Ações da Nvidia são quase uma unanimidade entre analistas. 'Não é uma bolha', diz diretor da empresa

Fabricante de chips chegou a alcançar o título de mais valiosa do mundo nesta semana. Márcio Aguiar, diretor da divisão de empresas para a AL, fala sobre a trajetória e desafios da queridinha do frenesi da IA

Por Marília Almeida, Valor Investe — São Paulo


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Na terça-feira, 18, o que parecia algo inimaginável há cinco anos, quando a Nvidia não figurava nem entre as 20 empresas mais valiosas do mundo, aconteceu. Por um dia a fabricante de chips e provedora de soluções para aplicações de inteligência artificial (IA) ultrapassou a Microsoft e a Apple e se tornou a empresa com o maior valor de mercado do mundo: a empresa é avaliada atualmente em US$ 3,21 trilhões.

A companhia atingiu o feito após ter realizado um desdobramento de ações no dia 10, que derrubou o valor da ação de US$ 1.208 para US$ 121. Corretoras como a Avenue registraram um aumento de 15% na procura pelo papel nos últimos 30 dias. Nessa conta já foi levada em consideração a valorização do papel, ou seja, o crescimento se refere apenas a novas compras ou aumento de posição na ação.

A ascensão da empresa foi meteórica: apenas no último mês a valorização dos papéis atingiu 19,30% e, no acumulado do ano, as ações sobem 164,10%. Ficou cara? Nada disso: a ação continua sendo quase uma unanimidade entre os analistas do mercado financeiro.

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Dados compilados no terminal da Bloomberg apontam que 64 especialistas recomendam atualmente a compra do papel, entre eles analistas de bancos como Wells Fargo, Citi, HSBC, UBS, Goldman Sachs, BNP Paribas, Barclays, Bank of America, J.P Morgan e Morgan Stanley, além da gestora Bernstein. Apenas sete, entre eles o Deutsche Bank, indicam manutenção da aplicação e um indica a venda do investimento.

Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para a América Latina, conta a trajetória da empresa até aqui. "Não queremos liderar um mercado, mas criar novos. Estimamos que nosso mercado valha hoje US$ 68 bilhões. No final do ano, devemos superar US$ 100 bilhões, mas acreditamos que o segmento de software para IA possa chegar a US$ 43 trilhões".

Há mais de dez anos na empresa, o foco de Aguiar é desenvolver mercados de inteligência artificial e ampliar o uso das plataformas de software e hardware da empresa. O executivo tem mais de 25 anos de experiência de vendas em TI e se formou em administração pela Loyola Marymount University, em Los Angeles, na Califórnia. Veja abaixo a entrevista concedida pelo executivo ao Valor Investe:

Valor Investe: Como a empresa passou de uma vendedora de unidades de processamento gráfico para vendedora de sistemas para clientes, e como essa mudança levou a um aumento significativo do valor da empresa?

Marcio Aguiar: A Nvidia fundou um ecossistema para usufruir ao máximo dos seus produtos. A empresa começou em 1999 focada em plataformas de jogos. Em 2003, verificamos que profissionais, como arquitetos, estavam usando nossos produtos para criação de gráficos em três dimensões. Então, resolvemos criar produtos para esses profissionais também.

Em 2006, lançamos a computação de alto desempenho, que atende às principais aplicações de físicos, químicos e biólogos, cuja atividade demanda muitos cálculos.

Em 2012, foi criada uma unidade de processamento gráfico (GPUs, na sigla em inglês, os chips) que atende redes neurais de classificação imagens, pela qual pesquisadores ganharam uma competição usando técnicas inovadoras. Nos aproximamos deles para entender o que precisavam para criar uma rede neural mais complexa. Vimos que era necessário um alto nível de processamento, que futuramente seria necessário na IA.

Hoje, entregamos arquitetura de hardware e plataforma de software para GPUs. Se a empresa não tiver desenvolvedores, nós fornecemos as aplicações. A empresa pode contratar quatro delas e criar o seu próprio ChatGPT. Temos hoje mais de 150 no portfólio.

