Bolsas e índices

Por Nathália Larghi, Valor Investe — São Paulo


A pouco mais de um mês para encerrar o primeiro semestre, a bolsa brasileira ainda não deslanchou. Até o dia 16 de maio, o Ibovespa acumulava perdas de 4,40% no ano. E o pior: ele não é o único. Dos 26 principais índices da bolsa brasileira, apenas quatro tiveram valorização nesse mesmo período, segundo um levantamento do Valor Data com dados da B3. Em contrapartida, as bolsas americanas sobem e de forma consistente. Mas, segundo analistas, não é hora de migrar o capital para o exterior. Ainda que o caminho para que a bolsa brasileira termine o ano em alta passe por alguns desafios, ele não é impossível. Para especialistas, esse cenário depende, principalmente, de uma melhora no ambiente fiscal e da queda de juros, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil.

O quadro do mercado brasileiro fica ainda pior considerando que, dos quatro índices da B3 que registram alta no ano, apenas um tem de fato a ver com a economia brasileira, que é o Índice do Setor Industrial (INDX, que sobe 3,20% no ano), como o próprio nome já diz, composto pelas empresas dos grandes setores industriais nacionais, entre eles os de commodities, que vão muito bem, obrigada. Os outros três, um é formado pelos recibos de ações de empresas americanas (chamados de BDRs) e os outros dois são fundos imobiliários, que têm cotas negociadas em bolsa.

Por mais contraditório que parece, os ventos da economia brasileira vão a favor de uma possível valorização da bolsa. No ano até agora, pode-se dizer que os indicadores de atividade local estão majoritariamente positivos. Em março, as vendas do varejo ficaram estáveis, mas vieram melhores do que o esperado. Por outro lado, a produção industrial voltou a crescer, mas menos do que as expectativas. Já os dados que medem o volume dos serviços prestados mostraram uma aceleração, inclusive acima do previsto.

Isso significa, portanto, que a atividade econômica segue aquecida. Por que, então, isso ainda não se reflete na bolsa? Afinal, com uma economia em alta, as empresas tendem a ter bons resultados e isso deveria pesar em suas ações. Mas, segundo analistas, a razão principal para isso não estar ocorrendo vem justamente lá de fora. Enquanto os juros americanos não caírem, será mais difícil “destravar” a bolsa por aqui.

Para os especialistas, isso acontece porque os juros maiores nos EUA atraem investimentos para os títulos públicos americanos, considerados os mais seguros do mundo e que, neste momento, estão com rendimentos recordes justamente por conta dos juros elevados. E isso se reflete aqui. Uma vez que as taxas americanas estão altas, o Brasil também precisa manter os juros um pouco mais altos para que seus títulos consigam “competir” com os americanos e também atrair investimentos. Trocando em miúdos: em primeiro lugar, a renda fixa americana se destaca, em segundo vem a renda fixa brasileira tentando também achar um lugar ao sol, sobra, quando muito, o bronze para as ações brasileiras, que tentam correr por fora.

“Os dados de atividade econômica local estão bons. Se olharmos o resultado das empresas, não tem sido ruim, inclusive a expectativa de lucro do Ibovespa está crescendo. O que atrapalha a bolsa nesse momento é a questão da queda, ou melhor, da "não queda", dos juros americanos. Os cortes estavam sendo muito aguardados pelo mercado e, inclusive, essa ideia de que eles aconteceriam em breve foi o que sustentou as altas da bolsa no fim do ano passado. Mas a queda não aconteceu”, explica Fernando Siqueira, chefe de análise da Guide Investimentos.

Com a perspectiva de que os juros ficariam menores, o rendimento dos títulos públicos americanos também cairia. Portanto, os investidores logo trataram de buscar rentabilidades maiores, alocando em ativos e países mais arriscados, como a bolsa brasileira. No começo deste ano, porém, dados da economia norte-americana mostraram que a atividade ainda estava pujante por lá, o que traz mais inflação. Os próprios indicadores inflacionários mostraram que a alta dos preços não estava totalmente sob controle. Com isso, as apostas de que os juros americanos cairiam em breve perderam força, o que penalizou os ativos de risco de modo geral. E a B3 foi levada de roldão por essa mudança de expectativas.

