Brasil e Política

Por Nathália Larghi, Valor Investe — São Paulo


Na semana passada, o Banco Central pausou, pelo menos por enquanto, o ciclo de cortes da Selic, mantendo a taxa em 10,50% ao ano. Segundo a autoridade monetária, a mudança de rota se deu porque o cenário de inflação se tornou mais desafiador. Essa foi a primeira pausa na queda dos juros desde agosto do ano passado.

Nesta terça-feira (25), o Banco Central explicou a decisão por meio da ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Nela, a autoridade monetária afirma que "as expectativas de inflação apresentaram desancoragem adicional desde reunião anterior". Para quem não se lembra, mesmo nessa reunião o BC já havia sinalizado que as preocupações com a inflação estavam crescentes. Não à toa, a autoridade monetária optou por diminuir, pela primeira vez, a magnitude dos cortes da Selic, promovendo uma queda de apenas 0,25 ponto percentual, diferente dos cortes de 0,5 pontp percentual feitos antes.

Mas afinal, o que são essas "expectativas desancoradas"?

São projeções da inflação distantes da meta perseguida pela autoridade monetária no chamado "horizonte relevante" da política monetária. Neste caso, 2024 em diante. Nos próximos anos, a meta de inflação é de 3% ao ano, mas segundo o que mostra o Boletim Focus, as expectativas do mercado estão bem acima disso.

Essas expectativas importam por terem certo poder de autorrealização. Ao esperarem inflação mais alta lá na frente, produtores acabam remarcando preços para cima para se proteger da alta de custos. Já consumidores antecipam intenções de compra.

E, na prática, essa inflação esperada mais alta pode acabar se materializando. Nesse cenário, se o BC afrouxa a política de juros, corre o risco de passar a impressão de inflação ainda mais descontrolada no futuro.

E agora? O que acontece?

A resposta do Banco Central para o que acontece daqui em diante é: "depende". E de muitos fatores. Na ata do Copom, a autoridade monetária afirma que "a política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente". Trocando em miúdos: os juros devem seguir altos até que haja algum sinal de que é seguro cortá-los sem que isso impacte negativamente a inflação e o cenário macroeconômico.

No documento, o Banco Central reforça que "eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta".

É importante lembrar que, recentemente, o presidente Lula (PT) fez duras críticas em relação ao patamar dos juros. Segundo o presidente, s Selic está em 10,5% "sem nenhuma explicação e nenhum critério”.

Apesar das críticas de Lula, um ponto importante e que, pelo menos a princípio, foi visto de maneira positiva pelo mercado, foi o fato de a decisão ter sido unânime. Para quem não se lembra, na reunião anterior, a decisão ficou dividida entre os dirigentes indicados por Lula (que preferiam um corte maior, de 0,5 ponto percentual) e os demais que foram maioria e optaram pelo corte mais brando, de 0,25 ponto percentual.

O Banco Central reforçou esse ponto na ata, ao destacar que "concluiu-se unanimemente pela necessidade de uma política monetária mais contracionista e mais cautelosa".

O que dizem os analistas?

Segundo Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Way Investimentos, a ata adotou um tom mais duro. O especialista afirma não ter convicção que o ciclo de cortes tenha realmente terminado.

"Permaneço apegado à palavra 'interromper', eles não usaram 'encerrar'. Ainda não descarto uma queda no segundo semestre de 0,25 ponto percentual", afirma o economista.

Segundo Espírito Santo, um ponto importante foi o parágrafo bem extenso sobre a chamada "taxa neutra" (ou seja, aquela taxa que não acelera e nem desacelera a inflação).

"Eles a elevaram no modelo para 4,75%, algo que considero correto", diz. "De qualquer forma, me pareceu uma ata adequada para esse momento complexo, tanto no cenário externo quanto no local. Fazia sentido o Copom mostrar consenso e focado na meta", diz.

Marco Saravalle, estrategista-chefe da MSX Invest, destacou que o Banco Central fez questão de frisar a unanimidade da decisão, mostrando que o colegiado "votou junto".

"O grande recado dessa ata é a presença da palavra ‘unanimidade’. Eles quiseram reforçar, claramente, que os membros votaram juntos", diz. Segundo o analista, outro ponto importante é que o Banco Central reforlou que vai permanecer vigilante em relação ao futuro, avaliando os dados que virão daqui em diante para tomarem outras decisões.

pausa — Foto: Getty Images
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Mais recente Próxima Ata do Copom: cenário de inflação ficou mais desafiador e juros devem ficar altos por 'tempo suficiente'
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