Saúde & bem-estar
 

Por Amanda Moraes


Sofrer um aborto nunca é algo fácil de lidar. Além do doloroso vazio que fica e das muitas preocupações que cercam a mulher, levantamentos recentes também alertam que este acontecimento pode literalmente mexer com o coração. Segundo uma revisão de dados realizada em 2022, que reuniu 22 estudos de todo o mundo, envolvendo mais de quatro milhões de mulheres, ter dois ou mais abortos espontâneos está associado a um aumento significativo no risco de doença cardíaca coronária no futuro.

Perdas gestacionais podem ser um sinal para a saúde do coração (Foto: Thinkstock) — Foto: Crescer
Perdas gestacionais podem ser um sinal para a saúde do coração (Foto: Thinkstock) — Foto: Crescer

As descobertas foram publicadas pela revista European Heart Journal. Além disso, foi relatado que ter um bebê natimorto está associado a um maior risco de doença cardiovascular e derrame. Outras pesquisas também chegaram ao mesmo resultado. Uma revisão das evidências publicadas na revista britânica The Lancet, em 2021, concluiu que o aborto de repetição era um "previsor de problemas de saúde de longo prazo", incluindo condições cardíacas e coágulos sanguíneos.

Neste mesmo ano, um estudo baseado em dados de mais de 100.000 mulheres nos EUA descobriu que aquelas que tiveram três ou mais abortos espontâneos, ou um aborto espontâneo antes dos 24 anos, tinham maior probabilidade de morrer antes dos 70 anos - e isso foi "principalmente resultado de um maior risco de morte por doença cardiovascular", escreveram os autores na revista The British Medical Journal (The BMJ), do Reino Unido.

Também em 2021, especialistas recomendaram que ter um aborto espontâneo seja considerado uma informação importante para os médicos perguntarem ao fazer exames de saúde do coração. “O histórico da gravidez deve ser parte integrante da avaliação do risco cardiovascular”, escreveram no European Heart Journal.

Qual é a relação entre o aborto espontâneo e as doenças cardíacas?

Uma gravidez pode ser interrompida espontaneamente por diversos motivos e as causas podem ser tanto ligadas ao feto quanto à gestante. “Quando a mãe tem doenças que afetam o desenvolvimento do feto, como hipertensão, diabetes, trombofilia, hiper e hipotiroidismo, doenças infecciosas ou obesidade, por exemplo, pode favorecer a perda gestacional”, explica Clarissa Thiers, presidente do Departamento de Cardiologia da Mulher da Sociedade de Cardiologia do Rio de Janeiro (SOCERJ).

Segundo a especialista, é preciso observar condições como estas com muita atenção durante a gravidez. “A paciente que tem risco para doença cardiovascular também é a paciente que vai ter um risco maior de aborto. Controlar estes fatores, ter um acompanhamento cardiológico e investigar tanto antes quanto durante a gestação pode ter um impacto, não só para o bebê, mas também para o futuro dessa mulher”, destaca.

Além disso, as mudanças hormonais podem ser uma outra possível explicação para a relação entre perdas gestacionais e condições do coração. “Durante a gravidez, no puerpério ou após uma perda gestacional, a mulher está sob risco de doença cardíaca. As oscilações hormonais têm impacto na parede dos vasos arteriais, o que pode fazer a mulher enfartar. Normalmente isso ocorre por dissecção espontânea da coronária, e a afetada mais frequentemente é a artéria descendente anterior, que é a coronária mais importante do coração”, diz Clarissa Thiers.

De acordo com a cardiologista, o estresse crônico e agudo também é um fator que deve ser levado em consideração. “Uma perda gestacional, principalmente se a paciente não teve a experiência de uma gestação prévia saudável, aumenta claramente o estresse e aumenta a chance de ter outras perdas gestacionais”, afirma.

O estresse impacta o organismo fortemente. “Ele aumenta o nível de cortisol, reduz a imunidade, tem maior risco de obesidade durante a gestação ou mesmo antes dela - porque a mulher começa a ter compulsões -, aumenta a ansiedade, os níveis tensionais e a frequência cardíaca, o que pode contribuir para riscos de doenças cardiovasculares”, ressalta Thiers.

Isso também foi comprovado cientificamente. Um estudo de 2018 realizado pela Universidade de Cambridge e publicado pela revista britânica Heart descobriu que as mulheres que nunca engravidaram e não têm filhos têm um risco menor de doença cardiovascular do que as mulheres que engravidaram e tiveram filhos. No entanto, o mesmo não aconteceu com as mulheres sem filhos, mas que sofreram perda gestacional. Segundo as análises, elas apresentaram 64% mais chances de desenvolver doenças cardíacas do que mulheres com um ou dois filhos.

“A perda da gravidez é um evento extremamente estressante que pode ter efeitos psicológicos anos após a gravidez”, escreveu Clare Oliver-Williams, pesquisadora da Universidade de Cambridge e autora do estudo. “Esse estresse, juntamente com algumas condições de saúde que podem tornar a gravidez mais desafiadora, podem explicar por que essas mulheres eram mais propensas a desenvolver doenças cardíacas”, completou.

