Séries

Por Arthur Almeida, com edição de Luiza Monteiro

Durante a Segunda Guerra Mundial, a ascensão do nazismo promoveu a perseguição de judeus por diversas regiões da Europa. Milhões de pessoas foram mortas e submetidas a violências diárias dentro e fora dos campos de concentração. Para muitos, a única possibilidade de sobreviver foi se escondendo.

Um dos relatos mais conhecidos sobre esse período tenebroso está no Diário de Anne Frank. O best-seller narra o dia a dia de mais de dois anos de duas famílias confinadas dentro de um anexo secreto em Amsterdã, na Holanda.

Apesar dessa história já ser amplamente difundida, há um aspecto dela que é pouco conhecido: o lado “de fora” do esconderijo. Para que os Frank e seus companheiros tivessem acesso a mantimentos, jornais, livros e outros objetos, eles precisavam da ajuda de pessoas de confiança que não estavam na mira dos invasores alemães.

Uma das responsáveis por isso foi Miep Gies. A jovem atuava como secretária do pai de Anne, Otto Frank, em seu escritório, onde também se encontrava o anexo secreto. Ela se tornou uma amiga próxima de toda a família e foi quem guardou o diário da adolescente após sua captura pelos nazistas.

Depois de anos como personagem secundária, a história de Miep ganha, pela primeira vez, o protagonismo na minissérie A Small Light. Os episódios sairão semanalmente e o lançamento está previsto para 1° de maio, às 21h, no canal da National Geographic, e nos serviços de streaming Disney+ e Star+ no dia 2.

“Desde o início, estávamos empenhados em contar uma história diferente, que complementasse o diário. Queríamos apresentar essa jovem que, desde que recebeu o primeiro pedido de ajuda dos Frank, disse ‘sim’ instantaneamente e continuou a dizer ‘sim’ durante dois anos. Sua liderança em um momento tão angustiante é inspiradora e merece ser conhecida”, relata o showrunner e roteirista Tony Phelan, em entrevista a GALILEU.

Quem foi Miep Gies?

Miep Gies (interpretada na série por Bel Powley) nasceu em 15 de fevereiro de 1909 em Viena, na Áustria, como Hermine Santrouschitz. Sua família era católica e, sem dinheiro para alimentá-la após a Primeira Guerra Mundial, enviou-a para ser cuidada por uma família adotiva nos Países Baixos. Ela morou com eles até se casar, em 1941, com o holandês Jan Gies (Joe Cole), o que lhe garantiu que fosse poupada.

Mesmo em meio à recessão econômica que vivia a Europa, Miep conseguiu um emprego com Otto Frank (Liev Schreiber) e passou a trabalhar com ele em sua empresa, Opekta. Como secretária e contadora, ela realizava atendimento aos clientes, respondendo a perguntas sobre o processo de fabricação de geleias por telefone e correio.

Quando Margot (Ashley Brooke), a filha mais velha dos Frank, recebeu uma convocação para o campo de concentração, a família decidiu se esconder e Miep foi uma das responsáveis por abastecer o esconderijo. Também foi ela quem levou a jovem ao local, fugindo por bicicleta da fiscalização dos oficiais alemães.

Além dos cuidados diários com as oito pessoas no anexo secreto, Miep e seu marido ainda prestaram ajuda a outros judeus durante o Holocausto. Eles auxiliaram crianças a ficarem abrigadas com famílias não judias e esconderam um universitário que se recusou a assinar uma declaração de lealdade aos nazistas em sua própria casa.

Quando os policiais encontraram o anexo secreto, em 4 de agosto de 1944, ela foi poupada da prisão após um dos oficiais perceber que ela era austríaca, como ele. Mas isso não impediu que Miep ainda fizesse uma última tentativa de suborno para libertar seus companheiros.

