uso recreativo é permitido em nível federal.
  3. Ásia: A Tailândia é o único país da região onde a maconha pode ser cultivada e consumida com finalidades medicinais, sendo que o uso em público é penalizado.
  4. África: Em 2017, Lesoto foi o primeiro país do continente a conceder uma licença para o cultivo da maconha para fins médicos e científicos. Desde então, países como Zimbábue, África do Sul, Malawi, Zâmbia, Uganda, Gana e Ruanda seguiram o exemplo.
  5. Europa: Nenhum país europeu permite o uso recreativo da maconha, mas grande parte aprova o uso medicinal. Alguns lugares — como a Holanda, que descriminalizou a planta em 1976, e Portugal, com seus programas de saúde — são referências na área de política de drogas.
  6. Oceania: Países como Austrália e Nova Zelândia consideram legal o uso da maconha na forma medicinal.

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