• Gabriela Bardusco (@gabibardusco)
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Female doctor portrait. Illustration of a female doctor, Friendly young doctor. Medical staff. Illustration in a flat style (Foto: Getty Images)

Ilustração de uma médica na linha de frente do combate contra a COVID-19 (Foto: Getty Images)

A pandemia de coronavirus, que há um ano faz com que as pessoas revejam a maneira de se relacionarem no cotidiano, já faz parte da vivência humana, e deixa, infelizmente, um rastro de caos devastador pelos quatro cantos do mapa mundi. Foram registradas 300 mil mortes por COVID-19 no Brasil desde o início da pandemia, como foi apontado em  levantamento de dados das secretárias estaduais de Saúde feito pelo consórcio de veículos de imprensa na última quarta-feira (24.03).

Como se não bastasse, um novo estudo realizado pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e chefiado pelo pesquisador Márcio Watanabe, mostra que o Brasil pode chegar a um pico de cinco mil mortes diárias pela doença entre abril e início de maio se as medidas de distanciamento social e uso de máscara não começarem a ser respeitadas com empenho e seriedade.

Por isso, criamos um dossiê com as 22 principais dúvidas sobre a doença que vemos por ai. Com o embasamento cirúrgico de quem vive isso de perto desde o começo, a Dra. Letícia Kawano-Dourado, médica pneumologista formada pela Faculdade de Medicina da USP, pesquisadora da Universidade de Paris, e membro do painel de especialistas que presta assessoria à OMS na elaboração de Diretrizes em Tratamentos para COVID-19, auxiliou a elaboração da matéria respondendo detalhadamente cada uma delas.

Abaixo, confira a conversa com a especialista, e não se esqueçam: continuem cuidando uns aos outros!

1. Quais são as origens do SARS-CoV-2?

Antes de tudo, o SARS-CoV-2 é o nome do vírus que causa a COVID-19. E ela é assim chamada porque é uma abreviação de coronavírus, de doença causada pelo corona vírus descoberto em 2019. Muito provavelmente o SARS-CoV-2 veio da interação entre humanos e morcegos, ou, menos provavelmente, entre humanos e tatus-bola (o pangolim). Em um recente artigo da Nature Communications, publicado em fevereiro de 2021, cientistas identificaram anticorpos neutralizantes contra o SARS-CoV-2 nos animais citados em regiões diferentes do sudeste asiático. Apesar disso, essa ainda não é uma resposta definitiva, pois o mesmo report mostra que o genoma sequenciado do SARS-CoV encontrado em tais espécies é muito parecido com o SARS-CoV humano, mas ainda não é o genoma que tem mais de 99% de identidade – o que, de fato, poderia confirmar que esse é o animal que transmitiu o SARS-CoV-2 para os humanos. Desse modo, a resposta definitiva ainda não existe, mas a causa mais provável, até então, é que o vírus tenha vindo de morcegos e tatu-bola do sudeste asiático.

Por outro lado, várias teorias conspiratórias surgiram desde o início da pandemia, querendo implicar que o SARS-CoV-2 fosse um vírus criado em laboratório para, então, cumprir com interesses geopolíticos do governo chinês. No entanto, existem evidências de que o SARS-CoV-2 está presente a mais de 70 anos na natureza, então, é muito pouco provável, ou melhor, é realmente teoria de conspiração achar que isso possa ser o motivo da pandemia da COVID-19, “um plano geopolítico da China contra o resto do mundo”.

Uma das alegações de quem defende essa teoria da conspiração é que os primeiros casos que foram reportados não estavam relacionados com o mercadão de Wuhan. E, na verdade, eu não vejo como isso fala contra o fato de ter ocorrido uma transmissão entre espécies na China. Porque veja: era uma concentração de casos de pneumonia de causa inexplicada grave, com um denominador comum, em um local em comum, certo? Pessoas que trabalhavam nesse mercado. Isso, então, foi o que chamou a atenção dos médicos, mas é muito provável que casos assim estavam chegado ao hospital sem um cluster, sem uma aglomeração que fizesse, então, o sininho tocar, vamos dizer assim, para que estivesse acontecendo alguma coisa de diferente. Muito provável que na comunidade esses casos já estavam acontecendo. Só para contextualizar, os casos de COVID eram pneumonias virais. Pneumonia, na maioria das vezes, a gente faz o diagnóstico sem conseguir recuperar a bactéria, o vírus que está causando a pneumonia. Então, o fato da pneumonia não ter um diagnóstico definido, especifico, não é nenhuma novidade. Então, esses casos chegando de forma isolada nos hospitais, provavelmente, não chamou atenção das equipes médicas, o que chamou atenção é de repente ver familiares doentes, pessoas que estão vindo de um mesmo local, que trabalhavam no mesmo local - que foi o que aconteceu com mercado de Wuhan.

Outra coisa que nos fala muito a favor dessa transmissão entre espécies, é que ao longo da pandemia surgiram variantes do SARS-CoV-2 na população, por exemplo, de visons – aquele bichinho que faz casaco de pele – na Noruega. E isso determinou uma enorme ação dos agentes locais para conter, mas essa transmissão, então, ocorreu entre os bichinhos e dos bichinhos para os fazendeiros. Isso mostra para a gente, na verdade, a necessidade de uma reflexão sobre a forma com a qual nós estamos explorando o planeta e consumindo os recursos. Essas fazendas são locais propícios para o surgimento desse tipo de infecção, porque os animais ficam absolutamente aglomerados em ambientes fechados, mal ventilados, e com contato humano.