Ainda assim, a bolsa americana conseguiu resultados bem melhores do que a brasileira nesse começo de ano. O índice S&P 500 registrava 11,1% de alta, no ano, até o dia 16 de maio. O Nasdaq, por sua vez, subia 11,2% no mesmo período, e o Dow Jones, 5,8%. Mas, segundo analistas, muito disso veio de ações específicas, especialmente as de tecnologia, que ainda surfavam a onda da “corrida da inteligência artificial”.

"A bolsa americana ainda está sendo puxada pelos papéis de tecnologia. E realmente a maioria das empresas de tecnologia mostrou bons resultados. E diferente do que aconteceu aqui, as ações de maior peso nos índices lá registraram balanços positivos, o que puxou a bolsa como um todo. Já no Brasil, Petrobras e Vale, por exemplo, apresentaram resultados fracos”, afirma Siqueira, da Guide.

No entanto, o analista não acredita que seja um bom momento para migrar para o mercado americano. Isso porque, segundo Siqueira, as bolsas dos EUA já registraram fortes altas e, caso os juros americanos caiam (o que ele acredita que aconteça ainda neste ano), a bolsa brasileira tende a ter mais fôlego para subir.

Acho um pouco tarde para ir para o mercado americano. O real se depreciou e bolsa lá já subiu bem e agora já está mais cara. É bom ter uma exposição internacional, mas não acho que seja a hora de aumentar. A economia americana, inclusive, está desacelerando e a onda da inteligência artificial nas bolsas pode chegar no limite em breve”, afirma.

Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Way Investimentos, concorda que não é um bom momento para migrar o capital para o exterior, especialmente por conta dos preços em que a bolsa está sendo negociada lá fora após sucessivas altas. Ele pondera, no entanto, que a bolsa brasileira também tem obstáculos, inclusive fatores pontuais, como a recente troca de comando da Petrobras.

"Eu não recomendo esse movimento [de migração de capital]. Agora, nesses preços, não. O que acontece é: a bolsa brasileira está relativamente barata olhando para um horizonte longo. O problema é que, além das questões macroeconômicas, a gente tem outras questões microeconômicas. Por exemplo, a situação da Petrobras, foi uma ducha de água fria no mercado, porque ela mostra a tal da ingerência política. A própria Vale, que é uma empresa já privatizada, passa por situações em que o governo tenta sugerir nomes para a presidência, para o conselho. E isso não é algo positivo. Essas coisas atrapalham junto com a questão macroeconômica", diz.

Para Espírito Santo, situações corporativas desse tipo aumentam mais a percepção de risco para o mercado e podem afastar os investidores. No caso da estatal, ainda há o agravante de que ela representa 13% do Ibovespa. Portanto, um movimento brusco de suas ações é capaz de arrastar o índice para baixo ou para cima.

Outro risco que fica no radar dos investidores e pode atrapalhar a bolsa neste ano é a questão fiscal. Atualmente, o governo tem a meta de zerar o déficit em 2024 (ou seja, equiparar seus gastos e receitas). O cumprimento desse objetivo seria um sinal a investidores de que a saúde financeira do país está em dia. Isso diminuiria a percepção de risco e, portanto, os prêmios exigidos para se investir no Brasil. Ou seja: com a percepção de que as contas públicas estão sob controle e a atividade em alta, mais investidores se sentiriam confortáveis para investir no Brasil, mesmo com taxas de juros mais modestas.

No entanto, segundo o economista-chefe da Way Investimentos, o cenário fiscal não é dos melhores e o pior: a tragédia trazida pelas chuvas no Rio Grande do Sul tende a deixar a situação ainda mais complicada. Além das óbvias consequências desastrosas no âmbito humanitário, a calamidade tende a mexer tanto com a inflação, já que a produção, especialmente do agronegócio do estado fica comprometida, quanto com as contas públicas, uma vez que muito dinheiro precisa ser direcionado para a região a fim de reconstruí-la.

“Esse evento no Rio Grande do Sul tem uma implicação muito mais séria do que está sendo falado. Essa tragédia tende a afetar o crescimento do PIB, a inflação deve ser impactada para pior e isso tudo afeta ainda mais a questão fiscal”, afirma o especialista.

Portanto, segundo o professor, é preciso que haja um sinal muito forte para os investidores (especialmente os estrangeiros) de que o país está comprometido com âncoras fiscais e com a saúde das contas públicas. “A gente tem hoje uma regra fiscal que está absolutamente questionada, porque o próprio governo mexeu nas metas e isso não é bom”, afirma.

