Vogue Repórter

Por Bianca Lima de Oliveira

"Eu tinha 18 anos e estava no sofá da sala em uma tarde normal de domingo, em agosto de 2017, quando senti uma pontada no meu olho direito. A sensação era como se uma agulha estivesse furando o meu olho a cada movimento. Fui para o quarto e me deitei. Fiquei com os olhos fechados na expectativa de que fosse melhorar, mas logo comecei senti-los latejando e uma dor de cabeça intensa no mesmo lado do olho afetado. A dor era tamanha que eu não conseguia me levantar.

Na época, as condições financeiras da minha família não eram muito boas e eu não tinha como ir a um oftalmologista. Permaneci calada sobre o que estava sentindo.

Os dias foram passando e outros sintomas surgindo. Agora, as dores de cabeça e sensação de pontada no olho eram acompanhadas de sonolência e visão embaçada, e eu já não conseguia mais realizar minhas atividades diárias. Um dia, ao acordar, e percebi que minha visão do olho direito estava com um borrão preto na parte inferior, de tal modo que eu conseguia enxergar apenas a metade do corpo de alguém. Dois dias depois, acordei com a visão totalmente afetada, eu não enxergava mais nada.

Dez dias após perder totalmente a visão do olho direito, as dores amenizaram. Foi quando decidi contar o que estava acontecendo para a minha família. Mesmo com medo e insegurança do que estaria por vir, me desliguei da pizzaria onde trabalhava e, na mesma época, recebi um convite da minha tia para visitarmos o meu avô em Lagoa Grande, também no Rio Grande do Norte. Saí de Passagem, onde morava, e chegando lá, contei a um tio que não estava muito bem. Sem hesitar, ele pediu que eu fosse ao oftalmologista e que o passasse o valor da consulta para que ele pagasse. Foi assim que a minha jornada começou na busca pelo diagnóstico.

Meu primeiro passo foi ir até uma ótica de óculos para uma consulta com um optometrista. Informei ao profissional que não estava enxergando e logo ele afirmou que eu tinha uma neurite óptica olho direito e que poderia ficar cega. Então, fui encaminhada para um hospital de urgência.

Bianca contou com a ajuda de amigos para se recuperar — Foto: Arquivo Pessoal
Bianca contou com a ajuda de amigos para se recuperar — Foto: Arquivo Pessoal

Lá, o oftalmologista me alertou sobre a gravidade do caso, a vasta possibilidade de diagnósticos e da necessidade de uma internação para uma investigação completa. Durante dois meses fiz diversos exames e descobri que estava com uma lesão no nervo óptico direito. Fiquei muito atordoada, pois os médicos não contavam as conclusões que estavam chegando ou até mesmo duvidavam um pouco das coisas que eu relatava sentir. Até que veio o diagnóstico: uma doença rara, a neuromielite óptica (NMO). Fiquei bastante assustada, com medo de morrer.

Também conhecida como doença de Devic, a NMO é uma condição autoimune e de origem neurológica, que acomete, principalmente, os nervos ópticos e a medula espinhal. Ela se manifesta por surtos - e um único episódio pode ser permanentemente debilitante. Por conta da maioria dos indivíduos não conseguirem se recuperar totalmente após uma crise, estima-se que 69% das pessoas com NMO tenham perda severa de visão em pelo menos um olho dentro de um período de três anos, e 34% podem desenvolver deficiência motora permanente. Trata-se de uma doença com impactos relevantes: 60% das pessoas com NMO relatam um impacto significativo no trabalho, em suas atividades e em sua capacidade de realizar tais tarefas sempre ou na maior parte das vezes.

"Pensei que a minha vida havia acabado ali, que não poderia estudar mais, não conseguiria trabalhar e nem fazer mais nada. Escutava que ninguém iria querer namorar ou casar comigo e que dependeria de alguém para sempre."

Apesar do alívio de saber o que estava acontecendo comigo, receber o diagnóstico de uma doença rara é desafiador. Eu passei por um momento extremamente delicado ao descobrir que estava com uma doença sem cura aos 18 anos, que poderia ficar cega para sempre e que eu estava com uma lesão no cérebro que me causava diferentes sintomas, como esquecimento, fraqueza e dificuldade de fala e mobilidade, por exemplo.

Hoje Bianca participa de eventos para aprender e divulgar a neuromielite óptica (NMO) — Foto: Arquivo Pessoal
Hoje Bianca participa de eventos para aprender e divulgar a neuromielite óptica (NMO) — Foto: Arquivo Pessoal

Pesquisava na internet e tudo o que li era de que não voltaria a enxergar. Pensei que a minha vida havia acabado ali, que não poderia estudar mais, que não conseguiria trabalhar e que não poderia fazer mais nada. Escutava que ninguém iria querer namorar ou casar comigo e que dependeria de alguém para sempre. Foi muito duro.

