Música

Por Guilherme Henrique (@guicostah)

Um dos principais nomes do rap nacional, Djonga lançou o sétimo álbum da carreira falando de amor. Em Inocente Demotape as discussões raciais e a artilharia pesada que o consagraram desde Heresia (2017), seu trabalho de estreia, deram lugar a sensibilidade de alguém que diz se apaixonar facilmente. “Conversando com as pessoas na rua senti muito mais essa demanda de falar de amor do que de conversar sobre o racismo e sofrimento. Quem gosta de ficar batendo nesse tema o tempo todo é o pessoal da esquerda branca e universitária”, disse ele em entrevista à GQ Brasil.

São 25 minutos distribuídas em 8 faixas, com participações de TZ da Coronel, MC Cabelinho e Veigh, entre outros. “Inocente é o disco mais feliz que eu já fiz. Foi onde pude me divertir o tempo todo. E mesmo assim deu um trabalho imenso, porque é um tipo de música que eu não estou acostumado a fazer e em muitos momentos fiquei pensando se estava fazendo do jeito certo e conversando com pessoas que eu admiro.”

O rapper mineiro diz não se importar com as críticas sobre ter adormecido seu lado combativo no novo disco. “Não posso fazer as coisas pensando só nos outros. Existe o Djonga, mas tem o Gustavo também. Só desejo ser o rapper que eu quiser e acredito que quem é fã vai se apegar nisso, e quem é hater vai para puta que o pariu.”

Djonga lançou sétimo álbum da carreira distante do estilo combativo que o consagrou — Foto: Divulgação
Djonga lançou sétimo álbum da carreira distante do estilo combativo que o consagrou — Foto: Divulgação

Após uma turnê na Europa que passou por cidades como Londres e Paris, no início do mês, Djonga volta ao Brasil para se apresentar no Afropunk, um dos maiores festivais de cultura negra do mundo, que será realizado em Salvador no próximo fim de semana. Além dele, também se apresentam artistas como Alcione, Iza, Carlinhos Brown e a norte-americana Victoria Monet.

“A expectativa é grande. “Estou empolgado, também porque não sei muito bem o que esperar do público. Sei que o pessoal de Salvador é foda. Sempre que me apresento lá fico sem saber se o que está rolando é a loucura do show ou uma briga”, brincou o rapper, que vai subir ao palco no sábado (18).

Na música “Depois da meia-noite” você fala algo sobre ser alvo de fofoca e o título do álbum é Inocente. Do que você está sendo acusado para se autodeclarar inocente?
Quem está em uma posição de destaque vive uma parada de estar protegido e vulnerável ao mesmo tempo. A nossa vida é totalmente exposta. É um pouco clichê dizer que por ser uma figura pública não se pode falar tudo, mas também é um pouco verdade. Parece que nossa vida deixa de ser só nossa, e a partir daí as pessoas começam a interpretar as nossas ações e atitudes da maneira que elas querem enxergar e pronto. Sou responsável só pelo que falo e faço, não pelo que o outro entende.

Ao fazer arte isso é ainda mais complexo, porque a arte não é um lugar para falar o óbvio, mas o lugar onde você transforma o óbvio em poesia. É como no caso do racismo. O "fogo nos racistas" é poesia. Eu poderia falar racismo é crime ou qualquer outra coisa literal, mas isso não é poesia. E o problema é fazer essa poesia em um país com uma deficiência funcional de aprendizagem. E isso não culpa da população, mas do Estado que não dá acesso à cultura e educação. Mas há uma dificuldade de interpretação. E nesse momento elas criam um conceito sobre o artista, o que elas acham que ele pensa, e dão opiniões sobre isso. Então, quando parte do púbico vê o artista fazendo algo diferente do que ele cantou em determinada música, esse artista é acusado de contraditório, incoerente, mentiroso, de querer ganhar dinheiro em cima da favela, de trair o movimento do rap por não falar de crime. Nós somos acusados o tempo todo e a galera esquece que nós queremos nos sentir bem.

Como essas ideias aparecem nesse disco?
Inocente é o disco mais feliz que eu já fiz. Foi onde pude me divertir o tempo todo. E mesmo assim deu um trabalho imenso, porque é um tipo de música que eu não estou acostumado a fazer e em muitos momentos fiquei pensando se estava fazendo do jeito certo e conversando com pessoas que eu admiro. Então, acusado ou não, eu já me declaro inocente porque só quero ser feliz. E tem uma coisa importante aí que é não aceitar as acusações. Tenho tido cada vez menos paciência. As pessoas acham que por ser artista você precisa aprender a lidar com as críticas e eu concordo que isso existe, mas aprender a apanhar não significa achar bom e nem ficar rindo ao concordar.

