Beleza
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Por Carolina Merino (@caamerino)

Das bases em uma quantidade reduzida de tons às fórmulas que invariavelmente acinzentavam a pele preta, o racismo pôde ser sentido anos a fio no Brasil também na indústria da beleza. A história conta que os primeiros cosméticos que chegaram em solos nacionais vinham da Europa, portanto, não eram inclusivos aos múltiplos fenótipos do País. Foram necessários centenas de anos para que o mercado passasse a olhar para a população racializada e, finalmente, atendesse suas necessidades.

Em um período em que surgiam blogs aos montes, um jornalista baiano decidiu falar sobre a beleza sob uma perspectiva inesperada. Há 11 anos, o também maquiador profissional está à frente do Herdeira de Beleza, canal do YouTube e perfil no Instagram de resistência negra onde a cultura é analisada através dos cosméticos. “Eu acredito que as marcas, principalmente de maquiagem, podem dizer muito sobre a história do Brasil, sobre padrões de beleza, sobre negritude”, conta Tássio Santos em entrevista à Glamour.

Nas redes sociais, ele foi responsável por colocar à prova lançamentos nacionais e internacionais indo na contramão de um mercado que tecia elogios a todo custo aos produtos disponíveis. Com resenhas embasadas e criteriosas que ganharam força de uma comunidade que também vivia o descaso da indústria na pele, ele se tornou um dos principais nomes a questionar a indústria nada inclusiva que, por consequência, conveniência ou mais consciência, passou a, finalmente, olhar para este público.

Desde 2020, ele se dedica a um novo projeto: o de escrever um livro. "Tem minha cor?: Quando se maquiar se torna um ato político", Editora Telha, chega às prateleiras neste mês. “Queria levar o tempo que fosse necessário para me dedicar a esse livro e fazer com que o material fosse útil na vida das pessoas por muito tempo, não queria que fosse um conteúdo instantâneo. Eu quero que esse livro seja útil durante muito tempo”, explica o escritor, que se dedicou a investigar as raízes do racismo e o mercado da maquiagem. No papo a seguir, ele explica mais detalhes sobre a nova fase e divide os desafios da escrita.

Tássio Santos lança livro sobre maquiagem e raça — Foto: Divulgação
Tássio Santos lança livro sobre maquiagem e raça — Foto: Divulgação

De onde surgiu a ideia de escrever o livro?

A ideia não foi minha, foi da minha comunidade. Desde que eu comecei a fazer vídeos mais robustos, dar entrevistas para monografia e tese de doutorado, meu público me apontou que seria bom se eu escrevesse um livro porque faltava muita referência que transpassava o mercado de maquiagem. A bibliografia e a indústria literária de beleza ainda são muito brancas, um conhecimento produzido no norte do globo. O livro veio para preencher essa lacuna e em 2020 me senti pronto para escrever.

Como se deu esse processo de questionamento do mercado?

Quando eu não encontrava o meu tom de base em uma loja de maquiagem, eu me sentia muito mal. No momento que eu comecei a contestar a indústria e reivindicar a minha existência através dos cosméticos, eu me senti muito mais contemplado e me senti muito mais visto. Parece que uma parte da minha cidadania foi reconquistada. Isso me trouxe o poder de fortalecer a minha autoestima, me deixou feliz.

Quais foram os maiores desafios que encontrou durante a escrita?

Além do prazo, porque a vida vai acontecendo e a gente vai equilibrando vários prazos ao mesmo temp, o processo de escrita em si foi desafiador. Eu estou há 11 anos na internet, estava acostumado a produzir roteiros e conteúdo através de foto e vídeo; e para colocar tudo o que eu tenho dentro da minha cabeça e dentro do peito em um livro foi difícil porque eu nunca tinha feito isso.

O processo de escrita fala muito sobre autoconhecimento. O que você aprendeu sobre você neste projeto?

Foi uma excelente oportunidade de conhecer mais a minha história porque o livro tem um perfil de entender como as coisas são como são. Não é um tutorial de maquiagem ou livro de fotografia, é um texto corrido, com dados, pesquisa, reflexões sobre o mercado cosmético - que em certos momentos se entrelaçam com a minha própria história. Eu me pego como referência para exemplificar como podemos reconquistar nosso poder através da maquiagem, porque foi assim que aconteceu comigo. Eu mergulhei em uma piscina de sentimentos para entender por quê o Herdeira da Beleza existia, por exemplo.

A relação com seu trabalho mudou depois que você finalizou o livro?

Eu me tornei mais cauteloso, antes eu achava que eu era dono da verdade (risos), talvez eu não tenha razão em todos os momentos. Na internet as coisas mudam muito rápido e ao escrever o livro, tomei cuidado para não deixar nada “escrito em pedra”. Faço o mesmo na internet, desde então.

"Tem minha cor?" está disponível a partir deste domingo (14.04) via Amazon por R$ 59.

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