Malu Gaspar
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A contadora de histórias Nyedja Gennari, que viralizou nas redes sociais após encenar um feto gritando durante um procedimento abortivo em uma sessão de debates do Senado Federal sobre o PL do aborto na última segunda-feira (17), registrou um boletim de ocorrência na Polícia Legislativa por ameaças recebidas na internet contra ela e suas filhas.

Nyedja foi ao Congresso convidada pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), um dos organizadores da audiência, para contar a história de um feto que havia passado por três tentativas malsucedidas de aborto e que, por fim, teve sua gestação interrompida em um quarta.

A sessão foi convocada no contexto do projeto de lei 1904/2024, o PL Antiaborto, que equipara o aborto após a 22ª semana ao crime de homicídio. O objetivo era debater a assistolia fetal, método abortivo adotado para gestações superiores a esse período. Na cena que viralizou nas redes, Nyedja se joga no chão e grita “me deixem viver”.

Além de bastante criticada, a interpretação irritou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), como mostrou O GLOBO.

Nyedja é professora da rede de educação do Distrito Federal e assessora especial da vice-governadora do DF, Celina Leão (PP), além de já ter trabalhado no gabinete do senador Izalci Lucas (PL-DF). Ela conta que já fez diversas performances a pedido de parlamentares e que não costuma cobrar porque usa a projeção que tem para contratos fora do Congresso.

A equipe do blog teve acesso ao boletim de ocorrência registrado por ela na Secretaria de Polícia do Senado com a transcrição das mensagens com ameaças.

“Vou dar uma injeção letal no coração de suas filhas para parar de defender estuprador”, diz uma delas. “Vou te esbofetear”, afirma outra.

Outra mensagens publicadas em seu perfil após o registro da ocorrência desejava sua morte em alusão ao seu diagnóstico de cavernoma cerebral, divulgado nas suas redes sociais. Nyedja afirmou ainda que suas duas filhas, de 20 e 22 anos, estão abaladas emocionalmente com as ameaças

“As pessoas acham que estão protegidas por uma tela. Se a gente fala tanto em democracia, e digo pela própria esquerda, porque quem está me atacando são pessoas de esquerda, será que a verdadeira democracia que a gente quer para o país é aquela cheia de ódio?”, disparou.

À equipe do blog, Nyedja admitiu ter se arrependido de participar da sessão e se defendeu dizendo que a encenação não emitiu juízo de valor sobre o PL do aborto.

“Ontem assisti no Fantástico [da TV Globo, que exibiu matéria sobre o PL] e cheguei a brincar em casa. ‘Nossa, será que vou contar essa história?’. Mas de forma inocente ou burra, não sei te dizer, pensei: vou! Até porque sou mulher, defendo mulheres, e quem me conhece minimamente sabe que já me apresentei no Congresso e na Câmara Legislativa [do DF] pelo menos umas cem vezes contando outras histórias”, relatou à equipe do blog.

“Mas não defendi em momento nenhum o PL”, ressaltou.

Apesar disso, a contadora de histórias disse ter recebido mensagens de solidariedade de parlamentares de esquerda e também da direita, sem detalhar quais, pelo seu histórico de atuação nas Casas Legislativas em Brasília.

Histórico no Senado

Ela alegou ainda não ter recebido cachê para interpretar o feto no plenário do Senado. Segundo Nyedja, o convite do senador Girão ocorreu na semana passada e o roteiro foi acertado com o parlamentar.

Em novembro passado, ela participou de outra encenação sobre aborto a convite do parlamentar cearense, que não chegou a viralizar nas redes, durante uma sessão de debates convocada pela oposição para criticar o “ativismo judicial” meses após o Supremo Tribunal Federal (STF) pautar a descriminalização do procedimento.

Já a decisão de participar sem ganhar pela apresentação, ainda de acordo com ela, está ligada à visibilidade garantida pelas TVs legislativas – que, nas suas palavras, já lhe abriu muitas oportunidades de trabalho – e a uma experiência pessoal.

“Uma de minhas filhas nasceu prematura, com 24 semanas, e lutou muito para viver. Vi essa situação de perto em uma UTI”.

A contadora de histórias também se disse assustada pelo “cancelamento cruel” das redes e ressentida pelos reflexos do episódio.

“Sou uma mulher de 50 anos, mãe de duas filhas, alfabetizei crianças e adultos e, de repente, você vê todo um legado em jogo”, declarou Nyedja.

“O presidente do Conselho Federal de Medicina [José Hiran Gallo, um dos convidados da sessão] falou depois de mim e repetiu tudo que falei no texto [da encenação] sobre assistolia fetal, mas em uma linguagem técnica O presidente do CFM não foi atacado. A vice-presidente do CFM [Rosylane Nascimento], que teve uma fala extremamente explicativa, não foi atacada. Só eu”.

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