Comportamento

Por Por Izabel Gimenez


Weena é da tribo Tikuna, localizada na Terra Indígena Tikuna Umariaçu no Amazonas — Foto: ( Arquivo Pessoal / Weena Tikuna)
Weena é da tribo Tikuna, localizada na Terra Indígena Tikuna Umariaçu no Amazonas — Foto: ( Arquivo Pessoal / Weena Tikuna)

Desde 1994, graças à iniciativa da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em 9 de agosto celebra-se o Dia Internacional dos Povos Indígenas. O objetivo da data é festejar a diversidade, levantar debates e conscientizar a população sobre a importância de manter condições de existência dignas aos povos e a preservação da cultura nativa.

Talvez você não saiba, mas diversas palavras e costumes comuns hoje em dia sofreram influência do contato entre portugueses e as tribos naturais da região. O legado deixado transformou e criou a cultura brasileira que conhecemos atualmente. Muito além disso, esta interação e os ensinamentos ancestrais propostos pelos Povos nos faz refletir, mesmo depois de todo esse tempo, sobre a relação dos humanos com a natureza e os animais.

Pensando nisso, o Vida de Bicho convidou quatro indígenas para contar sobre a sua relação com o ecossistema, seus aprendizados e experiências vivenciadas a partir do convívio intenso com diferentes espécies.

Weena, da Terra Indígena Tikuna Umariaçu, no Amazonas, leva a conexão com os bichos em seu nome, que em português, significa “a onça que nada para o outro lado no rio”. “Desde pequena fui ensinada, por meus avós e pais, que os animais eram professores. Nós aprendemos a nos alimentar na natureza. A comida deles é a nossa comida. Todos os nossos rituais e tradições envolvem essa conexão com os bichos.”

Os pais de Weena criaram uma comunidade indígena em Manaus para que os filhos tivessem boas oportunidades de estudo, sem perder os costumes e a tradição de povo originário — Foto: ( Arquivo Pessoal / Weena Tikuna)
Os pais de Weena criaram uma comunidade indígena em Manaus para que os filhos tivessem boas oportunidades de estudo, sem perder os costumes e a tradição de povo originário — Foto: ( Arquivo Pessoal / Weena Tikuna)

A tribo Tikuna é divida em 12 clãs, cada um nomeado por uma espécie de planta ou animal diferente. “Nós as retratamos em nossas danças. Usamos máscaras e maquiagens em rituais de passagem, com vestimentas que se relacionam com a simbologia de cada clã. Minha pintura, por exemplo, é de onça. Mas existem aqueles que usam penas para simbolizar araras, gaviões e por aí vai. Nossas artes são diferentes para que a gente possa se identificar.”

Ao contrário da experiência de muitos tutores, Weena não acredita na prisão dos bichos. Seus “pets” ficam livres na natureza e voltam quando sentem vontade. “Na minha casa, no Amazonas, temos muitos macacos. Eles vão até ali, ficam um pouco com a gente e depois voltam para a vida livre. Nenhum animal deveria viver preso em gaiola. Eles precisam estar felizes em seu lar, a floresta, e nós damos amor para que eles queiram nos visitar”, finaliza.

Valdelice Veron, do povo Kaiowa, por outro lado, ajudava animais machucados e os mantinha como pet. Nhapykani, a águia, foi sua fiel companheira por anos na aldeia Bororó, no Mato Grosso do Sul. “Lembro de ter entre 7 e 8 anos e recebê-la no ombro quando chegava em casa da escola. Buscava por minhocas, porque sabia que ela gostava, para dar de lanche. Era como se a gente tivesse uma conexão - quando estava triste, ela descia e vinha me lamber para secar minhas lágrimas. Quando estava feliz, ela voava para longe. Quando tinha saudade, ela voltava para mim.”

Mais tarde, a doutora em antropologia também teve uma onça-pintada de estimação, vítima das queimadas na região. A mãe, na tentativa de salvar seu filhote, morreu. E a pequena ganhou uma nova família, a de Valdelice. “Eu a chamava de miau. Nós caçávamos juntos, ela me lambia, dormia comigo e me aquecia. Mais tarde, quando cresceu, a soltamos na natureza. A vida é assim”.