2. O que sabemos sobre como o SARS-CoV-2 se espalha e por que ele está se espalhando tão rapidamente?

A essa altura do campeonato, março de 2021, nós já sabemos muito sobre o SARS-CoV-2, inclusive sobre seu mecanismo de transmissão e como isso acontece. Ele se transmite, basicamente, entre humanos através de gotículas e partículas respiratórias.

Para contexto, existe até uma polêmica que questiona se a COVID pode ser transmitida por aerossol (líquido disperso no ar sob a forma de fina névoa) e, explicando resumidamente, quando você fala que uma doença é transmitida por aerossol, estamos nos referindo à uma doença que tem potencial de transmissão muito alto, pois no aerossol há uma quantidade de vírus muito menor pelo fato de a partícula ser bem menor do que a de uma gotícula. É o caso, por exemplo, do sarampo, que é conhecido por ter um grau alto de transmissão, em torno de 10-15. A gente diz que o sarampo é exemplo de uma doença que é transmitida por aerossol, pois possui uma transmissibilidade muito alta. A COVID, por outro lado, em sua forma em natura, com pessoas em aglomeração, sem uso de máscara, chega à um grau de transmissão de 3 a 4 (considerado baixo). O sarampo é de 15, tem muita diferença. Apesar do grau baixo da COVID, ela está se espalhando de maneira tão intensa em decorrência de uma falta de cuidado.

Ela é praticamente transmitida por gotícula. E o que isso implica, então? Que uma pessoa contaminada respirando, tossindo, espirrando ou cantando, emite tais partículas contendo o vírus no ambiente. Aí, outra pessoa vem, respira aquilo, e, dependendo da carga viral, pode acontecer o estabelecimento de uma infecção efetiva, que dentro de alguns dias vai se manifestar na forma de doença, a COVID. Para finalizar a lógica do aerossol, não é que não tenha SARS-CoV no aerossol, nas partículas de aerossol geradas pela pessoa contaminada pela COVID. O fato é que, muito provavelmente, aquela carga viral não é capaz de causar infecção.

Essa sensação de que a COVID está espalhando rapidamente e contaminando todo mundo de uma vez tem a ver com o comportamento exponencial de qualquer infecção que se transmite, ou seja, se você transmite de uma pessoa para duas, essas duas pessoas vão estar transmitindo para outras e assim por diante. Se você parar para pensar que a COVID é uma doença que se espalha pela via respiratória de alguém contaminado, e que um dos grandes culpados de transmissão são os pacientes assintomáticos, você conclui que é como tivesse, entre aspas, um ‘disfarce’ que ajuda a doença a se espalhar mais e sem dar sintoma.

Porque, quando a pessoa tem sintoma, boa parte delas têm um pouco de consciência, fica em casa ou ao menos coloca uma máscara. Os assintomáticos, se não existe uma normativa de saúde pública, obrigando máscara para todos, eles estão expelindo o vírus sem máscara. Então, ao meu ver, esses dois fatores são muito importantes para essa sensação de que a COVID está se espalhando tão rapidamente. Um é o comportamento exponencial de transmissão da doença, que quando chega em um determinado nível elevado de transmissão comunitária, a sensação é de uma explosão no número de casos, e dois é a contribuição de assintomáticos na transmissão da COVID.

Além disso, tem também a questão das variantes, que a gente não sabe até que ponto a brasileira, identificada como P1, aumenta a transmissão. A gente já sabe que a britânica aumenta sim, e que ela carrega uma vantagem evolutiva em relação ao SARS-CoV-2 anterior. De forma que ela vai, então, ganhando espaço, até se tornar variante predominante. O quanto que isso contribui para o comportamento da COVID no Brasil, a gente não sabe, mas pode ser sim um fator.

3. Qual a situação das mutações atualmente?

A primeira coisa que precisamos entender é que a ocorrência de mutações quando o vírus se replica é algo absolutamente esperado e, quanto mais replicação existe, ou seja quanto mais o vírus está se espalhando e se multiplicando, mais provável é o surgimento dessas mutações. Na maioria das vezes, essas mutações não possuem nenhuma repercussão, só que por motivos óbvios de seleção natural, se surge uma mutação que garante ao SARS-CoV-2 um benefício de transmitir o seu material genético, essa mutação, então, é naturalmente selecionada. Por exemplo: a variante britânica B17, ela tem uma melhor eficiência na hora de se espalhar, naturalmente, então, vai substituindo o SARS-CoV anterior. A forma com a qual nós interrompemos esse surgimento de variantes que podem sim acabar desencadeando variantes que são realmente problemáticas, é reduzir a transmissão comunitária da COVID.

No cenário brasileiro, nós temos a variante P1, que carrega muitas semelhanças com a variante sul-africana no tipo e local de mutação, e temos a variante britânica. Um recente estudo, liderado pelo Dr. Alexandre Zavascki e a equipe do Hospital das Clinicas de Porto Alegre, mostra que a explosão de casos em Porto Alegre coincidiu com uma predominância da variante P1, que é a variante de Manaus. Isso é uma associação que, por si só, não mostra que a variante de Manaus causou a explosão de casos, ao menos não agora, mas sugere preocupação. Como a vigilância genômica no Brasil é deficitária, ou seja, ela é muito menor do que deveria ser, a gente fica sem condições de entender melhor qual é o papel dessas variantes nesse caos que estamos vendo. Porque para você saber o impacto dessa variante na doença clínica, na transmissão, ou se causa doença mais grave, é preciso coletar dados epidemiológicos, ou seja, número de casos novos, quantas pessoas estão sendo hospitalizadas, quantas pessoas estão morrendo – coisa que o Brasil já faz. Mas, além disso, é preciso cruzar esses dados com dados de sequenciamento genômico, dos PCRs positivos, para eu ir, então, vendo se está havendo uma tendência de predominância de uma variante e um comportamento mais grave.

