Testes de Carros

Antes de escrever as próximas linhas em homenagem ao icônico Audi R8 preciso confessar que odeio despedidas.

Mas quando vi a notícia de que a derradeira unidade do esportivo saíra das linhas de montagem na Alemanha após 18 anos de história, senti que precisava dizer Auf Wiedersehen de uma forma, digamos, mais próxima, pessoal e íntima. O R8 sai de cena devido às (cada vez mais) rigorosas leis de emissões de poluentes e restrições de carros a combustão na Europa. Atingir os índices requeridos (ainda mais em um motor V10 sem qualquer tipo de eletrificação) é difícil, além de muito caro. Uma pena...

Audi R8 V10 sai de linha pela impossibilidade de viabilizar seu motor em meio às normas de emissão de poluentes — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Audi R8 V10 sai de linha pela impossibilidade de viabilizar seu motor em meio às normas de emissão de poluentes — Foto: Renato Durães/Autoesporte

Porque eu me lembro exatamente do dia 3 de dezembro de 2015. Vai ficar sempre guardado na minha memória. Foi nessa data que ouvi o despertar do Audi R8 V10. Aquela trilha sonora de um grunhido estridente ficou ecoando na minha cabeça por muito tempo. Pudera: era a primeira vez que eu colocava as mãos no esportivo (nove anos depois de seu lançamento) e também em um modelo com motor de tantos cilindros assim. Falta um V12 ainda no currículo (alô, Ferrari e Lamborghini!)

Audi R8 V10 é esportivo cupê que teve duas gerações — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Audi R8 V10 é esportivo cupê que teve duas gerações — Foto: Renato Durães/Autoesporte

O carro em questão ainda era de primeira geração (mas já com o facelift). Foram poucas horas com o largo bólido trajado de um azul fosco (quase roxo) por estradas sinuosas, mas o suficiente para deixar com o gostinho de “quero mais”. O convívio em trechos urbanos era amistoso, apesar de o R8 instigar sempre a afundar o pedal da direita e acelerar para ouvir o V10 . A “nave” virou centro das atenções e entortava pescoços por onde passava.

O novo encontro só aconteceria dois anos depois, já na nova encarnação, pintada com um belíssimo vermelho. Antes, no entanto, vamos à zeitleiste (ou linha do tempo) do carro que teve duas gerações e vendeu quase 40 mil unidades no mundo.

Em quase 20 anos de história, Audi R8 vendeu quase 40 mil exemplares ao redor do mundo  — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Em quase 20 anos de história, Audi R8 vendeu quase 40 mil exemplares ao redor do mundo — Foto: Renato Durães/Autoesporte

O esportivo da marca alemã, que estará para sempre em qualquer livro de história do automóvel, teve as primeiras unidades entregues aos clientes em 2007. Porém, as sementes do R8 (nome que veio das pistas de corrida) foram plantadas quatro anos antes, em 2003, com o Le Mans Quattro Concept, mostrado no Salão de Frankfurt (Alemanha) e que parecia pronto para ser produzido (o R8 final, aliás, traz inúmeros traços desse protótipo). Mas ainda se tratava de um conceito. Tinha chassi e carroceria de alumínio com diversas partes de fibra de carbono.

Audi R8 é derivado de conceito inspirado nas 24 Horas de Le Mans, e seu nome homenageia carro que venceu quatro vezes a corrida — Foto: Autoesporte
Audi R8 é derivado de conceito inspirado nas 24 Horas de Le Mans, e seu nome homenageia carro que venceu quatro vezes a corrida — Foto: Autoesporte

No ano seguinte, 2004, no Salão de Nova York (EUA), outro conceito, o RSQ, dava mais uma prova de que o R8 se tornaria realidade. O protótipo, inclusive, apareceu nas telas do cinema, no filme futurista Eu, Robô, estrelado por Will Smith.

Compartilhando plataforma com o Lamborghini Gallardo à época, o R8 — nome em homenagem ao carro homônimo que venceu cinco vezes as 24 Horas de Le Mans — surgiu apenas com motor V8 4.2 litros aspirado de 420 cv e 43 kgfm de torque, em um primeiro momento. Mas o desempenho já era de gente grande: zero a 100 km/h em 4,3 segundos e velocidade máxima perto dos 300 km/h.

Retorno? R8 pode voltar elétrico — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Retorno? R8 pode voltar elétrico — Foto: Renato Durães/Autoesporte

O famoso V10 5.2 do Gallardo LP560-4 só estrearia em 2008 (como linha 2009). Eram 525 cv, 54 kgfm, zero a 100 km/h em 3,9 segundos e máxima de 316 km/h. O sucesso foi instantâneo, tanto que as quase 6 mil unidades emplacadas ao redor do mundo em 2008 (metade delas na Europa, claro) foram o recorde de vendas que nunca se repetiu. Nos anos seguintes (até este, 2024), a média se manteve entre 2 mil e 3 mil exemplares anuais. No Brasil, a Audi começou a vender o carro somente no final de 2009, com as primeiras unidades aterrisando só no ano seguinte. O preço ficava perto dos R$ 700 mil. O cantor Roberto Carlos, inclusive, foi um dos primeiros donos...

