Opinião
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Por Regina Esteves*

A necessidade de investimentos em medidas para a adaptação à mudança do clima nunca foi tão evidenciada como nos últimos tempos. Os eventos climáticos extremos representam o principal fator de risco à economia global na próxima década e é urgente fortalecermos a capacidade de resposta a situações de calamidade pública e reduzirmos a exposição a vulnerabilidades. Tal desafio pede ações coletivas e integradas e o setor privado é essencial nesta agenda, seja ao efetivamente alinhar suas estratégias de negócios e inovação aos princípios do desenvolvimento sustentável, seja ao conferir visão estratégica e sistêmica ao seu investimento social privado para inserir inteligência social em suas doações, seja no apoio a vítimas de desastres como no suporte a políticas públicas e organizações da sociedade civil que atuam no enfrentamento aos efeitos das mudanças climáticas.

O ano de 2023 foi o mais quente da história, segundo o monitoramento da Organização Meteorológica Mundial (OMM), com recordes de temperatura sendo observado em localidades tão distintas como China, Turquia, Marrocos e Brasil. Por aqui, o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) reportou, no ano passado, recorde de 1.161 ocorrências de chuvas excessivas, alagamentos e deslizamentos de terra, média superior a 3 eventos extremos por dia. Outros números do Cemaden também assustam: estes eventos resultaram em 123 mortes, mais de 9 mil feridos, quase 500 mil desalojados, perdas materiais superiores a R$ 5 bilhões e prejuízos econômicos próximos de R$ 25 bilhões, dando a magnitude do problema e indicando a implicação direta destes efeitos para o setor privado.

As doações de empresas em situações de desastres climáticos estão aumentando, movimentação que é consistente ao avanço da sustentabilidade corporativa e à necessidade de ampliação de recursos imposta pela maior frequência e intensidade dos eventos extremos. Dados do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (OCHA, em inglês) revelam que há um gap crescente entre a captação e a necessidade de recursos para alívio humanitário em perspectiva global. A diferença que era de 36% em 2019 já saltou para 58% em 2023. Nesse curto espaço de tempo, as doações corporativas para desastres climáticos foram multiplicadas em 62 vezes, passando a representar quase 10% do esforço global. Esses mesmos dados não estão disponíveis para o Brasil, mas sabemos que o percentual de empresas que declarou doar recursos para ações emergenciais subiu de 43% para 77% entre 2017 e 2022, de acordo com dados do Benchmarking do Investimento Social Corporativo (BISC), pesquisa anual realizada pela organização social Comunitas.

Segundo o BISC, o investimento mediano de empresas e fundações ou institutos corporativos em ações emergenciais após desastres climáticos foi de R$ 851 mil em 2022. Esta cifra pode ter subido em 2023, diante do retrato resumido acima, mas ainda fica bastante aquém dos padrões de economias desenvolvidas como os Estados Unidos, onde o aporte mediano foi de R$ 2,2 bilhões em paridade de poder de compra. Vale salientar que tais recursos compõem uma força-tarefa com outros atores no enfrentamento a emergências e que, em territórios específicos onde há poder público e sociedade civil enfraquecidos, podem ser determinantes para o alívio humanitário das comunidades atingidas.

A literatura acadêmica sistematiza os principais desafios que o setor privado enfrenta nas frentes de apoio emergencial após desastres, com claro destaque a questões de ordem logística de armazenamento, transporte e distribuição de itens e de articulação das ações com o poder público, organizações locais e população afetada para endereçar efetivamente as necessidades daquela comunidade e evitar sobreposições de esforços e desperdício de recursos.

Do ponto de vista prático, a pesquisa BISC, liderada pela Comunitas, identificou algumas práticas corporativas que vêm se mostrando efetivas em situações de emergência: são: i) reserva específica de recursos para apoio emergencial, uma vez que a urgência pede agilidade na liberação das doações; ii) atuação junto a parceiro de confiança da sociedade civil, que ofereça capilaridade para chegar aos territórios, eficácia para endereçar as necessidades específicas de cada comunidade, trabalho em rede para evitar sobreposição de esforços e capacidade de atendimento a políticas de compliance; iii) envolvimento das unidades de negócio e disponibilização de suas especializações, como dados, tecnologias e logística; e iv) direcionamento da estratégia social para o pós-crise, oferecendo suporte à forte queda das doações que acontece quando cessam a comoção pública e cobertura de mídia.

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Além de conferir maior eficácia e inteligência ao apoio privado em desastres, é essencial que o investimento social corporativo também exerça seu papel estratégico no desenvolvimento de capacidades para a adaptação climática. No Brasil, um dos eixos de atuação onde a inteligência social corporativa já mostra colaboração relevante nesse sentido é na produção de dados e conhecimento para suporte a territórios mais vulneráveis, a exemplo da Iniciativa Ação Climática, realizada pelo Instituto Votorantim em parceria com a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) e Instituto Itaúsa, que oferta indicadores de diagnóstico e ferramentas de gestão a lideranças públicas com o objetivo de incentivar ações práticas de enfrentamento à mudança do clima.

Da mesma forma, o investimento social corporativo tem grande potencial de impacto positivo através do fortalecimento de capacidades estatais em frentes como a elaboração de planos de crise e captação de recursos, especialmente nas comunidades do entorno de operações das empresas em cidades carentes de insumos básicos de gestão e infraestrutura. O investimento social é também a estrutura que fortalece o posicionamento da empresa na agenda ESG e que utiliza seu poder de mobilização e influência para articular atores e incidir no debate público. Cada empresa precisa reconhecer suas capacidades e sinergias com a temática e atuar à sua forma, mas é imperativo que o setor privado como um todo atue de forma proativa na agenda climática.

*Regina Esteves é cofundadora do Programa Juntos pelo Desenvolvimento Sustentável, que desde 2013 atua pelo desenvolvimento social e econômico do país por meio do aprimoramento dos serviços públicos. Participa ainda de diversos conselhos, sociais e corporativos, dentre eles: Conselho Social da FIESP, Conselho de Educação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Conselho do Fundo Social de São Paulo.

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