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Por Joana Cannabrava


Será que nudez é sinônimo de empoderamento feminino? (Foto: Ilustração: Juliana Ali) — Foto: Glamour
Será que nudez é sinônimo de empoderamento feminino? (Foto: Ilustração: Juliana Ali) — Foto: Glamour

Na primeira vez que eu postei uma foto do meu corpo nas redes sociais, me senti livre. Me senti poderosa e dona de mim. Aí eu conheci Joice Beth, autora do livro “O que é Empoderamento?”, e alguma coisa mudou.

Estávamos conversando sobre ser mulher quando ela afirmou que nudez, ensaio sensual e corpo livre nas redes sociais não são automaticamente empoderamento feminino. Foi quando minha cabeça deu um tilt (provavelmente o mesmo que está dando na sua neste momento).

É, não foi fácil assimilar essa informação. Precisei ouvir bastante e refletir mais ainda. Mas, depois que entendi o ponto de vista da escritora, passei a concordar com a Joice – e resolvi convidá-la para explicar, com suas próprias palavras, o motivo da sua afirmação. Vem comigo:

Um dia li uma afirmativa sua que me fez parar e repensar a minha percepção sobre o termo "empoderamento feminino". Por que você acredita que nudez não é empoderamento?
Quando falamos em opressões de gênero ou outra opressão qualquer, como racismo, por exemplo, estamos falando das relações de poder que se incorporaram à nossa sociedade, desenhando uma hierarquia, devidamente pautada pela pirâmide social. Homens, brancos, héteros e cisnormativos ficam no topo dessa pirâmide. Abaixo estão as outras categorias, como mulheres e pessoas negras. Empoderamento fala sobre isso, sobre subverter estruturas de poder. Por isso, tanto faz a sua nudez como forma de protesto, porque ela não subverte estruturas de poder – principalmente se sua nudez for aquela considerada "aceitável" pelo patriarcado.

Mulheres são objetificadas e vendidas há décadas. Embora essas mulheres fossem remuneradas, os editoriais reforçavam a ideia de corpo como objeto de dominação e deleite masculino. E eram sempre mulheres brancas, magras e dentro do padrão patriarcal de beleza que é excludente e racista. Então, não é uma questão moral, é uma questão política: nudez pode até contribuir para a relação da mulher com o próprio corpo, mas não representa em si um enfrentamento e nem instrumentaliza um questionamento que possa romper com as estruturas de poder que nos oprime.

Joice Berth: arquiteta, escritora e feminista (Foto: Instagram/Reprodução) — Foto: Glamour
Joice Berth: arquiteta, escritora e feminista (Foto: Instagram/Reprodução) — Foto: Glamour

Na prática, qual o risco de perdermos o verdadeiro sentido da palavra empoderamento?
Empoderamento é um neologismo que não deve ser levado ao pé da letra. Neologismos são palavras formadas a partir de outras já existentes e, que nem sempre vão ter o mesmo sentido. Logo, empoderamento não é apenas uma palavra, é um conceito a ser colocado em prática de maneira processual, unindo a ação política individual e coletiva para emancipação e fortalecimento de grupos minoritários. Tem sido desviada para o sentido “visual” da palavra que seria: dar poder. Não é isso. Empoderamento, na perspectiva de luta social, é conscientização social que determina a prática política por emancipação. Perder esse sentido é aderir ao que Silvia Faludi chama de Backlash Antifeminista. Ou seja, quando usamos sob uma perspectiva errada, fortalecemos o sistema de dominação que precisamos combater.

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Quais são os principais problemas que esse sistema de opressão traz hoje para as minorias do Brasil?
Ninguém nasce sabendo que é oprimido, embora alguns mais atentos percebam. E ninguém nasce opressor, e sim assimila privilégios e não os questiona como principal formador de desigualdades sociais. Então, é muito natural que a gente reproduza comportamentos opressores sendo homem, mulher, negro/a, indígena e principalmente brancos/as. Paulo Freire, um dos pilares teóricos que uso no meu livro, fala em sub-opressores. São pessoas que, mesmo fazendo parte dos grupos minoritários, se rendem ao sistema de opressão e passam a agir, conscientemente, da mesma forma, ignorando que isso se volta contra eles. E vemos muito isso em todos os movimentos sociais. O grande problema é que não avançaremos se não questionarmos e combatermos aquilo que nos foi passado de geração em geração. Precisamos pensar que não fomos nós que criamos esse sistema, mas somos responsáveis pela sua transformação, pelo bem de todos, inclusive o nosso. E só chegamos a essa conclusão quando nos conscientizamos profundamente sobre todos os elementos que formam essa estrutura.

Capisce?

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