Daniel Bolson

Por Daniel Bolson

Colunista | Arquiteto à frente do escritório Daniel Bolson Arquitetura

A busca por um pedaço da natureza em casa é visível, talvez como um reflexo pós-pandêmico. O número de butiques de plantas, perfis de Instagram botânicos e mesmo de empreendimentos com sacadas e áreas externas cresceu muito.

A verticalização do verde nas fachadas já começa a ser perceptível, não apenas nos lançamentos imobiliários, mas também nas varandas e janelas dos apartamentos por aí. Tons terrosos aparecem cada vez mais nos projetos, carregando essa atmosfera mediterrânea, de conexão com o solo. Fibras naturais, pedras, palhas, lâminas de madeira... A cor do ano divulgada por uma das maiores marcas de tintas do país, inclusive, traz esse aspecto de barro natural.

O diretor criativo Michell Lott no material de divulgação da Calcita Alaranjada, tom alaranjado que remete as cores das terras dos nossos antepassados — Foto: Suvinil / Divulgação
O diretor criativo Michell Lott no material de divulgação da Calcita Alaranjada, tom alaranjado que remete as cores das terras dos nossos antepassados — Foto: Suvinil / Divulgação

As edificações que evidenciam seu método construtivo, com um bom projeto, acabam por ganhar mais charme. Além disso, tendem a ser financeiramente mais interessantes e, inclusive, ecologicamente mais corretas. Destaca-se ainda o brutalismo das texturas.

Os projetos do paraguaio Solano Benitez são um exemplo do bom uso de elementos construtivos em sua forma bruta, utilizando tijolos de barro, posicionados de maneira a gerar belos painéis e brises de ventilação.

A partir do espaçamento entre os blocos, cria-se uma espécie de cobogó (elemento construtivo vazado originalmente brasileiro, popularizado na arquitetura ao longo das décadas). Essa técnica garante um efeito de ar-condicionado natural, graças à circulação cruzada, luminosidade e efeitos de luz e sombra.

O arquiteto paraguaio Solano Benitez mostra em sua arquitetura o bom uso de tijolos de barro no seu aspecto natural — Foto: Divulgação
O arquiteto paraguaio Solano Benitez mostra em sua arquitetura o bom uso de tijolos de barro no seu aspecto natural — Foto: Divulgação

Sempre falo que a melhor forma de alcançar atemporalidade em projetos é conectá-los a elementos naturais, assumindo as texturas originais dos revestimentos, por exemplo. Com a urgência da preservação de recursos, precisamos que a indústria desenvolva acabamentos fiéis às matérias-primas naturais. Lâminas de melamina para marcenaria, pedras fabricadas, como quartzos, pisos laminados, couros sintéticos e porcelanatos em grandes formatos são bons exemplos.

O importante é buscar nesses produtos sempre tons, acabamentos e toques que se assemelhem ao máximo com a inspiração original. Nada mais estranho do que percebermos uma marcenaria com um tom de madeira acinzentado que jamais se viu em lugar algum. Isso acentua a percepção de um espaço vinculado a modismos passageiros, enjoativo e pouco versátil.

A brasilidade do design traz o frescor das memórias conectadas aos recursos naturais, com a valorização desses materiais. Peças torneadas artesanalmente em madeiras originárias daqui, rochas vindas de diferentes partes do Brasil... O traço de Oscar Niemeyer reflete em suas curvas a observação sobre a figura humana e a natureza, seu maior charme, mantendo sua linguagem contemporânea. Isso também acontece nas obras marcadas pelo brutalismo de Paulo Mendes da Rocha, com estruturas aparentes e materiais em sua textura bruta.

Para além de projetos de exteriores, Burle Marx produziu uma série de painéis e tapeçarias, como essa que foi usada no hall do Hotel Emiliano, projeto de Arthur Casas, no Rio de Janeiro — Foto: Fernando Guerra / Divulgação
Para além de projetos de exteriores, Burle Marx produziu uma série de painéis e tapeçarias, como essa que foi usada no hall do Hotel Emiliano, projeto de Arthur Casas, no Rio de Janeiro — Foto: Fernando Guerra / Divulgação

Neste contexto, o paisagismo é parte essencial de um bom projeto. Ele insere o elemento construído ao meio, humaniza e conecta com o ambiente natural. Nossa flora é rica, com uma combinação de cores, desenhos e formas perfeitas. Especialmente me agradam os paisagismos que fazem releituras dos biomas de cada local, reproduzindo a paisagem natural. Os belos murais de Burle Marx e Candido Portinari remetem à exuberância da natureza tão diversa do nosso país – e nunca deixam de ser boas referências.

Conseguir integrar algo construído de maneira harmônica e respeitosa ao existente no local é um trabalho que exige sensibilidade e respeito ao contexto onde se está projetando. É fundamental entender que a arquitetura deve conversar com o entorno, para respeitar suas proporções, escala, paisagem natural e conformações de terrenos.

Reconhecer e trabalhar com essas características certamente acaba por ser o diferencial em um projeto. Empregar elementos locais, artesãos e matéria-prima produzida regionalmente também traz uma bossa difícil de se encontrar. É raro vermos projetos que, genuinamente, conseguem criar essas relações... Que através do simples e despretensioso, configuram uma aura sofisticada e repleta de personalidade, não datada.

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