Bolsas e índices

Por Beatriz Pacheco, Valor Investe — São Paulo


Em seis meses, o Ibovespa perdeu o chão. De dezembro passado até ontem, dia 12 de junho, as perspectivas para a bolsa brasileira foram da euforia ao desencanto. Acompanhando a deterioração do cenário, que não confirmou nenhuma das expectativas que o mercado tinha para 2024, as projeções para o Ibovespa, no fim deste ano, caíram em oito das 16 casas consultadas pelo Valor Investe. Outras quatro mantiveram seus números e, por fim, também houve quatro instituições que aumentaram as projeções para o principal índice da B3.

Mas a realidade é ainda pior: o Ibovespa acumula perdas de 10,6% neste ano.

Revisão das projeções para o Ibovespa no fim de 2024

Banco ou casa de análise Projeção 1* Potencial de alta 1* Projeção 2* Potencial de alta 2**
Ativa Investimentos 138.000 4% 135.000 12,6%
Way Investimentos 134.000 0,9% 140.000 16,7%
Guide 155.000 16,8% 140.000 16,7%
BB Investimentos 141.000 6,2% 141.000 17,6%
Hike Capital 143.000 7,7% 143.000 19,2%
Banco Inter 142.000 7% 144.000 20,1%
Genial Investimentos 142.700 7,5% 144.600 20,6%
XP Investimentos 149.000 12,2% 145.000 20,9%
Safra 142.000 7% 145.000 20,9%
Itaú 145.000 9,2% 145.000 20,9%
Terra Investimentos 145.000 9,2% 145.000 20,9%
Santander 160.000 20,5% 145.000 20,9%
Empiricus 170.000 28,1% 145.000 20,9%
BTG Pactual 147.000 10,7% 146.000 21,7%
EQI Research 160.000 20,5% 149.000 24,2%
Monte Bravo 155.000 16,8% 150.000 25,1%
MÉDIA 148.044 11,5% 143.913 20%

Alguns fatores criam essa lacuna entre as projeções e o que de fato acontece hoje com o índice:

  • as perspectivas para a bolsa no fim deste ano, um cenário hipotético, comportam um otimismo que a realidade nega a quem acompanhar a bolsa;
  • o intervalo entre as “pontas” diminuiu, por isso a média das projeções para o índice saiu de 148.044 pontos em dezembro para 143.913 pontos em junho, uma queda de nem 3% que mascara as revisões pessimistas desses cenários. Em dezembro do ano passado, 36 mil pontos separavam a visão da casa mais otimista da mais cética com a bolsa, enquanto essa diferença agora é de 15 mil pontos.

O primeiro ponto é crucial para entender toda a discussão em torno do Ibovespa hoje. Pondo de forma simples, os fundamentos para a bolsa brasileira não mudaram, e sim o comportamento de fatores exógenos que têm impacto direto sobre ela. Esses movimentos destoaram do que a maioria esperava e alteraram o destino do índice em 2024.

“Há uma desconexão entre os dados correntes da economia e as expectativas no mercado atualmente. Até revisamos para cima nossa projeção para o PIB do Brasil, que está em 2% [em 2024] agora, e estamos vendo um déficit primário para este ano menor do que esperávamos antes. Quer dizer, a economia em si não está ruim, e os resultados das empresas da bolsa estão refletindo isso. A piora está nas estimativas”, pondera Aline Cardoso, chefe de estratégia de renda variável do Santander.

A equipe de especialistas da XP relata ter começado a ver uma evolução no cenário externo, com dados econômicos melhores nos EUA e recuperação na China. Mas aí o Ibovespa se deparou com outra resistência: o risco Brasil.

Em relatório da XP ao mercado, Fernando Ferreira, estrategista-chefe e chefe da área de análise, Jennie Li, estrategista de ações, e Júlia Aquino, analista quantitativo, apontam que as ações da B3 continuaram sendo pressionadas pelos riscos domésticos.

“Uma combinação de riscos fiscais, maior cautela na política monetária e maior interferência do governo em grandes empresas continuam pesando no sentimento. Nossa recente pesquisa com investidores institucionais mostrou que o sentimento em relação ao Brasil está no menor nível de todos os tempos. É hora de ser contrário ao consenso, ou não?​”, provocam.

A casa reduziu sua visão de valor justo para o Ibovespa no fim deste ano, de 149 mil para 145 mil pontos, “devido às taxas de juros mais altas".

Um (vários) problema(s) para o Ibovespa

O movimento do Ibovespa está hoje ligado quase exclusivamente aos Estados Unidos. Especificamente, à política monetária americana e a quando se iniciará o ciclo de flexibilização dos juros por lá. Esta ação se desdobra em uma série de eventos dos quais a nossa bolsa depende para subir.

Da mesma forma, a inação do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) sobre as suas taxas vem estimulando a saída de capital estrangeiro, principal engrenagem do mercado de investimentos no Brasil e o que impede a alta da bolsa hoje. Mesmo quando há razões para ela se valorizar.