Cena da série em que Miep Gies [Bel Powley] e Otto Frank [Liev Schreiber] observam a chegada dos oficiais nazista a Amsterdã, após a invasão da Holanda — Foto: Divulgação/NatGeo
Cena da série em que Miep Gies [Bel Powley] e Otto Frank [Liev Schreiber] observam a chegada dos oficiais nazista a Amsterdã, após a invasão da Holanda — Foto: Divulgação/NatGeo

Mesmo com todos no campo de Auschwitz, Miep nunca perdeu as esperanças. Ela tomou as rédeas da empresa de Otto e garantiu que os negócios continuassem funcionando e o escritório — que, anos mais tarde, viria a ser o museu Casa de Anne Frank — fosse preservado.

Quando os judeus foram liberados após o fim da guerra, Otto foi o único sobrevivente. Ele voltou para Amsterdã e passou a morar com Miep. A secretária lhe entregou o diário de Anne (Billie Boullet) que havia guardado e o ajudou a publicá-lo.

Com o reconhecimento da obra, Gies passou o resto de sua vida palestrando sobre os horrores vividos durante aqueles anos e humanizando os personagens que aparecem em suas páginas, além de também escrever sobre o assunto. Ela morreu em 11 de janeiro de 2010, aos 100 anos.

Do “lado de fora”, para as telas

Para realizar a adaptação da história de Miep Gies, o showrunner Tony Phelan conta que a equipe por trás do roteiro trabalhou durante cinco anos em pesquisas antes das filmagens começarem. “Tentei colocar as mãos em tudo o que eu podia, não apenas sobre Meip e Jan, mas tudo o que envolvia seu mundo, a resistência holandesa e os históricos de Amsterdã e das locações em que estaríamos”.

A GALILEU, Bel Powley destaca que Miep estava apenas em seus 20 e poucos anos quando foi colocada em uma situação tão delicada. “Por ela ser tão relacionável, a narrativa escancara os horrores acontecendo do ‘lado de fora’ da estante [que mascarava a entrada do anexo], mas também lembra que, apesar de tudo, ainda havia humanidade”.

Com o passar do tempo na minissérie, Miep é retratada como ganhando cada vez mais responsabilidades e isso se traduz em uma mudança brusca em seu comportamento. Outrora vivendo ao máximo, com um emprego que gostava, festejando com as amigas, recém-casada e com uma boa relação com sua família, a personagem precisou se tornar uma pessoa distante e desconfiada para sobreviver e proteger seus companheiros.

Justamente para enfatizar essa mudança, Phelan explica que alguns eventos e personagens da história precisaram ser alterados ou criados. Entre eles, uma melhor amiga para Miep, Tess (interpretada por Eleanor Tomlinson). “Essa figura foi inventada para explicitar como outros moradores da cidade não judeus fizeram escolhas diferentes das de Miep, de modo que, conforme os eventos aconteciam, as duas personagens se encontram em circunstâncias muito diferentes, dois extremos opostos, inclusive. Tess colaborando ativamente com os nazistas, enquanto Miep fazia parte da resistência”, aponta o roteirista.

De forma a se preparar para um papel tão complexo, Powley relata que fez um extenso "laboratório". “A primeira coisa que fiz foi ir para Amsterdã. Por lá, mergulhei naquela realidade, peguei uma bicicleta, visitei a casa em que ela morava, pedalei até o local onde levou Margot para atravessar o posto de controle e entrei no anexo secreto”.

A atriz ainda leu os livros escritos pela secretária e assistiu às entrevistas cedidas por ela mais tarde em sua vida. “Miep falava coisas muito obscuras, mas suas palavras se aprofundavam com detalhes dos eventos e, a partir disso, foi possível conhecê-la muito bem e seu ângulo sobre tudo que foi vivido naqueles três ou quatro anos”, pondera.

“Para além de tudo, essa jornada é uma história de amadurecimento de uma garota para uma mulher em meio à violência e ao ódio. No final, ela perdeu amigos e entes queridos, além de arriscar sua própria vida. É um arco incrível que vale a pena conhecer”, conclui Powley.

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