Complicações contribuem para condições do coração

Além do aborto espontâneo, as complicações que podem ocorrer na gravidez também podem favorecer para doenças cadiovasculares. “A mulher que desenvolve hipertensão gestacional, pré-eclâmpsia, eclâmpsia ou diabetes gestacional tem maior chance de ter AVC ou de ter insuficiência cardíaca no futuro, isto é, quando o coração tem dificuldade em relaxar”, explica Clarissa Thiers.

Segundo a especialista, é preciso ficar muito atenta aos sinais que aparecem ao longo da gravidez e investigá-los a fundo. “A gestação é como se fosse um ‘test drive’ para a mulher. Muito do que acontece durante a gestação prediz os eventos futuros. As complicações que aparecem dizem que esse organismo, sob estresse, não consegue dar conta como se esperaria de uma mulher jovem”, ressalta.

Sintomas de doenças cardíacas na mulher

“Existem vários gargalos, não só no Brasil como no mundo todo, em que as mulheres são sub-representadas nos estudos e ensaios clínicos sobre doenças cardíacas, que são a forma de buscar melhor evidência científica. Isso retarda tanto o diagnóstico quanto o tratamento”, diz Clarissa Thiers. Essa falta de conhecimento tem uma enorme repercussão para a saúde feminina. Em 2019, uma pesquisa realizada pela British Heart Foundation estimou que mais de 8.200 mulheres na Inglaterra e no País de Gales morreram ao longo de dez anos porque não receberam tratamento igual ao dos homens.

“As mulheres têm vários sintomas atípicos, por vários motivos. Existem questões hormonais envolvidas, a coronária é menor do que a dos homens…Aquela dor no peito tradicional, que pode irradiar para o braço esquerdo, nem sempre acontece na mulher”, destaca Thiers. Os sintomas são diferentes e, por falta de estudo, podem não ser facilmente identificados, nem mesmo pela equipe médica.

Um enjoo ou uma fadiga incomum podem ser sinais de que algo não vai bem com a saúde do coração da gestante, por exemplo, como explica Clarissa Thiers. “É normal que as gestantes sintam muito cansaço durante a gravidez. Mas muitas vezes, é negligenciado. Em casos extremos, é preciso ser investigado, porque você pode descobrir que está relacionado a uma doença cardíaca subjacente”, completa. Dor no pescoço, nos ombros, no rosto, na mandíbula, falta de ar e palpitações são outros sintomas a ficar alerta.

As mulheres também possuem algumas condições características. “Uma das peculiaridades das mulheres é a síndrome do coração partido, como é conhecida popularmente, que acontece quando os ventrículos do coração não contraem corretamente, simulando um infarto, mas na verdade, as coronárias não estão obstruídas”, diz a cardiologista.

Segundo ela, a mulher tem muito mais doença microvascular, ou seja, o comprometimento da coronária nos vasos menores. “Se fizer exames, não vai ver obstruções tão significativas. Mas se não tiver placas obstruindo os principais vasos coronarianos, não significa que não exista doença no final da circulação. Ela pode ter dor, sim, outros exames podem mostrar as alterações”, destaca.

Outro empecilho para o diagnóstico de doenças cardíacas em mulheres, de acordo com Thiers, é a romantização da figura feminina. “É relativamente frequente a gente ter o cenário da mulher ser a cuidadora e se auto negligenciar. Ela demora mais para procurar assistência, a gente vê isso na prática lá no Instituto Nacional de Cardiologia. E, muitas vezes, quando ela procura, os sintomas são negligenciados pela equipe. A gente precisa desconstruir a imagem de que um paciente coronariopata é um homem idoso, obeso. Pode também ser a mulher jovem, a mulher de meia idade”, ressalta Clarissa Thiers.

Prevenção de doenças cardíacas após um aborto

“O primeiro passo quando uma paciente tem um aborto é confortá-la e dizer que abortos espontâneos são muito comuns, praticamente mais da metade das mulheres vão experimentar em algum momento da vida, e um primeiro aborto nem sempre prevê abortos futuros”, diz Thiers. Não é possível prevenir uma perda gestacional, mas é possível prevenir algumas doenças cardiovasculares. “Quando algo assim acontece, é uma grande oportunidade de rever o estilo de vida e fazer aconselhamento adequado”, completa.

É importante que a mulher busque uma assistência médica de confiança para mapear os riscos e entender o que deve ser melhorado. “É preciso ter avaliação de rotina, não precisa esperar chegar na menopausa para poder fazer o check-up. Principalmente se tiver histórico de abortos de repetição ou de trombose na família, merece a investigação”, afirma.

Além disso, há várias recomendações mais simples que podem ser implementadas no dia a dia que fazem a diferença. “Praticar atividade física é indispensável para uma boa saúde cardíaca. Ajuda a ter um bom controle do metabolismo e baixar o nível dos hormônios do estresse, como o cortisol”, explica a cardiologista. Uma boa rotina de sono também é muito importante, pois contribui para reduzir os riscos de hipertensão e obesidade, segundo a especialista. “Outra recomendação é evitar o consumo excessivo de álcool, energéticos e cigarro”, acrescenta.

Por fim, não se pode deixar de lado o psicológico e as emoções. “Manter a saúde mental em dia é fundamental, pois diminui o nível de estresse, reduz esses hormônios que aceleram o coração e aumentam a pressão, melhora a imunidade e muda, inclusive, a relação com a comida”, finaliza Clarissa Thiers.

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