Jornada de beleza
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Por Raquel Zendron*

"Eu nunca fui uma pessoa que colocava defeito em tudo. Quando eu era novinha, por ser magra, todas as roupas ficavam ótimas em mim. Depois aquele padrão da pessoa com curva, bumbum, coxa, estava mais em alta e as roupas passaram a ficar mais largas.

Não que eu fosse totalmente insatisfeita e deixasse de viver, mas no fundo, ficava ‘poxa, por que eu sou assim?’. Você começa a academia, mas ao mesmo tempo tem que trabalhar, aí vê uma imagem na internet que deixa mal... Eu sempre fui muito grata, mas via defeitos onde não existiam; o meu corpo estava ótimo.

Eu era bancária, mas gostava de me desafiar porque me dava aquela sensação de ‘nossa, eu sou capaz de fazer isso’. Óbvio que existe um medo, mas isso me ajudava na minha vida pessoal também, porque se eu tinha coragem de me jogar de um avião, eu era capaz de fazer outras coisas que eu considero difíceis.

Aos 19 anos fiz meu primeiro salto de paraquedas e amei, mas não voltei porque estava morando longe. Aos 30, acompanhei alguns amigos e aí sim me apaixonei completamente, lembrei o quanto eu tinha gostado e eu pensei ‘quero fazer isso para a minha vida’. Eu nunca fui boa em esporte, eu sou daquelas que foge da bola, mas no paraquedismo eu me encontrei porque era muito mais sobre esforço mental e consciência corporal, que eram coisas que eu tinha.

Raquel Zendron — Foto: Reprodução
Raquel Zendron — Foto: Reprodução

Eu acho que Deus foi muito bom comigo. porque eu procurei melhorar várias coisas em mim antes da minha cirurgia, como me conhecer melhor como mulher, me aceitar. Busquei a terapia, conheci a psicologia positiva e comecei a acreditar muito que a gente pode escolher ser feliz. O paraquedismo também foi nesse sentido de me superar, até mesmo a minha relação com a própria autoestima foi acontecendo nesse processo de amadurecimento.

Geralmente, quando a gente está com a autoestima baixa, a gente não se arruma, não passa maquiagem, não faz a unha, escolhe a pior roupa e aí tudo piora. Então, o que eu fazia quando estava mal era passar um esmalte com cor alegre e colocar uma roupa legal. Fazia muito efeito, parece uma coisa boba, mas ao se olhar no espelho dessa forma você já se sente melhor. Então, quando aconteceu a lesão, eu já tinha passado para várias situações em que eu me desafiei e me senti uma pessoa mais forte, e com certeza isso me ajudou.

No começo da lesão, por ter ficado tetraplégica, não conseguia mexer no celular. Um ano e meio depois, comecei a postar no Instagram para que minha família e meus amigos pudessem acompanhar a minha evolução e, sem querer, as pessoas começaram a me seguir, dizendo que eu estava as ajudando.

Raquel Zendron — Foto: Reprodução
Raquel Zendron — Foto: Reprodução

Nunca me expus, mas a internet possibilita que a gente alcance uma imensidão de pessoas que nem imaginava, e passo muito tempo em casa, por isso, decidi dividir um pouco sobre a minha rotina. Depois eu vi que as pessoas têm muita curiosidade em saber as coisas mais diferentes, por exemplo, o que acontece com uma pessoa com lesão medular.

A maioria das mulheres e homens ficavam ofendidos ou não falavam sobre e eu não concordo com isso, porque acho que as pessoas não querem saber por mal, é porque é diferente. Elas não sabem como funciona. É somente mostrando a realidade que podemos diminuir o preconceito, por isso comecei a fazer vídeos explicando, conversando abertamente sobre tudo, e acho que faz sentido.

Eu precisei de muita fisioterapia para conseguir passar a mão no rosto, mas eu precisava me cuidar. A partir disso, comecei a criar uma rotina para passar produtos de skincare. Já fui até em um casamento e me maquiei sozinha, eu demoro, mas gosto. Quando passo batom, sou só eu. Isso virou, além de uma atividade de beleza, uma atividade de me sentir capaz de fazer. Independência é muito diferente de autonomia, talvez eu não tenha independência, mas só de ter autonomia já sou mais livre.

O que eu mais gosto de mostrar na internet é que as pessoas podem ter uma vida leve e feliz apesar das circunstâncias. Realmente acredito que a felicidade está dentro da gente e todo mundo pode ser feliz, independentemente do que se está vivendo.

Já saltei de paraquedas depois que me tornei tetraplégica e o sentimento de hoje também é de liberdade, de sentir o vento no rosto. É muito gostoso, eu só agradeço. A gente tem que valorizar mais o que a gente tem. Deixar de viver nossos sonhos é muito pior do que adaptá-los para nossa realidade"

*Em depoimento à jornalista Carolina Merino

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