Sugestões, sutileza, pequenos incentivos sem força cogente. Assim se caracterizam os nudges. Conhecidos como “empurrãozinhos”, os nudges se destacam por serem alternativas de baixo custo aplicáveis às mais diversas áreas, como na formulação de políticas públicas, questões ambientais e finanças públicas.
Alterações na forma de redação do texto de uma notificação por atraso no recolhimento do tributo, por exemplo, podem aumentar a arrecadação, do mesmo modo que cores calmas e a presença de um conciliador em uma sala podem favorecer um acordo.
Tal conceito, popularizado por Richard Thaler e Cass Sunstein, remonta aos estudos do Nobel Daniel Kahneman. Em seus experimentos, o estudioso questiona a visão clássica da economia de que as decisões humanas são tomadas com base em uma análise racional de custo-benefício.
A partir daí, a economia comportamental ganha destaque e passa a ser usada como aliadas das administrações públicas ao redor do mundo, sendo a NudgeUnit mais conhecida a do Behavioral Insights Team – BI TEAM, ligada ao governo britânico e que auxilia o primeiro-ministro a tomar decisões com base no comportamento humano.
Essa organização desenvolveu uma metodologia simplificada para que os formuladores de políticas públicas possam atuar com base na economia comportamental.
O conjunto dos quatro pilares básicos para a formulação das políticas foi batizado de estrutura EAST. Em uma tradução livre isso significa dizer que para elaborar políticas mais eficazes e eficientes é preciso ser Fácil, Atraente, Social e Oportuno.
Make it Easy, ou fazer ser fácil, tem relação direta com simplificação de processos, padrões pré-prenchidos e reduzir o esforço necessário para tomar determinada decisão. Ações que levem isso em conta possuem uma taxa de aceitação e engajamento maior.
Make it attractive – fazer ser atraente – inclui não só recompensas e sanções, mas também formas de atrair a atenção por meio de imagens, cores e personalização.
Make it Social, ou fazer ser social, mostra a importância do comportamento social, que claramente influencia outros indivíduos a fazer o mesmo. Utilizar o poder de redes sociais é um dos caminhos atuais mais relevantes. Da mesma forma, os formuladores de políticas precisam se atentar para não reforçar inadvertidamente um comportamento problemático ao enfatizar sua alta prevalência.
Make it timely – fazer ser oportuno – trata de analisar quando a opção será posta frente ao indivíduo, uma vez que a mesma proposta oferecida em momentos diferentes tem mais ou menos probabilidade de ser aceita a depender do contexto. Tornar as pessoas mais receptivas a determinada ideia pode interferir drasticamente na sua aceitação ou rejeição. Aqui também se inclui a questão da imediatidade, sendo necessário levar em consideração que as pessoas tendem a se inclinar por benefícios no curto prazo em detrimento do longo prazo.
No âmbito brasileiro, o município do Rio de Janeiro foi pioneiro ao criar uma Nudge Unit em parceria com a Fundação João Goulart em 2018. Chamada de NudgeRio, a ideia remonta aos Grupos Transversais de Trabalho – GTTs dentro do programa Líderes Cariocas. Em 2015, o grupo atuou na tentativa de diminuição da dívida de Imposto Territorial Urbano (IPTU) em um experimento feito com 400 contribuintes.
Em vez do envio de cartas padrão foi utilizada a técnica baseada em mensagens personalizadas ao público-alvo. Os chamados direcionados, contavam, por exemplo, com o reforço positivo de afirmar que “o bom cidadão paga os impostos” e o retorno foi de uma ampliação de 200% na arrecadação do IPTU em atraso daquele ano.
Os resultados da NudgeRio chamaram a atenção também quanto à ação de rematrícula dos alunos da rede municipal, em que obteve êxito ao diminuir as longas filas e aumentar as matrículas online apenas com o envio de mensagens personalizadas para os pais e responsáveis além de modificações no site, fazendo-o mais intuitivo.
Ações como essa se destacam por não terem custos financeiros ou impactos financeiros significativos para a administração.
