Nutrição

Por Por Yara Guerra


A BARF faz parte da alimentação não convencional natural e nutre os cães a partir de ossos, vísceras, fruas e vegetais crus — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Syed Ahmad)
A BARF faz parte da alimentação não convencional natural e nutre os cães a partir de ossos, vísceras, fruas e vegetais crus — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Syed Ahmad)

Para responder a esta pergunta, devemos antes voltar um passo e entender a diferença entre a alimentação convencional e a não convencional.

Tudo aquilo que não é historicamente tradicional na dieta de pets, como rações secas e sachês, é considerado não convencional. Entra neste grupo o que se entende por alimentação natural: refeições elaboradas que utilizam ingredientes da natureza – como carnes, vísceras, vegetais, frutas e suplementos minerais – para nutrir o animal.

Segundo Laura Amorim, médica-veterinária especialista em nutrologia animal e alimentação natural, incorporar este tipo de dieta não é a mesma coisa que misturar aleatoriamente alguns alimentos naturais à ração sem orientação, e nem o mesmo que misturar restos de comida ao prato do animal.

"A alimentação natural deve ser feita de maneira séria e com conhecimento. Ela pode ser prescrita individualmente por um zootecnista ou médico veterinário especializado em nutrição, caso o tutor tenha interesse de preparar tudo em casa, ou comprada pronta através de empresas que tenham acompanhamento com um profissional especializado", diz.

A alimentação natural pode ser mais atrativa e palatável para os animais — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Louis Hansel)
A alimentação natural pode ser mais atrativa e palatável para os animais — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Louis Hansel)

Defensora da alimentação natural, Laura explica que a relação entre esta dieta e a ração é como comparar um copo de suco a um comprimido de vitamina C. Necessário para o organismo, o composto orgânico às vezes precisa ser suplementado em forma de comprimidos, mas o caminho mais saudável e saboroso de obtê-lo é, por exemplo, bebendo um copo de suco de acerola.

"A vitamina C vai ser melhor absorvida e junto dela virão vários outros tipos de vitaminas, antioxidantes, hidratação, fibras e propriedades benéficas que somente um alimento natural teria. Exatamente a mesma coisa pode ser observada entre os alimentos naturais e a ração comercial. Infelizmente, a maioria dos alimentos secos para animais são vendidos com a proposta de ter 'tudo' o que eles precisam, mas falham ainda em coisas simples, como a grande (e desnecessária) presença de grãos na composição, uso de conservantes e corantes, excesso de sódio e uso de subprodutos animais (resíduos animais que sobram da indústria alimentícia humana)", comenta Laura.

Para a especialista, isso acontece porque a indústria deseja que o alimento seja barato e possa ser armazenado fora da geladeira por muitos meses. "Não é que a ração 'faça mal', mas, com certeza, está longe de ser o melhor tipo de dieta", ela acrescenta.

Em contrapartida, a alimentação natural, de acordo com Laura, oferece uma dieta adequada e melhora todos esses pontos que podem ficar a desejar em alimentos convencionais.

É possível melhorar a qualidade das proteínas, diminuir a proporção de carboidratos, além de não usar conservantes e corantes. Mas o mais atrativo desta dieta talvez esteja no sabor: os alimentos utilizados podem ser frescos e mais palatáveis para os bichos.

De acordo com Sylvia Angélico, veterinária especialista em nutrição animal, alimentação natural é hoje um termo abrangente que se opõe a todas as dietas que não são processadas industrialmente e que não são transformadas em um produto irreconhecível, como é o caso da ração – que, independente da composição, tem sempre a mesma aparência.

"Há a alimentação natural crua, com ossos, sem ossos, cozida, vegana, vegetariana, comercial, entre outras. São dietas que utilizam ingredientes frescos e variados minimamente processados; preparados como a gente faz em casa. Cada modalidade tem as suas regras, o seu sistema, a suplementação indicada e os resultados que se pode esperar de cada uma", explica.

BARF? O que é isso?

A BARF utiliza no cardápio alimentos crus, como vísceras, carnes, ossos, legumes e frutas — Foto: ( PxHere/ Domínio Público/ CreativeCommons)
A BARF utiliza no cardápio alimentos crus, como vísceras, carnes, ossos, legumes e frutas — Foto: ( PxHere/ Domínio Público/ CreativeCommons)

Agora que explicamos o que é a alimentação natural e como ela funciona, podemos entrar no mundo da BARF – ou biologically appropriate raw food, em inglês.