Fazem parte também do nosso ecossistema mais de 5 milhões de desenvolvedores, que criam mais de 3 mil aplicações. Temos ainda 15 mil startups para as quais fornecemos conhecimento e que posteriormente poderão ser adquiridas por corporações que compram as nossas GPUs.

Por fim, 40 mil clientes usam nossos produtos. Quando a Microsoft diz que tem mais de 50 mil clientes usando o Copilot, ele está consumindo dados das nossas GPUs. A OpenAI usou nossas bibliotecas e outras aplicações abertas no mercado para montar o ChatGPT.

Valor Investe: Qual o diferencial da Nvidia perante competidores, como ASML e a AMD?

Marcio Aguiar: Vemos empresas desenvolvendo chips como a Nvidia, mas nenhuma tem bibliotecas como a nossa. Estamos onde estamos hoje não por conta de um ano, mas porque estamos há 16 anos otimizando o nosso sistema. Nenhuma outra companhia tem um ecossistema tão amplo.

Valor Investe: Como estão tratando a expansão de capacidade com a TSMC, já que há muito mais demanda do que conseguem suprir?

Marcio Aguiar: A TSMC (empresa taiwanesa que fabrica os chips da Nvidia) tem compromissos não apenas conosco, mas também com outras empresas tecnologia. Hoje todos os provedores de computação na nuvem firmaram compromissos conosco e receberam um cronograma de entrega. As empresas que não fizeram isso vão demorar mais para receber nossas soluções, mas elas não precisam do nosso último hardware. Não temos apenas um modelo de chip.

Portanto, não estamos deixando de atender ninguém: sabemos como dosar e controlar a demanda. Gostaríamos muito de entregar nossos produtos mais rapidamente aos clientes, mas todos querem comprar conosco. É por isso que nossas ações seguem crescendo.

Valor Investe: A Nvidia teme as tensões comerciais entre Estados Unidos e China?

Marcio Aguiar: A tensão entre os Estados Unidos e a China acontece no nível governamental. A China continua sendo um grande cliente nosso: suas universidades compram muitas das nossas soluções. Tensões geopolíticas restringem a venda de alguns de nossos modelos de GPUs no país e limitam o crescimento por lá. Mas como temos tecnologia que atende vários mercados e países, não dependemos da China. Como uma empresa americana, vamos trabalhar dentro das regulamentações impostas.

Valor Investe: Aonde acreditam que possam chegar?

Marcio Aguiar: Não é uma bolha. A IA moderna tem 12 anos, e acreditamos que estamos no meio de uma nova revolução industrial, que vai tirar proveito de técnicas de inteligência artificial para fazer com que grandes empresas sejam mais produtivas e competitivas no mercado em que atuam. Todo mundo já usa diversas técnicas de IA no dia a dia, cujo objetivo é acelerar o processo de entrega das informações.

Hoje, conseguimos ajudar empresas, como a Embraer e a Volkswagen, a realizarem cálculos de aerodinâmica na fabricação de seus aviões e carros, bem como fazer testes em um ambiente digital. Também auxiliamos a Petrobras a melhorar a perfuração de poços de petróleo, que é muito cara se feita de maneira errada. Ajudamos ainda farmacêuticas a criar medicamentos neste mesmo ambiente, dispensando o uso de cobaias, como animais.

No mercado financeiro, bancos, seguradoras e fintechs estão usando essas técnicas para melhorar o seu relacionamento com clientes, gerenciar melhor o perfil de crédito na carteira e calcular a probabilidade de um cliente bater o carro, por exemplo.

Acreditamos que nossas soluções possam ser importantes no setor de saúde. A máquina não vai substituir o profissional, mas poderá auxiliá-lo no diagnóstico, compará-lo a outros e antever problemas, até mesmo ajudando a indústria farmacêutica a aprimorar medicamentos.

O robô será manuseado por um humano, que irá validar resultados e, dessa forma, analisar melhor as informações. O seja, será capaz de fazer muito mais do que fazia antes.

Marcio Aguiar, diretor da divisão de empresas da Nvidia para a América Latina — Foto: Nvidia/ Divulgação
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