Malu Gaspar
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Informações da coluna

Por Malu Gaspar

O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Efrain Cruz, está tentando incluir um jabuti na Medida Provisória que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai assinar nesta quinta-feira (23) tratando dos incentivos às empresas de energias renováveis.

Jabuti é como se costuma chamar em Brasília os trechos incluídos em leis ou medidas provisórias que não têm relação direta com o propósito original do texto.

Nesse caso, o jabuti tenta incluir na MP das renováveis serve aos interesses de Carlos Suarez, dono da Termogás e conhecido no mercado como "rei do gás".

Cruz, o "pai do jabuti", é advogado e foi diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) até 2022. Ligado aos senadores Marcos Rogério (PL-RO) e Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), ele foi indicado para o conselho da Petrobras com o apoio da associação de distribuidoras de gás que representa os interesses de Suarez.

Segundo uma minuta que está circulando no mercado, o artigo, que também já consta de um substitutivo do deputado Zé Vitor (PL-MG) -- e que deve ser incluído na MP das Energias Renováveis -- muda o cálculo do valor do megawatt das usinas térmicas tornadas obrigatórias pela lei da privatização da Eletrobras, aprovada em julho de 2021.

Pela nova fórmula, o preço do megawatt a ser oferecido nos leilões pelos interessados em construir as usinas térmicas não vai mais incluir o custo do transporte.

Essa mudança é fundamental porque altera o trecho mais polêmico da lei da privatização aprovada no Congresso – o que obrigava o governo a contratar o fornecimento de 8 mil megawatts (MW) de usinas termelétricas a gás nas regiões Nordeste, Norte, Centro-Oeste e Sudeste a partir de 2026.

O dispositivo já havia sido feito sob medida para Suarez, já que ele é o dono das concessões para fornecer gás às usinas previstas no Norte, do Nordeste e no Centro-Oeste – mas não dispõe de dutos para transportar o combustível.

Ao obrigar a contratação das térmicas, a lei na prática obrigava também os governo ou os consumidores a bancar a construção dos dutos para viabilizar o negócio de Suarez – uma despesa estimada em R$ 120 bilhões e que, segundo a estimativa da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), encareceria a geração da energia em R$ 52 bilhões até 2036.

Só que os preços da energia ficaram tão caros que os leilões para as construções das térmicas não foram adiante. O jabuti de agora é uma nova tentativa de fazer essas usinas deslanchar – e solucionar o problema de Suarez.

Dessa vez, o texto diz que custo do transporte não será computado no preço a ser oferecido no leilão das térmicas, mas só depois da construção das usinas, que contratariam o transporte do gás a partir de uma chamada pública feita pelo governo estadual junto com as distribuidoras estaduais de gás.

Contudo, como não há outra forma de transportar o gás senão construindo os gasodutos, o custo inevitavelmente será incluído na conta de luz e pago por todos os consumidores.

Especialistas em energia apontam que a obrigatoriedade da construção das térmicas é, em si, controversa, uma vez que não falta energia nas regiões em que as térmicas estão sendo previstas. Em alguns casos, como o do Maranhão, há até excesso de oferta, e a energia gerada no estado é enviada para outros locais do Brasil.

Além disso, há outras fontes de energia mais baratas, como a hidrelétrica por exemplo.

Para mitigar a polêmica, o novo jabuti de Efrain Cruz também diminuiu a quantidade de térmicas a serem licitadas – que passa de 8 000 MW para 4.250 MW – , incluiu novos projetos a gás e previu mais 5.000 MW para usinas movidas a outras fontes energéticas que não constavam na lei de privatização da Eletrobras.

Na previsão de novas usinas a gás foi incluída a região do Triângulo Mineiro, base eleitoral do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD).

Já no rol de usinas de outras fontes há uma usina de ​​hidrogênio líquido gerado a partir do etanol, no Nordeste, que contempla usineiros da região, que são base por exemplo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); centrais hidrelétricas no Centro-Oeste, que por sua vez, atenderiam à demanda de grandes produtores agropecuários, como os do grupo Maggi; e usinas eólicas no Sul do Brasil.

Em resumo, depois de ter fracassado no governo de Jair Bolsonaro ao fazer um mais agressivo e explícito para atender aos interesses de Suarez, os amigos do empresário no governo Lula partiram para uma nova estratégia.

De um lado, simplesmente excluiu-se do texto a questão do financiamento dos dutos e se empurrou esse problema para adiante, atribuindo a responsabilidade aos estados. De outro, a tática foi "democratizar o jabuti" , contemplando outros padrinhos. O objetivo é diluir os potenciais alvos de polêmica e ampliar o apoio à medida.

O novo arranjo pode até ser eficiente e acabar passando no Congresso. Mas assim como na proposta anterior, quem vai pagar a conta é o consumidor.

A equipe da coluna procurou o secretário-executivo Efrain Cruz e a assessoria de imprensa do Ministério de Minas e Energia para perguntar sobre as mudanças no marco regulatório das eólicas offshore, mas não obteve resposta. O espaço está aberto para manifestação.

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