Sexo

Por Leonardo Ávila Teixeira


Fred Nicácio e Aline Wirley: cada qual tem relacionamentos abertos fora da casa — Foto: Reprodução / TV Globo
Fred Nicácio e Aline Wirley: cada qual tem relacionamentos abertos fora da casa — Foto: Reprodução / TV Globo

“Há mais ou menos sete anos, comecei a receber casais com um conflito que nunca tinha visto nos meus 40 e tantos anos de consultório: uma das partes propunha a abertura da relação, e a outra parte se desesperava”, diz à GQ Brasil Regina Navarro Lins, escritora e psicanalista, autora do livro Sexo na vitrine: Sobre desejos e prazeres (Editora Best Seller, 2022).

O assunto do relacionamento aberto ganhou palco recente com a edição 2023 do Big Brother Brasil, pontilhada por casos de relações não-monogâmicas: a da ex-Rouge Aline Wirley, do médico Fred Nicácio e mesmo o do psicólogo Manoel, que virou assunto ainda que não tenha sido selecionado na Casa de Vidro pré-BBB.

O que brothers e sisters comentam e vivem, claro, não vem de hoje: essas relações que ultrapassam a monogamia são a grosso modo frutos da revolução sexual trazida pela popularização da pílula anticoncepcional nos anos 60, diz a escritora. São formas alternativas de pensar uma organização mais tradicional da vida que, no geral, tem raízes no avanço do cristianismo e do conceito da propriedade privada na era moderna, que jogaram uma dimensão moral e econômica (vide a herança, os dotes e testamentos) à vida amorosa.

Para a escritora, há ainda um recorte de gênero. Em sua experiência, são as Alines e não os Manoéis que dominam o assunto. “Quem é que propõe mais a abertura das relações são as mulheres", comenta Regina, que diz usar de base as 50 ou 80 mensagens diárias de casais por redes sociais, e o trabalho no consultório.

Além da relação aberta (que prevê um casal como núcleo, com ambas as partes procurando outros parceiros, juntas ou não), há outras formas, como o trisal, no qual um trio se relaciona entre si, e o poliamor, mais amplo.

A lei brasileira trabalha com o princípio da monogamia desde a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no fim de 2020. Ou seja: o arranjo de pessoas capaz de se casar em cartório, dividir bens e exigir pensões é sempre uma dupla, ainda que a lei se abra para a possibilidade de famílias com mais de um pai ou mãe. Antes da decisão recente, casais não-monogâmicos encontravam respaldo para resolverem disputas ou entrar em acordos em um cenário sem normas prontas e definidas.

“Como você separava um poliamor de um adultério, que foi crime por muitos anos? A base era basicamente boa fé", lembra Marina Borges, advogada familiarista. "Se eu fico com um cara que é casado, não sei que ele é casado, mas construo uma vida com ele, eu teria direito”, comenta. A advogada cita ser comum casos de duas pessoas se casando oficialmente, mas se juntando a outras em caráter de uniões estáveis (ou seja, relações públicas com o intuito de constituir família).

"Com o entendimento do STF as relações paralelas passaram a ser vistas como concubinato e aí não eram mais família", explica.

Marina aponta que houve um boom no volume de casos envolvendo relações não-monogâmicas entre 2011 e 2012 - "Estavam por todos os tribunais", comenta. O grande motivador na época era a área previdenciária. "Várias cônjuges entravam com um pedido de pensão pós-morte e se via que o finado tinha outra, por exemplo. E daí essa pensão era rachada. Com o tempo, isso começou a se estender também para questões de família, como a partilha de bens”, lembra a advogada.

Se a não-monogamia é um assunto que te interessa, abaixo você encontra uma exploração do assunto em cinco tempos:

Especialmente no caso de um relacionamento aberto, todo mundo tem que estar disposto

“As duas pessoas têm que realmente desejar abrir a relação. Não adianta uma parte propor e a outra aceitar só para não desagradar, por medo de perder. Não pode. O preço cobrado inconscientemente da relação com o outro vai ser altíssimo. De repente, você não sabe porquê, dá uma rasteira no outro, desvaloriza a outra pessoa, como forma de cobrar", diz a escritora e psicanalista Regina Navarro Lins.