Mesmo tendo isso em um cenário ideal - por exemplo o Reino Unido, que está muito avançado na frente de todos os outros -, essas associações de causa e efeito são difíceis. Porque quando você tem uma transmissão muito alta na comunidade e muitos casos sendo hospitalizados, o sistema de saúde fica sobrecarregado, e o tratamento que as pessoas recebem é aquém do normal. Assim sendo, as pessoas acabam morrendo mais, porque não recebem o suporte adequado. E isso não é pelo fato de que a variante lesou o organismo da pessoa, mas porque simplesmente causou um maior número de casos, que sobrecarregaram o sistema de saúde. 

Então, essas associações são difíceis, mas a gente não está nem nesse ponto do desafio, estamos antes, porque não tem sequenciamento genômico suficiente das amostras de PCR positivo no Brasil. Na verdade, estamos ainda mais na retaguarda pois não tem PCR sendo feito de forma adequada no país, então, eu tenho colegas em capitais me dizendo que os resultados só saem em uma semana e isso é um gargalo terrível.

4. Qual é exatamente o período de incubação e os sintomas da COVID-19? Tem alguma mudança em relação as mutações?

O período de incubação da COVID é em média 4 a 5 dias, mas ele pode se estender até 12 dias e esse é o motivo pelo qual as quarentenas de isolamento quando você chega em um país são de 14 dias. Não existe ainda nenhuma informação de que esse período de incubação, para as variantes, seja diferente.

Após esses dias de incubação, é quando há uma quantidade de vírus suficiente já interagindo no organismo, e se replicando ao ponto de que a resposta que o organismo vai montando contra o vírus passa a ser sentida pela pessoa, o que equivale aos sintomas. Nesse caso, a pessoa começa a ter, por exemplo, febre e moleza, sensações causadas pelo organismo liberando uma série de marcadores, chamados de citocinas, que fazem a comunicação entre as células do sistema imunológico e avisam: “Olha pessoal, nós temos problema aqui, venham para cá”. As citocinas, então, começam uma resposta inflamatória contra o vírus, e essa resposta inflamatória começa a ser sentida pelas pessoas, que podem, então, ter fraqueza, febre, dor de garganta, tosse etc.

A medida que o quadro vai progredindo, naquela pequena proporção onde vai progredir, você tem, então, o desenvolvimento de uma pneumonia mais extensa com falta de ar e queda da oxigenação.

5. Máscaras e distanciamento social continuam sendo a melhor forma de prevenção contra o vírus e suas mutações?

Sim, com certeza! Máscaras e distanciamento social são a melhor forma de prevenção contra o vírus e, inclusive, são a melhor forma de evitar a criação de novas variantes. Porque? Porque a outra arma disponível são as vacinas, entretanto, o problema é que ainda existe uma escassez de recursos em relação a elas.

Desse modo, a vacinação, a imunização das pessoas até que a sociedade atinja um nível de imunidade de rebanho, vai demorar, e se não houver um cuidado com medidas comportamentais - que a essa altura do campeonato nós sabemos com certeza que controlam a transmissão comunitária de COVID – é possível que todos os esforços de encerrar a pandemia com imunização sejam colocados à perder. Isso porque se você não controla a transmissão, surgem novas variantes com chance de evasão imune, e essas variantes podem colocar o plano da vacinação todo por água à baixo. Isso para não falar na sobrecarga do sistema de saúde, que é o que o Brasil está vivendo agora, uma loucura. A demanda do sistema de saúde é maior do que se pode prover para a população, e isso, então, instaura uma situação de instabilidade social absurda, porque não existe hospital disponível.

E olha, isso é tão obvio. Uma doença de transmissão por via respiratória, se você se distancia, você está se distanciando da nuvem de gás expirado de alguém contaminado. Se você usa máscara, você está se protegendo daquela nuvem de gás expirado contaminado. Para aqueles que está com COVID assintomático, essa máscara, por sua vez, segura o vírus e impede que essa nuvem contaminada vá contaminar outras pessoas. É uma prática tão óbvia, que não consigo pensar em outra palavra se não estupidez para quem vai contra essas medidas, principalmente quando pensamos nessa situação caótica em que o Brasil está.

É claro que o distanciamento social pode implicar em restrições de impacto econômico, e é por isso que essas medidas precisam vir acopladas com medidas públicas de apoio a população que vai sofrer com isso. Então, por exemplo, os pequenos comerciantes, os trabalhadores informais, essas pessoas que vão ser impactadas por isso. Do contrário, se a pessoa trabalha hoje para comer amanhã, como é que a pessoa pode fazer distanciamento social?

6. Existe algo que eu possa tomar em casa para que o contágio de coronavirus se torne mais difícil?

O que eu posso dizer é o seguinte: o que a gente sabe, até então, é que a COVID é uma doença que depende basicamente de três fatores. O primeiro é a carga, a quantidade de vírus que você vai inalar, então, por experimentos em laboratório, a gente sabe que existe uma carga de vírus tão grande que mata, uma carga de vírus que da doença grave, e uma carga de vírus que da doença leve. Contra a carga do vírus a gente se protege usando máscara e praticando o distanciamento social, além de manter o ambiente ventilado - isso é muito importante! O ambiente ventilado faz muita diferença.

O segundo ponto, são aspectos endógenos, próprios das pessoas. Algumas pessoas possuem pré-disposição genética a responder mal à agressões infecciosas virais, isso também está demonstrado para COVID. Existe um estudo, inclusive, que mostra que uma mutação interferindo com a sinalização na via do interferon, acaba deixando jovens que não possuem comorbidades suscetíveis a doença grave. Por isso existe em alguns casos alguma suscetibilidade individual. E como terceiro e último, temos uma amplificação da resposta inflamatória do organismo. A resposta inflamatória do organismo serve para combater a COVID, mas às vezes ela é tão intensa que, por si só, lesa o organismo. 