“No fim de maio, estive em Londres numa conferência do banco e conversei com muitos investidores estrangeiros. Muitos reduziram as posições overweight [investimento em algum ativo ou em um país como um todo, acima do índice de referência usado] em Brasil de 7,5% em dezembro passado para 6,5%, em média, agora. E o que mais ouvi foi como as empresas daqui estão baratas e entregando resultados, mas a bolsa não ‘anda’. Minha percepção é de que eles estão bastante frustrados, conta Aline.

O Santander era um dos mais otimistas com o Ibovespa no fim do ano passado, enxergava espaço para o índice esticar até os 160 mil pontos, e agora integra um grupo com projeção intermediária, nos 145 mil pontos.

“Por outro lado, a maior parte desses investidores estrangeiros [institucionais] tem uma visão de médio e longo prazo. Então eles podem se dar ao luxo de segurar posições que não estão ‘andando’, mas acreditam que esses ativos estão num bom preço e têm bons fundamentos, então, eventualmente, vão subir”, pondera Aline.

João Piccioni, gestor de fundos da Empiricus Gestão, traz à tona outra questão que afeta a cena brasileira: o carry trade. Esta aplicação financeira consiste em tomar dinheiro a uma taxa de juros em um país e aplicá-lo em outro de moeda diferente, onde as taxas de juros são maiores, para tentar obter lucros com base na diferença entre as taxas de juros dos dois mercados.

“O Brasil sempre foi visto como um país de carry trade, porque os juros aqui sempre foram mais elevados do que lá fora. Acontece que, com a queda da Selic, esse ‘espaço’ que sobrou [em relação à taxa de juros em outro país] começou a ficar pequeno para quem faz esse tipo de operação”, pondera.

A Empiricus notou que essa mudança de paradigma no mercado global fez com que os investidores preferissem manter seu dinheiro “dentro de casa”, ou seja, investir localmente. Especialmente no caso dos EUA, que segue com uma economia forte mesmo com juros altos.

A Empiricus Gestão tinha o cenário mais otimista para a bolsa neste ano: enxergava o Ibovespa indo aos 170 mil pontos. Então foi também a que fez a maior correção na sua projeção: baixa de quase 15% entre a estimativa de antes e a atual.

Pessimistas, mas…otimistas?

De acordo com o levantamento do Valor Investe, apesar da queda nominal das projeções para o patamar do Ibovespa neste ano, refletindo o horizonte mais fechado para a bolsa brasileira, as casas veem um potencial de alta maior para o índice. Isso porque a bolsa já caiu 10,6% este ano, portanto, o caminho até as projeções é maior. Detalhe: antes, essa trajetória seria trilhada em 12 meses, agora, faltam menos de sete meses para o fim de 2024.

Antes, analistas e economistas viam um potencial de o Ibovespa valorizar entre 0,9% (ou seja, andar praticamente de lado) e 28% ao longo de 2024. Atualmente, estimam que o índice suba entre 12,6% e 25% entre junho e dezembro.

E esses números não são irreais para o histórico do índice. De 1994 (quando o Plano Real foi implementado) a 2023, o Ibovespa já conseguiu se valorizar mais de 28% no período de um ano por 12 vezes. Só que esse comportamento não é consistente.

Quer dizer, o horizonte temporal mais esticado não necessariamente joga a favor da bolsa brasileira. Numa janela de um ano, que é relativamente pequena, a amplitude do movimento do mercado de ações é mais dependente dos gatilhos de apetite por risco do que do tempo.

A exemplo de 2023, quando, depois de muito sobe e desce, 19 pontos percentuais dos 22% de alta que o Ibovespa teve no ano foram garantidos com o movimento em novembro e dezembro.

No patamar médio das projeções feitas em dezembro do ano passado, o índice subiria 11,5% em 2024. Agora, precisa subir 20% de onde está atualmente para alcançar a projeção média atual.

Mas o Ibovespa, hoje abaixo dos 120 mil pontos, está longe dos 132 mil pontos daquele 22 de dezembro de 2023 (data-base da primeira publicação do Valor Investe que tratou das projeções para o índice no fim deste ano). Com mais de 12 mil pontos de distância entre o fechamento da bolsa naquela quase véspera de Natal e no pregão de ontem, a queda do índice nesses quase seis meses foi mais ampla do que os reajustes baixistas das projeções.

Aqui cabem parênteses: no histórico de projeções das casas de análises, é raro encontrar um relatório que tenha acertado o horizonte para a bolsa naquele ano. Isso porque, defendem os especialistas, a ideia não é "cravar" o alvo do Ibovespa, e sim medir o preço justo para a carteira diante das condições que o mercado aponta naquele momento.

Ou seja, tudo pode mudar - inclusive nada. A ideia é que essas projeções estão mais para uma "previsão do tempo" daqui a 20 dias do que para uma "leitura de bola de cristal".

Alexandre Espirito Santo, economista-chefe da Way Investimentos e professor do Ibmec-RJ, encabeça a projeção da casa, que está entre as quatro que elevaram as estimativas para o Ibovespa. A despeito do ajuste altista na sua projeção, o especialista está mais pessimista com a bolsa brasileira hoje em dia.