A blogueira e colunista Laura Pires, que há três anos escreve sobre relacionamento, incluindo os não-monogâmicos, reforça que é bom o assunto não chegar como novidade nas discussões de casal: “Pessoas que nunca conversaram sobre isso e chegarem no assunto do nada, eu acho difícil. Tem gente que vai ouvir isso e se sentir ofendida, insegura”. Laura tem conhecimento de causa: "O meu próprio relacionamento aberto começou dessa forma, a gente percebeu que era isso que já estávamos fazendo e a gente só confirmou (risos)”.

Conversar, conversar

Para poliamores ou não, a advogada Marina Borges defende que amantes buscando relações firmes a longo prazo precisam conversar sobre planejamento. “Vocês precisam falar sobre regimes de bens. Ainda que você não case, ainda que você tenha uma união estável, tem com fazer um contrato de convivência, tem como fazer pacto. Por exemplo, eu sou casado com fulana de tal, mas estou com outra pessoa também e ela faz parte. Tem como entre eles fazerem pactos pensando em bens", diz. Mas para isso o melhor é fazer em estrutura pública. "Por exemplo, se for comprar um imóvel, já coloca em nome dos três (ou mais). Faça um testamento, também, é importantíssimo isso”, complementa.

No caso de uniões estáveis, "se você não coloca nada no papel, é como se fosse casado pela comunhão parcial de bens, e com essa decisão do STF, você pode acabar preterindo alguma outra pessoa com a qual você está. Então é muito importante que todos os envolvidos conversem muito”, conclui.

Mas na vida privada, não funciona botar tanta regra assim

“Como é uma coisa muito nova, as pessoas sentem necessidade de fazer pactos, combinações. Tem gente que quer saber tudo do outro nos mínimos detalhes. Outros não querem saber nada", conta Regina Navarro Lins. “Atendi um casal que combinou a seguinte coisa: cada um transa com quem quer, só não pode repetir a pessoa. Aí você vê como as pessoas não sabem bem o que fazer. Ninguém sabe o que é melhor”, diz.

"Mas tem umas coisas básicas, tipo: ‘tá, vamos abrir, mas sábado e domingo passamos juntos ou não?’ Combinam o que for melhor, aquilo que seja um denominador comum de ambas as partes”, conclui.

Amor não-monogâmico não é uma competição

Sobre sua relação aberta, Laura Pires lembra: "Eu saia com uma pessoa regularmente, já ele saia com pessoas variadas. Funcionou, mas é uma questão que as pessoas têm também: meu namorado sai com mais pessoas do que eu, eu deveria aumentar o número também? E não, só se você quiser”, comenta. “Não é uma competição."

Regina Navarro arrisca também que enxergar outros parceiros com competidores não reflete a realidade desse tipo de relação. “Aquela história de que na relação aberta você corre risco da outra parte se apaixonar por alguém é bem discutível. Todos os casais que eu conheço que uma das partes se apaixonou e foi embora não tinham relação aberta. Tinham uma relação aparentemente monogâmica, certinha", conta.

Esteja preparado para surpresas

Dito isso, é fundamental se preparar para frustrações. “É importante ter disposição para quebrar a cara vez ou outra. Se você vai viver alguma coisa fora das normas, das regras sociais, viver uma relação fora do roteiro, você vai experimentar muita coisa. Você vai se colocar em situações que você vai sofrer e você vai se magoar, e tudo bem”, diz Laura.

“Outro dia, uma mulher me escreveu assim: ‘Eu insisti muito para o meu marido abrir a relação e ele não queria; eu resisti, e agora estou morrendo de ciúmes’", lembra Regina. "Os conflitos vão surgindo, conflitos novos.”

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