Além da melhora da questão fiscal, outro “gatilho” que deve ser acionado para atrair investidores para a bolsa e, enfim, ajudar o Ibovespa a fechar o ano no azul vem do próprio Banco Central Brasileiro. Adriano Yamamoto, chefe comercial da corretora do C6 Bank, lembra que no fim do ano, a autoridade monetária terá novos membros e um novo presidente, indicados pelo governo atual. Caso o “sinal” passado por eles seja de que será tolerada uma inflação maior, isso tende a afugentar investimentos.

“No fim do ano vence o mandato do Roberto Campos Neto, atual presidente do BC, e de outros diretores. Como na última reunião do Copom os membros indicados por esse governo votaram por um corte de juros maior [de meio ponto percentual, sendo que o grupo dos diretores que devem sair do BC em breve votaram pela redução de apenas 0,25 ponto percentual] , pode ser que essa seja a postura do ‘novo’ Banco Central”, afirma o especialista. “Se você tem uma decisão de um corte mais alto de juros, pode significar que você está aceitando uma inflação um pouco mais alta para frente”, afirma.

Onde estão as oportunidades em meio a esse cenário?

Apesar do cenário inspirar cautela, os analistas afirmam que a perspectiva é positiva para a bolsa neste ano, especialmente porque espera-se que realmente haja uma queda de juros, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil.

“A gente teve uma 'reprecificação' da curva de juros. No fim do ano passado, esperávamos que cairia mais. Mas mesmo com essa mudança, as quedas [de juros] vão acontecer, ainda que mais lentas. Então, isso já será um componente positivo para a bolsa. Outra coisa que vale destacar é que passamos por algumas reações exageradas no mercado, tanto no otimismo, no fim do ano passado, quando achávamos que os juros cairiam muito, quanto no pessimismo agora”, afirma Phil Soares, analista da Órama.

Ainda que a Selic termine o ciclo de cortes em um patamar mais alto do que o projetado, o cenário é de queda de juros e, portanto, isso tende a beneficiar ativos da economia local, segundo o especialista. “Em linhas gerais, acho que vai ter uma melhora da bolsa e das empresas mais alavancadas [leia-se, endividadas], especialmente nos setores mais ligados à atividade local. Ainda assim, preferimos adotar uma postura mais cautelosa, sempre de olho em companhias com público de renda mais alta, como Arezzo, ou de consumo básico, como o atacarejo Assaí”, afirma.

Yamamoto, do C6, concorda que os juros menores tendem a beneficiar companhias mais sensíveis à Selic, como vestuário, construção e outros setores domésticos. Para ele, esses segmentos tendem a ter uma resposta mais rápida do que os demais. Ele afirma, porém, que os investidores precisam avaliar cuidadosamente as empresas, a partir de seus resultados e projeções, a fim de achar as melhores oportunidades.

Siqueira, da Guide, também sugere que o trabalho de "curadoria" das ações seja cuidadoso, apesar de destacar que uma queda de juros pode ajudar a bolsa como um todo. Ele afirma, porém, que os setores que representam as melhores oportunidades são os de vestuário, alimentos, saúde e seguro.

"Quando a bolsa começar a melhorar, o mercado vai primeiro nas empresas maiores. Algumas das nossas apostas são o BTG Pactual, que é mais sensível a juros, mas tem ido muito bem e ganhado participação de mercado, as Lojas Renner, porque acreditamos que o pior já passou e o segmento de alimentos. Temos recomendado Brasil Foods, JBS e Minerva, que é uma aposta mais arriscada. Em seguros, vale olhar com calma, porque cada uma das empresas desse segmento tem uma característica e história própria para contar. O lado positivo é que elas não dependem muito da atividade local. Por fim, empresas de saúde também são uma boa aposta, porque são sensíveis aos juros, mas não é um setor cíclico, que tende a se sair bem, especialmente com o envelhecimento da população etc", afirma.

Seja como for, o especialista reitera que "não dá para contar apenas com a mudança do cenário macroeconômico". Para ele, é fundamental que os investidores façam um "segundo filtro" a fim de escolher empresas com bons fundamentos e que possam se sair bem mesmo caso os "gatilhos" para a bolsa subir não aconteçam.

patinação — Foto: Getty Images
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