O que explica isso, segundo Espirito Santo, é o fato de ele ter subdimensionado um dos fatores que afetam seu modelo de projeção e puxam o Ibovespa pela sua correlação com os índices americanos, que batem recorde em cima de recorde nos últimos meses. Então, desta vez, o ajuste matemático supera a reavaliação qualitativa.

“Em dezembro passado, eu tinha uma projeção de 4,5% de alta no ano para o S&P 500, o que era muito inferior à performance que o índice americano está tendo [acumula alta de 13,65% no ano até aqui]. Corrigi essa projeção para uma alta de 6%, que ainda está distante desse patamar atual, mas eu acredito que, até o fim do ano, haverá um movimento de realização de lucros forte lá fora”, explica o economista-chefe da Way Investimentos.

Mesmo com a piora dos fatores de risco e a correção na taxa de câmbio de R$ 5,10 para R$ 5,20 (o modelo é dolarizado), a equação elevou a projeção para o Ibovespa de 134 mil pontos para 140 mil pontos.

“Outra variável importante no meu modelo é o investidor estrangeiro, para o qual tracei um fluxo líquido negativo em US$ 20 bilhões no ano, mas que atualmente já beira os US$ 40 bilhões. Acredito que existe a possibilidade, se não tivermos nenhuma grande ‘lambança’ no mercado doméstico, de esse investidor estrangeiro voltar para a bolsa brasileira ao longo do segundo semestre. Seria uma retomada lenta no fluxo, mas aí o saldo pode ir aos US$ 20 bilhões de resgates líquidos no ano”, acrescenta.

Para ele, o Brasil ainda precisará se provar em alguns pontos para que este cenário se concretize:

  • âncora fiscal - governo deve reforçar o compromisso (e não necessariamente garantir o cumprimento) da meta, que foi recentemente alterada;
  • âncora monetária - sanar dúvidas sobre o futuro do Banco Central, quem será seu novo corpo diretivo e se o comitê está dividido.

Assim, com a queda dos preços de ativos nos EUA, acompanhando o padrão histórico das bolsas, uma parte desse capital estrangeiro pode fluir para a bolsa brasileira.

Isso se o cenário doméstico permitir - ou melhor, se não afugentar os investidores.

Compensa investir na bolsa este ano?

Para os investidores com apetite por risco, sim, vale a pena entrar na bolsa brasileira neste momento. E o argumento é deveras persuasivo aos compradores: as ações estão com valores muito descontados diante de seus padrões históricos, quer dizer, estão baratas.

Em termos de ambiente para investimentos no Brasil, Fernando Siqueira, chefe de análise da Guide Investimentos, avalia que o principal ponto para uma melhora do cenário ainda em 2024 é a situação fiscal.

“O fortalecimento da percepção de que o governo vai tentar cortar custos, vetar gastos ou aumentar impostos - que, neste caso, acho um pouco mais difícil -, enfim, que vai estancar um pouco a ‘sangria’, deve provocar essa melhora. Se isso acontecer, há espaço para o real parar de depreciar e, assim, para o Banco Central voltar a reduzir os juros em algum momento no ano que vem, ou seja, uma volta a esse ciclo positivo para a bolsa”, diz Siqueira.

Mas este momento não é oportuno para qualquer investidor de risco. Apenas o alocador de renda variável com visão de longo prazo tende a colher ganhos com as posições na bolsa brasileira neste ano.

Quem estiver disposto a segurar a posição em ações por mais de dois anos e se apoia nas análises fundamentalistas para escolher ativos de qualidade poderá surfar lá na frente a “descompressão” do lucro (que pode se transformar em proventos) e do valor de mercado das empresas (que vai parar no bolso de investidores com a venda de ações), que deve jorrar recursos para a bolsa.

Mas que essa maré na bolsa vai virar não há dúvidas, a questão é não saber ainda quando isso deve acontecer.

Agora, para o investidor “trader” - aquele que compra e vende ativos financeiros na bolsa, seja ações ou derivativos, focando em ganho no mesmo dia -, o momento é ruim, porque o índice mantém a tendência de baixa. Ou seja, quem faz transações de compra e venda visando ganhos nos mesmo dia tende a se dar muito mal, porque a visão técnica para a bolsa é de que os ativos ainda não chegaram no fundo do poço.

“Mas o investidor brasileiro está tomando uma decisão errada neste momento: ele está saindo da bolsa com o Ibovespa nos 120 mil pontos e indo para a renda fixa. Daqui até o fim do ano, os títulos [de renda fixa] vão entregar 7%, enquanto os ativos da renda variável têm mais chances de disparar até o fim do ano”, diz Piccioni, da Empiricus Gestão.

Para a Ativa, o fluxo vendedor recente deixou o mercado brasileiro “muito leve”, por isso as correções para cima podem ser agudas. Ainda assim, a bolsa carece de gatilhos no curto prazo para alavancar o apetite a risco dos investidores.

Resumindo: o Ibovespa tem tudo para subir. A questão é quando, já que o horizonte para a bolsa ainda é vago...

Bolsa — Foto: GettyImages
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