Em 2012 veio a primeira pequena repaginada que mudou levemente os desenhos dos faróis e lanternas, além da estreia da opção GT, mais potente (560 cv) e leve devido ao uso de fibra de carbono em partes da carroceria e também no interior. O toque de frescor do R8 durou até 2015.

Primeira geração do Audi R8 foi lançada em 2006; modelo só passou a ser vendido no Brasil em 2009 — Foto: Autoesporte
Primeira geração do Audi R8 foi lançada em 2006; modelo só passou a ser vendido no Brasil em 2009 — Foto: Autoesporte

Estrela de cinema


Foi nesse ano que veio ao mundo a segunda geração do bólido, no Salão de Genebra (Suíça), e com uma novidade: sem o motor V8. O V10 passava a ser a única opção em duas potências, 540 cv e 600 cv (esta última ganhou o sobrenome Plus).

Se antes mesmo de estrear oficialmente no planeta o R8 já era protagonista de filmes de Hollywood, depois do lançamento o esportivo só faltou ganhar uma estrela na Calçada da Fama. Foram seis filmes da Marvel, tanto que ficou conhecido como o “carro do Homem de Ferro”. O cupê apareceu na trilogia de Iron Man com a versão V8 no primeiro, Spyder no segundo e o conceito elétrico e-tron no terceiro. A variante V10 Plus 2016 deu as caras na telona em Avengers: Era de Ultron e Capitão América: Guerra Civil. A última aparição foi da carroceria conversível (já de segunda geração) no longa Homem-Aranha: De Volta ao Lar.

Audi R8 V10 apareceu em dois filmes da Marvel na configuração Plus — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Audi R8 V10 apareceu em dois filmes da Marvel na configuração Plus — Foto: Renato Durães/Autoesporte

Corta para 11 de abril de 2024. Tenho a oportunidade de dar, quem sabe, a última volta no lendário R8 em nossa pista, o Rota 127 Campo de Provas. Coincidentemente, a última unidade produzida na Alemanha tem a mesma cor do modelo das fotos que a Audi do Brasil vai guardar em sua coleção. O ícone vestido amarelo Vegas ilumina ainda mais o dia ensolarado no interior de São Paulo.

O botão vermelho no belo volante acorda o V10 e os pássaros que vivem nos arredores da pista de teste. Uma sinfonia maligna sai dos quatro dutos de escapamento, dois dos quais só são usados quando uma borboleta elétrica libera o fluxo de gases (por meio de um comando também no volante) — uma artimanha para atender às normas de ruído sem perder a personalidade gutural. Enquanto dirijo para fazer as fotos que você vê nesta matéria, um filme passa na minha cabeça.

Passa rápido. Aliás, com 610 cv (na Europa são 620 cv, mas no Brasil não foi possível homologar o carro com essa potência por causa das emissões) e 57,1 kgfm, esse Audi R8 de segunda geração (com facelift que ocorreu em 2020 e já com o sobrenome Performance) gira acima das 8 mil rpm. Aí o V10 central-traseiro se torna uma carona de luxo que não para de cantar.

Botão de partida do Audi R8 V10 fica no volante e tem cor chamativa — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Botão de partida do Audi R8 V10 fica no volante e tem cor chamativa — Foto: Renato Durães/Autoesporte

Oficialmente, a Audi diz que o zero a 100 km/h é feito em 3,2 segundos. Nossa medição ficou em 3,9 s, mas não importa. As retomadas de 40-80 km/h, 60-100 km/h ou 80-120 km/h levam menos de 2 s (!). Ou seja, há força a qualquer momento — os 1.700 kg de peso se tornam só um número na ficha técnica.

O esportivo da marca alemã era até, digamos, usável no dia a dia. Claro que a suspensão baixa demais e as grandes rodas aro 20 não contribuem com o conforto, mas para esse tipo de proposta o R8 até que dava conta do recado. O consumo de 4,9 km/l na cidade era apenas outro detalhe...

Motor V10 envidraçado, aerofólio em fibra de carbono e rodas aro 20: o R8 é cheio de detalhes — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Motor V10 envidraçado, aerofólio em fibra de carbono e rodas aro 20: o R8 é cheio de detalhes — Foto: Renato Durães/Autoesporte

Os últimos exemplares do R8 no Brasil custavam cerca de R$ 1,3 milhão. O esportivo deve valorizar nos próximos anos, até porque o sucessor (se existir) será elétrico e não terá o charme (e o ronco) dos dez cilindros em “V”. A Audi até começou os ensaios com o R8 e-tron, em 2015, mas o alto preço e o fracasso nas vendas cancelaram o projeto. O RS e-tron GT, um sedã elétrico modernoso com quase 650 cv, lançado em 2020, vingou. E é muito rápido: vai até os 100 km/h no mesmo tempo do R8.

Enquanto o novo não chega, basta guardar o esportivo a combustão na garagem (quem tem) e, como diz a camiseta do meu colega designer Demetrios Cardozo na foto abaixo, resta a nós apenas desfrutar o momento. Danke, R8. Obrigado.

Audi R8 V10 - Zero a 100 km/h em 3,2 segundos! — Foto: Renato Durães/Autoesporte
Audi R8 V10 - Zero a 100 km/h em 3,2 segundos! — Foto: Renato Durães/Autoesporte

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