O que você, então sabendo desse tripé, pode fazer para melhorar suas chances de passar por uma COVID ileso, é realizar as medidas preventivas que comentei: máscara, distanciamento social e ambientes ventilados. Isso se explica na lógica de: Se você pegar COVID, você pelo menos reduz a carga viral e sua chance de ter uma doença leve é grande. A segunda coisa é reduzir a tendência pró-inflamatória do organismo. Então, do ponto de vista da alimentação, evitar alimentos pró-inflamatórios, como comidas ultra processadas, carnes, laticínios, entre outros. Opte por alimentos anti-inflamatórios, como legumes e verduras. A dieta é importante. Outra questão é a de comportamento, exercício físico, por exemplo, é super anti-inflamatório. Então, se você puder se exercitar, idealmente uns 30 minutos por dia, 5 dias na semana, é excelente!

Outra ponto é o debate sobre vitaminas. Existe muita incerteza acerca do papel das vitaminas do sistema imunológico no enfrentamento da COVID, mas ninguém tem dúvida de que ter níveis adequados de vitaminas faz bem e é necessário para uma série de outras funções. Com base nisso, eu recomendo vitamina D para as pessoas, tomem o seu banho de sol diário, 20 minutos por dia, pelo menos, expondo uma região do corpo do tamanho do antebraço ou da perna. Se não puder fazer isso, uma suplementação de vitamina D em valores normais, cuidado com reposições e bomba de vitamina D, pois isso pode gerar casos de intoxicação. Em relação ao zinco, também. A minha sugestão é um complexo vitamínico simples, que tem ali seus 30% de necessidade diária de zinco.

7. Atualmente, quem são as pessoas do chamado ‘grupo de risco’?

O principal fator, disparado, para identificarmos os grupos de risco é idade. Acima de 85 anos, a chance de ter COVID grave está em torno de 15%. Números apontam que 85% vão ter um quadro leve moderado que não vai precisar de hospital, e 15% um quadro grave. Depois de uma sequência de faixa etárias, vem comorbidades, como insuficiência renal (pacientes que tem problemas de rins e que estão fazendo dialise), comorbidades cardiovasculares, insuficiência cardíaca, problemas do coração, problemas do pulmão, pacientes com fibrose pulmonar, pacientes com doença pulmonar previa, DPOC, diabetes, hipertensão etc. Obesidade é outro fator muito importante, que nas casuísticas norte-americanas, por exemplo, justifica porque a população deles internada com COVID é em torno de 10 anos mais jovem do que a população de outros países em que a média de peso é menor.

8. O que exatamente é o ‘distanciamento social’ e como ele ajuda?


O distanciamento social é você se manter longe daquela nuvem de gás expirado que pode te contaminar. Ele é, basicamente, para evitar a transmissão da COVID-19, uma vez que ela acontece de pessoa para pessoa por via respiratória. Se você está em um ambiente fechado, com outra pessoa com COVID respirando e jogando no ar a partícula contaminada, a chance de você se contaminar é enorme. Com o distanciamento social e máscara, isso é reduzido.  

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 (Foto: Getty Images)

9. Por que ficar em casa e o 'distanciamento social' são importantes mesmo para grupos que não estão sob 'alto risco'?

Primeiro precisamos entender o fenômeno que está acontecendo no Brasil, para explicar o porquê o distanciamento social e a máscara são importantes mesmo para os grupos que não estão em alto risco. Estou impressionada com a quantidade de casos de COVID em jovens! Para se ter uma ideia, na semana passada, a Secretária de Saúde da cidade de São Paulo falou que nas UTIs, 50% das pessoas internadas tinham idade menor que 50 anos. Isso é bem chocante. Não sabemos o quanto isso tem a ver com a variante brasileira e precisa ser esclarecido. A outra razão é que as pessoas, entre aspas, de ‘baixo risco’, levam infecção para grupos de alto risco nas respectivas casas. Avós, pais, pais de amigos... Então, é preciso entender que a COVID é um problema de saúde pública, e se as pessoas não se percebem parte da sociedade que precisa resolver esse problema, a gente vai ficar com a COVID ainda se prolongando por muito tempo.

10. Com que frequência e depois de quais atividades eu devo desinfetar as mãos?

A desinfecção de mãos, seja lavando com sabão (usando a técnica adequada), ou passando álcool gel ou liquido 70 (da forma adequada), é uma medida importante mas não se compara ao uso de máscaras e ao distanciamento social em ambientes ventilados. Porque? Porque, a essa altura do campeonato, nós sabemos também que a transmissão por fomite, que é por superfície contaminada, é um problema de bem menor magnitude do que a gente sabia lá no início, ou seja, não sabíamos nada no início da pandemia, então tomávamos um cuidado geral absoluto, mas agora conseguimos estabelecer graus de importância.

Então, obviamente, a higienização das mãos é importante, mas uso de máscara, ambiente ventilado e distanciamento são fundamentais. Agora, com que frequência higienizar as mãos? Bom, sempre que você for terminar ou começar uma atividade é interessante higienizar sua mão para evitar de estar com ela contaminada e levar ao olho, nariz, ou boca, que é quando uma contaminação por fomite pode acontecer. Por exemplo: você acabou de sair do transporte público, onde você pegou na barra para se segurar, quando sair, higiene de mãos. Chegou do supermercado com as compras, higiene de mãos.

