Saúde
Publicidade

Você está na área externa de uma balada e avista um brilho metálico entre os dedos de alguém fumando. É um vape ou pod, item da nova geração de cigarros eletrônicos, em que uma bateria aquece e vaporiza um líquido com substâncias químicas. O dispositivo pode ser tragado enquanto libera um aroma docinho ou mentolado, a depender do gosto de quem o usa. A dosagem de nicotina varia de acordo com o fabricante – a mais baixa equivale a seis cigarros comuns; e a mais alta, 18.

Apesar de cada vez mais comuns nas mãos de adolescentes e adultos, eles são proibidos pela Anvisa desde 2009. À época, um grupo técnico se manifestou contrário à liberação no País; posição reiterada recentemente quando o debate voltou a borbulhar. Entretanto, uma busca rápida na internet mostra não só lojas online que disponibilizam o aparelho, como vídeos nas redes sociais que ensinam como prepará-los de forma caseira, relatos de usuários e até hashtags no TikTok em que relacionam os sabores das essências a traços de personalidade.

Sim, adolescentes também protagonizam o conteúdo. Essa é, aliás, uma preocupação da comunidade científica, que já monitora o uso do artifício no Brasil. O relatório Covitel (Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia), divulgado em abril, fez um levantamento inédito sobre uso de cigarros eletrônicos no País.

Pelo menos um a cada cinco jovens entre 18 e 24 anos usa vapes ou similares no Brasil.

A maior prevalência está entre os homens em todas as faixas etárias. O índice é de 10,1% entre eles contra 4,8% entre as mulheres. A região que se destaca é a Centro-Oeste (11,2% da população). O Distrito Federal, aliás, lidera o ranking nacional na proporção de adolescentes entre 13 e 17 anos. Segundo os dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo IBGE com dados de 2019 e divulgada no ano passado, 30,8% já experimentaram o produto.

Se em algum momento eles foram visto como substitutos ~saudáveis do cigarro tradicional, a teoria caiu por terra. Especialistas dizem que, na verdade, se troca um vício pelo outro. E este outro não é melhor.

Vapes são prejudiciais, porque liberam nanopartículas de metais pesados, solventes e outros produtos químicos que podem causar danos ao pulmão e às vias aéreas.

"Uma dessas substâncias químicas, por exemplo, é o propilenoglicol, que produz aquela fumaça de palco. Os compostos orgânicos voláteis em certos níveis ainda irritam olhos, nariz, garganta, além de afetarem negativamente fígado, rins e sistema nervoso. Outra substância comum é o formaldeído, sabidamente um carcinogênico. Além disso, a maioria dos cigarros eletrônicos contém nicotina, que vicia”, explica a oncologista Isabella Drumond, de São Paulo.

Em 2019, uma síndrome respiratória aguda exclusivamente atribuída ao uso dos cigarros eletrônicos foi nomeada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC): EVALI, sigla em inglês para doença pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico ou vaping (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury). “Tosse, dor torácica e sensação de falta de ar, além de dificuldade para respirar, estão entre os sintomas. Fora isso, dores abdominais, náuseas, vômitos, diarreia, febre, calafrios e perda de peso são sinais relacionados”, afirma o pneumologista Arthur Feltrin.

Vape vicia?

O primeiro contato com os dispositivos é capaz de gerar uma sensação de prazer momentâneo, o que ajuda a indução ao vício.

Os dispositivos eletrônicos permitem que o usuário dê mais tragadas em um curto período e bem mais rápido do que com o cigarro convencional. A nicotina dos e-cigarros atinge o cérebro entre 7 e 19 segundos após uma tragada, liberando substâncias que podem causar impactos em áreas do cérebro responsáveis por regular as memórias e emoções

Por isso, quem tem o desejo de abandoná-los passa por um período de abstinência, assim como qualquer outro vício. “Há a dependência química, que provoca a sensação de prazer no cérebro por meio de receptores, e há também a dependência comportamental. Geralmente, o ato de fumar está relacionado a situações de bem-estar, como aquele encontro dos drinques com os amigos. A partir do momento em que se toma a decisão de largar, as estratégias precisam passar por todos esses lugares”, diz Chin An Lin, pneumologista e acupunturista membro do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura.

“Você pode escolher o método abrupto ou gradual e é importante cortar os gatilhos do fumo. Contar com o apoio de familiares e pessoas também vale a pena. Por fim, procure ajuda médica e, se possível, troque experiências em grupos de apoio”, recomenda a médica Isabella Drumond.

Efeito borboleta

Os impactos do cigarro eletrônico também alcançam o rosto. Aos detalhes:

Boca e dentes
As substâncias químicas comprometem a microbiota bucal e aumentam as chances de doenças periodontais, sensação de boca seca, inflamações e até retrações da gengiva. “A diminuição da produção de saliva por culpa da nicotina também aumenta os riscos de cáries, sensibilidade nos dentes e mau hálito”, explica a dentista Fernanda Prado, head de operações da Yappy Odontologia.

Pele
“Há aumento do estresse oxidativo, que acelera o envelhecimento precoce, além do risco de infecções e dermatites causadas pela diminuição da resposta imune do organismo. Feridas e acne também demoram mais a cicatrizar”, explica a dermatologista Maria Eduarda Pires.

Vamos de fact-check

O que é verdade e o que é mito quando falamos em vapes?

Ele só tem essência
Mito! Há liberação de outras substâncias químicas, como aquelas envolvidas na fumaça e a nicotina.

Vape não vicia
Mito! Apesar do caráter lúdico dos sabores, ele tem potencial de gerar dependência química e emocional como o cigarro comum.

Quais são os efeitos a longo prazo?
Não se sabe. Faltam estudos para elucidar os efeitos ao longo do tempo, mas já há riscos em curto prazo.

Existem opções seguras?
Por ser um produto de comércio proibido, não tem regulamentação. Portanto, não há como atestar ao certo o que há em cada componente.

Vape ajuda a largar o cigarro comum
A troca pode até acontecer em um primeiro momento, mas há o risco de se “substituir” o vício.

Mais recente Próxima Aline Gotschalg passa por cirurgia para retirar câncer na tireoide
Mais de Glamour