A tradução pode ser entendida como dieta crua biologicamente adequada, ou seja, trata-se nada mais do que uma alimentação baseada no uso de carnes, órgãos e ossos comestíveis crus, além de uma pequena adição de vegetais e sementes na dieta.

Assim, a BARF é um dos grupos englobados pelo que se entende por alimentação natural. O que a difere das demais é que, nela, se utiliza ossos e itens crus como itens do cardápio e toda a suplementação é feita com alimentos.

Este tipo de refeição surgiu no final dos anos 1980, quando o veterinário australiano Ian Billinghurst publicou um livro explicando o seu sistema. A ideia dele era tentar imitar a composição e o perfil de macronutrientes – proteína, gordura, vegetais – da dieta dos ancestrais do cão selvagem. Em outras palavras, Billinghurst objetivava que a alimentação de cães modernos fosse o mais semelhante possível ao que um lobo ou coiote comeriam na natureza.

Benefícios da BARF

A dieta crua biologicamente adequada busca se assemelhar à alimentação dos ancestrais dos cães, como lobos e coiotes — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Usman Yousaf)
A dieta crua biologicamente adequada busca se assemelhar à alimentação dos ancestrais dos cães, como lobos e coiotes — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Usman Yousaf)

Segundo Sylvia, a alimentação crua biologicamente adequada é uma dieta de baixo índice glicêmico. Daí derivam alguns benefícios para os animais:

"Como os cães vão secretar menos insulina, eles vão ter uma glicemia melhor controlada. Isso ajuda a manter a inflamação em cheque, a manter a massa magra e a diminuir quadros de dor. Ajuda também a manter o peso enxuto naturalmente, mas claro que o tutor continuará precisando controlar a ingestão calórica. É uma dieta rica em enzimas, o que gera um efeito pró-digestivo e anti-inflamatório, e também rica em antioxidantes por causa dos ossos. Se eles forem oferecidos em pedaços que o cão consiga mastigar, podem fornecer uma limpeza dentária contínua e diária, ajudando a raspar o tártaro e a desorganizar a placa bacteriana que vai se acumulando sobre os dentes. É uma dieta que resulta em fezes pequenas, de pouco cheiro, porque apresenta alta absorção e digestibilidade. Além disso, como toda alimentação natural, a BARF é rica em água", explica.

Nem tudo que é bom para o pet do outro é bom para o meu

Como na BARF, os lobos (de quem cachorros descendem) se alimentavam de itens crus encontrados na natureza — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Yannick Menard)
Como na BARF, os lobos (de quem cachorros descendem) se alimentavam de itens crus encontrados na natureza — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ Yannick Menard)

Apesar dos inúmeros benefícios defendidos pelas veterinárias, a BARF pode não ser indicada para alguns cães. É o caso daqueles que não podem receber dietas com alto teor de proteína ou gordura, já que estamos falando de uma dieta que, geralmente, apresenta teor lipídico moderado.

Assim, bichos com linfangiectasia, pancreatite, hepatite ou outra condição renal ou problemas com gordura devem evitar este tipo de alimentação.

Além disso, se o cachorro for alérgico ou tiver intolerância a algum alimento conhecido, é preciso tirar este item da dieta ou adaptá-la para o quadro específico.

A especialista Laura Amorim não indicaria a BARF para pets idosos de focinho curto. As particularidades de cada animal devem ser consideradas — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ JC Gellidon)
A especialista Laura Amorim não indicaria a BARF para pets idosos de focinho curto. As particularidades de cada animal devem ser consideradas — Foto: ( Unsplash/ CreativeCommons/ JC Gellidon)

Laura explica ainda que existem modalidades de dietas que "combinam" melhor com certos pacientes.

"Por exemplo, ao atender um cão idoso, de focinho curto e porte pequeno, eu raramente indicaria uma modalidade de dieta crua e com ossos. Não que seja completamente impossível usar esse tipo de cardápio, mas, por questões anatômicas, possível desgaste dos dentes causado pela idade e até mesmo pela aceitação dos tutores, eu acharia mais indicado começar com uma dieta natural cozida, de textura pastosa", diz.