11. Como a COVID-19 afeta o organismo das crianças?

A COVID parece afetar o organismo das crianças de forma mais branda e isso, muito provavelmente, acontece porque o sistema imune da criança é mais efetivo em lidar com a doença. Também existe evidência de que as crianças possuem menos receptores do vírus nas suas células, então menos vírus são internalizados. O fato é que, independente da explicação, as crianças, na sua maioria esmagadora, têm quadros brandos. Excepcionalmente nos vemos casos graves de COVID e, principalmente, a síndrome multissistêmica Kawasaki – a qual foi descrita em todos os países. Em que momento que essa síndrome foi descrita? No momento de pico da pandemia em seus respectivos locais: Nova York, no Reino Unido, na Itália. Porque? Porque é uma situação rara, é uma complicação rara da COVID que acabamos vendo um número razoável de casos quando a pandemia está totalmente descontrolada e existem uma quantidade de infecções absurdas acontecendo. Então, de verdade, as crianças são menos uma preocupação na COVID do que os adultos e os mais velhos. O influenza, por exemplo, causa mais problemas para as crianças do que a COVID.

Outra coisa importante de ressaltar é que a possibilidade de desencadear um evento raro, como esse da síndrome multissistêmica, não é uma exclusividade da COVID. Outros vírus respiratórios, inclusive infecções bacterianas, podem dar quadros semelhantes. Acontece que nessas situações também é raro, e como a gente não está tendo uma pandemia de nenhum desses, não estamos vendo um aglomerado de casos raros de vírus comuns. Mas se houvesse, a gente também veria manifestações raras agregadas.

12. Pacientes assintomáticos são menos contagiosos?

Essa pergunta possui uma resposta complexa, que pega muita gente. De uma maneira geral, pacientes assintomáticos e pessoas sem sintomas excretam menos vírus, então é verdade, isso quer dizer que elas, muito provavelmente, são menos contagiosas. Ocorre que essas pessoas, se elas são em torno de 50% do total de pessoas contaminadas por COVID, e estão totalmente despreocupadas por não ter nenhum sintoma, não estão usando máscara, estão indo visitar um ao outro, saindo, passeando, elas acabam determinando uma proporção de infecção na população enorme. Inclusive, tem estudo mostrando que o segmento da população mais responsável por espalhar a COVID são os jovens, inclusive porque eles possuem mais mobilidade e são os que têm o quadro mais leve, muitas vezes assintomáticos. Então sim, eles expelem menos vírus, mas são o maior problema pois circulam mais e se cuidam menos. 

13. Se eu tiver sintomas de COVID-19, o que devo fazer?

Se você tiver sintomas de COVID, a primeira coisa a se fazer é se acalmar. Gostaria de fornecer alguns dados para ajudar nesse processo de se acalmar, baseado na realidade:
A maioria das pessoas que desenvolvem COVID vai ter um quadro leve, moderado, e que não vai precisar de hospitalização. Isso pode ser evidenciado quando a gente olha, por exemplo, para os estudos onde pacientes com COVID ambulatorial, ou seja, que não estão internados, são randomizados para intervenções, assim como o grupo placebo (pessoas usadas nas pesquisas e que recebem tratamento inerte, ou seja, substâncias que não apresentam interação com o organismo e que são empregadas como se fosse ativa para finalidade de comparação).

No estudo COLCORONA, uma pesquisa que buscou estudar os benefícios do remédio anti-inflamatório Colchicina como tratamento precoce para a COVID, realizado pelo Montreal Heart Institute no Canadá, eles recrutaram cerca de 2 mil pacientes para o grupo placebo, tratando-se de uma população que tinha fator de risco de hospitalização, ou seja, idade média de 45 a 65 anos, e com comorbidades de risco (pressão alta, diabetes etc). Ele mostrou, então, que, [apenas pelo fato de acharem que estavam recebendo um tratamento precoce], 96% dessas pessoas passou pela COVID sem necessidade de hospitalização e sem tratamento especifico. Para o momento atual, nós sabemos que não tem nenhum tratamento especifico para COVID ambulatorial por via oral, existe os anticorpos monoclonais que podem ser infundidos, mas tendo em visto o custo e a dificuldade de implementação, eles estão sendo reservados para pacientes imunossuprimidos, que estão fazendo tratamento, por exemplo, de câncer, ou que são transplantados e que a gente sabe que a vacina não vai pegar direito neles. Esses pacientes estão sendo os elegíveis para receber esse tipo de tratamento. Fora esse tratamento, que é infusão de anticorpos monoclonais, a gente não tem tratamento ambulatorial para a COVID.

Um outro exemplo de situação que ilustra como a pessoa pode se acalmar, é o caso do porta aviões Roosevelt, descrito com detalhes no New England Journal of Medicine. Ele teve um surto de COVID que infectou cerca de 2 mil recrutas, uma população que era diferente do estudo COLCORANA citado anteriormente pois eram pessoas jovens, com média de idade de 27 anos e sem comorbidades. Nessa população, 98,3% não precisou de hospitalização, de onde a gente consegue concluir que a maioria das pessoas vai passar pela COVID numa boa. Mas porque a gente está presenciando o colapso do sistema de saúde e toda essa confusão? Bom, porque a quantidade de pessoas que está se infectando na comunidade é gigantesca. Desse modo, uma pequena proporção que se torna grave, fica um número absoluto grande, maior que a capacidade do sistema de saúde. Por isso que a gente precisa controlar a transmissão comunitária.