Precisei do auxílio da cadeira de rodas durante alguns meses até que, com a fisioterapia, fui voltando a me locomover sozinha. Eu não tinha apoio psicológico e escutava que ela não voltaria a andar. Isso me desmotivou e fiquei depressiva. O ponto de virada foi um colega da igreja que me incentivou a me esforçar para tentar voltar a andar. Quando precisei parar com a fisioterapia, meu amigo me visitava toda semana para me ajudar. Com muito esforço, consegui voltar a andar, mesmo com fraqueza nas pernas. No início, foi muito desafiador aceitar minha nova realidade.

Passados três anos do primeiro surto da NMO, me vi novamente com a visão embaçada e pontadas nos olhos, principalmente no olho esquerdo, que antes não havia sido afetado. Era abril de 2021 e eu estava tendo outro episódio da doença. Desta vez, acometendo os dois olhos. Nesta ocasião, não consegui a internação e precisei me locomover diariamente, em um trajeto de duas horas, para receber o cuidado adequado. Fiz pulsoterapia e pude me recuperar antes de perder totalmente a visão, entretanto, por meio de novos exames, foram detectadas lesões no olho esquerdo.

Por conta de a NMO ter afetado consideravelmente ambos os olhos, já sou considerada uma pessoa com deficiência visual e algumas sequelas da doença me afetam em diferentes atividades cotidianas, como não conseguir ler letras pequenas e incômodo diante de luz intensa, precisando usar óculos escuros no cinema, por exemplo. Fora isso, também tenho mobilidade reduzida. Contudo, ter acesso a um cuidado multidisciplinar e adequado foi fundamental e tem me proporcionado mais qualidade de vida.

"Diante de todas as situações que vivi por conta da doença, despertou em mim o desejo de cuidar do próximo, da maneira mais humanizada possível. Com muito orgulho, faço enfermagem."

Continuo exercendo minhas atividades de forma produtiva, assim como mantenho uma vida social ativa. Apesar de ainda precisar lidar com lugares inacessíveis, pessoas que não conhecem e não entendem a minha doença por eu não “aparentar” tê-la, sigo firme e ciente que, ao compartilhar minha história com mais pessoas, estou também inspirando, conscientizando, ajudando a elevar a importância do diagnóstico precoce e representando muitas outras que convivem com a NMO.

Antes, o diagnóstico da NMO me dava muito medo. Ser uma pessoa com deficiência era realmente um obstáculo para mim. Felizmente, cinco anos depois, eu superei os meus traumas e passei a falar abertamente sobre a enfermidade, a dividir minha jornada com a doença nas redes sociais e a participar de eventos em apoio a quem também partilha desse mesmo diagnóstico.

Além disso, me deparei com algumas mudanças internas. Sonhava em ser professora, mas diante de todas as situações que vivi por conta da doença, despertou em mim o desejo de cuidar do próximo, da maneira mais humanizada possível - principalmente, de pessoas que também convivem com a NMO. A partir desta vontade, hoje, com muito orgulho, eu faço enfermagem na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e, a cada semestre, caminho para ver o meu sonho se transformar em realidade.

Bianca cursa enfermagem e quer divulgar a neuromielite óptica (NMO) e cuidar de pessoas — Foto: Arquivo Pessoal
Bianca cursa enfermagem e quer divulgar a neuromielite óptica (NMO) e cuidar de pessoas — Foto: Arquivo Pessoal

E não é só isso. A doença também não me impediu de explorar o meu lado artístico. Desde pequena, sempre tive facilidade para desenhar e pude aprimorar cada vez mais as minhas habilidades, principalmente durante a pandemia. Para a minha alergia, eu tive a oportunidade de participar do projeto “Fazendo Arte com Gustavo Rosa”, desenvolvido pelo Instituto Gustavo Rosa (IGR) e destinado a quem tem NMO. Por meio de uma oficina artística, pude explorar a minha criatividade e imaginação. Foi uma experiência engrandecedora, cujo resultado foi muito motivador para mim, pois o meu desenho foi exposto em uma exposição no metrô de São Paulo.

Além de enfermeira, sonho em ser cantora. Também desejo poder contribuir para a visibilidade da NMO no mundo. Me imagino dando palestras sobre o tema. Quero contar a todos minha históri e ajudar quem está passando por isso a ter uma trajetória mais leve."

Arte de Bianca Lima de Oliveira foi exposta no metrô em São Paulo — Foto: Divulgação
Arte de Bianca Lima de Oliveira foi exposta no metrô em São Paulo — Foto: Divulgação
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