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Por Geiza Martins


Stephanie Ribeiro e Renata Corrêa (Foto: Arquivo pessoal) — Foto: Glamour
Stephanie Ribeiro e Renata Corrêa (Foto: Arquivo pessoal) — Foto: Glamour

Em tempos de textão nas redes sociais, estas mulheres não têm medo de apontar o que está errado, propagar o empoderamento feminino e oferecer ajuda a quem busca respeito e espaço. Como fazem isso? Principalmente pela internet!

As feministas 2.0 usam todos os recursos pra espalhar valores de igualdade de gêneros, denunciar abusos, combater injustiças, modificar pensamentos e, acima de tudo, criar uma rede forte pra mostrar que não estamos sozinhas. Você simpatiza com essas questões mas ainda não acompanha o movimento? Então conheça estas quatro mulheres e abra a mente pra questões que talvez ainda não tenha parado pra pensar...

Renata Corrêa aka Letra Preta
É carioca, tem 32 anos, mora no Rio de Janeiro, mas já passou uns bons anos em São Paulo. Roteirista, é dela o roteiro do documentário “Clandestinas”, sobre mulheres que já realizaram aborto. É também escritora, lançou em 2015 o livro “Vaca e Outras Moças de Família”. Tem 7,5 mil seguidores no Facebook e quase 4 mil no Twitter. Atua principalmente nas redes sociais e no Medium. A temática? Empoderamento feminino e o direito ao próprio corpo.

Glamour: Renata, fale um pouquinho sobre sua bandeira dentro do feminismo?
RC: Defendo os direitos sexuais e reprodutivos. A maneira como a mulher se relaciona com o próprio corpo ainda não é livre, o exercício da sexualidade ainda é julgado e culpabilizado. Uma das faces mais cruéis disso é o aborto ainda ser crime no Brasil, fazendo com que milhões de mulheres caiam na ilegalidade todos os anos, tendo direitos básicos desrespeitados e colocando suas vidas em risco. Foi por isso que fiz o documentário “Clandestinas”, que traz depoimentos de mulheres que abortaram ilegalmente no Brasil. Quero que olhem essas mulheres e possam ver que elas poderiam ser suas amigas, suas irmãs, suas mães, namoradas.

G: Pra você, qual a importância do movimento feminista?
RC: É importante para que mulheres e meninas não tenham mais medo de levantar as suas vozes e mostrar que existe uma perspectiva não hegemônica de como o mundo funciona. Mostrar que existimos como agentes de mudança, como produtoras de conteúdo artístico, político e intelectual contribui enormemente para que a sociedade se torne um espaço mais justo e igualitário para mulheres e homens.

G: O que espera alcançar?
RC: Minha expectativa é de ser uma multiplicadora, alguém que reverbera boas ideias e boas práticas. Muito do que eu falo não é novidade: outras mulheres já falaram antes de mim, mas tento deixar esse conteúdo cada vez mais acessível e próximo da realidade, seja no Facebook, no Instagram, no Twitter ou no Snapchat. Eu também lancei um livro chamado “Vaca e Outras Moças de Família”, apenas com protagonistas mulheres que discute o slut shaming [quando as pessoas ridicularizam uma mulher por ela tido algum tipo de comportamento sexual, como o tamanho da saia que usa, quanto sexo faz, etc] . Tenho tido feedbacks muito positivos a respeito.

G: Algo já mudou?
RC: Muito já mudou, é claro. Mulheres não podiam votar e até a década de 60, existia o estatuto da mulher casada, onde deveríamos pedir permissão para o marido até para fazer uma viagem e claro, a Lei Maria da Penha, uma das mais avançadas do mundo em matéria de punição da violência doméstica. Mas muito precisa avançar ainda. Vivemos um período político sombrio, onde o congresso é o mais conservador desde a ditadura militar e muitos dos direitos conseguidos pelas mulheres estão em risco. É preciso estar atenta para não perder o que conquistamos.

Stephanie Ribeiro, do Afronta
Aos 22, Stephanie estuda arquitetura em Campinas, mas nasceu em Araraquara, interior de São Paulo. Ela começou a falar sobre feminismo no blog Mulheres Notáveis, passou pelo Blogueiras Negras, Confeitaria, Capitolina, Imprensa Feminista até chegar no HuffPost, que é o veículo com o qual mais colabora hoje. Segundo Stephanie, tudo isso é resultado dos textões que sempre mandou no Facebook. Não à toa, a moça tem mais de 19 mil seguidores! Além disso, é uma das fundadoras do Afronta, um site que conta a história de mulheres negras sob a perspectiva das mulheres negras.