Entendido tudo isso, e depois que a pessoa se acalmou, agora ela pode tomar as medidas necessárias dentro de casa. A primeira é garantir um isolamento adequado dentro de casa para não contaminar outras pessoas. É importante deixar os ambientes bem ventilados para todo mundo, fazer as refeições separadamente, usar o banheiro de forma separada - se o local é compartilhado, que a pessoa seja a última a tomar banho, ou depois que entrou para tomar banho, que o próximo a entrar espere uns 20 minutos antes -, se for entrar em ambientes fechados use máscara, separe toalha, copo, prato, entre outros, e faça um isolamento de 14 dias à partir do início dos sintomas (ou pelo menos 4 dias após o fim dos sintomas agudos).

Além do isolamento, alguns cuidados individuas: se manter adequadamente hidratado (você sabe que está hidratado quando faz xixi clarinho regularmente); não ficar largado na cama ou sofá o dia inteiro, é importante que a pessoa se levante e se movimente, mesmo dentro do quarto dando uma caminhada para lá e para cá para ativar e circular o sangue, uma forma de prevenção não farmacológica de trombose, e, para sintomáticos, uma forma de prevenção para febre e dor; uma alimentação adequada, evitando alimentos pro-inflamatórios; e naqueles pacientes com risco de hospitalização, a pessoa pode considerar sob supervisão médica, então contatem um médico, a prescrição off label de colchicina. A colchicina parece ter um efeito de reduzir a hospitalização por COVID, entretanto, o tamanho desse efeito ainda não ficou claro e é possível que seja pequeno, ou seja, a colchicina não é uma bala de prata milagrosa (isso falando dos resultados do estudo COLCORONA), mas ela, nesse cenário de risco aumentado e sem contra indicação (sendo a principal a disfunção renal), pode sim potencialmente beneficiar pacientes, preveni-los de internar.

Basicamente é isso assim que você descobre que está com COVID. Quanto demonstra sinais de piora, ai são outras medidas.

14. Se eu estive perto de alguém que apresentou sintomas, o que devo fazer?

Se você entrou em contato com alguém que positivou para COVID, a primeira coisa a se fazer é se isolar dentro do possível. Você, então, dentro de casa se isole da melhor maneira possível e, quando precisar sair, o faça com muita cautela: com uso de máscara e com distanciamento, porque lembre que você pode manifestar COVID, inclusive, de forma assintomática. O período mais importante que essas medidas precisam ser tomadas é durante a primeira semana, pois a maioria dos casos o período de incubação é 4 a 5 dias. Na segunda semana, sem manifestar sintoma, você continua tomando cuidado, mas saiba que a chance de abrir um quadro de COVID clinicamente manifesto é menor. Em um cenário fora de escassez, o ideal seria testar com o teste do antígeno, via cotonete do nariz, ou o PCR, também via cotonete, cerca de uma semana depois do contato e após o fim dos 14 dias do contato: esse seria o cenário ideal. Mas em contexto de escassez, as vezes isso não é possível.

15. Se o resultado do meu teste for positivo, o que devo fazer? Como identifico que de fato se trata de uma emergência e preciso procurar auxílio médico?

Parte da resposta para esse questionamento está baseada na pergunta 13. O que eu queria acrescentar aqui, e que conta com muita discussão e vêm cada vez mais se restringindo ao Brasil e alguns outros países em desenvolvimento (como Índia, Filipinas, e Costa Do Marfim), é à respeito do tratamento precoce, ou seja, como se você iniciasse medicações logo que o paciente sentisse sintomas de COVID com o intuito de impedir que a doença siga um curso natural.

Só que, para março de 2021, há uma quantidade de evidência robusta mostrando que, infelizmente, por enquanto nós não temos nenhuma dessas medicações disponíveis. Por exemplo, se você olhar as diretrizes da OMS em hidroxicloroquina, não existe nenhuma evidência que o inicio precoce dessa medicação faça qualquer diferença na COVID. Além disso, quando a gente começa usar uma medicação de uso amplo na população, começamos a ver efeitos colaterais que são raros ficarem comuns, e é com tristeza que ouvi mais de uma vez casos de hepatite medicamentosa graves, inclusive, um dos pacientes evoluindo com necessidade de transplante de fígado. O mais chocante é que tratava-se de um jovem sem comorbidade, ou seja, muito provavelmente iria tirar a COVID, que é uma infecção respiratória viral, de letra. Já para a azitromicina, a quantidade de evidência acumulada também é enorme e não mostra nenhum benefício. Então, infelizmente, o tratamento precoce não se mostrou, quando investigado, de forma adequado efetiva.

Eu sei que existe literatura médica de estudos dando suporte para o uso dessas medicações, mas são estudos de qualidade metodológica ruim, então para você fazer um apanhado da literatura cientifica é preciso separar o joio do trigo. A pessoa que não é letrada em método cientifico pode, então, ter muita dificuldade de fazer isso, e é o que a gente está presenciando em toda essa confusão. Além disso, tem uma politização do tratamento precoce. Sei que muitos colegas fazem com a melhor das intenções, vivendo a aflição de precisar fazer alguma coisa pelos pacientes, e eu me solidarizo completamente com isso, acontece que o tratamento precoce tem sido usado como uma justificativa para não necessidade de medidas restritivas de distanciamento social, que implicam em impacto econômico, como fechar restaurantes e bares, que a gente sabe que são locais super espalhadores de COVID, além de academias, festas, e aglomerações. Acho que, para mim, o principal problema do tratamento precoce é, além de expor o paciente a um potencial risco de efeito colateral sem evidência de benefício e com evidência de que não há benéfico – pois tem estudo mostrando que não faz nenhuma diferença –, a gente está diante também de um cenário em que o tratamento precoce é instrumentalizado politicamente de forma a ser um argumento contra as restrições sociais.

