Placenta em cápsula: por que mulheres estão consumindo o órgão após a gravidez e quais os riscos?

Especialistas explicam sobre a prática que ganhou popularidade entre celebridades e destacam falta de comprovação científica

Por Sara Magalhães


Placenta encapsulada é tendência entre celebridades @placentaplus
audima

Impulsionada por celebridades e influenciadoras, as pílulas de placenta têm se popularizado nos últimos anos. Embora no Brasil a placentofagia ainda cause estranheza, nos Estados Unidos ela já é bastante difundida e algumas mães chegam a desembolsar centenas de dólares para que empresas especializadas transformem suas placentas em cápsulas comestíveis, como foi o caso das irmãs Kim e Kourtney Kardashian, Alicia Silverstone, Chrissy Teigen, Hilary Duff, entre outras personalidades norte-americanas.

Mas será que seu consumo é benéfico? A placenta é um órgão que se desenvolve nas mulheres durante a gestação e é expelido juntamente com o bebê durante o nascimento. "Eu nunca fui uma pessoa holística e nunca havia pensado em comer minha placenta antes. E, quando eu digo 'comer', quero dizer que mandei congelá-la e secá-la, transformando-a em uma pílula – e não fritá-la como se fosse um bife (coisa que algumas pessoas fazem, aliás)", declarou Kim na época que ingeriu sua placenta após dar à luz seu segundo filho, Saint West.

Kourtney Kardashian compartilhou fotos das pílilas de placenta — Foto: Instagram

No Brasil, Bela Gil foi uma das personalidades responsáveis por colocar a prática em destaque. Em 2016, ela chamou a atenção para o assunto após ingerir sua placenta in natura batida no liquidificador com vitamina de banana. O casal Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert também consumiu a placenta logo após o nascimento da filha caçula, Maria Manoela, em 2019, e mostrou o momento em um vídeo do parto. Maíra Cardi, Fernanda Machado, Virgínia Fonseca – que além de consumir as pílulas de placenta, também encomendou um creme corporal com o material – e, mais recentemente, a influenciadora Fernanda Lacerda, entraram para a lista de adeptas da placentofagia.

Vogue conversou com Carlos Moraes, ginecologista e obstetra pela Santa Casa de São Paulo e médico do Hospital Albert Einstein, e o ginecologista e obstetra pela Santa Casa do Rio de Janeiro, Cesar Patez, que esclareceram as principais dúvidas sobre o hábito, seus riscos, se há ou não respaldo científico e como, cientificamente, a placenta é transformada em cápsulas.

Por que o consumo de placenta virou tendência?

"Por se tratar de uma prática comum no reino animal entre mamíferos, foi especulado que ingeri-la poderia também ser benéfico para a mãe", resume Carlos Moraes. "No entanto, não existem estudos científicos que comprovam tais benefícios", complementa. De acordo com Cesar Patez, mais de 4 mil espécies de mamíferos consomem sua placenta, um hábito evolutivo com o objetivo de obter nutrição e realizar a limpeza do local após o parto no mundo animal. Somente em humanos e camelídeos (camelos) foi observado que o material pós-parto não é ingerido rotineiramente. "Algumas mulheres acreditam que o consumo pode ser útil para prevenir a depressão pós-parto, aumentar a produção de leite materno, equilibrar os hormônios e facilitar a recuperação após o nascimento", cita Cesar. Apesar de ter se popularizado nas últimas décadas no Ocidente, a Medicina Tradicional Chinesa oferece registros milenares do uso da placenta seca como um remédio pós-parto.

PlusCenta é uma das empresas a oferecer placenta encapsulada nos Estados Unidos — Foto: Divulgação

Prática não possui respaldo científico

Os médicos são categóricos ao afirmar que não existem estudos científicos robustos capazes de comprovar os benefícios de ingerir placenta, seja na versão in natura ou desidratada. "A ideia de encapsular e consumir a placenta não recebe respaldo de organizações de saúde confiáveis, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC)", indica Cesar. Em 2015, um estudo feito na Faculdade de Medicina de Northwestern, nos Estados Unidos, analisou dez pesquisas sobre o tema e disse não ter encontrado evidências de que o consumo ofereça proteção contra depressão pós-parto ou quaisquer outros benefícios associados à prática.

Entre as principais justificativas para o consumo da placenta humana, estão suas altas taxas de ferro, um mineral fundamental para o bom funcionamento das células e responsável pelo transporte de oxigênio e síntese de DNA – e é verdade, o órgão é rico neste nutriente. No entanto, um estudo de 2010, feito pela Universidade de Nevada, nos Estados Unidos, com um pequeno grupo de mães, comparou os efeitos da ingestão de cápsulas de carne bovina com cápsulas de placenta. Metade das participantes recebeu suplementos feitos com sua placenta desidratada e, a outra parte, ganhou as cápsulas de carne. Embora os suplementos de placenta tivessem sete vezes mais nutrientes do que o bife, não foram observados diferenças consideráveis nas taxas de ferro nos dois grupos de participantes.

Como funciona e quanto custa o processo de encapsulamento de placenta?

O processo para encapsular a placenta é feito por etapas. Geralmente, o material in natura é levado para um forno, onde é vaporizada e desidratado. Em seguida, a placenta é triturada até se transformar em um pó fino, que é colocado em cápsulas de vitaminas seladas e entregues para a mãe. Embora este seja o método mais comum de ingestão, a placenta também é consumida crua, cozida, assada e em sucos e smoothies.

Mommy Made Encapsulation é uma das empresas conhecidas pelo serviço nos EUA — Foto: Facebook/ Mommy Made Encapsulation

Nos Estados Unidos, empresas consolidadas neste mercado oferecem o serviço de encapsulamento com valores que variam de US$ 299 a US$ 400. Na Placentar Brasil, que executa o serviço em Brasília, Florianópolis, São Paulo e Campinas, o valor sai por R$ 500 e são oferecidos dois tipos de placenta encapsulada: a simples e a vaporizada. "Na técnica simples ou 'natural', a placenta passa por um longo processo de desidratação a uma temperatura constante de 70°C. A próxima etapa é a trituração e encapsulação. Esse método geralmente rende mais cápsulas", diz a empresa em seu website. "A outra é a técnica da Medicina Tradicional Chinesa (MTC). Nessa, a placenta é vaporizada por 20 minutos com limão, pimenta e gengibre antes de ser desidratada. De acordo com essa tradição, a vaporização e os ingredientes resgatam a energia 'yang'. Por conta do vapor, esse método é mais seguro para a mulher que atravessou algum processo infeccioso ao longo da gestação, já que a temperatura no processo chega a 100°C. Mulheres relatam resultados semelhantes nos dois métodos", diz a empresa.

Quais os riscos de consumir placenta?

Carlos Moraes alerta para os riscos de infecções, especialmente do órgão in natura, no entanto, a versão encapsulada também pode causar doenças. Ele explica que placentas encapsuladas incorretamente podem abrigar bactérias perigosas que têm o potencial de deixar mãe e bebê doentes, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC). Se a mãe estiver amamentando, por exemplo, e contrair uma infecção por conta do consumo da placenta, poderá transmitir a infecção para seu filho.

Mais recente Próxima Dieta nórdica: o que é e por que é considerada uma das mais saudáveis do mundo

Leia mais