Assim, novas inciativas começaram a surgir, como por exemplo, na Universidade de Viçosa e na oficina de ciências comportamentais e políticas públicas em São Paulo, um laboratório que possui, entre outros, projetos semelhantes ao da NudgeRio sobre arrecadação de impostos.
O que se deseja aqui ressaltar é que o comportamento humano precisa ser levado em consideração na elaboração e implementação de qualquer política pública ou ação governamental, notadamente pelo fato de que nem todas as pessoas terão a mesma reação ou tomarão as mesmas decisões. Daí a necessidade de aderência ao público-alvo.
Conclusões aparentemente simples como o fato de que as pessoas tendem a manter o status quo – a inércia –, que preferências imediatistas normalmente se sobrepõem a benefícios de longo prazo e que as escolhas são influenciadas pelo estado emocional, pelo contexto ou outras influências externas, pode fazer com que a administração pública mude sua forma de interagir com o administrado.
A partir daí, modificar o modo como as opções se põem na frente do indivíduo pode favorecer a escolha de determinada opção. Por exemplo, comidas saudáveis à altura dos olhos ou em primeiro lugar em um self-service ou mesmo padrões de opção pré-preenchidas, em que caso a pessoa não concorde deve alterar a opção.
O exemplo clássico dessa última questão é a hipótese em que a regra seja a doação de órgãos e apenas se a família não quiser é que a doação não será feita. Isso pode fazer com que os níveis de doação aumentem consideravelmente. No entanto, o que vige no Brasil hoje é o contrário, um opt-out automático, em que apenas se a família se manifestar a favor da doação é que ela ocorrerá.
Levar o comportamento humano em consideração pode ser, pois, de grande valia para a administração pública. Nesse sentido, resta clara a necessidade do estudo do Direito por meio de um olhar transdisciplinar que englobe o conhecimento da economia, da psicologia e da sociologia como meio de entender o comportamento humano e auxiliar a administração pública na elaboração de projetos e políticas.
A principal contribuição que o estudo das influências comportamentais sob o marco da economia tem a oferecer é o direcionamento da tomada de decisões por meio do estímulo do desenvolvimento de uma consciência crítica que propicie a autonomia a partir da maior reflexão e entendimento das opções disponíveis, sem imposições ou retirada do direito de escolha.
Por isso há a necessidade de expansão da discussão do tema no Brasil, onde as iniciativas pautadas em nudges ainda são poucas e pouco conhecidas. Estudos, trabalhos e pesquisas que envolvam a temática têm, então, um amplo espaço de crescimento a ser conquistado.
Referências
BI TEAM. Disponível em: <https://www.bi.team/>.
BRASIL. Senado Federal. Doação de órgãos poderá ser feita sem autorização de familiares, decide CCJ Fonte: Agência Senado. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2019/05/22/doacao-de-orgaos-podera-ser-feita-sem-autorizacao-de-familiares-decide-ccj>.
CASTLEMAN, B. L.; PAGE, L. C. Summer nudging: Can personalized text messages and peer mentor outreach increase college going among low-income high school graduates? Journal of Economic Behavior & Organization, v. 115, p. 144–160, jul. 2015.
ECONOMIA COMPORTAMENTAL. “A Economia Comportamental aplicada a Políticas Públicas”. Disponível em: <http://www.economiacomportamental.org/nacionais/capitulo-politicas-publicas/>.
HANSEN, Pelle G. and JESPERSEN, Andreas M., Nudge and the Manipulation of Choice: A Framework for the Responsible Use of the Nudge Approach to Behaviour Change in Public Policy, European Journal of Risk Regulation, 2013.
NudgeRio. Seminário. Disponível em: <https://prefeitura.rio/fazenda/seminario-nudgerio-fundacao-joao-goulart/.Acesso>.
THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R. Improving Decisions about Health, Wealth, and Happiness. Nova Iorque. Penguim books. 2008.
KAHNEMAN, D. (2011). Thinking, fast and slow. New York, NY: Macmillan.
E Kahneman, D., & Tversky, A. (2000). Choices, Values, and Frames. Cambridge:Cambridge University Press.