A necessidade de buscar o hospital, por sua vez, ocorre quando se suspeita de necessidade de suporte de vida (oxigênio ou ajuda de aparelhos para respirar). Momento em que essa situação pode estar acontecendo é quando há queda da oxigenação, medida por oximetro, para valores em torno de 90%-92%, ou o surgimento de falta de ar (mais cansaço, falta de folego).  Nesse cenário, outras medicações passam a ter indicação, como o corticoide e o tocilizumabe (as duas medicações que vão se definindo como tratamento padrão da COVID grave), além de prevenção de farmacológica de trombose para aqueles sem contraindicação. 

16. Hoje existem vários tipos de testes para detectar o vírus. Qual a diferença entre eles?

De maneira bem simplificada, temos testes que detectam fragmentos do vírus, e testes que detectam a resposta imunológica ao vírus.Concluimos que, aqueles testes que detectam as respostas imunológicas, que são os anticorpos, só vão positivar quando essa resposta imunológica for detectável - e isso começa a acontecer só à partir da segunda semana, com o nível ficando realmente bom quando esses são desenvolvidos à partir da terceira semana depois do início da doença.

Então, a sorologia e o teste rápido com base em anticorpos (e com isso estou querendo dizer IGG, IGA, IGM) ele serve, em geral, para dar um diagnóstico de passado, de que aquela pessoa teve COVID. Vejo muito essa confusão de pessoas que falam tipo ‘o meu IGM veio positivo para COVID, então meu patrão não me deixa voltar a trabalhar’, o que não tem lógica. Se você quer um exame para ver o potencial risco de estar transmitindo COVID, você precisa ir atrás dos testes que detectam fragmentos do vírus, e esses são os testes do antígeno e do PCR, os dois feitos por cotonete no nariz. Então, para a população geral, essa talvez seja uma forma de discernir: os testes que são feitos por cotonete no nariz, são testes que detectam a presença de fragmentos do vírus e, à partir daí, nós inferimos potencial de transmissão ou de contaminação, necessidade de isolamento etc.

Os teste com base na presença de anticorpos contra o vírus, que são pedacinhos de proteína que nosso sistema imunológico produz contra o vírus, eles em geral servem para detectar um passado de contato com o vírus. Muito raramente vai haver uma situação em que uma pessoa está com COVID, no final da doença, e já vai ter uma quantidade de anticorpos suficiente para ser detectável. Então, você acaba detectando o final de uma doença e isso não serve de nada pois queremos fazer o diagnóstico precoce para poder isolar essa pessoa, impedir que ela transmita etc. Essa confusão precisa realmente ser esclarecida e ela ocorreu, inclusive, no início da pandemia por gestores públicos comprando kits de ponta de dedo que detectam anticorpos para a COVID, como se isso fosse detectar as pessoas que estão agora com COVID, ou seja, transmitindo.

17. Qual é o tratamento mais eficaz disponível para COVID-19 no momento?

O tratamento mais eficaz no momento, uma vez que a pessoa está com COVID grave e foi para o hospital, é suporte de vida adequado. E isso a gente consegue ver pela magnitude da diferença entre hospitais. Por exemplo, hospitais onde o suporte de vida é nível máximo, como os em Taiwan, alguns hospitais norte-americanos, alguns hospitais mesmo no Brasil, a mortalidade intra hospitalar está em torno de 15% a 20%, para COVID grave. 

Por outro lado, em alguns hospitais Brasil e mundo afora, a mortalidade fica em torno de 60% a 80%. Mas o que faz essa diferença absurda? Uma unidade de terapia intensiva que tenha os recursos necessários que o paciente precisa (oxigênio, ventilador, uma equipe multidisciplinar com médico, número adequado de enfermeiros e técnicos de enfermagem, e fisioterapeuta respiratório - fundamental para pacientes com COVID), que garante que o paciente atravesse a fase da infecção viral, saia dela, e possa seguir sua vida.

Não adianta, por exemplo, você ter ventilador, mas não ter alguém que saiba operar ou ajustar as pressões do ventilador de acordo com as necessidades do paciente. A mesma coisa com medidas de prevenção de infecção secundária: os pacientes com COVID que ficam graves estão morrendo nos hospitais de infecções bacterianas secundárias. Muito disso pode ser previnivel com técnicas irretocáveis de cuidados, como assepsia na manipulação dos cateteres, na manipulação dos pacientes, prevenção de trombose venosa, prevenção de úlcera de decúbito, medidas de prevenção de pneumonia associada à ventilação mecânica que pode complicar COVID, uma capacidade de suporte hemodinâmico, de entendimento de hemodinâmico adequado. Além disso, o que nós sabemos hoje de drogas que têm maior impacto em COVID, temos o corticoide e o tocilizumabe. 

Para COVID ambulatorial, de muito pouco acesso, existe a infusão de anticorpos monoclonais, mas que é um problema porque, além de caríssimo, precisa de infusão. Então é um paciente que não está no hospital e vai precisar receber isso em um centro de infusão, ou pelo menos passar um dia no hospital para isso.

18. Qual é a vacina mais promissora disponível até agora? Quais as principais diferenças entre elas?


Essa é uma pergunta que implica uma comparação entre as vacinas, e essas vacinas não foram comparadas em estudos, então estamos fazendo inferências com bases nos estudos de cada uma delas separadamente. Essa comparação em si não é adequada! Uma outra coisa que precisamos levar em consideração é que, o que adianta uma vacina eficaz, mas que a logística dela é inviável num determinado contexto? Então, para dar um exemplo real, temos as duas vacinas que até agora nos seus respectivos estudos mostraram um maior potencial de eficácia, que podem até ser chamadas de vacinas esterilizantes, quer dizer, impedem o desenvolvimento da COVID, que são as vacinas de NRA da Pfizer Bionthec e Moderna. Acontece que essas vacinas precisam da seguinte logística: freezers de -70ºC e uma monitorização de risco de reação anafilática, que é raro, mas pode acontecer e, por isso, a vacina não pode ser administrada em um posto de saúde qualquer, ela precisa ser administrada em um local onde haja condições de atender um choque anafilático. Isso não é uma realidade!

