Nós, que fique claro, somos as mães. Não que não existam pais que cuidam, zelam, se dedicam, mas é que é sobre as mulheres que recai o cuidado em nossa sociedade, e eu não preciso provar: você sabe. Você sabe quem cuidou de você, te levou ao médico, preparou a sua comida, acordou na madrugada para verificar se a febre passou, conferiu se a mochila e o uniforme estavam prontos para o início das aulas, ligou para a própria mãe ou para a amiga, irmã ou para a mulher mais próxima para pedir ajuda. Você sabe. Pode até não admitir, mas sabe!
É nos nossos cabelos que as crias fazem penteados enquanto tentamos responder àquele e-mail importante. Somos nós que fazemos cara de tranquilidade em uma reunião, enquanto os gritos de “Mãe, manda ele parar de me olhaaaaaaaaar!” concorrem com a voz do cliente. Somos nós que precisamos decidir se iremos extrapolar o tempo de tela ou se deixaremos metade dos afazeres para depois. Somos nós que encaixamos uma ida ao cinema entre aquela entrega importante e inadiável e o orçamento que precisa ser enviado até amanhã. E somos nós que fazemos tudo isso enquanto providenciamos 457.923 lanchinhos diferentes porque criança de férias sente mais fome que a Magali.
Ah, não posso esquecer, precisamos ser gratas. Gratas pelas crias saudáveis, pelas férias e pelo tempo junto. Gratas por sermos mães, afinal. Nada de piadas sobre as férias, nada de sonhar com a escola. Mãe que ama o filho de verdade tem uma programação maravilhosa para as férias, cheia de eventos e museus e colagens do Pinterest. Nós, as reles mortais que sentimos mais que gratidão, somos incentivadas a amargar quilos de culpa. Culpa pelo que não demos conta, pelas crianças presas em casa, pela agenda cheia, pela sobrecarga que não deveria ser nossa.
Quantos pais vivem as férias assim? Quantos se culpam pela falta de programação das crianças? Quantos ligam para os amigos e perguntam o que farão nas férias escolares? Quantos trabalham na madrugada porque deixaram o relatório para depois do cinema? Quantos precisam reler o e-mail inúmeras vezes, porque interromperam para acolher choro, separar briga e estourar pipoca? Por que – e até quando – esse peso cai apenas nos ombros das mães?
“Eu não dou conta” pode ser substituído por “Eu não tenho apoio suficiente”. Não é um problema individual, como aprendemos que era, mas a falta de uma rede que ampara e suporta. Não darmos conta das crianças nas férias fala sobre ausência de figuras de apoio: sociais, familiares, governamentais.
Falta de divisão justa da responsabilidade de educar e cuidar. Enquanto acreditamos que basta amor, planejamento e boa vontade, deixamos as mães – e as crianças – abandonadas à própria sorte. Crianças merecem férias divertidas. E mães merecem ter tempo e energia para curtir as suas crianças. Ah, se merecem!
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