Colunas de Hudson Bessa

Por Hudson Bessa

Professor universitário e especialista em fundos de investimento

São Paulo


Uma das vantagens de lecionar matérias relacionadas a realidade cotidiana é poder criar o link entre a teoria e a realidade e envolver os alunos na tarefa de entender a teoria diretamente por meio das situações reais que eles vivem em seu dia a dia. No meu caso, como leciono disciplinas de mercado financeiro, em específico gestão de renda fixa e renda variável, o que não falta é notícia para interpretar.

Na semana passada apliquei uma prova em que pedi aos alunos que, a partir da ata do COPOM de maio, debatessem os efeitos que a redução de 0,25% ao ano da taxa básica de juros, contra a expectativa de 0,50% ao ano, teria na economia, na rentabilidade das classes de ativos e no resultado das empresas. Coincidentemente, nesta mesma semana, uma amiga me perguntou como seria possível as ações continuarem caindo em meio a redução da taxa de juros e melhora da economia, que vem performando melhor que o esperado.

Entre a pergunta da minha amiga e a resposta de boa parte dos alunos percebi que havia um fio condutor (a tal coincidência que citei acima), em ambos os casos existia uma visão um tanto mecanicista, automática, e um certo desapreço pelo contexto.

Sobre a questão da elevada taxa de juros, é preciso lembrar que uma das heranças da covid-19 foi o surto inflacionário provocado pela desarticulação das cadeias globais de produção conjugada com a pressão de demanda decorrente dos altos déficits fiscais e expansão monetária. O remédio amargo administrado por todos os bancos centrais ao redor do globo foi elevação dos juros e contração monetária.

A desinflação tão almejada foi atingida, porém com ímpeto menor do que o esperado, ou seja, o nível de preços ainda se situa em patamar acima das metas de inflação de muitos países. Resultado, o Banco Central americano e Europeu, vêm mantendo suas taxas básicas de juros ainda em patamar contracionista.

No front externo a geopolítica continua complicada, com o confronto Rússia e Ucrânia, Israel e Hamas e a constante ameaça de contágio na região do Oriente Médio.

Dois fatores mais estruturais vêm atuando para tornar a inflação mais resiliente, com impacto direto sobre a margem de manobra para redução dos juros, o arrefecimento da globalização e a transição energética. Ambos devem pressionar custos e preços ainda por alguns anos.

O quadro internacional vem sendo dominado por maior incerteza e a busca por ativos para proteção prova que o medo está em alta. Neste ano as cotações do ouro e prata batem recordes e os criptoativos ativos continuam subindo forte, apesar da volatilidade.

Neste contexto global, o Brasil precisa se manter competitivo na briga por investimentos estrangeiros e naturalmente enfrenta um piso para a redução da Selic. Aos olhos do capital externo nossa taxa básica de juros tem de pelo menos compensar o juro americano mais a percepção de risco do país. Ou seja, quanto mais alta a taxa americana, menor o espaço para reduzir a taxa brasileira.

Sobre a percepção de risco do país, a saída de recursos dos investidores estrangeiros é um indicador de que ela não está boa. Todos os cinco primeiros meses do ano registram saídas de capital, que já acumula a cifra de quase US$ 35 bilhões no ano.

Voltando à ata do Copom e a pergunta original sobre os motivos pelos quais as taxas de juros para empréstimos não cedem, pelo menos na intensidade da Selic, e a Bolsa não empina, ao que parece o prêmio de risco do país está mais alto.

Nos últimos meses o Governo emitiu quatro sinais bastante negativos, quais sejam: a redução da meta de superavit fiscal, a intervenção na Petrobras, tentativa de influir na ex-estatal Vale e a desarticulação no Congresso, que o levou a sucessivas derrotas em votações.

O desapreço pela disciplina fiscal e a insistente convicção de que as empresas públicas devem atuar de forma parafiscal para estimular a economia, trazem lembranças da política econômica do período Dilma Rousseff e criam calafrios. As cicatrizes da denominada Nova Matriz Econômica e os dois anos seguidos de recessão que seguiram ao experimento freiam o espírito animal de qualquer empresário um pouco mais experiente.

Já o desacerto nas negociações com o Congresso cria dúvidas sobre a capacidade do Governo de fazer caminhar pautas mais estruturantes como a reforma tributária e até sobre a capacidade em propor e liderar a discussão de projetos de longo prazo. Por outro lado, a captura do orçamento por deputados e senadores tem levado a perda de eficiência na alocação dos recursos públicos, que mais financiam obras paroquias em municípios do que projetos de longo prazo necessários ao desenvolvimento do país.

O resultado deste estado de coisas é a deterioração das expectativas, principalmente as de longo prazo, que precifica um risco maior no horizonte e pressiona a taxa de juros longa. Ou seja, o que se exige de prêmio de risco deve mais que compensar a redução na Selic. Não é à toa que o Tesouro IPCA está pagando mais de 6% ao ano além da inflação.

Com expectativas ruins e taxa de juros de longo prazo nas alturas, o investidor prefere se manter em juros do que arriscar na Bolsa. Já os empresários, estes preferem adiar os investimentos. Vale lembrar que os empréstimos de longo prazo e as taxas utilizados nos valuations das empresas são balizados pela curva longa de juros.

Em resumo, as pessoas tomam decisões olhando para o futuro e quando percebem que o risco está alto preferem a segurança. O medo de ganhar pouco é menor do que o de perder muito.

Hudson Bessa - Economista e sócio da HB Escola de Negócios
hudson@hbescoladenegocios.com
www.hbescoladenegocios.com

Hudson Bessa — Foto: Arte sobre foto/Divulgação
Hudson Bessa — Foto: Arte sobre foto/Divulgação
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