Quando a gente leva isso em consideração, essas vacinas, que se você olhar para a eficácia isolada são muito interessantes, o interessante delas passa a ficar cada vez mais desinteressante quando isso é colocado em contexto, principalmente na realidade brasileira. Então, a que eu vejo agora, como interessante, são todas elas. A vacina mais interessante é aquela que está mais rapidamente disponível para você.

Vem, vacina (Foto: Colagem: Stefânia Sangi)

Vem, vacina (Foto: Colagem: Stefânia Sangi)

19. Quem pode e deve se vacinar?

Todos devem se vacinar! É óbvio, seguindo a lógica de priorização. Primeiro os grupos de risco, depois nós vamos movendo para os grupos de menor risco. Quanto às pessoas que não foram representadas nos estudos, por exemplo, gestantes, a gente vai movendo com mais parcimônia.

As gestantes são grupo de risco e eu compartilho da opinião dos colegas da comunidade cientifica internacional de que mais para o final do segundo trimestre, elas devem sim se vacinar para se protegerem.

Levando em consideração que o número de doses de vacina aplicadas em pacientes ao redor já passou de 100 milhões há tempos, e que a quantidade de eventos adversos é mínima, podemos concluir que as vacinas são muito seguras e muito eficazes. As pessoas devem se vacinar.

20. Existem efeitos colaterais para quem toma a vacina?

Os efeitos adversos mais comuns reportados com essas vacinas são reações locais, como dor no braço e, eventualmente, um mal estar, uma febre, que duram questão de horas, no máximo um dia. São efeitos colaterais leves, que se colocados em perspectiva do que estamos vivendo com essa pandemia, ficam até não relevantes.

21. Em sua opinião como profissional da saúde, de que maneira o Brasil vai conseguir sair desse período catastrófico? O que precisa ser feito urgente e de que maneira a população deve se portar?

Como alguém imersa dentro da COVID desde o início da pandemia, eu acredito que a saída seja uma imunidade através da vacina, com a ajuda de períodos de restrição a agregações, ou seja, distanciamento social. A combinação desses dois vai permitir com que haja uma vacinação extensa da população, tirando a sobrecarga dos serviços de saúde, e protegendo também contra o desenvolvimento de novas variantes que escapem a vacina. Então, eu não vejo saída fácil e, por conta disso, não são só medidas médicas que precisam ser tomadas, existem medidas sociais também, como, por exemplo, auxilio emergencial. Como é que alguém pode ficar sem trabalhar, se trabalha hoje para comer amanhã? Eu entendo que essa é uma questão difícil, pois o país vive um momento enorme de recessão, mas se a gente não fizer essas escolhas difíceis, eu antevejo ainda mais dificuldade, porque a falta de controle da COVID está associada com uma recessão econômica ainda maior. Então, a escolha não é entre o que é bom e o que é ruim, mas sim entre o que é ruim e o que é menos pior.

Existe a necessidade de liderança, de informação homogênea e coesa, porque nessas situações de pandemia é muito comum teorias conspiratórias e delírios de perseguição surgirem. Inclusive, em um artigo do The New York Times, foi comentado o que a pandemia de peste bubônica na Europa nos ensinou, onde pontuaram que o grupamento humano repete comportamentos persecutórios, de que o mal vem de fora e que vem de propósito para matar. Agora é a China, mas lá na época da peste era um outro império. Então, precisamos de uma liderança com mensagens claras, bem definidas, alinhadas nos diferentes níveis da Federação em relação ao uso de máscara e restrição de aglomeração, principalmente naqueles cenários que a gente sabe que existe potencial de super espalhamento, além de um esforço sobre medida de acelerar ao máximo a vacinação. É assim que a gente vai sair dessa.

22. Onde posso encontrar informações verdadeiras e oficiais sobre o coronavirus em tempo real? 

No site oficial do Ministério da Saúde, que possui uma página destinada somente à pandemia, contendo informações que explicam o que é o coronavírus, como funciona o tratamento, quais são os sintomas, orientações para higienização correta e boletim epidemiológico, com dados de monitoramento da doença.

No aplicativo gratuito Coronavírus-SUS, plataforma disponível para celulares com sistema Android e IOS, também criada pelo Ministério da Saúde, que apresenta dicas de prevenção e notícias oficiais sobre o coronavírus em um só lugar. Além disso, ele permite que o usuário busque as unidades de saúde mais próximas utilizando o serviço de geolocalização do celular. 

A Fiocruz, ou Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), é também  referência em discussões e especialistas na área da saúde pública. O site oficial da instituição apresenta conteúdo especial sobre o coronavírus, onde é possível conferir notícias, vídeos, e tirar dúvidas sobre a pandemia.

Já a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), durante a pandemia, conta com seus canais oficiais na internet publicando diariamente conteúdos sobre o coronavírus além das entrevistas de seus especialistas cedidas para a imprensa.

Fora esses, a Organização Mundial da Saúde - OMS, e seus escritórios regionais, como a Organização Pan-Americana da Saúde, disponibilizam regurlamente a toda a comunidade científica e ao público em geral informação confiável e atualizada nos idiomas oficiais da Organização, tanto em portais dedicados à temática, como em bases de dados e ferramentas desenvolvidas para esse fim, que descrevemos a seguir.