Luiz Sobral Fernandes

Por Luiz Sobral Fernandes

Colunista | Arquiteto sócio da Meridional Arquitetura, escritório que atua em projetos de diferentes escalas e Doutorando pela ETSAB/UPC Barcelona, na Espanha

O arquiteto e professor João Batista Vilanova Artigas (1915-1985) será sempre lembrado pelo projeto que fez para a nova sede da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). O edifício, inaugurado em 1968, substituiu a antiga sede da instituição localizada na Rua Maranhão, em Higienópolis, projetada por Carlos Ekman.

É neste edifício, considerado um dos mais importantes da segunda metade do século 20, que visualizamos muitas das soluções espaciais do arquiteto. Por exemplo, a utilização dos domus, as rampas e os pavimentos em níveis intermediários, o uso do concreto armado aparente, o desenho dos pilares (neste caso, levados ao máximo da exploração formal), e a preocupação com os espaços públicos e coletivos.

No pátio interno coberto dessa faculdade, chamado de Salão Caramelo, já ocorreram e ainda ocorrem as mais variadas reivindicações estudantis da universidade.

Projetada por Vilanova Artigas, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP) reforça o uso do concreto aparente — Foto: Nelson Kon / Divulgação
Projetada por Vilanova Artigas, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU-USP) reforça o uso do concreto aparente — Foto: Nelson Kon / Divulgação

Segundo colegas, Artigas dizia que “as cidades deviam ser como as casas, e as casas como as cidades”. As residências e os edifícios públicos do arquiteto são um universo experimental de um país futuro e se tangenciam em muitos momentos.

Uma interpretação recorrente é de que estes edifícios, projetados com escalas e para públicos distintos, se organizavam espacialmente de maneira semelhante – um à luz do outro. As construções de Artigas se organizam a partir de dentro, são edificações ensimesmadas ao redor de um pátio interno, sem pavimentos tradicionais, visto que as rampas são concebidas para acessar níveis internos.

Artigas projetou ao longo de sua vida muitas casas e, infelizmente, esses projetos acabaram inacessíveis àqueles interessados em arquitetura. Por isso, a mostra Aberto 02, que utiliza uma casa dele como espaço expositivo, ganha tamanha relevância.

Localizado no Alto da Boa Vista, em São Paulo, o imóvel foi projetado pelo arquiteto em 1974 para o engenheiro Alfred Domschke e sua família, que residiu por lá até recentemente. Agora, recebe a mostra temporária idealizada por Filipe Assis, que assina a curadoria ao lado de Claudia Moreira Salles e Kiki Mazzucchelli, com obras de Adriana Varejão, Lygia Pape e Tarsila do Amaral, e estrangeiros como Andreas Eriksson e Edgar Degas.

A Casa Domschke, projetada por Vilanova Artigas, também foi estruturada em concreto armado — Foto: Ruy Teixeira / Divulgação
A Casa Domschke, projetada por Vilanova Artigas, também foi estruturada em concreto armado — Foto: Ruy Teixeira / Divulgação

Nesta residência, as estratégias de projeto partem de um repertório já utilizado pelo profissional em outros trabalhos. A casa, executada em concreto armado, estrutura-se com ‘meios níveis’ a partir de uma topografia criada artificialmente, visto que o terreno original é quase plano. Esta decisão permite que a propriedade seja desenhada com setores específicos e bem trabalhados pelo arquiteto.

Vale também um olhar atento para as cores escolhidas, todas originais e restauradas para a exposição. São combinações pouco comuns de verdes, vermelhos, azuis e amarelos – aliás, o caramelo utilizado em algumas paredes lembra a cor escolhida para o piso da Faculdade de Arquitetura da USP.

As cores da casa construída por Vilanova Artigas foram restauradas para a mostra "Aberto 02" — Foto: Ruy Teixeira / Divulgação
As cores da casa construída por Vilanova Artigas foram restauradas para a mostra "Aberto 02" — Foto: Ruy Teixeira / Divulgação

Outro imóvel que deve estar no roteiro dos interessados por Artigas é o que ele projetou para morar com a família na Rua Barão da Jaceguai, no bairro Campo Belo. Este foi o endereço do arquiteto dos anos 1940 até o final de sua vida, permanecendo habitada por familiares até alguns poucos anos atrás e, hoje, abriga um pequeno café.

Diferente da Casa Domschke, a residência foi projetada em um momento inicial da carreira do arquiteto. Apresenta influências norte-americanas e nenhum elemento em concreto armado aparente – material que seria muito explorado pelo arquiteto nos anos seguintes.

A casa Vilanova Artigas, onde o arquiteto viveu boa parte de sua vida, hoje, sedia um café e um coworking — Foto: Casa Vilanova Artigas / Instagram / Reprodução
A casa Vilanova Artigas, onde o arquiteto viveu boa parte de sua vida, hoje, sedia um café e um coworking — Foto: Casa Vilanova Artigas / Instagram / Reprodução

De pequenas dimensões, a planta se organiza ao redor de um núcleo hidráulico composto por cozinha e banheiro. Ao acessar a casa, indo à esquerda, estão os três dormitórios. Indo à direita, temos sala, varanda e uma escada que acessa um pequeno estúdio envidraçado – local onde ficava o escritório do arquiteto. Dentro do mesmo terreno, mas fechada para visitação, está outra pequena residência feita por ele quando tinha apenas 23 anos, cujo projeto faz referência ao arquiteto estadunidense Frank Lloyd Wright.

E, para aqueles que gostariam de adentrar ainda mais no universo do profissional, indico o documentário "Vilanova Artigas: o arquiteto e a luz", feito por Laura Artigas e Pedro Gorski, com entrevistas de muitos dos ex-alunos e admiradores do arquiteto. Lançado nos cinemas em 2015, está disponível em algumas plataformas de streaming e para compra no YouTube.

  • Mostra "Aberto 02 "
    Quando:
    quarta a domingo, até 17 de setembro
    Horário:
    das 9h30 às 17h
    Ingressos:
    R$ 60 a R$ 80
    Endereço:
    Rua Comendador Elias Zarzur, 2036 - Alto da Boa Vista, São Paulo (SP). CEP: 04736-003
  • Café Artigas
    Funcionamento:
    quarta, quinta e domingo das 12h às 17h; sexta e sábado das 12h às 17h, e das 19h30 às 22h30
    Endereço:
    Rua Barão de Jaceguai, 1151 - Campo Belo, São Paulo (SP). CEP: 04606-003

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