Já quando atende cães de porte médio ou grande e com o crânio longo, é comum que os tutores a procurem bem interessados em uma dieta crua e com ossos. Essa modalidade de dieta costuma ter valor mais acessível e preparo mais rápido, o que pode ser crucial em famílias com animais maiores, especialmente se for mais de um.

"Também atendo pacientes cuja família preferiu um cardápio misto, usando rações de qualidade associadas a alimentos naturais e complementos alimentares, e isso também pode ser uma forma excelente de melhorar a nutrição e qualidade de vida sem mudar muito a rotina dos tutores. No fim, tudo vai depender do que conversamos na nossa consulta e das necessidades de cada paciente. Não existe uma regra absoluta", explica a especialista.

Quero trocar a alimentação do meu cachorro de convencional para BARF. O que devo fazer?

A suplementação natural deve ser iniciada somente quando o cão estiver 100% adaptado à BARF — Foto: ( Pexels/ Pixabay/ CreativeCommons)
A suplementação natural deve ser iniciada somente quando o cão estiver 100% adaptado à BARF — Foto: ( Pexels/ Pixabay/ CreativeCommons)

Antes de tudo, conversar com um ou mais médicos veterinários especialistas em nutrição ou nutrologia animal. Isso porque a transição entre as dietas pode ser sofrida para os bichos, que podem apresentar diarréias, vômitos, desconfortos e alergias.

Além disso, cada animal vai demandar um preparo, suplementação e quantidade diferentes, de acordo com o seu porte, gasto energético e particularidades. Portanto, é de suma importância que o processo seja acompanhado por um profissional qualificado – nada de começar a oferecer alimentos crus de repente.

"A alimentação natural pode ser benéfica para qualquer animal e em qualquer fase da vida, e no final das contas quem vai decidir a modalidade de dieta é o tutor. Meu papel será fornecer o cardápio mais adequado para o animal e seus possíveis problemas de saúde, dentro do que a família espera", diz Laura.

A transição entre a alimentação convencional e a natural deve ser feita de forma gradual para proteger a saúde do cão — Foto: ( Pexels/ MART PRODUCTION/ CreativeCommons)
A transição entre a alimentação convencional e a natural deve ser feita de forma gradual para proteger a saúde do cão — Foto: ( Pexels/ MART PRODUCTION/ CreativeCommons)

Sylvia também indica que esta transição seja feita de forma gradual. "O tutor deve levar uns 7 ou 10 dias, pelo menos, para ir introduzindo a nova dieta aos poucos, fazendo uma substituição gradual. Por exemplo, se hoje ele põe 10% da alimentação natural, deve reduzir a dieta industrializada proporcionalmente. Se não for apresentada nenhuma reação cutânea ou gastrointestinal grave, no dia seguinte é possível adicionar 20% de AN e reduzir, de forma proporcional, a ração. E daí em diante", sugere.

Quanto à suplementação, a especialista indica somente começar quando o cachorro já estiver 100% adaptado à nova dieta. Neste momento, a inserção também deve ser gradual, inserindo um suplemento por dia, como cápsulas de óleo de peixe ou vitaminas, até estarem todos presentes.

"Eu também recomendo evitar alguns alimentos que são mais problemáticos para começar, como abóbora, berinjela, inhame, quiabo, fígado de frango (o de boi é melhor tolerado), sardinha, ovo cru… esses são itens que podem soltar o intestino e que precisam ser testados devagar para que não se tenha problemas", explica Sylvia.

O processo de transição e a dieta BARF devem sempre ser acompanhados e orientados por um especialista — Foto: ( Pexels/ Samson Katt/ CreativeCommons)
O processo de transição e a dieta BARF devem sempre ser acompanhados e orientados por um especialista — Foto: ( Pexels/ Samson Katt/ CreativeCommons)

Para animais mais sensíveis, é interessante considerar também o uso de probióticos uma semana antes de iniciar a BARF, de forma a preparar o microbioma intestinal para a mudança dietética vindoura.

"Apesar do tutor receber todas as orientações necessárias do profissional que irá te orientar, muito também depende de você. Sugiro sempre muita leitura e pesquisa sobre o tema e conhecer pessoas que já passaram por essas mudanças. Assim, você vai saber muito melhor o que esperar desse novo mundo – ele é apaixonante!", garante Laura.

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