Valdelice Veron é da tribo Kaiowá, localizada estado do Mato Grosso do Sul. Junto com os Guaranis formam o segundo maior povo indígena atualmente — Foto: ( Arquivo Pessoal / Valdelice Veron)
Valdelice Veron é da tribo Kaiowá, localizada estado do Mato Grosso do Sul. Junto com os Guaranis formam o segundo maior povo indígena atualmente — Foto: ( Arquivo Pessoal / Valdelice Veron)

Cutia, papagaio, ema e outras vítimas de violência viravam animais de estimação da família. “Esse contato verdadeiro e sem medo da natureza é transformador. No rio, por exemplo, ainda tinham jacarés e outras espécies que dividiam espaço com a gente. Nós não podíamos atirar, matar e mexer com esses animais. Quando tem desmatamento, as divindades choram com estas perdas.”

Valdelice conta que o principal ensinamento passado de uma geração para outra pelo povo Kaiowa diz que os seres, independente de quem seja, merecem ser respeitados.

“Os bichos que vivem embaixo da terra, em cima, os do mato, do serrado, dos mares, as plantas, não importa. Todas as vidas dependem uma da outra para sobreviver. Eles dependem da floresta, do rio, do mato, e cada uma tem sua representação simbólica para o povo Kaiowá.”

Jander Massi, indígena da Reserva de Dourados Jaguapiru (MS), entende a relação com os animais como algo cultuado desde seus ancestrais. O Povo Terena, do qual faz parte, acredita que a união da tribo aconteceu devido a um bem-te-vi e Oreka Yuvakea, um homem conhecido por poucos.

A história diz que ninguém sabia bem sua origem. Ele andava caminhando pelo mundo. Um dia, durante um dos passeios, avistou um passarinho olhando com medo para o chão. Era o bem-te-vi. Por curiosidade, o homem chegou perto do animal e viu um feixe de capim. Embaixo havia um buraco, onde estava alocada uma multidão - eram os Povos Terenas, trêmulos e calados. Oreka Yuvakae os tirou da fresta, os conectou com os bichos e os salvou.

Jander faz parte do Povo Terena, etnia localizada em pontos no Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e São Paulo — Foto: ( Instagram / @janderterena / Reprodução)
Jander faz parte do Povo Terena, etnia localizada em pontos no Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e São Paulo — Foto: ( Instagram / @janderterena / Reprodução)

Jander ainda conta que outras lendas relacionam os Terenas com os animais. “A nossa mitologia explica a origem de nosso povo, justifica a permanência de alguns aspectos culturais, crenças e superstições. Acreditamos que quando um bem-te-vi pousa na cumeeira da casa de uma Indígena, por exemplo, ele anuncia que ali dentro tem uma nova vida, ou seja, uma mulher está grávida.”

Outro exemplo citado pelo dentista diz que os pets são capazes de proteger e afastar seus tutores de coisas ruins. “Eu tenho a Iyly, uma cachorra. Ela representa um elo de amizade e companheirismo para mim. Ter sido criado na aldeia me fez aprender a importância da terra e como devemos valorizá-la. Este contato fez com que eu me conectasse com minha ancestralidade.”

Val Eloy, também do Povo Terena, define a natureza como a vida para os Povos indígenas. “A nossa relação com os animais tem um sentido sagrado. Alguns deles são, inclusive, representados dentro da cosmologia de cada povo. Uma de nossas danças tradicionais, por exemplo, envolve a ema, chamada de Kipaé na nossa língua materna. Nós reproduzimos seus passos - longos e sutis -, enquanto narramos a história do Paraguai. Esse movimento representa a guerra e a defesa.”

Val Eloy também faz parte do Povo Terena. A pré-candidata a deputada estadual vive no Mato Grosso do Sul — Foto: ( Instagram / @valeloyms / Reprodução)
Val Eloy também faz parte do Povo Terena. A pré-candidata a deputada estadual vive no Mato Grosso do Sul — Foto: ( Instagram / @valeloyms / Reprodução)

Val sempre conviveu com os bichos de sua mãe e os de vida livre que compartilham espaço com sua tribo. “Crescer na aldeia faz com que a gente se conecte mais com este lado. Aprendemos que cada canto dos pássaros representa um sinal, como um aviso. Zeus, Tom e Jolie, nossos pets, me ensinaram sobre lealdade e companheirismo. Os cachorros não se separam de seus donos nem por um instante. Para eles existe um único amor, faça chuva ou faça sol”.

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