Glamour: O que você defende?
SR: Meu mote é o Feminismo Negro Interseccional. É a luta que defendo e que me contempla. Por isso, as minhas leituras, escritas e posições passam sempre por questões que envolvem a mulher negra na sociedade e, consequentemente, isso tem a ver comigo enquanto indivíduo. Porém, a partir do momento que compartilho meus anseios, se torna coletivo.

G: Fale um pouquinho sobre o Afronta.
SR: Quando criei com amigas o Afronta, um projeto sobre arte, sociedade e cultura, a ideia principal era contar a história de mulheres negras. Quando essas histórias se tornam públicas, criamos laços de mulheres negras para com mulheres negras. As histórias têm sempre pontos semelhantes, que unem esses indivíduos. Com o tempo, começamos a fazer uma galeria para expor o trabalho de artistas negros que admiramos e hoje temos um blog com contéudo diverso. Mas o foco principal é dar espaço as narrativas negras no campo que for.

G: Qual a importância de erguer essa bandeira?
SR: Enquanto mulher negra falando sobre a mulher negra e o negro no Brasil, consegui ocupar vários espaços que nunca imaginei ocupar. Em 2015, por exemplo, movimentamos via redes sociais um boicote a uma peça no Itaú Cultural por conta do blackface [prática teatral em que os atores se colorem com tinta preta para representar negros] usado por uma das personagens. Depois disso, o Itaú Cultural não só deu espaço para um debate sobre o negro e a sociedade, como hoje está criando um projeto envolvendo pensadores e artistas negros. Ou seja, uma empresa fez conscientização sobre racismo por conta de um texto meu, sobre expressões racistas. São coisas que não esperava que fossem acontecer.

G: E o que ainda espera alcançar?
SR: Tenho expectativa de ver mais e mais mulheres negras podendo falar por si e sendo ouvidas. Entendo que isso é uma revolução enorme na nossa sociedade. Mas eu sei que não é fácil, sei que o machismo e o racismo agem de uma forma que acreditamos que não somos capazes e nos faz sentir inferiores. Porém, a minha luta é essa, que as mulheres negras possam entender o poder que elas tem e construir suas narrativas.

G: Você já enxerga algumas mudanças?
SR: Acredito que sim, vejo mais mulheres negras se movimentando em redes sociais, blogs, textos, eventos, saraus etc. A questão é que precisamos difundir mais ainda essas narrativas. Tem muitas mulheres negras ainda silenciadas e sem apoio, principalmente as que não têm acesso as redes, universidade, etc. Temos de difundir mais e mais nossas narrativas. Sermos os exemplos e a representatividade para nós mesmas. Quem sabe, lutando dessa forma, pois isso tudo não deixa de ser difícil e até agressivo, conseguiremos viver numa sociedade onde a base da pirâmide, nós negras, tenhamos o mínimo.

Ana Paula Souza e Carol Patrocínio (Foto: Arquivo pessoal) — Foto: Glamour
Ana Paula Souza e Carol Patrocínio (Foto: Arquivo pessoal) — Foto: Glamour

Ana Paula Souza, fundadora do Lado M
Ela é do Belém do Pará e mora em São Paulo desde 2011, tem 23 anos. Foi pra SP aos 17, com o sonho de estudar jornalismo. Hoje, prestes a se formar, é a fundadora do Lado M, que criou em 2014. É no site que fala sobre empoderamento feminino, junto com um time de 30 colaboradoras. Elas criam textos, vídeos, ensaios fotográficos e campanhas com a temática feminista. Umas delas foi a #NãoQueroFlores, lançada no último Dia Internacional da Mulher. Você provavelmente viu (quem sabe até aderiu) no Facebook.

Glamour: Qual a bandeira que você defende no Lado M?
AS: O empoderamento feminino. Mostramos que as mulheres podem ser donas de si mesmas e fazer o que quiserem, independentemente dos tradicionais estereótipos de gênero; que as mulheres são mais poderosas do que elas imaginam e que todas nós - independentemente de nossas escolhas, cores, orientações sexuais, crenças etc - merecemos respeito.

G: Qual a importância de campanhas como #NãoQueroFlores?
AS: Temos uma média mensal de 200 mil visitas, sendo que 94% do público é formado por mulheres. A campanha #NãoQueroFlores, por exemplo, teve o objetivo de chamar a atenção para o machismo e para a desigualdade de gênero. Aparecemos em diversos veículos, tivemos um alcance de mais de 3 milhões de pessoas no Facebook e chegamos ao número 1 dos trending topics no Brasil no dia 8 de março. É fantástico saber que estamos conseguindo levar a mensagem do empoderamento para tantas mulheres.