É possível se blindar das críticas? Como reagir?
Eu aprendi que meu jeito de reagir é o silêncio e foda-se, porque eu ligo pouco para isso. Mas se o cara ou a mina quiser brigar e discutir está tudo certo. Sou artista, mas sou gente também, tá ligado? A galera precisa entender isso. É foda ficar ouvindo crítica de quem nunca construiu nada é bizarro. Pode ser polêmico dizer isso, mas é a real.

O rapper mineiro não está preocupado com as críticas: "Os haters vão para a puta que pariu". — Foto: Divulgação
O rapper mineiro não está preocupado com as críticas: "Os haters vão para a puta que pariu". — Foto: Divulgação

Como foi deixar o racismo de lado para falar de amor?
Sou um cara que se apaixona fácil, quero casar toda hora...Sou apaixonado pela vida e pelos meus amigos. Conversando com as pessoas na rua senti muito mais essa demanda de falar de amor do que de conversar sobre o racismo e sofrimento. Quem gosta de ficar batendo nesse tema o tempo todo é o pessoal da esquerda branca e universitária. Eles amam falar sobre isso porque é uma coisa que não dói no mesmo lugar que dói para gente. Quero falar sobre as coisas que meu pessoal quer ouvir, e eles também desejam diversão, felicidade...Já escrevi sobre assuntos sérios e a minha galera abraçou a ideia e gostou. Mas a demanda que tenho sentido hoje é em busca do direito de esquecer por um dia que na segunda-feira ele precisa encarar o patrão de novo e que a semana vai ser o sofrimento de sempre. E tem o lance do mercado também, de ganhar dinheiro, está tudo aí.

Talvez o público volte naquele tema dizendo que você se vendeu....
Mas nós também queremos vender e ganhar dinheiro. Precisa parar com essa besteira, que no Brasil é muito forte, com esse lance da humildade, um troço meio esquisito...Confundem humildade com ser bobo, e não entendem qual a lógica do jogo, e nem estou falando só do rap. Você abaixa a cabeça e as pessoas vão pisando em cima. Não dá, é preciso se impor e ocupar os espaços.

Quando o artista surge ele não tem nada, então é o sujeito humilde que está chegando e todo mundo ama. Só procuram as qualidades. Quando esse mesmo artista começa a fazer sucesso, todo mundo vai atrás dos feitos. O cara pode doar milhões de reais para uma instituição de caridade que ainda assim vão procurar alguma coisa para botar defeito. São dois momentos muito loucos. Uma hora você é ninguém e todo mundo te ama, e depois vem a fama e só querem te colocar para baixo. Faz parte do processo e eu já me acostumei com isso. E é por isso que vou fazer a música que eu quiser, porque se eu criar só a música que essa fração crítica do público espera, eles vão me xingar do mesmo jeito. E outra: se fosse só pelo dinheiro eu nem precisaria mais cantar. Não por ser o cara mais rico do mundo, mas por ter investido em outras coisas menos arriscadas que a arte.

É sobre pensar mais em você, certo? Vi uma entrevista sua dizendo que esse disco era também sobre um processo pessoal.
É que a carreira acaba ficando na frente e passa por cima de tudo. Mas tenho olhado no espelho e me questionado sobre algumas coisas. E esse é um processo de descoberta. Isso significa que em alguns dias quero cantar samba ou que não estou a fim de fazer um show. Por no começo tem aquela história de ser grato. Porra, sou grato pra caralho, mas isso é uma linha muito tênue. Você fica obrigado a gostar de fazer show, de tirar foto e, em alguns momentos, tudo que eu quero é não falar com ninguém. Não posso fazer as coisas pensando só nos outros. Existe o Djonga, mas tem o Gustavo também. Só desejo ser o rapper que eu quiser e acredito que quem é fã vai se apegar nisso, e quem é hater vai para puta que o pariu.

Djonga apostou no amor e deixou o racismo de lado em novo trabalho — Foto: Divulgação
Djonga apostou no amor e deixou o racismo de lado em novo trabalho — Foto: Divulgação

Qual o limite entre saber o que quer e a arrogância?
Sabedoria e arrogância andam juntas, assim como dinheiro e arrogância. Para você sair de um cara inteligente e se tornar um filho da puta é muito rápido.

Como é estar no Afropunk?
Muito foda. É uma negociação que existe há alguns anos, mas que nunca tinha rolado por problemas de data, cachê, só que dessa vez deu certo. Estou empolgado, também porque não sei muito bem o que esperar do público. Sei que o pessoal de Salvador é foda. Sempre que me apresento lá fico sem saber se o que está rolando é a loucura do show ou uma briga. É uma loucura mesmo. É bom poder fazer parte dessa história e de um evento tão importante. Enfim, acho que vai ser lindo

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