G: Como sabe que esse tipo de campanha tem efeito prático?
AS: Todos os dias, nós recebemos mensagens. Algumas são mulheres que contam como um texto nosso mudou a vida delas, outras sofreram abusos e entram em contato com a gente pedindo ajuda para denunciarem os seus abusadores. Sendo assim, tão importante quanto levar a mensagem do empoderamento e propor questionamentos a respeito de como as mulheres são tratadas na sociedade, a importância também está em fazer com que as mulheres sintam que elas não estão sozinhas. Fazer com que elas percebam que, mesmo que tenhamos histórias de vida diferentes das delas, as angústias delas também são nossas e que, assim como elas, nós também queremos e lutamos para que todas as mulheres sejam respeitadas.

G: O que espera mudar?
AS: Empoderar as mulheres para que elas estejam em relacionamentos saudáveis consigo mesmas e com todo mundo que possa estar na outra ponta da linha dessa relação: seus parceiros/parceiras, seus familiares, suas amizades, suas carreiras, etc. A temática dos relacionamentos abusivos é a que mais me toca, porque envolve todas as questões de desrespeito em relação às mulheres. E não é só no âmbito de um namoro violento que resulta em casos de agressão, mas também, por exemplo, na maneira com que a sociedade lida com as mulheres e que faz com que elas desenvolvam relacionamentos abusivos consigo mesmas.

G: Acredita que algo já mudou?
AS: Sim. E eu digo isso não apenas pelas mensagens das leitoras que falam o quanto a gente mudou a vida delas, mas falo também por questões matemáticas: o nosso número de acessos e de seguidores nas mídias sociais é crescente. No mínimo, a gente tem conseguido atrair cada vez mais o interesse das pessoas para conteúdos relacionados ao debate em torno dos direitos das mulheres. E isso, para uma sociedade historicamente machista como a nossa, já é uma baita conquista.

Carol Patrocínio, da Comum.vc
A paulista de 31 anos, de Santo André (mas mora em São Paulo) é jornalista, mãe e tem mais de 6 mil seguidores no Twitter. Durante quase cinco anos, foi colunista no extinto blog “Preliminares”, em que abordava o feminismo. Hoje, compartilha suas ideias no Medium, nos textões no Facebook, no Snapchat (carolpatro) e no Brasil Post. Também é uma das fundadoras da “Comum.vc”, uma comunidade de fóruns e encontros que debatem o empoderamento feminino.

Glamour: Carol, o que você defende?
CP: O fim da desigualdade e papéis de gênero por meio da educação e troca de experiências, que podem se tornar políticas públicas. Não tenho um foco apenas. Acredito que tudo está ligado. A gente precisa educar os meninos com mais generosidade para que eles se tornem homens empáticos, precisa dar oportunidades a quem vive nas periferias, que são em sua maioria pessoas negras, precisa acabar com o genocídio dessa população.

G: Você tem algum projeto?
CP: Meu maior projeto é debater. Seja para gerar reflexão por meio dos textos, iniciar um papo no Facebook ou levar pessoas a me mandarem mensagens e e-mails com histórias e dúvidas. Meu dom é escrever, é me comunicar, criar espaços em que as pessoas se sintam à vontade para trocar e para isso qualquer lugar é lugar. Acredito que ir mudando quem está ao seu redor, sejam 10 ou milhares de pessoas, é sempre a melhor maneira de mudar as coisas. É preciso haver empatia e reconhecimento para haver mudança.

G: O que espera dessa luta?
CP:
Salvar quem tá em situação de risco. Muitas mulheres não sabem que podem deixar o companheiro agressor ou como fazer isso, outras não entendem os abusos que sofrem por serem mães solteiras e ficam vivendo em uma eterna prisão. E, no meio disso, há as pequenas agressões do dia a dia, as cobranças sociais que não nos deixam avançar. A expectativa é dar armas para que essas pessoas mudem suas vidas – e a cada vida mudada outras muitas vidas são impactadas. Dividir informação e lembrar que todas nós merecemos tudo de bom que existe é a maior arma que eu posso oferecer.

G: Algo já mudou?
CP:
Muito, na verdade. A gente está mais organizada, conseguimos questionar o que nos incomoda e conseguimos ajudar umas as outras. O olhar mudou também, a gente tem mais generosidade com a gente mesma e com a outra. É claro que ainda há um imenso caminho a seguir, ainda mais quando a gente pensa em políticas públicas, direitos reprodutivos, saúde da mulher negra e periférica. Mas a gente tá aprendendo a brigar e se armar, não vamos mais ficar caladas, e essa mudança é muito representativa.

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